Tema nº 977 do STF: uma análise de perspectivas e jurisprudência.

Policial pode acessar dados de celular?

Exibindo página 2 de 2

Resumo:


  • O tema aborda a discussão sobre o acesso da autoridade policial à agenda telefônica e ao registro de chamadas em um celular encontrado no local do crime, equilibrando a proteção dos direitos individuais e a eficácia das investigações criminais.

  • A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal destaca a relevância da correta aplicação do princípio constitucional da inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas e a necessidade de autorização judicial para acesso a dados de celulares.

  • Os Ministros do STF têm proposto teses que defendem a necessidade de decisão judicial fundamentada para acessar dados de celulares apreendidos no local do crime, visando conciliar a proteção da intimidade e privacidade com a eficiência das investigações policiais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4. DEBATE JURISPRUDENCIAL SOBRE A LICITUDE DA PROVA

4.1. TESE PROPOSTA PELO MINISTRO DIAS TOFFOLI

Inicialmente, o Ministro Dias Toffoli firmou seu entendimento de que é lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico ou agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado, não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações, à intimidade ou à privacidade do indivíduo (CF, art. 5º, incisos X e XII).

4.2. PROPOSTAS DOS MINISTROS GILMAR MENDES E EDSON FACHIN

Os Ministros Gilmar Mendes e Edson Fachin, que negavam provimento ao recurso interposto, propunham a fixação da seguinte tese:

O acesso a registro telefônico, agenda de contatos e demais dados contidos em aparelhos celulares apreendidos no local do crime atribuído ao acusado depende de prévia decisão judicial que justifique, com base em elementos concretos, a necessidade e a adequação da medida e delimite a sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade e ao sigilo das comunicações e dados dos indivíduos (CF, art. 5º, X e XX).

4.3. REVISÃO DE POSICIONAMENTOS E A PROPOSIÇÃO DO MINISTRO FLAVIO DINO

Mais recentemente, o Ministro Dias Toffoli alterou seu entendimento aderindo ao posicionamento do Ministro Gilmar Mendes, fixando a seguinte tese:

  1. O acesso a registro telefônico, agenda de contatos e demais dados contidos em aparelhos celulares apreendidos no local do crime atribuído ao acusado depende de prévia decisão judicial que justifique, com base em elementos concretos, a necessidade e a adequação da medida e delimite a sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade, ao sigilo das comunicações e à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais (CF, art. 5º, X, XII e LXXIX).

  2. Em tais hipóteses, a celeridade se impõe, devendo a Autoridade Policial atuar com a maior rapidez e eficiência possíveis e o Poder Judiciário pode conferir tramitação e apreciação prioritárias aos pedidos dessa natureza, inclusive em regime de Plantão.

Esse também é o entendimento do Ministro Flavio Dino, que propõe, com o objetivo de salvaguardar os direitos fundamentais à privacidade e intimidade, é necessária uma decisão judicial fundamentada para o acesso a qualquer conteúdo de aparelho celular apreendido. No entanto, a apreensão do dispositivo, conforme estabelecido pelo artigo 6º do Código de Processo Penal, ou em situações de flagrante delito, assim como a determinação de preservação dos dados e metadados de suspeitos ou investigados, não requer reserva de jurisdição.


5. REFLEXÕES SOBRE O EQUILÍBRIO ENTRE A NECESSIDADE DE INVESTIGAÇÃO E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Conforme evidenciado, a tendência da jurisprudência do STF, e mesmo dos votos já proferidos pelos Ministros é de dar prioridade ao Direito à Intimidade e Privacidade, em se tratando da atuação policial sem prévia decisão judicial, balizando a conduta dos policiais no sentido de não negligenciar esses direitos em face da celeridade de sua atuação.

Refletir sobre o equilíbrio entre a necessidade de investigação e a proteção dos direitos fundamentais é essencial para uma abordagem justa e eficaz no campo da justiça criminal.

Por um lado, a investigação eficiente é fundamental para a aplicação da lei e a manutenção da ordem pública. Ela pode ser crucial para identificar e deter criminosos, prevenir crimes futuros e garantir a segurança da sociedade como um todo.

Por outro lado, é vital garantir que essa investigação seja realizada dentro dos limites estabelecidos pela lei e que respeite os direitos fundamentais dos indivíduos. A privacidade, a intimidade e o sigilo das comunicações são direitos protegidos por lei e essenciais para a dignidade humana e o exercício da liberdade individual.

O desafio reside, portanto, em encontrar um equilíbrio adequado entre a necessidade legítima de investigação e a proteção dos direitos fundamentais, para que nenhum direito seja negligenciado em face do outro.

De qualquer forma, possui o STF um difícil papel de se posicionar a respeito do tema. Atualmente, há 4 votos a favor da ilicitude do acesso dos policiais, sem prévia autorização judicial, a registros e informações contidos em aparelho de telefone celular, mas a questão ainda se encontra indefinida.

Em última análise, o objetivo é alcançar um sistema de justiça equitativo e eficiente, no qual a proteção dos direitos fundamentais seja considerada uma parte integrante e indispensável do processo de investigação criminal.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – TEMA 977. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=5173898&numeroProcesso=1042075&classeProcesso=ARE&numeroTema=977. Acesso em: 19 maio. 2024.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 05 maio. 2024.

CÓDIGO CIVIL. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 05 maio. 2024.

CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 05 maio. 2024.

LEI Nº 9.296, DE 24 DE JULHO DE 1996. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9296.htm. Acesso em: 05 maio. 2024.


Notas

1 HC 168052; Órgão julgador: Segunda Turma; Relator(a): Min. GILMAR MENDES; Julgamento: 20/10/2020; Publicação: 02/12/2020. Trechos: “Acesso a aparelho celular por policiais sem autorização judicial; Necessidade de autorização judicial. 3. Violação ao domicílio do réu após apreensão ilegal do celular ; Ordem concedida para declarar a ilicitude das provas ilícitas e de todas dela derivadas

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

2 RE 1116949; Órgão julgador: Tribunal Pleno; Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO; Redator(a) do acórdão: Min. EDSON FACHIN; Julgamento: 18/08/2020; Publicação: 02/10/2020. Trechos: “Prova obtida por meio de abertura de encomenda postada nos correios; É possível ao legislador definir as hipóteses fáticas em que a atuação das autoridades públicas não seriam equiparáveis à violação do sigilo a fim de assegurar o funcionamento regular dos correios”.

3 RE 625263; Órgão julgador: Tribunal Pleno; Relator(a): Min. GILMAR MENDES; Redator(a) do acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES; Julgamento: 17/03/2022; Publicação: 06/06/2022; Trechos: A interceptação telefônica [...] dependerá de ordem judicial (cláusula de reserva jurisdicional) e deverá ser expedida pelo juiz competente para a ação principal, em decisão devidamente fundamentada que demonstre a sua conveniência e a indispensabilidade desse meio de prova; O afastamento do sigilo de dados telefônicos somente poderá ser decretado, da mesma maneira que no tocante às comunicações telefônicas, nos termos da Lei n. 9.296/96 e sempre em caráter de absoluta excepcionalidade; A citada lei vedou o afastamento da inviolabilidade constitucional quando não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal ou a prova puder ser feita por outros meios disponíveis; Possibilidade de sucessivas prorrogações da interceptação telefônica, desde que demonstrada a necessidade de renovar a medida e respeitado o limite de 15 (quinze) dias entre cada uma delas, sem que exista violação ao art. 5º, da Lei n. 9.296/96; Diante da demonstração, mínima e razoável não há como declarar a nulidade das decisões que, embora sucintas, estão de acordo com o dever de fundamentação”.

4 ADPF 635 MC-ED; Órgão julgador: Tribunal Pleno; Relator(a): Min. EDSON FACHIN; Julgamento: 03/02/2022; Publicação: 03/06/2022. Trechos:Transparência e Publicidade Dos Protocolos de Atuação Policial; Instalação de Câmeras e Gps ; Redução da letalidade policial; Os protocolos de atuação policial devem ser públicos e transparentes, porque asseguram a confiabilidade das instituições de aplicação da lei e amparam os agentes de Estado na sua atividade, dando a eles a necessária segurança jurídica de sua atuação; Segundo a maioria do Colegiado, a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados”.

Assuntos relacionados
Sobre os autores
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos