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Caso Deolane Bezerra: críticas à prisão preventiva

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A banalização da prisão preventiva pode gerar o cerceamento da liberdade individual sem que existam devidas e necessárias justificativas, prejudicando a efetividade do sistema de justiça penal.

Este texto visa analisar os aspectos jurídicos da prisão preventiva com algumas críticas a sua banalização atualmente. A prisão é a última hipótese para o ser humano, por isso há os institutos das medidas cautelares diversas da prisão. A Constituição Federal, lei maior, em seu artigo 5°, inciso LVII, foi bem clara ao afirmar que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória”. Sendo assim, alguém só deveria ser preso após o tribunal analisar e de fato condenar o réu. Recentemente notamos vários juízes/juízas decretando prisões preventiva sem cabimento ou sem observar os requisitos objetivos dispostos no Código de Processo Penal brasileiro.

No início do mês de setembro de 2024, a advogada, influenciadora e empresária Deolane Bezerra e sua mãe foram presas preventivamente em uma operação que as acusa de lavagem de dinheiro proveniente de jogos ilegais. A juíza responsável pela audiência de custódia manteve a prisão preventiva de ambas e os próximos passos do caso são a produção de provas para uma futura sentença, seja condenatória ou absolutória. Para ser decretada a prisão preventiva, deve-se o julgador observar alguns artigos do Código de Processo Penal, tais como: 312, 313, 318 e 319. O artigo 312, do CPP, diz que: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. Ou seja, alguns requisitos objetivos são necessários para decretação de uma prisão preventiva. E, devemos lembrar que a prisão em um estado democrático de direito é exceção e não regra. Por isso, o artigo 318, do CPP trata das medidas cautelares diversas da prisão, isto é, prisão deverá ser última hipótese, pois limita o bem mais valioso que temos em vida, o direito de ir e vir. O supremo tribunal federal em sede de julgamento de Habeas Corpus nº 1236.292 decidiu: a prisão preventiva deve ser uma exceção, exigindo justificativa sólida.

Acerca do tema, também nos orienta Cezar Roberto Bittencourt:

“O princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima ratio, orienta e limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. Se outras formas de sanção ou outros meios de controle social revelarem-se suficientes para a tutela deste bem, a sua criminalização é inadequada e não recomendável.”

Após uma análise da vida pessoal da advogada Deolane Bezerra, notei que ela possui bons antecedentes e é mãe de uma menina menor de 9 anos, o que nos leva a criticar tal decisão de manutenção da prisão preventiva pela magistrada de Pernambuco, pois de acordo com o artigo 318, do CPP, que trata da prisão domiciliar, poderá o juiz substituir a prisão preventiva em domiciliar caso a acusada seja mulher e com filho de até 12 anos de incompletos.

Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.

Vejo com preocupação essa banalização da prisão preventiva que só vem crescendo no Brasil recentemente. Isso só tem por resultado o encarceramento em massa do sistema prisional brasileiro. De acordo com dados recentes da 17° edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, no Brasil, há cerca de 210.687 presos provisórios aguardando julgamento. Segundo dados desta edição, são 832.295 pessoas ao total no sistema prisional brasileiro. Por isso, devemos recordar que a prisão dever ser decretada de acordo com requisitos objetivos e somente ao final do trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parafraseando o saudoso ex-ministro do STJ, Nefi Cordeiro: “juiz não enfrenta crime, juiz não é agente de segurança pública, não é controlador da moralidade social ou dos destinos políticos da nação. O juiz criminal deve conduzir o processo pela lei e Constituição Federal, com imparcialidade, e somente ao final do processo sopesando adequadamente as provas, reconhecer a culpa ou declarar a absolvição”.

Sendo assim, a banalização da prisão preventiva pode gerar o cerceamento da liberdade individual sem que existam devidas e necessárias justificativas, e isso prejudica a efetividade do sistema de justiça penal, bem como traz instabilidade ao sistema jurídico penal brasileiro. Desse modo, a prisão preventiva deve ser utilizada de forma criteriosa e excepcional, e somente quando realmente for necessário para a garantia da ordem pública, da instrução criminal e aplicação da lei penal, conforme determinado no art. 282, I, do Código de Processo Penal.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Decreto - Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal, artigo 312 a 319. 

ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA 2023. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ano 17, 2023. ISSN 1983-7364.

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 16ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

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Sobre o autor
Carlos Daniel Targino da Silva

Correspondente Jurídico e Pesquisador

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Daniel Targino. Caso Deolane Bezerra: críticas à prisão preventiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7737, 6 set. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/110829. Acesso em: 16 set. 2024.

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