Os programas federais e o gasto com pessoal à luz da LRF

13/12/2024 às 11:45
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Primeiramente, os programas federais são imprescindíveis para o desenvolvimento do país, atuando em diversas áreas como saúde, educação, segurança pública, entre outras. No entanto, é importante garantir que esses programas sejam executados de forma responsável e dentro dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

É fato que um dos aspectos fundamentais para a manutenção da saúde financeira do país é a apuração criteriosa do gasto com pessoal nos programas federais. A LRF estabelece limites para o gasto com pessoal, tanto no âmbito federal quanto nos estados e municípios, com o objetivo de evitar o descontrole das contas públicas e garantir a sustentabilidade fiscal.

Logo, a Constituição Federal de 1988 no seu art. 169 estabeleceu que “a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar”. A Lei Complementar a que se refere o texto constitucional vem posteriormente a ser a Lei Complementar 101/2000, que nos artigos 18 a 23 regula a matéria.

É fato que os programas federais (nas áreas de saúde, educação, assistência social, dentre outras), custeados com recursos transferidos pela União entram no cálculo das despesas com pessoal, para efeito de apuração de limite de gastos com pessoal, previsto na LRF.

Acima de tudo, o conceito das despesas com pessoal foi trazido pelo art. 18 da LRF, enquadrado o limite total com pessoal como “o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência”.

Nesse sentido, pode-se entender como despesa com pessoal as despesas elencadas no caput do art. 18 da LRF, bem como, as despesas classificadas como “outras despesas com pessoal”, onde podem ser incluídos gastos com terceirização de mão de obra, desde que os terceirizados tenham sido contratados em substituição a servidores e empregados públicos, conforme previsão do § 1º do art. 18.

Além disso, conforme previsão dos § 1º e 2º do art. 19 da LRF, devem ser excluídas do cálculo: indenização por demissão de servidores ou empregados; incentivos à demissão voluntária; derivadas da aplicação do disposto no inciso II do § 6º do art. 57 da Constituição; decorrentes de decisão judicial e da competência de período anterior ao da apuração a que se refere o § 2º do art. 18; com pessoal, do Distrito Federal e dos Estados do Amapá e Roraima, custeadas com recursos transferidos pela União na forma dos incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e do art. 31 da Emenda Constitucional 19; com inativos, ainda que por intermédio de fundo específico, custeadas por recursos provenientes da arrecadação de contribuições dos segurados, da compensação financeira de que trata o § 9º do art. 201 da Constituição e das demais receitas diretamente arrecadadas por fundo vinculado a tal finalidade, inclusive o produto da alienação de bens, direitos e ativos, bem como seu superávit financeiro. As despesas com pessoal decorrentes de sentenças judiciais serão incluídas no limite do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.

Sobretudo, o Tribunal de Contas do Estado do Piauí no processo TC/010574/2014 que trata de consulta cujo objeto foi o cômputo das despesas decorrentes de programas federais no cálculo do limite de despesas de pessoal formulada pela Associação Piauiense dos Prefeitos Municipais (APPM), o plenário decidiu de forma unânime “a) Pela impossibilidade de exclusão dos gastos com programas federais do cálculo do índice de despesas com pessoal do Poder Executivo Municipal, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal”.

Na contemporaneidade o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco no processo 1005499-6 e o Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo no processo TC/0216/2014 se pronunciaram que em programas federais na área de saúde, o gasto com as remunerações não podem ser afastados do cálculo dos limites da LRF atinentes a despesas com pessoal.

Muito se discute sobre a flexibilização dos limites da LRF para gasto com pessoal, na Câmara Federal dos Deputados foi aprovada no final de agosto de 2024 proposta que aumenta o total de recursos que pode ser gasto com despesas de pessoal. O projeto de lei complementar (PLP) 141/2024 que retira dos limites de despesas com pessoal os gastos com terceirização e organizações da sociedade civil (Organizações Sociais - OS) foi aprovado dia 3 de dezembro de 2024 na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal.

Vale dizer, que no tema fiscalização de recursos públicos federais é importante observar que o Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE) de forma concorrente pode fiscalizar recursos públicos federais em virtude do Acordo de Cooperação Técnica firmado em 03 de outubro de 2023 entre o Presidente do Tribunal de Contas da União, Ministro Bruno Dantas e o Presidente da Atricon, Conselheiro Cezar Miola publicado no Diário Oficial da União em 06/10/2023, Seção 3, número 192, pág. 222 teve por finalidade definir diretrizes para a atuação dos Tribunais de Contas nos casos de competência concorrente ou complementar na fiscalização dos recursos públicos.

Então, o TCE/PI aderiu ao Acordo de Cooperação Técnica tendo sido firmado em 11 de janeiro de 2024 pelo Presidente do TCE/PI, Conselheiro Joaquim Kennedy Nogueira Barros e publicado no Diário Oficial Eletrônico do TCE/PI extrato do Termo de Adesão em 16 de janeiro de 2024. O Acordo visa definir diretrizes para a atuação dos Tribunais de Contas nos casos de competência concorrente na fiscalização dos recursos públicos, de modo a fortalecer a segurança jurídica e evitar o retrabalho, o desperdício de recursos públicos, a ineficiência e a ineficácia da alocação dos limitados meios fiscalizatórios do controle externo.

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Ademais, a Cláusula Segunda do citado Acordo estabelece as formas de cooperação dentre elas citamos de forma resumida: definir diretrizes gerais acerca da responsabilidade de atuação nos processos de controle externo; estabelecer as formas de comunicação entre os PARTÍCIPES; viabilizar a alocação eficiente dos meios fiscalizatórios dos TCs; viabilizar a coordenação com o intuito de uniformizar diretrizes e procedimentos de fiscalização; e de compartilhar informações entre si, mediante a disponibilização de documentos, bases de dados e sistemas informatizados.

Outrossim, a Cláusula Terceira determina as atribuições dos partícipes no que se refere aos processos de fiscalização de iniciativa dos Tribunais de Contas de qualquer das esferas de governo, uma vez verificada a competência concorrente ou complementar com outro Tribunal de Contas, permanecerão sob a responsabilidade daquele que deu início às apurações até a sua conclusão, sem prejuízo do estabelecimento de parcerias, acordadas pelas partes, para atuação conjunta.

Por outro lado, a Cláusula Quinta trata da vigência e da publicação, tomando-se por base que o Acordo foi publicado no Diário Oficial da União na data de 6 outubro de 2023 e cuja validade é de 24 (vinte e quatro) meses, o Acordo é vigente até 6 de outubro de 2025, podendo ser prorrogado mediante termo aditivo.   

É essencial que os gestores públicos estejam atentos a esses limites e façam uma gestão eficiente dos recursos destinados aos programas federais. Isso significa controlar o aumento das despesas com pessoal, garantir a transparência na utilização dos recursos e buscar constantemente a eficiência na prestação dos serviços.

Bem como, é importante que os programas federais sejam avaliados constantemente, para verificar se estão atingindo os objetivos propostos e se estão sendo executados de forma eficaz. Essa avaliação é fundamental para garantir que os recursos públicos sejam bem aplicados e que os programas tenham um impacto positivo na vida dos cidadãos.

Finalmente, a gestão do gasto com pessoal nos programas federais deve ser feita de forma responsável e transparente, em conformidade com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Somente dessa forma será possível garantir a sustentabilidade das contas públicas e o sucesso dos programas em benefício da sociedade como um todo.


Notas e Referências:

BRASIL. Acordo de Cooperação Técnica Tribunal de Contas da União e a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil. Dispõe sobre a finalidade de definir diretrizes para a atuação dos Tribunais de Contas nos casos de competência concorrente ou complementar na fiscalização dos recursos públicos. Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/egestao/ObterDocumentoSisdoc?codPapelTramitavel=74729042&seAbrirDocNoBrowser=true>. Acesso em: 12 de dezembro de 2024.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 12 de dezembro de 2024.

BRASIL. Extrato do Termo de Adesão ao Acordo de Cooperação. Termo de Adesão com o intuito de se tornar partícipe do referido Acordo de Cooperação Técnica o TCE/PI. Disponível em: <https://www.tcepi.tc.br/publicacao/333693.pdf>. Acesso em: 12 de dezembro de 2024.

BRASIL. Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000. Lei de Responsabilidade Fiscal. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm>. Acesso em: 12 de dezembro de 2024.

Sobre o autor
Benigno Núñez Novo

Pós-doutor em direitos humanos, sociais e difusos pela Universidad de Salamanca, Espanha, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción, com o título de doutorado reconhecido pela Universidade de Marília (SP), mestre em ciências da educação pela Universidad Autónoma de Asunción, especialista em educação: área de concentração: ensino pela Faculdade Piauiense, especialista em direitos humanos pelo EDUCAMUNDO, especialista em tutoria em educação à distância pelo EDUCAMUNDO, especialista em auditoria governamental pelo EDUCAMUNDO, especialista em controle da administração pública pelo EDUCAMUNDO, especialista em gestão e auditoria em saúde pelo Instituto de Pesquisa e Determinação Social da Saúde e bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Assessor de gabinete de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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