3. A recente decisão do STJ acerca do cabimento da verba honorária em cumprimento de sentença – valoração do princípio da causalidade – a questão da fixação dos honorários em início de cumprimento e em sede de impugnação
Nesse sentido, merece aplauso a primeira e recente decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial n. 978.545 – MG, julgado em 11.03.2008, cuja relatora foi a Ministra Fátima Nancy Andrighi, tendo participado do julgamento os Ministros Ari Pargendler e Sidnei Beneti, e que passamos a transcrever in verbis:
VALÉRIA DA SILVA BELMONTERECURSO ESPECIAL Nº 978.545 - MG (2007/0187915-9)
RECORRENTE :
ADVOGADO : BERNARDO RIBEIRO CAMARA E OUTRO(S)
RECORRIDO : LIQUIGÁS DISTRIBUIDORA S/A
ADVOGADO : FERNANDO AUGUSTO PEREIRA CAETANO E OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSO CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NOVA SISTEMÁTICA IMPOSTA PELA LEI Nº 11.232/05. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS. POSSIBILIDADE.
- O fato de se ter alterado a natureza da execução de sentença, que deixou de ser tratada como processo autônomo e passou a ser mera fase complementar do mesmo processo em que o provimento é assegurado, não traz nenhuma modificação no que tange aos honorários advocatícios.
- A própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos "nas execuções, embargadas ou não".
- O art. 475-I, do CPC, é expresso em afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, se faz por execução. Ora, se haverá arbitramento de honorários na execução (art. 20, § 4º, do CPC) e se o cumprimento da sentença se faz por execução (art. 475, I, do CPC), outra conclusão não é possível, senão a de que haverá a fixação de verba honorária na fase de cumprimento da sentença.
- Ademais, a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo advogado até então.
- Por derradeiro, também na fase de cumprimento de sentença, há de se considerar o próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei nº 11.232/05, em especial a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC. De nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária, arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação.
Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti e Ari Pargendler votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 11 de março de 2008 (data do julgamento).
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Recurso especial, interposto por VALÉRIA DA SILVA BELMONTE, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional. Trata-se do cumprimento de sentença proferida nos autos de ação de indenização por danos morais e materiais, ajuizada pela recorrente em face de LIQUIGÁS DISTRIBUIDORA S/A, ora recorrida. Decisão: afastou a incidência de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença, em razão do desaparecimento da figura da "execução de sentença", em virtude do advento da Lei nº 11.232/05. Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrente, nos termos do acórdão (fls. 202/207) assim ementado: "EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - NOVA LEI DE EXECUÇÃO N. 11.232/05 - FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS NO DESPACHO INICIAL DA EXECUÇÃO - EXECUÇÃO NÃO EMBARGADA - IMPOSSIBILIDADE - Sendo a ação de execução de título judicial continuidade do processo de conhecimento, incabível a fixação de honorários advocatícios no caso de a mesma não ser impugnada, ante a nova sistemática do processo de execução instaurado pela lei n. 11.232/05 ". Recurso especial: alega a recorrente violação aos arts. 20, § 4º, 475-J, 475-R, 651 e 710 do CPC. Em suas razões, sustenta a necessidade de fixação de novos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. Prévio juízo de admissibilidade: apresentadas contra-razões (fls. 225/236), foi o recurso especial regularmente admitido na origem (fls. 238/239). É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cinge-se a controvérsia a determinar se, na nova sistemática de execução estabelecida a partir da edição da Lei nº 11.232/05, há incidência de honorários advocatícios na impugnação ao cumprimento da sentença. Na fundamentação deste julgado, restou consignado que: "(...) de acordo com a nova lei, que altera substancialmente o Código de Processo Civil, o arbitramento dos honorários de sucumbência limitar-se-ão àqueles arbitrados na fase de conhecimento, a não ser que sejam criados eventuais incidentes causados pelo devedor, o que será analisado caso a caso.(fls. 204)(...) Dessa forma, sendo a ação de execução de título judicial continuidade do processo de conhecimento, tenho que não é cabível a fixação de honorários advocatícios no caso de a mesma não ser impugnada, com ocorre no caso em discussão (...).Ora, não há cabimento em fixar verba honorária quando não existe sucumbência, não se fazendo necessária a fixação de honorários pelo douto Julgador a quo quando do despacho inicial da execução, uma vez que não se sabe se vai haver impugnação pelo devedor ou não (...)" (fls. 206) Com efeito, as alterações perpetradas pela Lei nº 11.232/05 tiveram o escopo de unificar os processos de conhecimento e execução, tornando este último um mero desdobramento ou continuação daquele. Conforme anota Luiz Rodrigues Wambier, "hoje, o princípio do sincretismo entre cognição e execução predomina sobre o princípio da autonomia " (Sentença Civil: liquidação e cumprimento. São Paulo: RT, 2006, 3ª ed., p. 419). Essa nova realidade foi materializada pela alteração da redação dos arts. 162, § 1º, 267, caput, 269, caput, e 463, caput, todos do CPC; tudo para evidenciar que o processo não se esgota, necessariamente, com a declaração do direito, de modo que a função jurisdicional somente estará encerrada com a efetiva satisfação desse direito, ou seja, a realização prática daquilo que foi reconhecido na sentença. Entretanto, o fato de se ter alterado a natureza da execução de sentença, que deixou de ser tratada como processo autônomo e passou a ser mera fase complementar do mesmo processo em que o provimento é assegurado, não traz nenhuma modificação no que tange aos honorários advocatícios. A idéia de que havendo um só processo só pode haver uma fixação de verba honorária foi construída em uma época em que o CPC albergava o modelo liebmaniano da separação entre os processos de cognição e execução, e não pode ser simplesmente transplantada para a nova sistemática imposta pela Lei nº 11.232/05. Aliás, a própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos "nas execuções, embargadas ou não".No julgamento do EREsp 158.884/RS, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, Rel. p/ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 30.04.2001, a Corte Especial deste Tribunal decidiu que a redação do art. 20, § 4º, do CPC, "deixa induvidoso o cabimento de honorários de advogado em execução mesmo não embargada, não fazendo a lei, para esse fim, distinção entre execução fundada em título judicial ou execução fundada em título extrajudicial ".Confrontando esse precedente com as inovações da Lei nº 11.232/05, o Min.Athos Gusmão Carneiro ressalta que "esta orientação jurisprudencial permanece mesmo sob a nova sistemática de cumprimento da sentença, porquanto irrelevante, sob este aspecto, que a execução passe a ser realizada em fase do mesmo processo, e não mais em processo autônomo " (Cumprimento da Sentença Cível. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 108). Com efeito, diz a Lei, e isso é sintomático, que os honorários serão fixados nas execuções. Não há no texto da norma referência aos "processos de execução", mas às execuções. Induvidoso, portanto, que existindo execução, deverá haver a fixação de honorários. Acrescente-se, ainda, que o art. 475-I, do CPC, é expresso em afirmar que o cumprimento da sentença, nos casos de obrigação pecuniária, se faz por execução. Ora, se haverá arbitramento de honorários na execução (art. 20, § 4º, do CPC) e se o cumprimento da sentença se faz por execução (art. 475, I, do CPC), outra conclusão não é possível, senão a de que haverá a fixação de verba honorária na fase de cumprimento da sentença. No mais, o fato da execução agora ser um mero "incidente" do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual esta Corte admite a incidência da verba. Confira-se, nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp 737.767/AL, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, Rel. p/ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 22.05.2006; REsp 751.400/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 19.12.2005; e AgRg no REsp 631.478/MG, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 13.09.2004. Outro argumento que se põe favoravelmente ao arbitramento de honorários na fase de cumprimento da sentença decorre do fato de que a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo advogado até então. E nem poderia ser diferente, já que, naquele instante, sequer se sabe se o sucumbente irá cumprir espontaneamente a sentença ou se irá opor resistência. Contudo, esgotado in albis o prazo para cumprimento voluntário da sentença, torna-se necessária a realização de atos tendentes à satisfação forçada do julgado, o que está a exigir atividade do advogado e, em conseqüência, nova condenação em honorários, como forma de remuneração do causídico em relação ao trabalho desenvolvido na etapa do cumprimento da sentença. Do contrário, o advogado trabalhará sem ter assegurado o recebimento da respectiva contraprestação pelo serviço prestado, caracterizando ofensa ao art. 22 da Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Advocacia, que garante ao causídico a percepção dos honorários de sucumbência. Nesse ponto, o que releva destacar, apenas, é que, com o advento da Lei nº 11.232/05, a incidência de novos honorários pressupõe o esgotamento do prazo legal para o cumprimento espontâneo da condenação. Sem que ele se escoe não há necessidade de praticar quaisquer atos jurisdicionais, donde o descabimento daquela verba. Por derradeiro, é aqui que reside o maior motivo para que se fixem honorários também na fase de cumprimento de sentença, há de se considerar o próprio espírito condutor das alterações pretendidas com a Lei nº 11.232/05, em especial a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC.Conforme observa Cássio Scarpinella Bueno, "este acréscimo monetário no valor da dívida, aposta o legislador, tem o condão de incentivar o devedor a pagar de umavez, acatando a determinação judicial" (A Nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, 2ª ed. p. 83). Realmente, a segunda onda de reformas do CPC/1973, a chamada "reforma de reforma", foi centrada no processo de execução, tendo como objetivo maior a busca por resultados, tornando a prestação jurisdicional mais célere e menos burocrática, antecipando a satisfação do direito reconhecido na sentença. Nesse contexto, de nada adiantaria a criação de uma multa de 10% sobre o valor da condenação para o devedor que não cumpre voluntariamente a sentença se, de outro lado, fosse eliminada a fixação de verba honorária, arbitrada no percentual de 10% a 20%, também sobre o valor da condenação. Considerando que para o devedor é indiferente saber a quem paga, a multa do art. 475-J do CPC perderia totalmente sua eficácia coercitiva e a nova sistemática impressa pela Lei nº 11.232/05 não surtiria os efeitos pretendidos, já que não haveria nenhuma motivação complementar para o cumprimento voluntário da sentença. Ao contrário, as novas regras viriam em benefício do devedor que, se antes ficava sujeito a uma condenação em honorários que poderia alcançar os 20%, com a exclusão dessa verba, estaria agora adstrito tão-somente a uma multa no percentual fixo de 10%. Tudo isso somado – embora cada fundamento me pareça per se bastante – leva à conclusão de que deve o juiz fixar, na fase de cumprimento da sentença, verba honorária, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC. Forte em tais razões, CONHEÇO do recurso especial e lhe DOU PROVIMENTO, para determinar que, sobre a parte da sentença não cumprida voluntariamente pela executada incida verba honorária no valor de R$3.000,00 (três mil reais), nos termos do art. 20, § 4º, do CPC.
Observe-se que acórdão prolatado traz de forma clara e precisa o entendimento de que são cabíveis honorários advocatícios em quaisquer circunstâncias processuais na dita fase de cumprimento da sentença, haja vista a disposição contida no art. 20, parágrafo 4º do CPC.
A confirmação desta assertiva está no fato de que o STJ reconheceu, através do julgado ora examinado, que ocorre a violação ao art. 20, parágrafo 4º do CPC, caso o juiz não fixe em momento inicial da fase executiva, em execução ‘não embargada’ (e in casu, não impugnada), a devida verba honorária em contraprestação ao trabalho do advogado do exeqüente, como queria o acórdão recorrido prolatado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, sob o pretexto de que, "sendo a ação de execução de título judicial continuidade do processo de conhecimento, incabível a fixação de honorários advocatícios no caso de a mesma não ser impugnada, ante a nova sistemática do processo de execução instaurado pela lei n. 11.232/05." [33]
Interessante verificar, corroborando as idéias lançadas neste artigo, que a violação à lei processual civil foi examinada pela ilustre relatora, Ministra Fátima Nancy Andrighi, não pela óptica da natureza jurídica do ato ou do momento processual, mas sim pelo reconhecimento do trabalho desenvolvido pelos causídicos, ante o não cumprimento voluntário da obrigação de pagar quantia, levando os advogados a dar continuidade ao procedimento executivo, imprimindo atos executivos expropriatórios e, efetivamente, exercendo tecnicamente a prestação de um serviço, exigido pela causalidade e não pela sucumbência.
A análise do teor dos argumentos contidos no julgado prolatado referenda a tese de que os honorários advocatícios estão muito mais vinculados ao princípio da causalidade, e não somente à sucumbência, traduzindo-se a contraprestação do serviço executado pelo causídico na mais pura e simples razão de ver apenado quem utiliza inutilmente a máquina judiciária protelatoriamente, ou ainda, sem razão alguma, caracterizando, in casu, a recalcitrância em dar cumprimento voluntário à decisão judicial.
É uma forma de responsabilização daquele que, por ação ou omissão, dá ensejo à continuidade da relação processual, sem motivos. [34]
A causalidade dá mais valor e respeito aos atos processuais, impedindo a progressão sem causa do processo e o surgimento de incidentes infundados ou protelatórios.
Claro que os dois princípios se somam, pois normalmente aquele que responde pela verba honorária é aquele que deu causa à ação e foi sucumbente. Causalidade e sucumbência normalmente andam juntas e justificam a imposição dos honorários advocatícios.
Porém, tal assertiva não pode se tornar regra geral, pois, sendo assim, em circunstâncias onde temos a causalidade, restando comprovado o trabalho do advogado, mas não temos a sucumbência, como no caso dos cumprimentos de sentença não impugnados, seria sempre vencida a tese dos argumentos pelo reconhecimento do trabalho do advogado somente sob o pretexto processual da existência precípua de decisão que declara o direito, ou de, ao menos, evidente litigiosidade formada incidentalmente em alguns casos.
Cai por terra, com o acórdão prolatado pelo STJ, toda a argumentação doutrinária e jurisprudencial já apresentada neste artigo de que não cabem honorários em execução de sentença pois não existiria sucumbência que ensejasse o novo arbitramento.
Realmente, nas hipóteses de fixação de honorários na fase inicial de execuções não impugnadas, não há sucumbência, mas existe trabalho, que deve ser reconhecido e remunerado!
Não podemos admitir a idéia de que o trabalho do advogado está somente centrado na litigiosidade que advém de ação completa, contestada, ou de uma execução embargada ou impugnada. [35]
Em cumprimento de sentença não impugnado, há sim, também, muito trabalho exercitado pelo causídico em diversas circunstâncias, a exemplo da elaboração da memória de cálculo e do requerimento de penhora e avaliação, dos procedimentos de pedido de penhora on-line, das solicitações ao juízo de busca de informações acerca de bens em nome do devedor caso não se obtenha antecipadamente estas informações, de eventual requerimento de informação de averbação de bem efetivada a teor do art. 615-A, parágrafo 1º. do CPC, etc. [36]
Todas estas circunstâncias são derivadas da causalidade, mas não se ligam em nenhum momento à eventual sucumbência.
Todo este trabalho do advogado, frise-se, do qual não se tem previsão (advogado não tem bola de cristal!), deve ser remunerado igualmente aos demais momentos processuais subseqüentes, de acordo com as circunstâncias da continuidade da relação processual, agora em fase executiva.
A tentativa de englobar ou abarcar toda esta dedicação técnica do profissional da advocacia na verba honorária estipulada pela sentença do processo de conhecimento constitui, além de violação à regra do art. 20, parágrafo 4º, do CPC, como muito bem reconheceu o acórdão prolatado pela 3ª Turma do STJ, um alvitre à noção mínima de contraprestação econômica de um serviço prestado, dentro dos limites de cada diferente momento em que ele possa ser exigido.
E aqui entra a segunda problemática, que envolve questões antigas, como a do cabimento ou não de verba honorária em incidentes processuais, que voltam à baila, sobretudo pelo fato de que a nova reforma, na tentativa de imprimir celeridade e efetividade ao cumprimento das sentenças, caracterizando a etapa executiva como etapa final do processo de conhecimento, efetivada no mesmo iter procedimental, passou a considerar como ‘incidentes’ da fase processual executiva a antiga ação de liquidação da sentença e a impugnação do devedor (antigos embargos à execução). [37]
Tão logo adveio a publicação da lei 11.232/05, ficou clara a idéia de que o primeiro sucumbente com a nova sistemática foi o advogado, pelo menos em algumas interpretações doutrinárias e jurisprudenciais iniciais, que fizeram reavivar os inúmeros pretextos processuais já ressalvados neste artigo, afastando a imposição de verba honorária em sede de cumprimento de sentença sob a alegação de que passando a impugnação e a liquidação à categoria de incidentes processuais, descabidos seriam os honorários pelos motivos que a jurisprudência já tinha assentado há longo tempo. [38]- [39]
Penso que o acórdão prolatado pelo STJ deixa largas linhas para uma interpretação pelo cabimento de verba honorária em quaisquer momentos processuais derivados da causalidade na fase de cumprimento de sentença, inclusive no que diz respeito à impugnação do devedor.
Não será a natureza jurídica da impugnação, seja como for considerada, por ação, defesa ou como incidente, que dará a tônica do cabimento ou não dos honorários advocatícios. [40]
Também não será a idéia de que o ato que encerra o referido momento processual, seja ele sentença ou decisão interlocutória, em uma óptica voltada ao parágrafo 3º do art. 20 do CPC, com ideal centrado unicamente na sucumbência, que dará lugar definitivamente à justificativa que determinará a imposição da verba honorária.
De igual forma às colocações expostas no tocante ao cabimento dos honorários em sede de cumprimentos de sentença não impugnados, ou ainda não impugnados, a imposição da contraprestação aos serviços prestados pelo advogado se dará principalmente pela causalidade.
Então, surge a indagação: poderemos, em sede de cumprimento de sentença, ter a imposição de honorários advocatícios, a cada um desses momentos processuais, de forma independente, de acordo com cada trabalho apresentado pelos causídicos?
A resposta é sim! Sim, em pelo menos três momentos distintos!
Teremos decisão acerca da verba honorária pelo juiz se houver o incidente de liquidação de sentença, que é incidente prévio ao cumprimento da mesma, sobretudo na modalidade por artigos, em casos de trabalho claro e comprovado do advogado, dada a litigiosidade que advém do referido momento processual, que nesta hipótese em nada se liga às discussões que se desenvolverão em sede de impugnação, jamais constituindo um ‘bis’ remuneratório, mas, muito pelo contrário, reconhecimento do trabalho detalhoso desenvolvido neste momento processual.
Teremos a fixação de honorários no início do cumprimento de sentença, a teor do art. 652-A, por aplicação subsidiária do art. 475-R do CPC combinado com o art. 20, parágrafo 4º, do mesmo diploma legal, e de acordo com a nova jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça supra abordada, por força da causalidade, em vista do não cumprimento voluntário do decisum por parte do devedor, havendo necessidade de desenvolvimento de trabalho técnico do profissional. [41]- [42]
E, sim, teremos, a imposição da contraprestação ao advogado do executado ou do exeqüente, caso a impugnação seja acolhida, ou respectivamente, rejeitada.
Na primeira hipótese, onde é devida verba honorária ao advogado do executado, estaremos diante de causalidade e sucumbência ou, só causalidade. Se a impugnação for acolhida, com a conseqüente extinção da execução, haverá causalidade e sucumbência e, se for acolhida para retornar-se ao início do cumprimento devido a alguma nulidade reconhecida, por exemplo, estaremos diante de hipótese isolada de causalidade. Em todos os momentos, inclusive naquele em que houve sucumbência, o advogado do executado trabalhou e, por isso, tem direito aos honorários, independentemente do ato ou natureza jurídica do momento processual que se operou.
Na segunda hipótese, onde o trabalho marcante foi do advogado do exeqüente, obtendo a parte credora a rejeição da impugnação, por força da causalidade, é devida, de igual modo, a verba honorária, pelos mesmos motivos já apresentados.
Pense-se na idéia de uma simples ação de cobrança, onde a sentença prolatada é favorável ao autor. Transitada em julgado a decisão, e não cumprido voluntariamente o decisum, fixa-se o valor inicial, nos termos do art. 652-A do CPC, por eqüidade, a verba honorária ao advogado do exeqüente. Intimado da penhora efetivada, vem aos autos o executado, apresentando impugnação, com base no parágrafo 1º do art. 475-L, e sustentando, por exemplo, a polêmica tese de ‘relativização da coisa julgada material’ ante a existência de nova interpretação do Supremo Tribunal Federal relacionado à questão já transitada em julgado e então objeto de cumprimento de sentença. [43]
Ora, o trabalho que terá o causídico que representa o credor, para, em contra-razões a esta impugnação, convencer o julgador da inaplicabilidade do julgado do Excelso Pretório, será, sem dúvida, bem mais complexo, no mínimo, do que a simples petição inicial de cobrança redigida na fase de conhecimento.
Aqui, teremos como norte do juiz, na decisão interlocutória que por acaso rejeitar a impugnação, na forma do art. 475-M, parágrafo 3º, do CPC, não a natureza jurídica da decisão, não a eventual existência ou inexistência de sucumbência, mas sim, a causalidade, de ter motivado o devedor a extensão da relação processual, sem razão, em um incidente complexo, mas sem qualquer fundamento.
Pensemos, ainda, em uma quarta e eventual hipótese, na qual o devedor apresenta exceção de pré-executividade, com base em matéria de ordem pública que será discutida antes da penhora, e por suposto, da impugnação. [44]
Se acolhida, teremos honorários a favor do advogado do executado, em vista da extinção da execução, com base em causalidade e sucumbência. Se for acolhida, para que se retome o curso de um momento processual anterior, ante uma nulidade reconhecida, da mesma forma, teremos honorários, só que impostos, unicamente aqui, por causalidade, ao advogado do devedor.
Se rejeitada, conforme entendimentos ainda discutíveis na esfera jurisprudencial, conforme já asseverado, teremos novamente a imposição de verba honorária motivada por causalidade, só que agora favoravelmente ao advogado do credor. [45]
Perfazendo uma ligação entre a verba honorária e os demais elementos processuais da reforma implementada, sobretudo no que diz respeito à imposição da multa de 10% (dez por cento), de que valeria a imposição desta, se a parte ficasse isenta do pagamento de honorários advocatícios, sob os pretextos de que a execução é de sentença e não de título extrajudicial e de que a impugnação ofertada é um mero incidente? [46]
Acredito que, na esteira da louvável decisão prolatada no Resp n. 978.545 – MG, pela Terceira Turma, o Superior Tribunal de Justiça abriu uma porta fundamental à interpretação objetiva e precisa não só do cabimento de honorários advocatícios no processo de execução, sobretudo, no que diz respeito ao cumprimento de sentenças, mas também, em diversos momentos processuais, inclusive da fase de conhecimento, ou no processo cautelar, onde o trabalho do advogado chega a ser exaustivo e longo, em determinadas situações, mas por assumirem lamentável e enfadonho pretexto processual rotulado de ‘incidentes’ (ou ainda sob a idéia de que não constituem momentos de declaração de direitos), deixam de reconhecer contraprestação que seria digna e legalmente prevista. [47]
Cabe aos Tribunais, e aos juízes de primeiro grau, estabelecer um rigoroso controle, é claro, de quais são os momentos processuais em que o trabalho do advogado deve ser remunerado e dos limites para esta imposição, a exemplo do que foi apresentado neste ensaio, não permitindo que qualquer manifestação de uma das partes, contraditada pela outra, permita que qualquer dos causídicos tome esta circunstância como fato gerador da verba honorária derivada do art. 20, parágrafo 4º do CPC.
E o limite está definido no próprio CPC, quando o texto legal, no parágrafo 4º do art. 20, faz menção precisa de que "os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior."
Verifique-se que o controle está vinculado, em todos os momentos processuais supra citados, ao grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço e à natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Cabe, igualmente, aos advogados, exigir o cumprimento da lei, de ter a garantia de sustento, de ver o reconhecimento do trabalho desenvolvido, de obter contraprestação do passar do tempo e das horas.
Mas, sobretudo, de saber ponderar e requerer a medida econômica justa e ideal que corresponde ao ir e vir, ao correr e ao lutar, ao eterno tic-tac, tic-tac, dia e noite, noite e dia...
Pois, antes de tudo, ADVOGADO não é relógio!