INTRODUÇÃO
O Ano de 2025 é muito especial para o Direito brasileiro. O Código de Defesa do Consumidor completa trinta e cinco anos de existência. A fim de reforçar a importância da defesa do consumidor no Brasil e as contribuições proporcionadas por aquele documento legal, uma análise mais precisa e detalhada se faz necessária.
Este texto trata da defesa do consumidor e tem como objetivo passar em linhas gerais pelos principais temas que cercam a questão, a fim de apresentar o momento histórico do seu desenvolvimento, o contexto em que foi introduzido no Brasil, a sua evolução, contribuições para outros ramos, além das políticas em torno da matéria.
Cada um dos tópicos discutidos aqui, além de outros, serão temas de artigos específicos ao longo deste ano, para que a importância e a magnitude sejam transparecidas e as contribuições oportunizadas pela defesa do consumidor sejam de fato conhecidas e reconhecidas.
A defesa do consumidor é muito mais ampla e abrangente do que o Código de Defesa do Consumidor, no entanto, é inegável que a lei consumerista é o principal pilar da consecução dos direitos desta natureza e ao prestigiá-lo, no aniversário dos trinta e cinco anos de existência, é evidenciar a relevância do próprio referido ramo.
ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Para uma melhor compreensão sobre a importância da defesa do consumidor no Brasil é primeiro necessário entender o contexto internacional, anterior à década de 1990, quando o Código de Defesa do Consumidor foi promulgado. Ainda que no país os debates e políticas voltadas para a matéria fossem isolados e quase inexistentes, no mundo o tema já era discutido desde a década de 1960.
A defesa do consumidor ganhou força a partir do final da Segunda Guerra mundial, circunstância em que as reflexões sobre a adoção de instrumentos capazes de garantir a proteção dos Direitos Humanos já eram disseminadas, para evitar abusos como os ocorridos durante os conflitos na Europa, principalmente para banir as violações à dignidade humana e impedir que elas voltassem a ocorrer.
Foi nesta conjuntura que discussões acerca da matéria ganharam destaques em diversos pontos do globo. Em 1962 o assunto ganhou grande visibilidade em virtude do discurso do então Presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, ao Parlamento americano quando reconheceu “o direito essencial à segurança, à informação, à escolha e de ser ouvido” (Lucca, 2008, p. 87), como próprios dos consumidores.
As palavras deram vultuosidade à pauta ao estabelecer um paralelo entre os bens jurídicos que se pretendiam proteger com a destinação de direitos aos consumidores, com aqueles que já eram tratados como direitos humanos e estavam previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas de 1948. O fato foi fundamental para o seu reconhecimento como ramo autônomo.
O CONTEXTO DO BRASIL AO TEMPO DA PROMULGAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
A importância da defesa do consumidor no Brasil reflete o momento que o país passava ao tempo da promulgação da Lei Nº 8.078 de 1990 (Código de Defesa do Consumidor). Marcado pela reabertura política, cujo ápice foi a promulgação da Constituição Federal de 1988, que já reconhecia a defesa do consumidor como direito fundamental (Art. 5º, XXXII) e previa a criação de uma lei específica (art. 48. ADCT).
No começo da década de 1990 o país também vivia um processo de abertura econômica, circunstância em que o Brasil adotou medidas para favorecer a entrada de produtos estrangeiros, favorecendo a demanda, que passou a ter mais opções de bens a sua disposição e, em certa medida, obrigou as empresas nacionais a tornarem seus produtos competitivos, frente aos novos concorrentes.
Com o advento do Plano Real, houve o controle da inflação e a estabilização da moeda. Com isso facilitou-se o acesso aos bens e serviços de todos os tipos, muito por força das linhas de créditos disponibilizadas pelos bancos e ofereceram oportunidades às pessoas de adquirir produtos de maior valor econômico 1, tornando ainda mais necessária a existência de uma lei que previsse tais categorias de direitos.
Outra questão consiste no processo que ficou conhecido como “modernização do Estado” e resultou na privatização das empresas e de serviços estatais 2. O Estado deixou de ser o principal provedor dos serviços, que passaram a ser oferecidos também pela iniciativa privada (saúde, energia elétrica, telecomunicações, bancários, dentre outros), e exigiu a criação de órgãos regulatórios, que atuam em favor dos consumidores.
Para entender como as Agências Reguladoras agem na defesa do consumidor 3.
A IMPORTÂNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Ao completar trinta e cinco anos de existência, o CDC deve ser reconhecido e enaltecido, não tão somente pela sua importância na defesa do consumidor no Brasil, mas também pela maneira de como o documento legal vem contribuindo para o fortalecimento de outros ramos e até mesmo para o próprio direito.
Parte desse reconhecimento consiste na sua estrutura. Apresenta-se como um microssistema de normas, ao estabelecer regras processuais em favor do consumidor, bem como ao prever matérias penais, conforme discorre Miragem (2016). Outro ponto está na maneira que permeia as instituições brasileiras, na medida que ganha maturidade e atinge objetivos, especialmente nesses tempos de avanços tecnológicos e economia globalizada.
A defesa do consumidor no Brasil é fruto de um processo longo e árduo, que transcende a própria lei consumerista, vez que se sustenta em outros alicerces, como no status de direitos humanos que recebeu da Carta Mãe, e está intimamente ligado à solidariedade e resultante da terceira dimensão dos direitos humanos, alinhada ao contexto histórico em que a atual Constituição foi promulgada.
Outro ponto que merece destaque são suas diretrizes. Elas preveem a proteção dos direitos coletivos, difusos e metaindividuais, e desta forma, a proteção não se limita aos interesses das vítimas da atuação dos maus fornecedores e alcançam a própria sociedade, conforme pondera Rodrigues (2011), quando os eventos gravosos atingem uma coletividade indeterminada ou pessoas em situações de hipervunerabilidade, como os idosos, por exemplo 4.
A DEFESA DO CONSUMIDOR NO BRASIL
Ao tratar da importância da defesa do consumidor no Brasil é preciso discuti-la sob um aspecto mais amplo. Conforme o já abordado, a matéria não se restringe a lei, mas encontra fundamentos em um sistema muito mais amplo, e engloba instituições dos Poderes Constituídos, bem como iniciativas diversas.
A lei consumerista não é o único pilar da defesa dos consumidores em âmbito nacional, mas é parte de uma política nacional da relação de consumo, tem objetivos bem definidos e estão expressamente previstos no artigo 4º da Lei 8.078 de 1990, bem como os princípios que lhes dão sustentação.
Destaca-se ainda que a proteção do consumidor não está restrita ao Poder Judiciário, mas também ocorre pela via administrativa, sob a égide das Procuradorias do Consumidor (Procons), presentes nas três esferas do Estado, como na atuação do Ministério Público, das Agências Reguladoras e delegacias especializadas, nos casos de crimes contra os consumidores e até mesmo por entidades privadas.
Finalmente, além das medidas judiciais e extrajudiciais visando a reparação dos danos, a política conta com outras iniciativas, tais quais a conscientização dos fornecedores, a educação e a informação dos consumidores por meio de diversas iniciativas, como cursos, orientações, distribuição de materiais, além das fiscalizações junto aos estabelecimentos para coibir e reprimir às práticas abusivas e a concorrência desleal.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É inequívoco que há muito a ser feito para tornar a proteção ao consumo mais eficiente, mas é inegável a importância da defesa do consumidor no Brasil e os resultados acumulados ao longo destes 35 anos, desde a criação da lei consumeristas, por isso merece o destaque e as justas homenagens.
Visando ressaltar estas conquistas e dar-lhes maior visibilidade, bem como tratar os pontos que precisam ser aperfeiçoados, ao longo deste ano, quando o Código de Defesa do Consumidor celebra o seu trigésimo quinto aniversário, uma série de artigos serão publicados, com o propósito de promover uma compreensão mais adequada acerca dos ganhos e desafios proporcionados pela proteção do consumidor em território brasileiro.
Serão tratados temas sobre a defesa do consumidor no Brasil, a partir das políticas consumeristas, análises dos contextos em que elas se desenvolvem, além das instituições protecionistas, atuantes em todas as esferas e poderes, bem os reflexos que as iniciativas produzem em outros ramos do direito e seus impactos na legislação.
Fiquem atentos e até lá.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Lei Nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 1990.
LUCCA, Newton. Direito do Consumidor – Teoria Geral da Relação Jurídica de Consumo. 2ª edição – São Paulo: Quartier Latin, 2.008.
MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. [livro eletrônico]. São Paulo: Editora Thomson Reuters, 2016. e-book.
RODRIGUES, Geisa de Assis. In Direito do Consumidor. Coleção Doutrina Especiais. Vulnerabilidade do consumidor e modelos de proteção. Vol. II. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
Notas
1 https://jus.com.br/artigos/46606/politicas-crediticias-e-seus-impactos-na-economia
2 https://jus.com.br/artigos/46307/empresas-estatais-vantajosas-ou-prejudiciais-para-o-pais
3https://jus.com.br/artigos/52512/as-atividades-reguladoras-e-a-protecao-dos-consumidores
4https://jus.com.br/artigos/46021/desenvolvimento-social-e-terceira-idade