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A obrigatoriedade das novas alíquotas trazidas pela reforma tributária brasileira ao imposto de transmissão causa mortis e doação no instituto da herança e da doação

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08/01/2025 às 14:04
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A obrigatoriedade de progressividade da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação prejudica a capacidade contributiva dos contribuintes menos favorecidos ou mais pobres da população brasileira?

Resumo: O artigo científico tem como objetivo analisar a influência da progressividade do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). Para tanto, torna-se necessário trazer à baila a finalidade temática sob a luz da Constituição Federal de 1988, considerando diversas discussões doutrinárias sobre o elemento da contribuição quantitativa e buscando mudanças no dispositivo legal do Sistema Tributário Nacional. Esse debate se intensifica, especialmente, em razão da aplicação de alíquotas fixas ou progressivas de até 8%, como já ocorre em diversos estados da federação. Diante disso, surge o questionamento: a capacidade contributiva está mais conectada ao conceito de justiça tributária ou à arrecadação justa? Isso porque, na medida em que o nível de progressividade da alíquota impacta a distribuição de renda do contribuinte, a perpetuação da riqueza e a efetivação de direitos fundamentais, há uma possível ofensa ao princípio da isonomia. O Brasil, sendo um dos países com as maiores desigualdades sociais do mundo, enfrenta uma situação agravada por uma política fiscal injusta, na qual a parcela mais pobre e vulnerável da população arca com a maior parte do custeio dos serviços básicos, de forma proporcionalmente mais onerosa do que a classe mais rica. Essa última, por sua vez, consegue transferir e preservar seu patrimônio ao longo de gerações, contribuindo para a manutenção das desigualdades.

Palavras-chave: Do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação. Das alíquotas do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação. Do principio da capacidade contributiva.


INTRODUÇÃO

No ordenamento jurídico brasileiro, é imprescindível que quaisquer discussões sobre uma iminente reforma tributária tragam, prontamente, à baila o tema da justiça distributiva. De outro modo, qualquer interferência pode prejudicar gravemente um sistema que já é bastante desequilibrado, cumulativo e retrógrado.

Com referência ao sistema tributário nacional que, em breve, entrará em vigor, considerando que o Projeto de Lei foi aprovado e convertido em lei por meio da votação pelo sistema bicameral no Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal) no ano de 2024, é importante destacar que a eficácia das regras propostas deverá observar os princípios da anterioridade anual e da anterioridade nonagesimal. Assim, as alterações realizadas passarão a vigorar a partir do ano seguinte, ou seja, 2025.

Nesse contexto, eventuais transferências de ativos a título de herança ou doação realizadas ainda no ano de 2024 estarão sujeitas à alíquota atual de cada estado e do Distrito Federal, independentemente do valor transmitido.

O tema em questão ocupa o centro das discussões, seja na esfera doutrinária, seja nos tribunais. Sobretudo com a possibilidade de a nova legislação, que entrará em vigor em 2025, suscitar debates, torna-se plausível a seguinte averiguação: a obrigatoriedade de progressividade da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação prejudica a capacidade contributiva dos contribuintes menos favorecidos ou mais pobres da população brasileira?

O objetivo geral deste estudo é verificar a progressividade da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação. A escolha do tema justifica-se pela relevância da possível opção pela progressividade da alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação, o que torna pertinente a realização de um estudo aprofundado sobre o tema.

A metodologia adotada consiste em uma pesquisa qualitativa, fundamentada no procedimento de abordagem dialética. No que diz respeito às técnicas de pesquisa, foi utilizada a revisão bibliográfica para fins de coleta e análise de dados, bem como para a obtenção de pareceres doutrinários sobre a referida imposição e de fundamentos jurisprudenciais. Dessa forma, passa-se à análise do conceito do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação


DA PERSPECTIVA HISTÓRICA DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO

O Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) é, historicamente, “um dos impostos mais antigos na história da tributação, havendo relatos de sua vigência em Roma, sob a forma de vigésima sobre heranças e doações” (SABBAG, 2010, p. 1016).

Ricardo Lobo Torres também destaca em seus escritos que “há relatos de sua existência na Roma antiga, sob a forma de vigésima sobre heranças e legados” (TORRES, 2013, p. 385).

Com a expedição do Alvará de 3 de junho de 1809, foi regulamentada a transmissão inter vivos de escravos e imóveis. Conforme relatado no alvará: “Crêa o imposto da siza da compra e venda dos bens de raiz e meia siza dos escravos ladinos” (BRASIL, Alvará de 3 de junho de 1809).

Posteriormente, em 2 de outubro de 1811, o imposto sobre heranças e legados no ordenamento jurídico brasileiro foi regulamentado, conforme disposto no alvará: “Sobre o pagamento da taxa de herança e legados” (BRASIL, Alvará de 2 de outubro de 1811).

É pertinente salientar que, até meados do ano de 1832, o Estado brasileiro mantinha uma postura unitária em relação às receitas tributárias. Contudo, a partir desse período, passou a descentralizar essas receitas, separando as competências entre o governo central e as províncias (FERNANDES, 2013, p. 29).

Com o advento da Constituição de 1891, a competência para a cobrança do imposto sobre a transmissão de propriedade foi atribuída aos estados (BRASIL, Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1891).

Já na Constituição de 1934, foi realizada a divisão desse imposto, distinguindo-se a transmissão de propriedade causa mortis da transmissão de propriedade imobiliária inter vivos, sendo ambos mantidos sob a competência dos entes federativos, ou seja, os estados membros. O artigo 128 dessa Constituição previu, ainda, a progressividade para o imposto sucessório (BRASIL, Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1934).

O tributo atualmente denominado Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) foi atribuído, como competência, aos estados e ao Distrito Federal, conforme determinação expressa no artigo 155, inciso I, da Constituição Federal de 1988:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988)

O ITCMD é regulamentado nos artigos 35 e seguintes do Código Tributário Nacional.

Nesse sentido, a competência para instituir o imposto sobre a transmissão de bens inter vivos foi atribuída aos municípios, enquanto cabe aos estados instituir o imposto sobre a transmissão causa mortis e doação, abrangendo quaisquer bens, sejam móveis ou imóveis, ou direitos.

Diante disso, passa-se à análise de alguns conceitos básicos do ITCMD.


DO CONCEITO DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO

O conceito do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) é definido como “um tributo estadual devido por toda pessoa física ou jurídica que receber bens ou direitos de forma não onerosa” (SEFSC - Secretaria de Estado da Fazenda, 2017).

Outra definição do ITCMD pode ser encontrada na transcrição a seguir:

A sigla ITCMD vem de Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação. Trata-se de um tributo estadual que incide sobre a transferência de bens móveis, imóveis e direitos por herança em caso de falecimento ou doações. Um aspecto importante é que, para que possa ser sujeita à cobrança do imposto, a transferência do bem ou direito deve ser não onerosa, ou seja, não oriunda de uma venda. (INFOMONEY, Publicado em 19/07/2023)

É um tributo de competência dos estados e do Distrito Federal. Ele incide sobre a transferência de bens móveis, imóveis e direitos transmitidos em decorrência de herança, em caso de falecimento, ou por doação.

Dessa forma, passa-se à análise das alíquotas aplicáveis ao Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação.


DAS ALIQUOTAS DO IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO

O artigo 155, §1º, inciso IV, da Constituição Federal de 1988, estabeleceu que a alíquota máxima do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) é de 8%. Esse limite foi estipulado pelo Senado Federal por meio da Resolução nº 9 de 1992. Dessa forma, a alíquota será livremente prevista pela legislação estadual, desde que respeite o limite estabelecido pela Resolução. Ademais, aplica-se a alíquota vigente no momento da abertura da sucessão, conforme dispõe a Súmula 112 do Supremo Tribunal Federal.

O fato gerador da obrigação tributária encontra-se definido no artigo 114 do Código Tributário Nacional (CTN) de 1966, que estabelece: “Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência” (BRASIL, CTN, Publicado em 25/10/1966).

O ITCMD, como tributo de competência estadual, possui alíquotas que podem chegar até o limite de 8%. “Há estados em que a alíquota é fixa, independentemente do valor do patrimônio, e outros em que há progressividade” (ESTADÃO, Publicado em 09/11/2023).

O imposto incide sobre o valor de bens ou direitos, tais como imóveis, veículos, dinheiro e ações, que sejam transmitidos após o falecimento do de cujus, seja por herança decorrente de inventário, seja pela transferência por meio de doações inter vivos, realizadas ainda em vida.

Antes da entrada em vigor da nova legislação decorrente da reforma tributária, “as alíquotas flutuam de 2% a 8% do valor da doação” (GIFE, Publicado em 15/10/2018).

Dessa forma, é necessário identificar quais estados da federação ainda possuem alíquotas fixas para o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação:

A maioria dos estados da federação já adota alíquotas progressivas, ou seja, com taxas mais elevadas para a transmissão de patrimônios de maior valor. Entretanto, em dez estados, a alíquota ainda é fixa e, com a reforma, será necessária uma alteração para cumprir a nova norma. Os estados afetados por essa mudança são: Alagoas, Amapá, Amazonas, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Norte, Roraima e São Paulo. (GAZETA BRASIL, Publicado em 07/04/2024).

Nesse contexto, torna-se importante conhecer as alíquotas praticadas por alguns estados brasileiros em relação ao Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) (MARTELLO, Publicado em 07/04/2024):

Estado

Alíquota (Doação)

Alíquota (Morte)

Acre

2%, 4%, 6%, 8%

4%, 5%, 6%, 7%, 8%

Alagoas

2%

4%

Amapá

3%

4%

Amazonas

2%

2%

Bahia

3,5%

4%, 6%, 8%

Ceará

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

Distrito Federal

4%, 5%, 6%

4%, 5%, 6%

Espírito Santo

4%

4%

Goiás

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

Maranhão

1%, 1,5%, 2%

3%, 4%, 5%, 6%, 7%

Mato Grosso

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

Mato Grosso do Sul

3%

6%

Minas Gerais

5%

5%

Pará

2%, 3%, 4%

2%, 3%, 4%, 5%, 6%

Paraíba

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

Paraná

4%

4%

Pernambuco

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

Piauí

4%

2%, 4%, 6%

Rio de Janeiro

4%, 4,5%, 5%, 6%, 7%, 8%

4%, 4,5%, 5%, 6%, 7%, 8%

Rio Grande do Norte

3%

3%

Rio Grande do Sul

3%, 4%

0%, 3%, 4%, 5%, 6%

Rondônia

2%, 3%, 4%

2%, 3%, 4%

Roraima

4%

4%

Santa Catarina

1%, 3%, 5%, 7%, 8%

1%, 3%, 5%, 7%, 8%

São Paulo

4%

4%

Sergipe

2%, 4%, 6%, 8%

3%, 6%, 8%

Tocantins

2%, 4%, 6%, 8%

2%, 4%, 6%, 8%

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Com a reforma, a Constituição passou a determinar que o imposto “será progressivo em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação” (artigo 155, §1º, inciso VI, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988) (BRASIL, 1988).

José Luís Saldanha Sanchez explica o principal motivo da aplicação da alíquota progressiva:

[...] O argumento principal a favor de uma taxa progressiva foi fornecido pela teoria da utilidade marginal decrescente do rendimento: se as primeiras fracções do rendimento (tal como o primeiro copo de água) proporcionam uma utilidade maior do que as últimas, e se a utilidade de cada dose adicional decresce, então o princípio da igualdade do sacrifício conduz às taxas progressivas. (SANCHEZ, 2010, p.33).

Conforme rMattos Filho, a reforma tributária impõe a obrigatoriedade da aplicação de alíquotas progressivas ao Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD):

Tal proposta vem no contexto da Reforma Tributária, com modificações introduzidas pela Emenda Constitucional n° 132/2023, aprovada pelo Congresso Nacional no fim do ano de 2023, incluindo previsão no art. 155, § 1°, da Constituição Federal para determinar a obrigatoriedade de que o ITCMD seja progressivo. (MATTOS FILLHO, Publicado em 06/02/2024)

Cabe destacar que o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) será aplicado de forma progressiva, com alíquotas que variam de 1% a 8%, tanto nas transmissões decorrentes de herança quanto nas doações inter vivos.

O intervalo de tempo entre a publicação da nova lei e o início de sua vigência deve obedecer aos parâmetros estabelecidos pela Constituição Federal de 1988:

Ao final, sendo o PL aprovado e convertido em lei ainda no ano de 2024, a eficácia das regras propostas deverá observar os princípios da anterioridade anual e nonagesimal, de modo que as alterações propostas entrem em vigor a partir de 2025, e desde que decorrido o prazo de 90 dias contados desde a data da publicação da lei. Portanto, eventuais transferências de ativos a título de herança ou doação ainda no ano de 2024 estarão sujeitas à alíquota atual de 4%, independentemente do valor transmitido. (MATTOS FILLHO, Publicado em 06/02/2024)

Para que o ITCMD entre em vigor, será necessário cumprir os princípios constitucionais da anterioridade anual e da anterioridade nonagesimal. Somente após o cumprimento desses requisitos a nova legislação tributária poderá produzir efeitos.

De acordo com Hugo de Brito Machado:

Na linguagem da Ciência das Finanças Públicas e do Direito Tributário, progressividade dos impostos significa alíquotas diversas, crescentes na medida em que cresce a base de cálculo do imposto, ou excepcionalmente um outro elemento eleito pelo legislador para esse fim. (MACHADO, 2010, p. 317)

É sabido que a alíquota é um elemento estrutural dos impostos que, juntamente com a base de cálculo, permite a definição de seu critério quantitativo.

O critério quantitativo e progressivo será abordado no item subsequente.

Dessa forma, passa-se à análise do princípio da capacidade contributiva.


DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

O princípio da capacidade contributiva, também conhecido como princípio da capacidade econômica, possui fundamento constitucional, conforme disposto no artigo 145, §1º, da Constituição Federal de 1988:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988)

A definição dos impostos que compõem o Sistema Tributário Nacional, bem como todos os elementos que estruturam sua matriz, deve ser realizada em conformidade com o princípio da capacidade contributiva, além de considerar os componentes que viabilizem uma maior abrangência e justiça fiscal.

Klaus Tipke e Douglas Yamashita fornecem importantes diretrizes sobre o princípio da capacidade contributiva:

Se o princípio da capacidade contributiva fosse minuciosamente aplicado por leis altamente diferenciadas, as leis tributárias não poderiam mais ser aplicadas isonomicamente pelas autoridades fazendárias com o emprego razoável de pessoal e tempo, uma vez que tais autoridades têm milhões de contribuintes para fiscalizar. O princípio da isonomia da tributação seria violado. Por isso, embora o princípio da capacidade contributiva se prenda à capacidade contributiva individual, é permitido, dentro de certos limites, que a lei tipifique certos casos medianamente comuns desconsiderando todos os desvios do caso concreto. Isso tem por consequência que casos desiguais sejam tratados igualmente e não desigualmente, o que, em si, não corresponde ao princípio da igualdade. (TIPKE; YAMASHITA, 2002, p.38).

Nesta seara, há diversas possibilidades de classificação dos impostos, como, por exemplo, os impostos diretos e indiretos. Nos primeiros, a carga tributária é suportada diretamente por quem praticou o fato gerador, sem que haja transferência econômica do encargo. Em outras palavras, o imposto é devido pelo contribuinte tanto de fato quanto de direito (AMARO, 2012, p. 99).

Por outro lado, Kiyoshi Harada explica que “os impostos classificados como indiretos são aqueles que incidem sobre um terceiro, por meio da repercussão econômica, ocorrendo a transferência do encargo ao consumidor final” (HARADA, 2006, p. 328).

De acordo com Luciano Amaro, “o contribuinte de direito recolhe o tributo, mas repassa o encargo a um terceiro” (AMARO, 2012, p. 99).

Dessa forma, torna-se necessário examinar o caráter pessoal ou real dos impostos, de acordo com a exigência de vinculação ou não às particularidades individuais de cada contribuinte.

Para o doutrinador Luciano Amaro:

depende de se verificar se predominam características objetivas ou subjetivas na configuração do fato gerador. Se o tributo leva em consideração aspectos pessoais do contribuinte (nível de renda, estado civil, família etc.) ele se diz pessoal. Real será o tributo que ignore esses aspectos. (AMARO, 2003, p.89)

Nesse contexto, o princípio da capacidade contributiva não se confunde com o princípio constitucional da isonomia, que está relacionado ao ideal de igualdade. Enquanto a isonomia busca tratar os desiguais na medida de suas desigualdades, o princípio da capacidade contributiva está mais diretamente vinculado ao conceito de justiça tributária e à busca por uma arrecadação justa.

Luciano Amaro preconiza que:

quer-se preservar o contribuinte, buscando-se evitar que uma tributação excessiva (inadequada a sua capacidade contributiva) comprometa os seus meios de subsistência, ou o livre exercício de sua profissão, ou o exercício de outros direitos fundamentais, já que tudo isso relativiza sua capacidade econômica. (AMARO, 2003, p. 137).

Aliomar Baleeiro preconiza que a “capacidade contributiva do indivíduo significa sua idoneidade econômica para suportar, sem sacrifício do indispensável à vida compatível com a dignidade humana, uma fração qualquer do custo total dos serviços públicos” (BALEEIRO, 1987, p. 259).

No que diz respeito ao critério quantitativo, o legislador busca minimizar os problemas relacionados à tributação excessiva, estabelecendo alíquotas mais justas e adequadas ao padrão econômico de cada contribuinte.

Nas palavras de Eduardo de Moraes Sabbag:

O critério da progressividade diz com o aspecto quantitativo, desdobrando-se em duas modalidades: a progressividade fiscal e a progressividade extrafiscal. A primeira alia-se ao brocardo ‘quanto mais se ganha, mas se paga”, caracterizando-se pela finalidade arrecadatória, que permite onerar mais gravosamente a riqueza tributável maior e contemplar o grau de “riqueza presumível do contribuinte”. A segunda, por sua vez, filia-se à modulação de condutas, no bojo do interesse regulatório. Consoante a previsão explícita na Carta Magna, exsurgem 3 (três) impostos progressivos: o imposto sobre a renda, o IPTU e o ITR. (SABBAG, 2010, p.403)

Nesse caso, quanto maior a renda ou o patrimônio do contribuinte, maior será a tributação incidente, evidenciando o objetivo arrecadatório do sistema. Esse mecanismo possibilita que os ganhos e as riquezas tributáveis mais elevadas sejam oneradas de forma proporcionalmente maior, ao mesmo tempo em que beneficia os contribuintes com menor capacidade econômica. Tal estrutura reflete o modelo de cobrança do imposto por meio de alíquotas progressivas.

Para o mestre Hugo de Brito Machado:

Essa progressividade é uma forma de realizar o princípio da capacidade contributiva, ou, mais exatamente, de adequação do tributo à capacidade econômica de cada um. Além disto, dependendo do percentual estabelecido, pode constituir desestímulo à acumulação de riqueza e, desta forma, contribuir, ainda que modestamente, para a redistribuição de renda no País. (MACHADO, 2010, p. 379)

Nesse contexto, a modalidade de progressividade é a forma mais adequada para refletir o princípio da capacidade contributiva, configurando-se como o meio mais justo de cobrança do ITCMD pelo ente público em relação ao contribuinte.

Com base na nova legislação, que entrará em vigor no ano de 2025:

o imposto será obrigatoriamente progressivo, com base no valor da doação ou herança, de quaisquer bens e direitos. Haverá uma alíquota máxima ainda a ser definida. Isso quer dizer que quanto maior o valor da herança ou doação, maior será a alíquota aplicada. Porém, o índice de progressividade deve acompanhar o valor do quinhão ou do legado, não o da herança. No caso de uma herança dividida por vários herdeiros, o valor que cada um recebe pode não significar um aumento significativo no patrimônio a ser recebido. Dessa forma, não seria necessário uma alíquota maior. Por isso, a progressividade da tributação deverá ser justificada a partir do legado. (ESTADÃO, Publicado em 09/11/2023).

Em síntese, ao se avaliar o posicionamento doutrinário brasileiro ao longo dos anos e, posteriormente, a votação da PEC no Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), ficou estabelecida a obrigatoriedade da progressividade na alíquota do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). O percentual máximo foi fixado em 8% sobre os bens, seja no caso de herança ou doação.

Compete a cada Estado membro e ao Distrito Federal instituir o imposto por meio de lei estadual. Assim, os Estados que atualmente adotam alíquotas fixas deverão aprovar novas legislações para implementar a cobrança progressiva, conforme exigido pela nova determinação constitucional.

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Sobre o autor
Evantuir Juttel Pereira

Advogado OAB-SC 50982. Graduado em Direito; Pós-graduando em Direito Civil/Processo Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Evantuir Juttel. A obrigatoriedade das novas alíquotas trazidas pela reforma tributária brasileira ao imposto de transmissão causa mortis e doação no instituto da herança e da doação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 7861, 8 jan. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/112364. Acesso em: 9 jan. 2025.

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