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A não aceitação dos atestados médicos pelas empresas particulares

Resumo:


  • Os atestados médicos têm finalidades diversas, como autorização de registro civil, admissão ao trabalho, matrículas, licenças, entre outros, contribuindo para a Justiça em casos de perícias médicas e processos judiciais.

  • Para atestados com finalidades que não abonam faltas trabalhistas, a recusa sem justificativa do médico da empresa não é válida, devendo ser aceitos e considerados, podendo haver discordância fundamentada.

  • Para abono de faltas trabalhistas, a ordem preferencial de aceitação de atestados é estabelecida por lei, sendo revogado o § 2º do art. 6º da Lei 605/49. O médico da empresa pode negar atestado médico particular, desde que justifique e realize novo exame.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Os atestados médicos têm finalidades diversas. Autorização de registro civil, admissão ao trabalho, matrículas, licenças, impedimentos por razões psiquiátricas, indenizações, óbitos, além de contribuírem para a Justiça nos casos de perícias médicas, dos inquéritos policiais e dos processos judiciais.

Para a devida análise do tema, mister se faz separar os atestados abonadores de faltas trabalhistas dos demais atestados, referidos supra.


1 – Atestados Médicos em Geral:

Tratando-se de atestados com finalidades outras que não o abono de faltas trabalhistas, a exigência do visto por parte do médico da empresa somente se justificaria na hipótese de considerarmos o mesmo como uma mera formalidade de aceitação, com o intuito único de regularizar a entrada de tais documentos na empresa através do setor especializado na matéria. A recusa ao atestado particular sem justificativas não merece guarida.

O atestado médico não deve, inicialmente, ter sua validade recusada. Na douta opinião de Genival Veloso de França (in Comentários ao Código de Ética Médica, 5ª edição, Editora Guanabara Koogan, página 178), "a utilidade e a segurança do atestado estão necessariamente vinculadas à certeza de sua veracidade. Sua natureza institucional e seu conteúdo de fé pública são os pressupostos de verdade e exatidão que lhe são inerentes".

Ademais, em casos de discordância com o atestado particular, o médico da empresa deve realizar um novo exame e emitir um atestado próprio, fundamentando assim sua posição, nos termos da Resolução do CFM nº10/1990.

Dispõe assim a Resolução do CFM nº10/1990:

"Atestado é o instrumento utilizado para se afirmar a veracidade de certo fato ou a existência de certa obrigação. É o documento destinado a produzir, com idoneidade uma certa manifestação do pensamento. Assim o atestado passado por um médico presta-se a consignar o quanto resultou do exame por ele feito em seu paciente, sua sanidade, e as suas conseqüências. É um documento que traduz, portanto, o ato médico praticado pelo profissional que reveste-se de todos os requisitos que lhe conferem validade, vale dizer, emana de profissional competente para a sua edição – médico habilitado – atesta a realidade da constatação por ele feita para as finalidades previstas em Lei, posto que o médico no exercício de sua profissão não deve abster-se de dizer a verdade sob pena de infringir dispositivos éticos, penais, etc. O atestado médico, portanto, não deve "a priori", ter sua validade recusada porquanto estarão sempre presentes no procedimento do médico que o forneceu a presunção de lisura e perícia técnica, exceto se for reconhecido favorecimento ou falsidade na sua elaboração, quando então, além da recusa, é acertado requisitar a instauração do competente inquérito policial e, também, a representação ao Conselho Regional de Medicina para instauração do indispensável procedimento administrativo disciplinar."

Portanto, todo atestado médico emitido por médico legalmente habilitado, revestido de lisura e perícia, é válido e possui todas as prerrogativas legais a que se destina, devendo ser sempre aceito e levado em consideração pelo médico da empresa, dele discordando somente se fundamentado em sólidas razões científicas ou éticas.


2 – Atestado para abono de faltas trabalhistas:

Diferente se afigura a situação do atestado emitido por médico particular para abonar faltas do trabalhador.

De acordo com a Lei 605/49, em seu artigo 6º:

"Art. 6º Não será devida a remuneração quando, sem motivo justificado, o empregado não tiver trabalhado durante toda a semana anterior, cumprindo integralmente o seu horário de trabalho.

§ 1º São motivos justificados:

(...) f) a doença do empregado, devidamente comprovada.

No parágrafo 2º deste artigo 6º fica estabelecida uma ordem preferencial para aceitação de atestados. Dispõe tal parágrafo:

§ 2º A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha."

No entanto, tal dispositivo encontra-se tacitamente revogado pelo art. 5º da Lei 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social), reproduzido pelo art. 27 da CLPS (Decreto 89.312/84).

Na precisa lição de SERGIO PINTO MARTINS (Direito da Seguridade Social, 22ª edição, Editora Atlas, página 343),

"essa ordem preferencial dos atestados tem origem no art.5º da Lei nº 3.807/60 (LOPS), com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 5.890/73, regra essa reproduzida no art. 27 da CLPS (Decreto 89.312/84). O § 2º do art. 6º da Lei 605/49 (que trata do repouso semanal remunerado) nesse ponto encontra-se revogado, pois dispõe que a ordem de preponderância dos atestados se faria em primeiro lugar em relação ao médico do INSS. Como o § 2º do art. 6º da Lei nº 605/49 e o art. 5º da Lei nº 3.807 possuíam o mesmo campo de incidência, sendo entre si incompatíveis, prevalece a regra do último dispositivo, legal sobre o primeiro, tendo sido revogado o § 2º do art. 6º da Lei nº 605/49. Esse entendimento não se modifica com o § 4º do art. 60 da Lei nº 8.213/91, que reproduz a orientação da LOPS".

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Ainda segundo o citado autor:

"a empresa que dispuser de serviço médico próprio ou em convênio, procederá ao exame médico e ao abono de faltas correspondentes aos primeiros 15 dias de afastamento da atividade (En. 282 do TST). Caso a empresa não possua médico ou convênio médico, ficará a cargo do médico da previdência, do sindicato ou de entidade pública o fornecimento do atestado. Os atestados médicos deverão obedecer a esta ordem para efeito de abono dos dias em que houve falta do empregado (En. 15 do TST). Assim, primeiro vale o atestado médico da empresa ou do convênio e depois os atestados dos médicos da previdência, do sindicato ou de entidade pública, para efeito do abono do dia em que houve ausência do obreiro ao serviço".

Dispõem as referidas Súmulas do Tribunal Superior do Trabalho:

"TST Enunciado nº 15 Justificação - Ausência no Trabalho - Doença - Atestado Médico

A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos, estabelecida em lei."

"TST Enunciado nº 282

Ao serviço médico da empresa ou ao mantido por esta última mediante convênio, compete abonar os primeiros quinze dias de ausência ao trabalho."

Negando a empresa eficácia a atestado médico apresentado pelo empregado em desconformidade com a seqüência relacionada pela Lei 605/49, não estará agindo de forma errônea, não implicando tal conduta em contestação sobre o seu conteúdo, idoneidade ou sequer veracidade das informações nele contidas. Contudo, fica o médico da empresa, que assumiu o exame do trabalhador, responsável pela emissão de novo atestado e seu conteúdo.

Entendemos, assim, que afigura-se permitido ao médico da empresa negar atestado médico particular para abono de faltas trabalhistas desde que justifique tal negativa e providencie pessoalmente a realização de exame no paciente.

Diante do exposto, conclui-se que é prerrogativa do médico da empresa, nas empresas que possuírem serviço médico próprio ou conveniado, a emissão do atestado médico para abono de faltas, por motivo de doença cujo afastamento não supere 15 dias. Superado esse prazo, caberia o exame à Previdência Social (art. 59 da Lei 8.213/91).

Portanto, fica ao seu arbítrio aceitar ou não atestados médicos para abono de faltas emitidos por outros médicos, já que em desconformidade com a seqüência prevista em Lei pertinente ao assunto.

Os demais atestados devem, até prova em contrário, ser aceitos sem restrições pelo médico da empresa, podendo-se considerar o visto como um ato de aceitação expressa. E, em caso de discordância, deve realizar um novo exame e emitir um atestado próprio, fundamentando assim sua posição.

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Sobre o autor
André Pataro Myrrha de Paula e Silva

Analista Jurídico do Ministério Público de Minas Gerais

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, André Pataro Myrrha Paula. A não aceitação dos atestados médicos pelas empresas particulares. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1690, 16 fev. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10953. Acesso em: 18 dez. 2024.

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