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O princípio republicano.

A declaração de inconstitucionalidade no processo administrativo tributário

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6.CONCLUSÃO

Após toda a explanação realizada no presente estudo, vê-se que o conflito existente acerca do tema ainda não se encontra totalmente superado. Isto se dá pelos fortes argumentos que ambas as correntes possuem, mormente à interpretação do texto constitucional e seus princípios.

Conforme foi demonstrado, todo o conflito reside, principalmente, na interpretação do Princípio Republicano, base do Estado Democrático de Direito e responsável pela tripartição dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).

Entretanto, de acordo com as conclusões deste trabalho, o Princípio Republicano não enseja a total tripartição do poder governamental, visto que cada um desses Poderes possui alguns pontos de interseção com os demais, como forma, inclusive, de garantir a autonomia dos mesmos. Sendo assim, a própria Constituição Federal, ao passo em que determina expressamente a separação dos Poderes, elenca, a cada um, as situações em que deverá exercer funções distintas daquelas de maior característica.

Por este motivo, concluiu-se que o controle de constitucionalidade não é tarefa privativa do Poder Judiciário, sendo exercido por todos os Poderes, cada um dentro dos limites constitucionalmente estabelecidos. Do mesmo modo, viu-se que o controle de constitucionalidade é método essencial à manutenção do Estado Democrático de Direito, pois, apesar de o sistema brasileiro adotar a teoria da nulidade dos atos inconstitucionais, os administrados somente podem furtar-se de cumprir as leis com o amparo de outra norma (uma decisão judicial ou administrativa, por exemplo).

A partir desta premissa, concluiu-se que o julgador administrativo possui ampla capacidade, constitucionalmente fundamentada, de exercer o controle de constitucionalidade, controle este que deve ser exercido de modo difuso, ou seja, aplicado a casos específicos, e jamais com efeitos erga omnes, pois, por outro lado, esta é uma atribuição privativa do Supremo Tribunal Federal.

Tal exercício do julgador administrativo não ofende, de nenhuma maneira, a tripartição dos Poderes governamentais, visto que o processo administrativo é constitucionalmente fundamentado pelo princípio do devido processo legal, contraditório e, principalmente, ampla defesa. Por este motivo, o administrado possui o direito constitucional de argüir, em seu favor, qualquer que seja a matéria, incluindo-se as de ordem constitucional.

Pelo mesmo motivo, não há de se falar em princípio da legalidade como fundamento para que não se apreciem matérias constitucionais em sede de julgamento administrativo. Pelo contrário, o julgador administrativo, uma vez pautado pelo princípio da ampla defesa, deverá interpretar o princípio da legalidade em seu sentido amplo e material, uma vez que a aplicação de lei, qualquer que seja ela, é a aplicação da própria Constituição Federal, fundamento de todo o ordenamento jurídico brasileiro. Em outras palavras, o princípio da legalidade em seu sentido material engloba todas as espécies legislativas, principalmente a Constituição Federal.

Contudo, apesar destas afirmações, concluiu-se também que o controle administrativo de constitucionalidade não pode ser exercido por qualquer agente público, uma vez que somente aqueles incumbidos de exercer a função jurisdicional é que estão pautados para tanto (julgadores administrativos e Tribunais de Recursos administrativos).

Deste modo, concluindo o pronto principal do presente trabalho, vislumbrou-se que é possível e, principalmente, necessário, que o julgador administrativo analise as questões constitucionais alegadas pelos administrados, pois, somente assim, estará atendendo a todos os princípios constitucionais que fundamentam o processo administrativo (devido processo legal, contraditório e ampla defesa) e as decisões oriundas deste.

Caso contrário, a decisão proferida sem análise de alegadas inconstitucionalidades é omissa e, pior ainda, imputa ao administrado o ônus da cobrança (inscrição em dívida ativa e execução fiscal) sem ao menos decidir o mérito por este questionado. A Administração Pública deveria, na pior das hipóteses, sobrestar o processo administrativo e socorrer-se do Poder Judiciário para que se resolvesse a questão, uma vez que entende não ser competente para dirimir inconstitucionalidades.

O presente trabalho não coaduna com este entendimento e conclui que é possível aos julgadores administrativos, dentro da mais inteira constitucionalidade, adentrar o mérito de questões constitucionais, deixando de aplicar, quando for o caso, a lei inconstitucional, e anulando, consequentemente, a autuação fiscal oriunda do mesmo.


REFERÊNCIAS

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________. Lei nº 5.172 de 1966. Código Tributário Nacional. Brasília, 1966.

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NOGUEIRA, Alberto. O devido processo legal tributário, Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

PINHO, Rodrigo César Rebello. Da organização do Estado, dos poderes e histórico das constituições. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

RODRIGUES, Daniel Costa. Segurança constitucional tributária no sistema positivo brasileiro. São Paulo: De Direito, 1997.


NOTAS

01 "Art. 22-A. No julgamento de recurso voluntário, de ofício ou especial, fica vedado à Câmara Superior de Recursos Fiscais afastar a aplicação, em virtude de inconstitucionalidade, de tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo em vigor."

02 QUESTÃO de Ordem no Proc. nº DRT 10 nº 2123/93, rel. Adhemir Ramos da Silva. Câmaras Reunidas. Boletim III, ano XXIII, edição Extra, nº II, fev. 1996.

03 "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte [...]".

04 "Art. 77. Fica o Poder Executivo autorizado a disciplinar as hipóteses em que a administração pública federal, relativamente aos créditos tributários baseados em dispositivo declarado inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, possa:

I – abster-se de constituí-los;

II – retificar o seu valor ou declará-los extintos, de ofício, quando houverem sido constituídos anteriormente, ainda que inscritos em dívida ativa;

III – formular desistência de ações de execução fiscal já ajuizadas, bem como deixar de interpor recursos de decisões judiciais."

05 "LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;"

06 Quando as decisões a que se refere o artigo anterior forem contrárias, no todo ou em parte, à Fazenda Estadual, deverá o julgador de primeira instância interpor recurso de ofício para o Conselho de Recursos Tributários, observando o disposto no artigo 68 deste Decreto, inclusive em procedimento especial de restituição, nos casos de deferimento no todo ou em parte da restituição pleiteada.

07 "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte [...]".

08 "Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

[...]

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais."

09 "Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."

10 "Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário."

11 "Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

[...]

IX - julgar anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar os relatórios sobre a execução dos planos de governo;"

12 "Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

I processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;"

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13 "Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.

§ 1º Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto."

14 "Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação."

15 "Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público."

16 "Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;

[...]

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.

d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal

§ 1.º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal

§ 3º No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros."

17 "Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

[...]

§ 2º - Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias."

18 "A lei ou é constitucional ou não é lei. Lei inconstitucional é uma contradição em si. A lei é constitucional quando fiel à Constituição; inconstitucional, na medida em que a desrespeita, dispondo sobre o que lhe era vedado. O vício da inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição vigente ao tempo de sua elaboração" (ADI nº 2/DF, Rel. Min. Paulo Brossard. STF. Tribunal Pleno. DJU 21.11.1997. Ementário nº 1892-01/1).

19 "Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional."

20 "Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional."

21 "Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;"

22 "Art. 96. Compete privativamente:

I - aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;

b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo exercício da atividade correcional respectiva;

c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos de juiz de carreira da respectiva jurisdição;

d) propor a criação de novas varas judiciárias;

e) prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, obedecido o disposto no art. 169, parágrafo único, os cargos necessários à administração da Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei;

f) conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem imediatamente vinculados;"

23 "XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;"

24 Trecho do voto do Min. Moreira Alves proferido na RP nº 980/SP, relator o próprio Min. Moréia Alves. RTJ 96/496-513.

25 Faz-se a ressalva de "antiga" por ter sido o processo civil modificado e, como se sabe, hoje o procedimento se dá por meio de "cumprimento de sentença", conforme as disposições do Código de Processo Civil.

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Sobre o autor
Francisco Chagas da Frota Neto

advogado, especializando em Direito e Processo Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FROTA NETO, Francisco Chagas. O princípio republicano.: A declaração de inconstitucionalidade no processo administrativo tributário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1703, 29 fev. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10993. Acesso em: 27 abr. 2024.

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