Este artigo complementa a análise sobre a Lei nº 13.060/2014, disponível em: Lei nº 13.060/14: prioridade para o uso de armas não letais pela Polícia. Muito barulho por nada
A Lei 13.060/14 disciplinou “o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo” pela Polícia em todo o território nacional. Eventuais legislações estaduais ou regulamentos seriam, a partir de então, submetidos a essa lei federal; permaneceriam válidos, desde que em consonância com as novas regras legais.
O artigo 7º estabeleceu que a classificação e o uso de instrumentos não letais seria objeto de regulamento (Decreto) do Poder Executivo Federal. É preciso notar que esse decreto não poderia fazer mais do que essa classificação e regulamentação do modo de emprego dos equipamentos de menor potencial. Não caberia a esse decreto estabelecer normas “extra legem” que viessem a restringir ou expandir o alcance dos ditames da Lei 13.060/14.
A Lei 13.060/14 não foi dotada de “vacatio legis”, vigorando imediatamente a partir de sua publicação, conforme consta de seu artigo 8º, embora no aguardo do decreto que agora veio à luz.
Fato é que, após 10 anos de vigor da Lei 13.060/14, veio a lume o Decreto 12.341/24 que, finalmente, a regulamenta. Novamente houve reações histéricas em ambos os sentidos. Nenhuma das reações compatíveis com a realidade. A única estranheza possível é que se tenha levado 10 anos para regulamentar uma lei e somente se o faça devido a notícias de violência policial na mídia, com destaque para governos estaduais de oposição. Isso demonstra que nada em nosso país é feito com a verdadeira intenção do bem – comum, mas apenas de forma simbólica e demagógica com interesses políticos.
O Decreto 12.341/24 nada mais faz do que praticamente repetir as normativas já existentes na Lei de regência, bem como no Código Penal, Código de Processo Penal e na Constituição Federal. A única inovação mais nítida é a exposição de dois princípios não previstos antes expressamente na Lei 13.060/14. São eles: os princípios da “precaução”, da “responsabilização” e da “não discriminação”.
Poder-se-ia pensar que o Decreto teria extrapolado de suas funções ao acrescentar princípios não previstos na lei. Mas, nem mesmo isso procede.
A “precaução” ou prudência na atuação da polícia é algo nada inovador e estava contida na proporcionalidade e razoabilidade.
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A “responsabilização” é algo inerente a todo agir humano, seja de policial ou não. As pessoas devem ser responsabilizadas por suas condutas nos âmbitos civil, administrativo e criminal. Não há qualquer novidade nisso.
Finalmente, a “não discriminação” por quaisquer motivos (v.g. racismo, condição social, motivação política ou qualquer outra) é nada mais do que obedecer a comando constitucional expresso (inteligência dos artigos 1º., III; 3º., IV; 4º., VII, “in fine” e 5º., “caput”, CF).
As reações histéricas são despidas de sustentação, tanto para a demonização da norma, quanto para a demonização das instituições policiais.
Na verdade, os dispositivos da Lei 13.060/14 nada mais fazem do que reiterar todo um conjunto de normativas que estabelecem limites constitucionais e legais há muito tempo para o emprego de força estatal legítima de acordo com a configuração de um Estado Democrático de Direito que reconhece o indivíduo como seu centro e fim, ao reverso de um modelo totalitário que vê nas pessoas servos de um poder estatal ilimitado.
A mesma conclusão pode ser aplicada ao Decreto 12.341/24 que, finalmente, regulamenta a legislação ora enfocada.
REFERÊNCIAS
BÍBLIA Sagrada. Trad. Frei João José Pedreira de Castro. São Paulo: Ave Maria, 2002.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. 5ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
FRANCO, Alberto Silva, “et al.”. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial. 5ª. ed. São Paulo: RT, 1995.
GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 8ª. ed. Niterói: Impetus, 2014.