A Inteligência Artificial Geral (AGI) será um campo profícuo para a Metalógica. Além de criar máquinas mais inteligentes, cujo QI tende a ser superior à média da maioria das pessoas, a AGI enfrentará o desafio de compreender a complexidade da mente humana, replicando-a. Evidentemente, aí residem dilemas éticos, dentre outros, que são um vasto campo para a Metalógica.
Se a Lógica é a ciência das conclusões necessárias, a Metalógica é a linguagem que fala sobre a Lógica, enquanto a Meta-metalógica é a linguagem que fala sobre a Metalógica, e assim por diante, um nível de linguagem referindo-se àquela que lhe é imediatamente inferior, em uma possível hierarquia de sucessivos graus de abstração, quiçá infinitamente, tão infinita quanto forem a inteligência humana e a inteligência artifical.
A Metalógica é uma forma lógica (metaconceito) que versa sobre outra forma lógica (conceito), trazendo respostas e ampliando conhecimentos e reflexões sobre as estruturas nas quais se assenta a inteligência artificial. Vale dizer: A Metalógica é uma metalinguagem que poderá ser desenvolvida tanto pela inteligência humana como também pela inteligência artificial generativa.
É bem antiga a intrínseca relação entre Direito e linguagem. Nos primórdios do Direito, a linguagem era simples (L), referindo-se diretamente apenas aos fatos, à realidade concreta. A natureza normativa é da essência da linguagem, mas há processos normativos que interpenetram várias camadas de linguagem e são, não raro, polissêmicos. É importante a análise do Direito em sua vertente semiótica e linguística, pois que é deveras reveladora, considerando-se que as normas jurídicas podem ser entendidas como signos, com funções sintáticas e semânticas1.
Todavia, é bem de se ver que, na verdade, talvez não haja necessariamente uma tendência natural das sociedades humanas à desigualdade, rotulada como “neodarwinismo social”, o que também traria consequências sintáticas e semânticas para a semiologia jurídica e, por conseguinte, para a Metalógica. Embora vários autores reconheçam essa tendência natural à desigualdade, cabe observar que ela não é arbitrária nem retórica, mas parte das constatações etológicas, cujos modelos se repetem nas sociedades dos animais2. Esta constatação pode gerar discrepâncias ou contradições entre modelos linguísticos do Direito e da realidade, dependendo do sistema de lógica aplicado, o que traz consequências importantes para a Metalógica e suas análises. Nesse sentido, o emprego de sistemas lógicos não-clássicos ou heterodoxos poderiam proporcionar à Metalógica traduções intersemióticas3.
Metalógica é o estudo das estruturas e das propriedades formais de sistemas lógicos formais. Poderia incluir, por exemplo, provas (ou desprovas), problemas de consistência, incorreção, inadequação, completude e decidibilidade de um caso. A Metalógica pode responder, por exemplo, a questões como se tal ou qual argumento é presumivelmente necessário; se há alternativas; se há consistência, etc.4 São metaconceitos.
Outro objeto de apreciação para a Metalógica é a criação de Inteligências Artificiais para corrigirem os erros da própria Inteligência Artificial, num exercício claro de metalinguagem, que poderá ser extendida em vários e incontáveis níveis, para o futuro. Serão ferramentas criadas especificamente para a correção de determinados dados.
Até mesmo as estratégias utilizadas pelas pessoas para obter melhores resultados no uso da ferramenta Inteligência Artificial poderão ser analisadas pela Metalógica, pois, com o avanço da tecnologia, ficarão obsoletas e, além disso, a escolha de certas estratégias significa a exclusão de outras, vale dizer, há uma forte carga semântica de subjetividade nessa eleição. Escolher algo é preterir outro algo.
É bem verdade que há interseções entre os campos da Metalógica e da Hermenêutica, entendida esta como a teoria da interpretação. Sim, pois há interpretações também na Metalógica, tanto no processo cognitivo como nas conclusões. Todavia, o que diferencia a Metalógica da Hermenêutica é que algumas escolas de pensamento hermenêutico permitem-se grande liberdade para digressões, não se atendo tão-somente à linguagem-objeto, mas podendo derivar para outras áreas do conhecimento. Já a Metalógica, por seu turno, tende a ater-se de modo mais específico à linguagem-objeto ou às demais linguagens às quais possa se referir, desde que derivadas e relacionadas à linguagem-objeto. Não obstante essa diferenciação, resta claro haver pontos em comum entre a Hermenêutica e a Metalógica, posto que em ambas ocorre o processo interpretativo dos dados e achados.
Enfim, boa parte das discussões inter, multi e transdisciplinares que versarão sobre a IA e seus avanços tangerão o campo da Metalógica, ensejando meta-meta-análises gradativas, que se desenvolverão pari passu ao desenvolvimento tecnológico, nessa seara, não se confundindo com o nível 1 da linguagem-objeto.
Porém, é recomendável ter cautela com tudo o que se refere à IA. Por exemplo, alguns estudiosos não a caracterizam como mera ferramenta, mas sim como “consciência”; outros observam que a IA aprendeu a mentir, que pode expressar emoções, e assim por diante. Por razões assim, é imprescindível manter alerta o pensamento crítico sobre tudo o que se refere à IA, mesmo no caso da Metalógica.
Por derradeiro, permitimo-nos expor uma conjetura algo solipsista, que nos acompanha há cerca de uns trinta anos, desde os primórdios das redes neurais: é interessante observar que o desenvolvimento da IA caracteriza-se por ser eminentemente cerebral, imitando a inteligência humana e dos animais, parecendo descurar, aos menos por ora, de outros tipos de inteligência porventura existentes no Universo ou na natureza, como, por exemplo, a inteligência espiritual.
Notas
ARAÚJO, Clarice von Oertzen. Semiótica do Direito. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
MAMEDE, Gladston. Semiologia do Direito – Tópicos para um debate referenciado pela animalidade e pela cultura, 2ª. edição, Porto Alegre: Síntese, 2000.
Plaza, Julio. Tradução Intersemiótica. São Paulo: Perspectiva, 2003.
HAAK, Susan. Philosophy of Logics. Cambrige University Press: Cambridge / London / New York / New Rochelle / Melbourne / Sydney, 1980.