3. A fixação da indenização
"A indenização mede-se pela extensão do dano", diz o art. 944, do CC. A razão de ser da indenização e do próprio instituto da responsabilidade civil é a recomposição do dano injusto sofrido pela vítima, buscando, sempre que possível, recolocar a vítima na situação que ocupava antes de sofrer a dita lesão (cf. Cavalieri F.º, 2005, p. 133).
Assim a indenização será determinada pelo prejuízo sofrido pela vítima; nem mais, nem menos. Indenizar por valor superior ao dano implicaria em enriquecimento sem causa à vítima; não indenizar todo o dano, seria fazer aquele que sofreu o dano injusto arcar com esse ônus, além de também implicar em enriquecimento sem causa do causador do dano, ainda que não ele não tenha efetivamente auferido ganho com a sua ação, mas pelo simples fato de deixar de despender o que se lhe exige.
Há situações excepcionais, porém, de modo que o valor da indenização não será necessariamente igual ao do dano. No âmbito estrito das relações civis ordinárias, o art. 944, parágrafo único, do CC, prevê que havendo desproporção entre a culpa do agente e o dano resultante de seu ato, o juiz poderá determinar a redução do montante da indenização por eqüidade, caso em que a vítima terá de suportar parte do prejuízo.
Esta exceção não se aplica às situações de responsabilidade que não sejam baseadas na culpa, pois nestes casos a culpa do agente para a produção do resultado danoso é irrelevante. Parece-nos que tal regra também não se aplica nas relações de consumo em geral, mesmo nas hipóteses de responsabilidade subjetiva, por força do disposto no art. 7º, VI, do CDC, que não dá espaço para exceções.
Há também casos em que a lei determina um teto para o valor da indenização, ainda que o dano seja efetivamente superior ao valor pré-determinado. São casos hoje em dia cada vez mais raros, visto que tem se tendido a privilegiar a reparação integral do dano.
Temos, então, que a quantificação dos danos reparáveis determinará o valor máximo da indenização, ainda que não necessariamente haja uma equivalência entre esses valores; qualquer valor que ultrapasse esse teto não terá natureza indenizatória, mas punitiva, o que só é possível nos casos excepcionais em que houver expressa previsão legal (cf. Pessoa Jorge, 1999, p. 413)
Ademais, deve ser levado em conta que se do dano adveio ao lesado alguma vantagem, ela deverá ser levada em conta para a fixação do valor da indenização, sob pena de haver enriquecimento ilícito (cf. Pessoa Jorge, 1999, p. 414). Se, p.ex., o lesado possuía algum seguro que o indenizou de parte do prejuízo, ao responsável caberá indenizar a vítima somente da diferença, que foi o seu efetivo prejuízo – a reparação integral do dano seria injusta.
"Seja por título judicial, seja por título extrajudicial, todo devedor tem, por efeito da obrigação, de pagar o devido. Se se trata de coisa certa, cumpre-lhe efetuar a entrega. Se de quantia certa, solvê-la mediante o pagamento da soma devida" (Caio Mário, 1999, p. 309).
Assim, é preciso que esteja determinado o que efetivamente será pago. Na responsabilidade civil, em geral, teremos uma obrigação de quantia certa, com vistas à recomposição econômica do patrimônio da vítima (ou uma compensação pelos danos extrapatrimoniais sofridos). Haverá situações, porém – sobretudo, mas não somente, no campo da responsabilidade contratual – em que será devido o cumprimento de uma obrigação específica de entregar ou de fazer, para que efetivamente cumpra uma obrigação inadimplida, ou para que desfaça o que fez em infração a uma obrigação de não fazer.
Na seara da responsabilidade extracontratual há situações que comumente resultam em condenação em obrigação de fazer, tais como aquelas ligadas a danos à imagem ou à honra, como na publicação de direito de resposta, publicação de decisão condenatória etc.
Não sendo cumprida a obrigação devida, ou sendo impossível o seu adimplemento, a obrigação originária é substituída pelo seu equivalente pecuniário – é o que Caio Mário (1999, p. 311) chama de sub-rogação real: um bem toma o lugar do outro, como objeto de direito. Note-se que não haveria aí uma faculdade do credor; o débito é a obrigação originária; a liquidação de perdas e danos "consistirá em traduzir o dano em prestação pecuniária, e é o mais freqüente, porque as mais das vezes não será viável a recomposição da coisa ou a prestação do fato especificamente" (1999, p. 316).
"(...). O Código Civil italiano considera a indemnização específica como direito do lesado, embora o juiz possa impor a indemnização pecuniária, se aquela for excessivamente onerosa para o devedor (art. 2058.º); parece resultar do Código alemão (§§ 249,º e 251.º) orientação fundamentalmente semelhante; o Código suíço concede ao juiz competência para fixar a forma de indemnização (art. 43.º)" (Pessoa Jorge, 1999, p. 421).
No sistema português (cf. Pessoa Jorge, 1999, p. 422), cabe tanto ao devedor como ao credor o poder de escolher a indenização específica; porém, pode o devedor se opor à reposição natural requerida pelo credor, se for excessivamente onerosa, bem como pode o credor se opor à requerida pelo devedor, se não reparar integralmente o dano.
3.1. A fixação da compensação pelo dano extrapatrimonial
O ponto mais tormentoso em toda a doutrina da responsabilidade civil provavelmente ainda é o da fixação do quantum da indenização, rectius: compensação, pelo dano extrapatrimonial sofrido pela vítima.
Hoje já se encontra superada a questão da possibilidade de se condenar alguém por causar um dano extrapatrimonial, mas como avaliar monetariamente algo que por definição não tem valor econômico?
A doutrina francesa defendeu a condenação em valor simbólico – um franco –, que acabava mais por representar uma vitória moral da vítima, que via reconhecida judicialmente a violação de seu direito, do que propriamente uma condenação do ofensor.6
Alguns propõem o tarifamento dos valores de acordo com o tipo de dano, e por vezes levando em conta outros elementos, tais como repercussão, dolo, e situação econômica das partes. O tarifamento, entretanto, vai contra a idéia de se reparar integralmente o dano sofrido – que estaria consagrada no próprio texto constitucional (art. 5º, V e X, da CF). Por conta disso, ele tem sido rejeitado, apesar de sua evidente utilidade prática, facilitando a determinação da condenação, bem como dando uma maior segurança jurídica ao tornar previsível o valor da condenação pela prática de determinado ato.
Nossos tribunais de cúpula não chegaram a se pronunciar sobre a possibilidade em tese de se tarifar a reparação do dano moral, tendo, porém, decidido contra a constitucionalidade de regras específicas, tais como a prevista na Lei de Imprensa (Súmula 281, do STJ), e na Convenção de Varsóvia (RE nº 172.720, rel. Min. Marco Aurélio). A doutrina em geral se posiciona contra qualquer tipo de tarifamento (por todos, Cavalieri F.º, 2005, p. 114).
Para a corrente prevalente, o valor da condenação deve ser arbitrado pelo magistrado, levando em conta as circunstâncias do caso, o que acaba resultando em valores disparatados para casos essencialmente idênticos.
Como já dito, a função da reparação do dano extrapatrimonial não é propriamente restituir o lesado ao estado anterior, "tendo mais uma genérica função satisfatória", de compensar o dano sofrido. "Substitui-se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta", os efeitos da lesão (Cavalieri F°., 2005, p. 102), através de uma "compensação ou benefício de ordem material (a única possível), que lhe permite obter prazeres ou distracções – porventura de ordem puramente espiritual – que, de algum modo, atenuem a sua dor" (Pessoa Jorge, 1999, p. 375). Não se fala em ‘preço da dor’ (pretium doloris), mas antes numa ‘compensação da dor’ (compensatio doloris).
A doutrina, assim como a jurisprudência, mostra grande preocupação em traçar limites para o valor da reparação, evitando que a compensação se torne na verdade em fonte de lucro. Assim, Cavalieri F.º afirma que o valor "deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais. Qualquer quantia a maior importará enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano" (2005, p. 115).
O Código Civil vigente, incluindo no conceito de ato ilícito o dano "ainda que exclusivamente moral" (art. 186), para que não sobrem dúvidas sobre a sua reparabilidade, não cogita de sua limitação nem recomenda que o ressarcimento seja moderado (art. 927). Não obstante,
"se a indenização, em termos gerais, não pode ter o objetivo de provocar o enriquecimento ou proporcionar ao ofendido um avantajamento, por mais forte razão deve ser eqüitativa a reparação do dano moral para que se não converta o sofrimento em móvel de captação de lucro (de lucro capiendo)" (Caio Mário, 1999, p. 318).
Buscando definir parâmetros, ainda que um tanto quanto etéreos, Cavalieri F.º recorre à doutrina de Luís Recasens Siches:
"Creio, também, que este é o outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade. A razoabilidade é o critério que permite cotejar meios e fins, causas e conseqüências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes" (Cavalieri F.º, 2005, p. 116).
Com vistas a estabelecer critérios para a quantificação do dano extrapatrimonial, a doutrina, enumera algumas regras a serem observadas pelo juiz na aplicação da lei ao caso concreto, com a intenção de, mantendo uma margem de discricionariedade para a atuação do juiz, eliminar a arbitrariedade "desprestigiante do Poder Judiciário".
A primeira regra, diz Dalazen (1999, p. 79), é a compreensão de que o dano extrapatrimonial não é mensurável, o que torna qualquer fórmula matemática inviável; "não deve constituir preocupação, pois, apurar uma soma pecuniária que corresponde ao valor intrínseco preciso" dos bens lesionados.
Deve ainda ser considerada a gravidade objetiva do dano, avaliando a "extensão e profundidade da lesão, tomando em conta os meios empregados na ofensa, as seqüelas deixadas" (Dalazen, 1999, p. 79). A isso há de se acrescentar se do injusto adveio algum lucro para o ofensor. Também hão de ser apreciados, os aspectos objetivos do ofensor, tais como antecedentes, índole, e bem como o seu maior ou menor poder econômico, de modo que o valor da condenação venha a representar um real desestímulo a futuras ofensas. Ressalte-se que a condição econômica ou nível social da vítima são completamente irrelevantes (cf. Maria Celina Bodin, 2003, p. 190).
O grau de culpa na conduta não é relevante, pois a regra é que o dano deva ser reparado em sua integralidade. Fosse levada em consideração a culpa do agente, seria de ser permitir "a indenização menor do que seria necessário à reparação, em caso de culpa mais leve" (Maria Celina Bodin, 2003, p. 190), o que não se admite em nosso sistema, pois mesmo agindo com a mais leve culpa, o agente fica obrigado a reparar o dano em sua integralidade; com maior razão é de ser desconsiderada a intenção do agente nos casos de responsabilidade objetiva. Somente quando houver "excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano" (art. 944, do CC), haverá relevância na intencionalidade do agente, permitindo que o juiz determine a redução, e nunca majoração, do valor da reparação devida.
Nesse sentido era a crítica dos Mazeaud (1931, p. 7), afirmando que na responsabilidade civil há tão somente atribuição de um liame jurídico, uma relação obrigacional entre duas pessoas, fazendo uma credora e a outra devedora, resultando que o valor da indenização concedida à vítima deve ser absolutamente independente da gravidade do ato do devedor. Enquanto a pena se mede pela gravidade do crime, a reparação se mede pela gravidade do prejuízo sofrido. Ao agir de outra forma, os tribunais acabam por fazer da condenação civil uma pena privada.
Por outro lado, seria de se levar em conta também o aspecto pessoal e subjetivo da vítima, em especial a intensidade do sofrimento da vítima, elemento esse "marcadamente individual e variável", pois "lesões igualmente graves do ângulo objetivo, podem provocar sofrimento diverso às pessoas, segundo a maior ou menor sensibilidade física ou moral de casa um" (Dalazen, 1999, p. 80). Note-se que a ausência ou diminuto sofrimento por parte da vítima não elimina o seu direito de ter o dano reparado – pois o dano está na conduta e não na reação da vítima ao dano –, mas certamente influirá na sua quantificação.
Por fim, o valor da reparação deve ser determinado pautando-se pela razoabilidade e eqüidade, evitando-se a fixação de valor ínfimo de modo a não servir à sua função inibitória, e nem elevado a ponto de se configurar situação de enriquecimento sem causa, ou levar o ofensor à ruína. Para tanto, deve ser levada em conta a conjuntura econômica do país, que poderá dizer o que é e o que não é um valor muito ou pouco elevado.
"O certo é que tal valor, no Direito brasileiro e até no Direito Comparado, subordina-se essencialmente ao bom-senso do juiz e, portanto, a uma avaliação preponderantemente e sempre subjetiva de quem julga.
"Eis por que, em meu entender, esse sistema de absoluto culto à discricionariedade judicial não tem produzido resultados satisfatórios, notadamente porque tem gerado cifras ostensivamente desiguais, em que a desejável e prudente discricionariedade do Juiz, em alguns casos tangencia perigosamente os limites da arbitrariedade, pura e simples.
"Naturalmente, não se advoga aqui a previsão legal de um incompatível reparação tarifária, ou estandardização do valor, de modo a que seja obtido de forma mecânica e automática.
"Entretanto, se me for dado aqui emitir um juízo crítico, direi que o critério prevalecente no direito brasileiro, de absoluta discricionariedade do Juiz, clama por urgente aperfeiçoamento, pois adota solução diametralmente contraposta. Ora, qualquer extremo é desaconselhável: ‘in medio virtus’, ensinavam os latinos.
"Penso que convém, assim, mediante legislação infra-constitucional disciplinadora do texto constitucional (art. 5º, inc. V e X), fixar patamar mínimo e máximo (piso e teto), bem como delinear objetivamente os elementos para a aferição e dosagem do valor do dano moral.
(Dalazen, 1999, p. 80-81).
Caio Mário também defende que a reparação do dano extrapatrimonial deve incluir uma "punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial", além de "pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie", de cunho moral ou mesmo material; acrescendo ainda que "na reparação por dano moral insere-se a solidariedade social à vítima" (1999, p. 317-318). Também Cavalieri F°. reconhece "a necessidade de se impor uma pena ao causador do dano moral, para não passar impune a infração e, assim, estimular novas agressões. A indenização funcionará também como uma espécie de pena privada em benefício da vítima" (2005, p. 103).
A esse entendimento se opõe a idéia de que no campo civil, nas relações entre particulares, não haveria que se falar em condenações de caráter punitivo – "pena civil" –, mas meramente reparatório, mas apenas em reparação do dano sofrido, pois punição somente haveria nas relações do indivíduo com o Estado.7 Não seria admissível, assim, que o cidadão "possa assumir a função do Ministério Público, pretendendo que venham cominadas sanções decorrentes de um ilícito civil, e, pior, que delas se possa beneficiar" (cf. Maria Celina Bodin, 2003, p. 255).
Ademais, no campo penal há os clássicos brocardos afirmando inexistir responsabilidade se a conduta não for previamente tipificada, e tampouco sem pena anteriormente prevista em abstrato. Fica evidente o desrespeito a esses postulados quando, no juízo cível, ao agente é imposta uma condenação de caráter punitivo sem que haja uma previsão expressa, e nem mesmo que se tenha conhecimento de antemão da pena que lhe será aplicada.
É verdade que na esfera civil temos o ancestral instituto da cláusula penal no campo da responsabilidade contratual, ainda que muitas vezes funcione como ‘danos presumidos’. É certo, porém, que nessa hipótese há um prévio acordo entre as partes, enquanto que na seara extracontratual inexiste previsão normativa geral expressa do aspecto punitivo da reparação pelo dano extrapatrimonial, de modo que a sua aplicação somente se sustentaria juridicamente nas poucas situações de previsão legal expressa. Daí afirmar Maria Celina Bodin que se constitui, "em sistemas jurídicos como o nosso, numa figura anômala, intermediária entre o direito civil e o direito penal" (2003, p. 258).
Mais, frequentemente o mesmo ato que enseja a responsabilidade civil por dano extrapatrimonial também é fato gerador de responsabilidade penal, de modo que a imposição de uma pena no juízo cível pode acarretar no vedado bis in idem; e isso, para Maria Celina Bodin (2003, p. 260-261), seria injustificado, ainda mais porque "as sanções pecuniárias cíveis têm potencial para exceder, em muito, as correspondentes do juízo criminal". Outro ponto trazido pela citada autora, é que em sede de responsabilidade civil, nem sempre o agente causador do dano e o responsável são a mesma pessoa, o que tornaria a idéia de punição sem sentido; outrossim, não raro o agente está coberto por seguro, de modo que para ele o valor da condenação é indiferente.
Não obstante, a tese do caráter punitivo da reparação do dano extrapatrimonial ganhou força como resposta aos argumentos de que não seria possível compensar materialmente, pelo menos não com valores significativos, um dano que não é material. Assim, justificou-se a condenação em valor atribuindo-lhe um caráter punitivo, e não indenizatório, mas aqui a punição é paga em favor da vítima, e não do Estado (cf. Maria Celina Bodin, 2003, p. 223).
Hoje em dia já se reconhece que independente de um caráter punitivo, o dano extrapatrimonial é sim reparável. A fim de se evitar condenações em valores irrisórios, ou que não atinjam a consciência do ofensor para que deixe de praticar o ilícito, a jurisprudência aderiu à tese de que a reparação também deve conter um aspecto punitivo, com vistas à repressão e prevenção, atingindo o ofensor em seu patrimônio, com intuito de assim ‘sensibilizá-lo’.8
Para Maria Celina Bodin (2003, p. 227) o ideal seria, então, reconhecendo-se o caráter de pena civil da reparação por dano extrapatrimonial seria "normatizar as fattispecie merecedoras, do ponto de vista do legislador democrático, de aplicação de pena pecuniária". A autora ainda argumenta que sem critérios claros, tal tese "se configura praticamente como um ‘cheque em branco’", liberando o magistrado para punir como quiser, e permitindo que o lesante sofra punição desproporcional, a título de servir de exemplo.
O que acaba ocorrendo, para evitar esse tipo de arbitrariedade no arbitramento, é que o julgador se utiliza de critérios jurisprudenciais, utilizando como parâmetro outros julgados semelhantes, temperados com as condições peculiares do caso concreto. Por óbvio, por obediência à garantia constitucional do contraditório, todos os motivos que levaram o julgador a fixar o valor da condenação devem ser explicitados.
Essa utilização de paradigmas judiciais contribui para a previsibilidade das conseqüências das condutas lesivas, e, em decorrência disso, também para a segurança jurídica das relações sociais em geral, o que, afinal, é o grande objetivo do Direito.
Notas
1 Nesse sentido: REsp nº 664115, rel. Min. Menezes Direito.
2 "Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior".
3 "Der zu ersetzende Schaden umfasst auch den entgangenen Gewinn. Als entgangen gilt der Gewinn, welcher nach dem gewöhnlichen Lauf der Dinge oder nach den besonderen Umständen, insbesondere nach den getroffenen Anstalten und Vorkehrungen, mit Wahrscheinlichkeit erwartet werden konnte".
4 Cf. REsp nº 35393, rel. Ruy Rosado de Aguiar; REsp nº 84752, rel. Ari Pargendler.
5 REsp nº 58783; 60033-2; 58660-7.
6 Apesar de já não ser a corrente prevalente, podemos encontrar reflexo dessa doutrina na recente condenação de uma empresa aérea irlandesa pelo uso indevido da imagem do presidente francês Nicolas Sarkozy e de sua esposa Carla Bruni. Sarkozy requereu a condenação da empresa no valor simbólico de €1, sendo seu pedido julgado procedente; sua esposa pediu €500 mil, porém a condenação limitou o valor da reparação em €60 mil (https://www.estadao.com.br/internacional/not_int120084,0.htm).
7 Para uma análise detalhada, v. Maria Celina Bodin, 2003, p. 195-202.
8 Por todos, v. REsp nº 246.258, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira.