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Da prevenção de Câmaras no habeas corpus

01/05/1999 às 00:00
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Da mesma forma combatemos a prevenção de Câmaras em julgamentos na Superior Instância. Admitimo-la na primeira Instância, desde que não tenha ocorrido o trânsito em julgado, mesmo que o juízo da sentença venha a ser o juízo da execução. Entendemos que esta nada tem a ver com aquela, são fases distintas. Se o juízo de primeira Instância não pode dar nova sentença depois de transitado em julgado o processo, da mesma forma entendemos que após decisão com trânsito em julgado de qualquer recurso, mormente o de habeas corpus que é a matéria que aqui focalizamos, também os juizes de instâncias superiores não poderão dar nova sentença em seu julgados.

Quer-nos parecer, que se o julgador já tiver se manifestado negativamente a respeito de certo fato, seja ele sobre excesso de prazo, ou nulidade processual, e eventualmente venha o paciente através, até mesmo de outro impetrante, intentar novamente a busca pela concessão da ordem anteriormente denegada, os mesmos julgadores - Câmara preventa - terão, em si, previamente incutido subsconcientemente, a matéria discutida anteriormente - até mesmo por força de despacho inicial em que o Presidente ou Vice-Presidente determina à Secretaria que sejam anexadas à petição, em breve relatório, tudo que constar em seus artigos e assentamentos referente ao paciente, e consequentemente ao processo em julgamento -, e a probabilidade de darem nova definição ao entendimento anterior é bem remota.

Por outro lado, é comum se observar através dos julgados de todos os Tribunais, indistintamente, várias interpretações para um mesmo fato, entendemos que, distribuindo-se o recurso para a Câmara preventa, se está, implicitamente, restringindo a amplitude de defesa, que assegura ao cidadão, tentar, até com sorte, quem sabe, recorrer a uma Câmara cuja matéria que se leva à discussão, tenha entendimento favorável. Assim, na impetração de uma ordem de habeas corpus, cuja matéria em discussão tenha várias interpretações, é de se entender que o julgamento ficará entregue à sorte do sorteio da distribuição de Câmara para o julgamento do remedium extraordinarium.

Pelos fatos mencionados, entendemos, venia permissa, não haver condições do mesmo órgão colegiado modificar a sua própria sentença, proferida anteriormente. Seria, ab absurdo, tal se tolerasse. Nada impediria que o Juiz de 1ª. Instância, viesse a modificar sua própria sentença, ainda que já coberta pelo manto da coisa julgada. Haveria, em tal hipótese, frontal desrespeito ao princípio da estabilidade jurídica, que é uma das aspirações que a ciência processual visa aperfeiçoar cada vez mais.

É de se entender que a partir do momento que uma Câmara proferiu decisão denegatória em matéria de habeas corpus, não deve, a pretexto de prevenção de Câmaras, se julgar competente para julgar outra Ordem, referente ao mesmo processo e versando sobre a mesma matéria, ainda que sob outro ponto de vista, ou com novos argumentos. Entendemos que, a partir do momento que se proferiu uma decisão, no caso denegatória, o Juízo ou Tribunal, passa a se constituir em autoridade coatora, e deve, sem provocação da parte, encaminhar o pedido, revestido da denominação de recurso ordinário constitucional ao tribunal competente, para se processe como tal.

Pedimos venia ao mestre Frederico Marques (1), para tomarmos emprestado um pouco de seus ensinamentos. "Não pode tomar conhecimento de um pedido de habeas corpus o juiz ou tribunal que praticou ou confirmou, expressa ou implicitamente, o ato considerado ofensivo da liberdade física do paciente" e os de Florêncio de Abreu (2) de que somente é competente "para conhecer do pedido (de habeas corpus) autoridade judiciária superior à de que provier a violência, ou coação, sendo incompetente à de hierarquia inferior ou mesmo igual" e ainda Espínola Filho (3), "a autoridade judiciária só agirá licitamente, tendo jurisdição e sendo competente. É óbvio, falta de absolutamente, ao juiz, de que emana o constrangimento, competência para fazer cessar a coação, mediante habeas corpus".

Por outro lado, continua o renomado jurista, não pode "uma câmara isolada conhecer de habeas corpus, quando a coação parte dela própria, ou de outra do mesmo Tribunal, inclusive por ter confirmado a decisão do juiz singular".

Entendemos que a partir do momento que uma Câmara decide sobre um habeas corpus e o indefere, passa a ser a autoridade coatora, portanto deve-se julgar incompetente e encaminhar o pedido ao Tribunal ad quem.


NOTAS
  1. MARQUES, Frederico

Elementos de Direito Processual Penal Volume IV - 1965 - pág. 41
  • ABREU, Florêncio de Comentários ao Código de Processo Penal Editora Forense - Vol. V - pag.575
  • ESPÍNOLA Filho, Eduardo Código de Processo Penal Brasileiro Anotado Edição de 1955 - vol. VII - págs. 199 e 204
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    Sobre o autor
    Jorge Candido S. C. Viana

    consultor jurídico e escritor

    Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

    VIANA, Jorge Candido S. C.. Da prevenção de Câmaras no habeas corpus. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 31, 1 mai. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1136. Acesso em: 23 abr. 2024.

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