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A flexibilização das normas trabalhistas frente à globalização

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01/09/2000 às 00:00
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VIII - Conclusões

54. A missão da Justiça do Trabalho, frente ao processo de globalização - tal como entendido na presente monografia - reside na busca de conciliação de controvérsias decorrentes da relação de trabalho em face da internacionalização da economia. Para tanto, precisa se adequar à nova realidade que ora se apresenta, pois o Direito, como a sociedade, é dinâmico, dialético. Aliás, não houvesse distância entre a norma jurídica e a realidade, a ordem social seria mais justa.

55. Já que alguns juristas têm apresentado argumentos vários para apontar inconstitucionalidades da Lei 9.601, propugnando pela obediência estrita dos preceitos constitucionais, cumpre ressaltar a prevalência e a auto-aplicabilidade de preceitos como o art.170,VIII (busca do pleno emprego, como princípio da ordem econômica); o art. 3º,II e III (onde se prevê serem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil "garantir o desenvolvimento nacional" e "erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais"); e o art.193 ("A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais"). Ora, se estão os direitos sociais estabelecidos na Constituição Federal, que se lhes apliquem. Se se prevê dificuldade em aplicar o Direito, melhor seria se não tivessem sido aqueles direitos explicitados na Lei Maior.

56. Convém cuidar sempre para que não se vincule simplesmente o emprego às condições econômicas vigentes, eis que "a lei da oferta e da procura não é adequada às relações de trabalho, pois o valor do trabalho exige estimativas coerentes com o seu significado social e humano". (xxxi) Com efeito, em matéria trabalhista, o país não pode ser considerado como mero mercado de capitais. Os fatores sociais precisam ser levados em conta ao lado dos fatores econômicos, nunca abaixo destes, nunca relegados a segundo plano.

57. Deve-se atentar para a possibilidade de abuso e má-fé do empregador, quando estipula severas condições de trabalho, aumenta exigências e diminui benefícios a seu bel-prazer com a anuência do empregado, sob pena de ficar este sem emprego. Tendo em vista que a autonomia da vontade pode servir de exploração do hipossuficiente, torna-se necessária a atenta vigilância dos sindicatos, do Ministério do Trabalho, da OAB, do Ministério Público do Trabalho e da sociedade civil. A flexibilização que acarreta redução de direitos conquistados só se justifica quando houver benefícios compensatórios para o trabalhador.

58. Somente com a atuação conjunta do Executivo, do Legislativo e do Judiciário poderão, na implementação de eventuais propostas, ser alcançados os resultados desejados. Cabe ao governante elaborar e implementar eficientes políticas públicas que procurem conferir estímulos para que todos os agentes econômicos criem condições para a queda da taxa de desemprego. Cabe ao legislador entender os anseios, angústias e conflitos da sociedade, sempre dinâmica, em constante movimento e contínua transformação, com o objetivo de encontrar, no meio social, o próprio Direito. Cabe ao juiz procurar fazer uma interpretação social da lei, com o objetivo último de atender ao bem comum, ao bem da coletividade, dos empregados e dos empregadores.

59. Convém lembrar aqui o art. 5º do Código Civil Brasileiro, que reza: "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". No mesmo sentido, o art. 8º, in fine, da CLT, o qual ressalta: "nenhum interesse de classe ou particular deve prevalecer sobre o interesse público"

60. Pode-se concluir que, diante dos novos desafios impostos pela "globalização", o princípio da flexibilização das normas trabalhistas brasileiras pode vir a ser ampliado e aplicado com o fito de procurar dar maior liberdade negocial às relações de trabalho - desde que se garanta, por meio do Poder Público, a existência e a eficácia de mecanismos de proteção mínima do hipossuficiente - na busca de soluções criativas e equânimes que melhor atendam às necessidades dos dois lados, empregados e empregadores, sempre com o objetivo último de tornar o Brasil um país economicamente desenvolvido e socialmente justo.


IX – FONTES CONSULTADAS

  1. Doutrina:

    BATALHA, Wilson de Souza Campos. Tratado de Direito Judiciário do Trabalho. São Paulo, ed. LTr, 1985.

    NASCIMENTO, Amaury Mascaro. Teoria da Norma Jurídica Trabalhista. São Paulo, ed. LTr, 1976.

    NASCIMENTO, Amaury Mascaro. Fundamentos do Direito do Trabalho. São Paulo, ed. LTr, 1970.

    RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. Rio, Forense, 1986.

    RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. Curitiba, Juruá Editora, 1997.

    SOUZA JÚNIOR, José Geraldo e AGUIAR, Roberto (org.). Introdução Crítica ao Direito do Trabalho. Brasília, UnB, 1993.

    SUSSEKIND, Arnaldo et alii. Instituições do Direito do Trabalho. Rio, Freitas Bastos, 1984.

  2. Jurisprudência:

    Vide notas xvi, xvii, xviii, xx, xxiii e xxix

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  1. Legislação:
  • Constituição da República Federativa do Brasil, 5 de outubro de 1988.
  • Consolidação das Leis do Trabalho (DL nº.5452, de 1º.05.43).
  • Lei nº 6.019 / 74
  • Lei nº 8.880 / 95
  • Lei nº 9.601 / 98
  1. Periódicos:
  • jornais O Globo, Gazeta Mercantil e Correio Braziliense de fevereiro a abril de 98;

  • revistas L’Express e Le nouvel observateur, de dezembro de 97 a março de 98.

  1. Livros diversos:
  1. ARON, Raymond. "Os Estados e a economia internacional". In: Os Últimos Anos do Século. RJ, Guanabara, 1987.
  2. GILPIN, Robert. "Dependence and Economic Development". In: The Cold War International System. Classic Readings of International Relations, Belmont. Cal., Wadsworth, 1993, Section IV.
  3. MARUANI, Margaret et alii. La Flexibilité en Italie – Débats sur l’emploi. Paris, Syros/Alternatives, 1989.
  4. SEYFARTH et alii. Labor Relations and the Law in France and the United States. The University of Michigan, 1972.

Notas

  1. Cf. art.226, # 3º da Constituição Federal de 1988.
  2. Cf. art.227, # 6º da Constituição Federal de 1988.
  3. AGUIAR CUNHA, Paulo Guilherme, "Indústria Nacional e Política Externa". In: Temas de Política Externa Brasileira II, vol.1, p.354-5.
  4. BENTES, Ivana. "Cultura e globalização na América Latina: Globalização Eletrônica". In: Globalização na América Latina: Integração solidária. Seminário Internacional. FUNAG, Brasília, 1997.
  5. CALVEZ E PERRIN, Église et société économique, Paris, 1959, p.295.
  6. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. São Paulo, Saraiva, 1990, p.301.
  7. Apud: GALVÃO, Luís Eduardo. "A bomba que ameaça o mundo". In: Revista Rumos do Desenvolvimento, dez/97, p.25.
  8. Cf. matéria da revista Veja de 11.02.98: "Assombração Nacional", p.68-73.
  9. Cf. Jornal de Brasília, p. 10, 11.02.98.
  10. Cf. reportagem de O Globo, dia 11.02.98, p. 27.
  11. Cf. reportagem à p. 32 da edição de 8-14 janeiro/98 de Le Nouvel Observateur.
  12. Cf. reportagem da revista L’Express, de 14.12.97: "La révolte des petits patrons", p.38-46.
  13. Cf. reportagem da Gazeta Mercantil de 05.02.98, à p. A-18.
  14. MARUANI, Margaret et alii. La flexibilité en Italie / Débats sur l’emploi. Paris, Syros/Alternative, 1989, p.25.
  15. Cf. BRUNO, Sergio. "La flexibilité : un concept contingent". In: MARUANI, op. cit, p.39.
  16. Cf. As seguintes decisões do TST proferidas em Recursos Ordinários em Dissídio Coletivo: Acórdão n. 1373, de 03.11.97, publicado no DJ de 12.12.97, à p. 65847; Acórdão n. 1373, de 03.11.97, publicado no DJ de 12.12.97, à p. 65847; Acórdão n. 923, de 04.08.97, publicado no DJ de 05.09.97, à p. 42134; Acórdão n. 448, de 15.04.97, publicado no DJ de 23.05.97, à p. 22142; Acórdão n. 354 de 31.03.97, publicado no DJ de 02.05.97, à p. 16821; Acórdão n.166, de 24.02.97, publicado no DJ de 04.04.97, à p. 10777; Acórdão n. 704, de 24.06.96, publicado no DJ de 04.10.96, à p.37363; bem como decisões proferidas em Recursos de Revista : Acórdão n.6876, de 23.10.96, publicado no DJ de 23.05.97, à p. 22244; Acórdão n.7451, de 11.12.96, publicado no DJ de 07.03.97, à p.05809; Acórdão n. 4310, de 08.09.97, publicado no DJ de 19.09.97, à p. 45817.
  17. Cf. Acórdão n. 6876, de 23.10.96, proferido pela Segunda Turma do TST em Recurso de Revista. Redator Min. José Luciano da Castilho Pereira. Recorrente: Fertisul S/A. Recorrido: Morency Goulart Gonçalves.
  18. Acórdão n. 1434, de 17.11.97 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST, publicado no DJ de 12.12.97, à p.65850. Recorrente: Ministério Público do Trabalho da 4ª Região. Recorridos: Sindicato das Indústrias Químicas no Estado do RS e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas e Plásticas de Estância Velha.
  19. Cf. reportagem da revista Isto É, de 17.12.97, à p. 108 : "Tudo pelo emprego".
  20. Decisão proferida pela Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST em 15.04.97, Acórdão n. 448, Relator Min. Antônio Ribeiro.
  21. Apud: BUENO DE CARVALHO, Amílton. "Flexibilização x Direito Alternativo". In: SOUZA JÚNIOR, José Geraldo e AGUIAR, Roberto (org.).Introdução crítica ao direito do trabalho. Brasília, UnB, 1993, p.97-102.
  22. BUENO DE CARVALHO, Amílton, op.cit, p.101.
  23. Cf. Acórdão n. 4310 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST, publicado no DJ de 19.09.97, à p. 45817. Embargo em Recurso de Revista. Embargante: Mineração Morro Velho Ltda. Embargados: Valdir Margarido dos Santos e outros. Relator: Min.Rider Nogueira de Brito.
  24. PIMENTEL, Marcelo. Lei do trabalho temporário erra o alvo. In: Caderno "Direito e Justiça" do Correio Braziliense de 30.03.98.
  25. Cf. matéria do jornal "Hoje em Dia", de 13.02.98, à p. 9: "Salej critica o custo estadual".
  26. Apud: ALTENFELDER SILVA, Rui Martins. O novo perfil das relações trabalhistas. In: Correio Braziliense, 20.02.98, p.17.
  27. Cf. reportagem Le travail en miettes, à p. 43 da revista "Le nouvel observateur", de 5-11 / fevereiro de 1998.
  28. CAMARGO, José Márcio. Entrevista ao Jornal de Brasília, 15.03.98, p.11.
  29. Cf. Acórdão n. 448 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST, publicado à p. 22142 do DJ de 23.05.97. Relator : Min. Antônio Fábio Ribeiro.
  30. FERREIRA FILHO. Op. cit., p. 306.
  31. NASCIMENTO, Amaury Mascaro. Teoria da Norma Jurídica Trabalhista. São Paulo, Ed. Ltr, 1976, p.21.
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Sobre o autor
Ancelmo César Lins de Góis

diplomata de carreira em Brasília (DF), bacharel em Direito e em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), professor de Ciência Política na Faculdade de Direito do UniCEUB

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GÓIS, Ancelmo César Lins. A flexibilização das normas trabalhistas frente à globalização. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 45, 1 set. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1145. Acesso em: 22 nov. 2024.

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As opiniões expressas neste texto são de exclusiva responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, a posição oficial do Ministério das Relações Exteriores

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