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Embargos declaratórios.

Estudo sob a perspectiva de seu efeito suspensivo

07/03/2008 às 00:00
Leia nesta página:

Os embargos de declaração, conquanto remanesçam prestigiosas opiniões em contrário, têm natureza jurídica de recurso.

Para a fixação da premissa acima, basta uma análise topológica do Código de Processo Civil para se concluir que o instituto está alocado no capítulo referente aos recursos em processo civil. Nesse sentido, Alexandre Freitas Câmara afirma que:

"Há que se considerar que a atribuição de natureza recursal a determinado instituto é função do legislador, cabendo ao intérprete tão somente acatá-la (ao menos de lege lata). E quanto a tal modo de proceder, nosso legislador foi de extrema clareza. Os embargos de declaração estão tratados no CPC dentro do Título que regula os recursos." [01]

Pois bem, a partir disso, o presente trabalho perquire analisar um específico aspecto do citado recurso, qual seja, o seu efeito suspensivo.

Sem maiores indagações, afirma-se que os embargos de declaração têm o efeito suspensivo. A doutrina, de modo geral, considera o efeito suspensivo como inerente aos embargos de declaração, tendo em vista que a lei, quando tenciona desprover determinado recurso de efeito suspensivo, o faz expressamente. É a letra do artigo 520, 542, § 2º do Código de Processo Civil, dentre outros. Nesse sentido, Nelson Nery Jr [02], Manoel Caetano Ferreira Filho [03] e Humberto Theodoro Jr. [04]

Ocorre que, com a devida venia, não se pode considerar apenas a ausência de regramento para se emprestar efeito suspensivo aos embargos de declaração, já que existem outras questões que devem ser enfrentadas para se extrair uma ilação.

A primeira delas diz respeito ao fato de que não é o recurso que suspende os efeitos de uma decisão, mas sim a decisão em si, que exsurge e tem sua executividade de plano. O recurso apenas prolonga a suspensividade nascida com a prolação da decisão.

É a doutrina de Ada Pellegrini, Antonio Scarance e Antonio M. Gomes Filho, citados por Fredie Didier Jr.

"É interessante notar, como prelecionam Ada Pellegrini, Antonio Scarance e Antonio M. Gomes Filho, que antes mesmo da interposição do recurso e pela simples possibilidade de sua interposição, a decisão ainda é ineficaz. De modo que, para os autores, não é o recurso que tem efeito suspensivo, tendo antes o condão de prolongar a condição de ineficácia da decisão." [05]

Ora, ao se conferir indistintamente efeito suspensivo aos embargos de declaração, sem se observar a decisão se recorrida nasce ou não provida de tal efeito, quebra-se o vínculo havido entre a decisão e o recurso naturalmente aceito para a sua revisão, desconsiderando-se a vontade da lei, ao emprestar efeito suspensivo onde originalmente não se tem.

Destarte, o direito deve ser considerado como um sistema orgânico e lógico. O interprete da norma deve considerá-la dentro de um todo harmônico. Ao extrair a profundidade de uma dicção normativa, deve jungi-la com os demais preceitos normativos de forma a evitar incompatibilidades.

Com efeito, os embargos de declaração são manejáveis, hodiernamente, em face de todas as decisões, desde que preenchidos os requisitos do artigo 535, I e II do Código de Processo Civil.

Diante dessa generalidade, deve-se interpretar que os embargos declaratórios devem se adequar à exigência da decisão que busca atacar, a fim de se evitar incongruências no sistema processual.

Por isso, deve os embargos de declaração seguir a sorte do recurso que naturalmente seria manejável para guerrear a decisão. Se a decisão desafia recurso desprovido de efeito suspensivo, nada mais lógico do que os embargos de declaração seguirem o mesmo procedimento.

Essa é a doutrina de Fredie Didier Jr. que baliza sua doutrina na tese de Flávio Cheim Jorge, conforme se denota da citação abaixo:

"Parece mais correto, contudo, perfilhar o entendimento de Flávio Cheim Jorge, para quem os embargos de declaração devem seguir a regra do recurso que seria cabível da decisão embargada ou que seja interposto após seu julgamento. É que, pela sistemática do CPC/73,os atos judiciais são classificados para definir is recursos que poderão ser interpostos. Da sentença cabe apelação, devendo ser interposto agravo contra decisão interlocutória, ao passo que o despacho é irrecorrível. Do acórdão cabem embargos infringentes, recurso ordinário, recurso extraordinário, recurso especial ou embargos de divergência. Para cada um desses recursos, há disciplina própria, a estabelecer quais os efeitos que eles têm: há dentre eles, os que têm efeito suspensivo e os que não têm. Quanto aos embargos de declaração, são cabíveis contra todo e qualquer ato judicial, devendo, então, seguir a regra do recurso cabível na espécie. Assim, se opostos embargos declaratórios contra decisão interlocutória, como o agravo não tem efeito suspensivo, os embargos também não deveriam ter. Proferida a sentença, se a apelação estiver em uma das hipóteses descritas no artigo 520 do CPC, os embargos não teriam efeito suspensivo. Do contrário, ou seja, enquadrando-se a hipótese na regra geral e tendo a apelação efeito suspensivo, então os aclaratórios, no caso teriam também efeito suspensivo." [06]

Teresa Wambier corrobora a tese acima esposada, como se infere abaixo:

"Os embargos de declaração são interponíveis de todos os tipos de pronunciamos judiciais, portanto, de pronunciamentos que ensejam a interposição de outro recurso. Por isso é que se deve levar em conta, segundo o citado autor (Cheim Jorge), o recurso cabível (próprio) contra a decisão que se quer impugnar, num primeiro momento, por meio dos embargos de declaração. Assim, os embargos de declaração não teriam o condão de alterar a situação criada pelo recurso próprio: se se trata de hipótese em que os efeitos da decisão não se estão produzindo, porque está sujeita a recurso com efeito suspensivo, estes não se produzirão; se já há efeitos no mundo empírico porque se trata, v.g., de uma liminar (impugnável por agravo) não é a interposição dos embargos de declaração que fará com que estes cessem" (op. cit., p. 91). Confira-se, também, artigo de Carlos Gustavo Rodrigues Del Prá: "As decisões interlocutórias são sujeitas a recurso de agravo, o qual, em regra, não tem efeito suspensivo. Ou seja, delas emanam seus efeitos desde logo. Ora, como podem, então, os embargos de declaração ter efeito suspensivo ? Uma de duas: ou a mera impugnabilidade por embargos de declaração já impediriam a produção dos efeitos da decisão interlocutória (como ocorre ordinariamente nas sentenças, sujeitas ao recurso de apelação), ou bastaria a sua interposição para obstaculizar que a decisão produzisse seus efeitos. De qualquer forma, a solução interpretativa atentaria contra a própria lógica do sistema. E mais, prejudicaria sobremaneira sua efetividade" [07]

A par disso, outra questão que deve ser levada em consideração, e que foi objeto de substancioso estudo de João Batista Lopes, publicado na Revista de Processo - RePro n° 154 – dezembro de 2007, é a efetividade das tutelas de urgência e o possível óbice por meio dos embargos de declaração.

O Constituinte de 1988, cônscio de que a integral proteção dos direitos fundamentais da pessoa depende do reforço do instrumento para o atingimento de tal desiderato, erigiu à estatura constitucional, diversos princípios de ordem processual.

Dentre eles, destaca-se a previsão do artigo 5, XXXV da Constituição que ao estabelecer a garantia da inafastabilidade da jurisdição, agasalhou não só a lesão, mas também a ameaça, como fato ensejador de apreciação jurisdicional.

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Pois bem, com base na teoria de Ada Pellegrini, Antonio Scarance e Antonio M. Gomes Filho, não se pode extrair outra conclusão que não a de que as tutelas de urgência, que visam tutelar direito em face de perigo eminente de lesão, não se sujeitam a recurso naturalmente provido de efeito suspensivo. Adotar tese contrária seria desvirtuar o sistema processual.

Diante disso, considerar se poderia embargar a decisão e com isso suspende-la até o julgamento do recurso seria priorizar o instrumento em detrimento do direito, fazendo letra morta a Constituição Federal que tencionou o contrário.

Ciente disso, em parecer devidamente publicado na Revista de Processo n° 154, verbalizou João Batista Lopes:

"A entender de modo diverso, aberta estaria a porta à neutralização dos comandos de urgência: bastaria que vencido manejasse sucessivos embargos de declaração para livrar-se do cumprimento da obrigação o que atentaria contra a efetividade da jurisdição." [08]


CONCLUSÃO

Diante dos argumentos expostos acima, pode-se extrair a ilação de que ao se considerar de modo genérico a afirmativa de que os embargos de declaração têm efeito suspensivo, porquanto inexiste regra processual que diga o contrário, é se olvidar dos dois importantes aspectos da ciência processual expostos nesse trabalho, quais sejam, a necessidade de se interpretar a norma dentro de um contexto geral, de forma a manter hígida a harmonia do sistema, bem como ter-se ciência que o direito processual deve ser efetivo, na medida em que visa resguardar direitos constitucionalmente protegidos.

Com isso, por vez mais, pedimos escusas a considerável parte da doutrina que conclui em sentido contrário, para afirmar que é preciso construir o sentido da norma jurídica de forma a adequá-la dentro de um sistema concatenado e lógico bem como de maneira a preservar a máxima efetividade desse sistema de direito processual, em observância a imperativos constitucionais vigentes.


BIBLIOGRAFIA

CÂMARA, Alexandre Freitas, - Lições de Direito Processual Civil, 14ª edição, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.

FERREIRA FILHO, Manoel Caetano, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 7, Revista dos Tribunais, 2001.

LOPES, João Batista, Efeito suspensivo dos embargos de declaração, Revista de Processo n° 154, dezembro/2007

NERY JÚNIOR, Nelson e ANDRADE NERY, Rosa Maria de Andrade – Código de Processo Civil Comentado, 9ª edição, Revista dos Tribunais, 2006.

THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, v. I, 36ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 2004

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, Omissão Judicial e Embargos de Declaração, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2005


Notas

01 CÂMARA, Alexandre Freitas, - Lições de Direito Processual Civil, 14ª edição, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2007.

02 NERY JÚNIOR, Nelson e ANDRADE NERY, Rosa Maria de Andrade – Código de Processo Civil Comentado, 9ª edição, Revista dos Tribunais, 2006.

03 FERREIRA FILHO, Manoel Caetano, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 7, Revista dos Tribunais, 2001.

04 THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de Direito Processual Civil, v. I, 36ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 2004.

05 Curso de Direito Processual Civil, v. III, ed. Podium, p. 75.

06 Curso de Direito Processual Civil, v. III, ed. Podium, p. 167.

07Omissão Judicial e Embargos de Declaração, São Paulo, RT, 2005

08 LOPES, João Batista, Revista de Processo n° 154, dezembro/2007, p. 249.

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Sobre o autor
Rafael de Oliveira Rodrigues

Procurador do Estado de São Paulo em Guarulhos (SP). Pós-graduando em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Pós-graduando em Direito Tributário pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Rafael Oliveira. Embargos declaratórios.: Estudo sob a perspectiva de seu efeito suspensivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1710, 7 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11029. Acesso em: 18 dez. 2024.

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