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Regime inicial de cumprimento da pena reclusiva ao reincidente

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01/10/1999 às 00:00
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

No âmbito da noção do castigo, a privação da liberdade é a maneira específica pela qual o Direito Penal objetivo concretiza o princípio da reparação equivalente. A prisão, como instrumento realizador da pena-castigo, só tem contribuído para a reprodução da criminalidade. Neste sentido, há que se buscar mecanismos e instrumentos que possibilitem a efetiva diminuição da delinqüência, a salvaguardar o interesse público e social.

O sistema prisional, por sua realidade, é denunciado como um fracasso desde 1820, pois até então não conseguiu cumprir a primordial função de reeducar ou preparar o condenado para a volta ao convívio na sociedade.

Feitas estas primeiras considerações, passa-se à ponderação do tema principal deste trabalho, que foi conceder uma visão sobre a interpretação do artigo 33, §§ 2º, a, b e c, e 3º, do Código Penal, ou seja, a relevância da observação isolada dos dispositivos e a sua conjugação com o que dispõe o art. 59 do mesmo Código, na hipótese de réu reincidente nos crimes delimitados ao presente estudo.

Vê-se que, na maioria dos casos, o critério para a adequação do regime é o objetivo — reincidência.

Contrapondo-se a este entendimento, em recentes julgados, alguns tribunais vêm decidindo que o simples fato de ser reincidente não obriga a fixação do regime prisional inicial de cumprimento da pena no sistema fechado, pois constitui direito fundamental do condenado a motivação.

Tem-se como coerente com a complexidade e a realidade penal brasileira o órgão julgador que faz referência explícita às circunstâncias judiciais que o levaram a decidir por um regime mais gravoso.

O juiz não deve considerar apenas a reincidência na definição do regime prisional, outros fatores, além daqueles previstos no artigo 59, também devem ser levados em conta, como, exemplificando, na hipótese de autorização para recorrer em liberdade (art. 594, CPP).

Sabe-se, pelo que ficou demonstrado, que o réu reincidente condenado à pena de reclusão não faz jus ao regime aberto, se a pena estabelecida ficar entre quatro e oito anos. Todavia, não está escrito que deve iniciar o cumprimento da pena em regime fechado.

O Código Penal, nas hipóteses das letras b e c do § 2º do artigo 33, usa a expressão poderá e não deverá, como o fez em relação à letra a.

A diversidade dos vocábulos tem rigoroso sentido, que não pode ser descurado. Com efeito, são manifestamente distintas as situações emergentes do dever ser e do poder ser, principalmente quando procuram exprimir comandos sancionatários.

Não resta dúvida de que o cumprimento da pena superior a 8 anos será obrigatoriamente iniciado em regime fechado. Abrem-se, contudo, para condenados a penas situadas aquém desse limite, possibilidade de cumprimento em condições menos severas, atendidas as condições personalíssimas do agente e a natureza do crime cometido.

A fixação do regime inicial de cumprimento da pena para os condenados à reclusão, observados os limites que a lei estabelece (artigo 33, § 2º, b e c), depende de outros requisitos, quais sejam, não ser reincidente e atender positivamente os ditames do artigo 59 do Código Penal. Se as diretivas não lhe forem favoráveis, outro regime mais rigoroso poderá ser implementado como necessário para reprovar a conduta típica.

A lógica, portanto, está na assertiva de que não se tratando de pena superior a oito anos de reclusão (art. 33, § 2º, letra a, do CP), a imposição de regime inicial fechado dependerá de fundamentação adequada em face do que dispõem as alíneas b e c do § 2º e também o § 3º e artigo 59 do mesmo diploma. A reincidência afasta o regime próprio, considerada a pena cominada, mas não impõe, obrigatoriamente, entre os existentes, o mais rigoroso.

A alínea c do dispositivo citado faculta ao condenado não reincidente, com pena igual ou inferior a quatro anos, desde o início, cumprir a pena em regime aberto. Essa norma é a maior causadora de equívocos, pois é a única que se dirige às duas espécies de penas: reclusão e detenção.

Considerando que o artigo 33 não fixa o regime fechado para pena inferior a quatro anos ao réu reincidente, sendo favoráveis as circunstâncias do artigo 59, a fixação do regime semi-aberto ou aberto, conforme o caso, para início de cumprimento da pena corporal, satisfaz os fins da pena.

Ao arremate, consigna-se que, ao proceder à individualização da pena, o juiz, após um leque de circunstâncias de natureza subjetiva — culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do agente — e de natureza objetiva — motivos, circunstâncias e conseqüências do crime —, fixará aquela cabível dentre as cominadas, em quantidade que for necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do delito, definindo, a seguir, o regime inicial de cumprimento da pena, a qual não deve ser excessiva nem demasiadamente abrandada, mas justa, adequada e idônea, em qualidade e quantidade bastantes para reprimir a prática da infração e promover a tutela da sociedade.

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A relevância da definição do regime prisional decorre do sentido e da função da pena, que não deve ser concebida como instrumento de castigo, mas em consonância com os modernos desígnios que realçam a recuperação moral e social do réu.

Reforça-se a necessidade da reflexão sobre tema que, por sua importância e por si só, merece especial atenção.


NOTAS
  1. BECCARIA, Cesaria. Dos delitos e das penas. Tradução por Lucia Guidicini. São Paulo : Martins Fontes, 1991, p. 146.
  2. Op. cit., p. 146.
  3. DELMANTO, Celso. Código Penal comentado. 3ª ed. Rio de Janeiro : Ronovar, 1991, p. 60.
  4. KUEHNE, Maurício. Teoria e prática da aplicação da pena. 2ª ed. Curitiba : Juruá, 1998, p. 24.
  5. TARS — RA 290108117 — JUTARS 76-27.
  6. FAGÚNDEZ, Paulo Roney. Holismo, Direito e ética. http://www.iaccess.com.br/roney/arthol. htm.
  7. ROSA, José Miguel Feu. Direito Penal. 1ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1995, p. 421-422.
  8. Também denominado Filosofia das Luzes, foi um movimento filosófico do século XVIII que se caracterizava pela confiança no progresso e na razão, pelo desafio à tradição e à autoridade e pelo incentivo à liberdade de pensamento.
  9. BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Rio de Janeiro : Forense, 1967, t.1, p. 82-83.
  10. Antropologia Criminal: estudo da história natural do homem.
  11. Ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social, do comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma informação válida contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime — contemplado este como problema individual e como problema social —, assim como sobre os programas de prevenção eficaz e técnicas de intervenção positiva no homem delinqüente.
  12. CARVALHO, Hilario Veiga de. Compêndio de Criminologia. São Paulo : José Bushatsky, 1973, p. 191-192.
  13. Op. cit., p. 29-42.
  14. Op. cit., p. 77.
  15. TORRES, Paulo R. Pinheiro. Noções de Direito Penal. Rio de Janeiro : Liber Juris, 1973, p. 24-25.
  16. Sistema de governo em que o governante se investe de poderes absolutos, sem limite algum, exercendo de fato e de direito os atributos da soberania.
  17. Atavismo: reaparecimento, em um descendente, de um caráter não presente em seus ascendentes imediatos, mas sim em remotos.
  18. Crânio pequeno e assimétrico, fronte baixa, arcadas salientes, maxilares desenvolvidos, orelhas de abanos, espessos cabelos, insensibilidade física e psíquica, olhar duro para os criminosos de sangue, e instável para os ladrões.
  19. Liberalismo político: doutrina que visa a estabelecer a liberdade política do indivíduo em relação ao Estado e preconiza oportunidades iguais para todos.
  20. FARIAS JÚNIOR, João. Manual de Criminologia. Curitiba : Juruá, 1993, p. 30-31.
  21. O que emprega unicamente o raciocínio, partindo de princípios considerados como verdadeiros e indiscutíveis; método categórico-dedutivo.
  22. Consiste em se estabelecer uma verdade universal ou uma proposição geral com base no conhecimento de certo número de dados singulares ou de proposições de menor generalidade.
  23. AMARAL, Agamenon Bento do. Direito Processual Penal: lições teóricas e práticas. http://www.ccj.ufsc.br/~agamenon/principal.html.
  24. OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. Florianópolis : UFSC, Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina, 1984, p. 37-68.
  25. Trabalho ao ar livre, com pequena vigilância, mas com remuneração.
  26. Capitães que para aqui vieram, com poder discricionário amplo, sendo absolutamente independentes na aplicação da justiça em seus territórios, conforme constava das cartas de doação do rei.
  27. Democracia e Estado de Direito: Como realização de valores de convivência humana (igualdade, liberdade e dignidade da pessoa), o conceito de democracia é mais abrangente do que o de Estado de Direito, pois este emergiu como expressão da democracia liberal. Assim, o Estado Democrático de Direito concilia Estado de Direito e Estado Democrático, revelando um novo conceito que incorpora os princípios daqueles dois primeiros, superando-os à medida que agrega um componente revolucionário de transformação do estado anterior. Dessa forma, chega-se aos seguintes princípios básicos do Estado Democrático de Direito: a) da constitucionalidade; b) democrático; c) sistema de direitos fundamentais; d) da justiça social; e) da igualdade; e) da igualdade; f) da divisão de poderes; g) da legalidade; e h) da segurança jurídica.
  28. PRADO, Luiz Regis. BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal anotado e legislação complementar. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1997, p. 144.
  29. Op. cit., p. 4.
  30. STF — HC — Relator Firmino Paz — DJU de 16.10.81, p. 10.310.
  31. TACRIM-SP — AC — Relator Adauto Suannes— RT 594-355.
  32. TFR — ED — Relator Assis Toledo— RTFR 149-277.
  33. O processo deve ser apto a cumprir integralmente a sua função sócio-político-jurídica, atingindo em toda a plenitude os seus escopos institucionais. Dinamarco, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 2a. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1990, p. 83.
  34. Quando for considerada entre seu mínimo e seu máximo. Ex.: Art. 155, § 4º (furto qualificado) — pena de 2 a 8 anos, e multa. Em concreto: quando já há uma definição quanto à pena. Ex.: sujeito condenado irrecorrivelmente a 8 anos de reclusão por lesão corporal de natureza grave (transitada em julgado) — Já existe a individualização da pena.
  35. Tudo aquilo que possa modificar um fato criminoso, sem alterar-lhe a essência.
  36. Não confundi-las com as qualificadoras que se encontram na Parte Especial, na descrição dos delitos. Pelas agravantes o quantum a ser acrescido fica a critério do juiz; pelas qualificadoras não, o próprio Código já traz o mínimo e o máximo da pena agravada.
  37. A pena deve ser necessária e suficiente à reprovação e prevenção do crime. Deve ser a retribuição justa da culpabilidade, no sentido amplo.
  38. Fato típico e antijurídico.
  39. Op. cit., pág. 59.
  40. TACRIM-SP — AC — Relator David Haddad — JUTACRIM 85-457.
  41. TACRIM-SP — HC — RJD 7-91 — JUTACRIM 80-108 e 87-127.
  42. MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 12ª ed. São Paulo : Atlas, v.1, p. 288.
  43. STF — RE — Relator Ministro José Cândido — RSTJ 17-472.
  44. TJSC — Habeas corpus n. 11.434, de Canoinhas. Relator Tycho Brahe.
  45. TACRIM-SP — AC — Relator Ricardo Couto — JUTACRIM 31-98.
  46. TJSC — Processo-crime n. 254, de Xanxerê. Relator Nilton Macedo Machado.
  47. TJSC — Apelação Criminal n. 96.008689-7, de São Carlos. Relator Álvaro Wandelli.
  48. TJSC — Apelação Criminal n. 96.006655-1, de Balneário Camboriú. Relator Nilton Macedo Machado.
  49. Op. cit., p. 88.
  50. MIRABETE, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. São Paulo : Atlas, 1999, p. 336.
  51. JUTACRIM 82-33.
  52. TACRIM - SP HC 130.800 — Relator Leite Cintra.
  53. TACRIM-SP — AC — Relator Amaral Salles — JTACRIM 69-335.
  54. TACRIM-SP — AC — Relator Reynaldo Ayrosa — JUTACRIM 84-266.
  55. STF — HC n. 71.509-5 — Relator Marco Aurélio — DJU de 27.10.94, p. 29.163.
  56. TJMG — AC — Relator José Arthur — RT 519-425.
  57. JESUS, Damásio E. de. Código Penal anotado. 6ª ed. São Paulo : Saraiva, 1996, p. 152.
  58. HC — 68.991— SP — 2ª T. — Relator Néri da Silveira — DJU de 11.06.1993.
  59. STF — HC n. 69.793 — SP — 1ª T. — Relator Octávio Gallotti — DJU de 24.09.1993.
  60. HC — Relator Celso de Melo — RJD 25-517.
  61. Op. cit., p. 173.
  62. Op. cit., p. 324.
  63. É uma sanção imposta pelo juiz a um sujeito ativo de um crime, oriunda de uma sentença judicial.
  64. Idem, p. 325.
  65. RODRIGUES, Maria Stella Villela Souto Lopes. ABC do Direito Penal. 12ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1996, p. 123.
  66. Op. cit., p. 173-174.
  67. TACRIM-SP — AC — Relator Camargo Sampaio — JUTACRIM 67-403.
  68. TACRIM-SP — AC— Relator Ítalo Galli — RT399-287.
  69. TJSP — Relator Ary Belfort — RT 649-252.
  70. TACRIM-SP — AC — Relator Segurado Braz — JUTACRIM 94-342.
  71. TACRIM-SP — AC — Relator Edmond Acar — RT 396-315.
  72. TACRIM-SP — AC — Relator Onei Raphael — JUTACRIM 19-297.
  73. JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. São Paulo : Saraiva, v.1, 1983, p. 539.
  74. TJSC — Apelação criminal n. 31.081, de Lages.
  75. FRANCO, Alberto Silva et al. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 6ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, v.1, t.1, 1997, p. 1.023.
  76. Op. cit., p. 175.
  77. Op. cit., p. 365.
  78. Op. cit., p. 256-257
  79. Op. cit., p. 253.
  80. Op. cit., p. 109-110.
  81. Op. cit., p. 124-125.
  82. Op. cit., p. 62-63.
  83. STJ — RE n. 134.598, 6ª Turma, 14.4.98 — Relator Vicente Leal — DJU de 11.598, p. 163.
  84. STJ — RE n. 566, PR, Relator Flaquer Scartezini — JSTJ 8-192.
  85. TJSC — Apelação criminal n. 32.766, da Capital. Relator Nilton Macedo Machado.
  86. TJSC — Apelação criminal n. 30.392, de Criciúma. Relator José Roberge.
  87. TJSC — Apelação criminal n. 96.003407-2, de Mondaí, Relator Álvaro Wandelli.
  88. JTAERGS 104-150.
  89. STJ — RT 725-533.
  90. RSTJ 89-385 — STJ: RSTJ 26-340; JSTJ 8-192.
  91. TJSC — Apelação criminal n. 96.007854-1, de Sombrio. Relator Jorge Mussi.
  92. TJSC — Apelação criminal n. 96.004598-8, de Blumenau. Relator Jorge Mussi.
  93. TJSC — Apelação criminal n. 96.003826-4, de São Lourenço d´Oeste. Relator Cesar Augusto Mimoso Ruiz Abreu.
  94. TACRIM-SP — AC1.053.001-1, de 14.4.97 — Relator Abreu Machado.
  95. RT 749-666.
  96. TACRIM-SP — AC — Relator Corrêa de Moraes — RT 733-592.
  97. STJ — RE n. 22.829-7 — Relator Vicente Cernicchiaro — DJU de 23.8.93, p. 16.593.
  98. TACRIM-SP — Ap. — Relator Ary Casagrande — RT 727-523.
  99. TACRIM-SP — Ap. — Relator Moacir Pires — RJD 28-222.
  100.   STF — HC n. 71.851 — Relator Sydney Sanches — RT 719-552.
  101. TACRIM-SP — RT 725-585.
  102. TACRIM-SP — RJDTACRIM 28-222.
  103. TACRIM-SP — RJDTACRIM 24-302.

BIBLIOGRAFIA

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TORRES, Paulo R. Pinheiro. Noções de Direito Penal. Rio de Janeiro : Liber Juris, 1973, 251p.

WARAT, Luis Alberto. Mitos e teorias na interpretação da lei. Porto Alegre : Síntese, 1979, 159 p.

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Sobre o autor
Dilton Ávila Canto

bacharel em Direito, assessor jurídico do Tribunal de Justiça de Santa Catarina

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CANTO, Dilton Ávila. Regime inicial de cumprimento da pena reclusiva ao reincidente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 35, 1 out. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1099. Acesso em: 25 dez. 2024.

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