Capa da publicação Juizado de Trânsito soluciona colisões em São Luís
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O direito ao trânsito em condições seguras

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Como o Juizado Especial de Trânsito resolve colisões no local? Serviço móvel agiliza acordos, evita congestionamentos e garante direitos de condutores e vítimas.

Resumo: O presente estudo tem como objetivo demonstrar a importância da instalação do Juizado Especial de Trânsito na Comarca da Ilha de São Luís para a resolução in loco de conflitos decorrentes de colisões entre veículos automotores.

Palavras-chave: Juizado. Trânsito. Veículo automotor. Condutor. Colisão. Resolução do conflito in loco.

Sumário: 1. Introdução. 2. Do papel do Juizado Especial Cível na garantia do direito ao trânsito. 3. Conclusão.


1. Introdução

​O automóvel, em nossos dias, é meio essencial de transporte, pois é por intermédio dele que se encurtam, por terra, as questões do tempo e da distância.

É altíssimo o número de veículos em circulação em nosso país. Por isso, não se pode olvidar o perigo que essa máquina representa em poder de mãos irresponsáveis. Milhões de brasileiros utilizam diariamente esse meio de transporte para chegarem a lugares que, dantes, a pé ou em lombos de animais demoravam horas, dias ou meses.

Daí porque, não raras vezes, deparamo-nos com as ruas e avenidas das grandes cidades totalmente inacessíveis à normal circulação de veículos, configurando, tal situação, aquilo que comumente chamamos de engarrafamento ou congestionamento de tráfego, que resulta no travamento das vias públicas.

Com a popularização do automóvel, grande também é o número de pessoas que dependem dele para o seu sustento, como profissionais do volante. A par disso, enorme é o contingente humano apto a dirigir veículos automotores. Contudo, a direção veicular, por força de legislação específica, está sujeita à obtenção da permissão para dirigir veículo automotor ou da carteira nacional de habilitação, dado ser tais credenciais documentos de porte essencial.

O trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, rege-se pela Lei n.º 9.503, de 23 de setembro de 1997, norma que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro. Na definição do Código em destaque, considera-se trânsito “a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.” (art. 1.º, § 1.º).

Por outro lado, o § 2.º, do mesmo dispositivo legal, enfatiza que “o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.”

Note-se que a pretensão deste estudo é exatamente a abordagem do trânsito de veículos automotores em condições seguras, expressão que se ajusta perfeitamente ao direito fundamental de segurança declarado nos arts. 5.º, caput, e 144 da Constituição Federal.

O direito de transitar ou de circular nas vias terrestres, nos termos acima definidos, incorpora-se no direito de cidadania, fincado no portal da Constituição da República (art. 1.º) como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito.

Na essência, portanto, do direito de trânsito estão a cidadania e a segurança, sendo certo que a característica de nacionalidade do direito de trânsito está declarada no art. 22, XI, da Constituição Federal, por competir privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte, circunstância que afasta o poder dos Estados-membros e dos municípios para dispor ou legislar sobre a matéria, salvo quando estiverem expressamente autorizados por lei complementar federal.

Vale registrar, por oportuno, que, a despeito da referida vedação legislativa, a Constituição Federal atribui competência comum aos entes retrocitados para estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito, conforme reza o seu art. 23, inciso XII.

São regras, por exemplo, nos âmbitos estadual e municipal, que dizem respeito à mão de direção, às vias preferenciais, ao controle da poluição, ao uso obrigatório de cinto de segurança, à velocidade permitida, ao uso de buzina, aos estacionamentos, aos locais e momentos de carga ou descarga, ao limite de altura ou peso, ao uso de luz alta e baixa, etc.


2. Do papel do Juizado Especial Cível na garantia do direito ao trânsito.

A Constituição da República Federativa do Brasil assegura a todos os cidadãos a prestação de justiça, como um dos valores supremos da sociedade. Essa garantia constitucional vem expressamente manifestada não apenas em inúmeros dispositivos da lex legum, mas desde o seu preâmbulo, que representa, na sua tarefa realizadora do pensamento vivo do direito, a ideia mais que perfeita e sublime do eterno devenir dos diplomas legislativos que consagram e abrigam, de forma sempre atual, os princípios fundamentais com os quais prometem adimplir o pacto social.

O preâmbulo, que incorpora também a evocação divina, contém princípios que exercem uma força centrípeta sobre as demais normas da Constituição, circunstância que projeta sua importância ao nível de interpretação dentro e fora do contexto onde fora transcrito.

A prestação de justiça ao indivíduo vincula-se ao direito de cidadania. Por essa razão, a lex mater, cumprindo a promessa de dar solução pacífica aos conflitos humanos, permitiu a criação, nas esferas estadual e federal, de unidades judiciais que denominou de juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turma de juízes de primeiro grau.

Em face disso, a União editou, em 26 de setembro de 1995, a lei n.º 9.099. Interessa-nos, para este estudo, examinar unicamente a parte cível desse diploma legal, por ser aplicável na dirimência das questões que envolvem a responsabilidade civil de condutores e proprietários de veículos automotores.

A enorme demanda judicial, envolvendo colisão entre automóveis no Estado do Maranhão, obrigou a criação e instalação do Juizado Especial Cível de Trânsito, por projeto de iniciativa do Poder Judiciário. Essa unidade jurisdicional foi instalada nos idos de 1992, detendo jurisdição em toda a ilha de São Luís.

Apesar disso, não se pode inviabilizar o direito da parte autora em mover ação perante o JET maranhense, quando o acidente de trânsito ocorrer fora dos limites geográficos da ilha de São Luís. Isto, em face do disposto no art. 4.º e seus incisos, da lei n.º 9.099/95.

Desde a sua instalação, o JET funciona no âmbito das espaços físicas do DETRAN-MA, em prédio destinado especificamente à sua finalidade. Posteriormente, criou-se a unidade móvel, constituída por duas viaturas do tipo VAN, adaptadas e dotadas de estrutura necessária para atendimento às partes litigantes, no próprio local do acidente.

Sabe-se que são inúmeros e graves os incômodos provenientes de sinistros envolvendo veículos automotores em vias públicas. A rápida desobstrução do local afetado com a colisão facilita o imediato restabelecimento do fluxo circulatório e evita transtornos de várias espécies.

A vantagem do serviço móvel está no fato de que, ao local do sinistro, é deslocada uma equipe constituída de motorista, conciliador, oficial de justiça e peritos, que vão – cada um deles - dentro de suas atribuições, realizar trabalho dignificante no sentido de colher os nomes dos condutores envolvidos no sinistro, os elementos característicos dos veículos automotores, o levantamento dos vestígios deixados com o acidente e de convencer as partes a se conciliarem.

Fracassada a possibilidade de acordo, ficam, de logo, as partes intimadas para comparecerem à audiência de instrução e julgamento em dia, hora e local, que lhes é fornecido pela equipe presente ao locus delicti civile.

Quando da realização da audiência de instrução, o laudo pericial de acidente de trânsito, elaborado pelos peritos do Juizado que compareceram ao local do sinistro, já deverá estar obrigatoriamente pronto e juntado aos autos, posto ser de fundamental importância para o julgamento da lide, embora não esteja o Juiz vinculado às conclusões dos expertos.

No que concerne à unidade fixa do JET, a reclamação (escrita ou verbal) deve relatar o fato litigioso, naquilo que for essencial, e ser apresentada mediante a comprovação da ocorrência policial ou do Boletim de Ocorrência, preenchido por policiais que tenham comparecido ao local do acidente, bem assim do laudo pericial se já houver sido elaborado ou do laudo de interpretação do BO, da apresentação de três orçamentos1 ou de notas fiscais que comprovem o serviço já realizado e da prova de propriedade do veículo abalroado.

O ideal é que essas provas documentais sejam apresentadas com a petição inicial. Se isso não for possível, podem elas, assim como a prova testemunhal, ser apresentada até a abertura da audiência de instrução e julgamento, instante limite para a produção dessas e de qualquer outra prova, sob pena de preclusão.

O pedido de indenização por dano material pode vir cumulado com o de dano moral, bem assim de lucros cessantes e/ou danos emergentes. A tarefa do peticionário, a partir da pretensão deduzida será especificamente fazer a prova de cada verba indenizatória pleiteada, pois apesar da informalidade procedimental da lei dos juizados especiais cíveis não se pode dispensar o dever imposto a todo litigante de demonstrar a veracidade e idoneidade de suas alegações.

Nada impede também que o pedido seja formulado via internet. Para isso, há de existir resolução do tribunal permitindo essa postulação. Essa questão, atualmente, está superada pela obrigatoriedade da utilização do sistema PJe para postulação em juízo, cabendo à equipe da unidade móvel providenciar tal requisito in loco..

Na minha opinião, não basta a postulação em si. É indispensável que a parte reclamante ou seu advogado compareça ao juizado posteriormente para requerer a juntada da documentação necessária à demonstração de suas alegações, sob pena do pedido ser fadado ao insucesso. Essa providência deve ser tomada antes da realização da audiência de instrução e julgamento, se não houver sido, de pronto, designada audiência una.

O acionamento da unidade móvel dá-se por via telefônica. O condutor envolvido em acidente de trânsito transmite a ocorrência para o terminal telefônico do Juizado, instalado exclusivamente para esse fim, onde profissional treinado faz as anotações preliminares e solicita a localização dos veículos envolvidos no sinistro para facilitar o atendimento no local do sinistro.

De posse das informações relatadas, a equipe comparece ao local, onde são tomadas as providências de praxe, instaurando-se, caso haja conciliação ou não entre as partes – e desde que seja feito pedido formal – o devido processo para a homologação do acordo firmado (no caso de consenso) ou a pacífica solução do litígio, mediante sentença definitiva de mérito, após regular instrução, no caso de contenda.

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3. Conclusão

Um motorista que desconhece as regras mínimas de trânsito jamais conduzirá um carro em condições seguras. Somente o condutor dotado de educação para o trânsito conseguirá ter domínio sobre a máquina e dirigir com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito.

A complexidade das relações que envolvem a circulação de veículos, com reflexos nos campos administrativo, penal e cível, impõe a todos o dever de não lesar a ninguém. Para isso, é indispensável que não somente os condutores de veículos automotores colaborem para a aplicação das normas listadas pelo Código de Trânsito Brasileiro, mas também os pedestres e as autoridades constituídas, pois sem a participação conjunta, decisiva e responsável de cada um dos setores interessados, o direito de circulação nas vias públicas em condições seguras será apenas uma utopia, que nunca sairá da norma abstrata em que foi idealizado.

A garantia a um trânsito em condições seguras diz respeito aos direitos fundamentais do indivíduo, tais como: a vida, a cidadania, a soberania, a liberdade ambulatória, e tantos outros proclamados no art. 5.º da Constituição Federal, cuja operacionalização resulta do esforço conjunto do ser humano e do poder público.

Aliás, dentre os objetivos básicos do Sistema Nacional de Trânsito, se encontra fixada a obrigação de implantação de política de trânsito uniforme para todo o território brasileiro, tendente à padronização de diretrizes com vistas à segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para o trânsito, mediante a fiscalização de seu cumprimento.

Ao proprietário que se comportar dentro das regras de trânsito e, embora assim, tiver seu veículo abalroado por outro, em face da conduta culposa do condutor, cabe aforar a ação correspondente para obter o devido ressarcimento, pois a ninguém é permitido o direito de lesar a outrem e permanecer indene.

O Juizado Especial Cível de Trânsito possui papel de suma relevância nesse processo de resolução dos conflitos que envolvem acidentes de veículos automotores, pois marcando presença - quer no local do sinistro, quer na rápida entrega da prestação jurisdicional -, ajuda a pacificar, em curto espaço de tempo, disputa que no juízo comum – dada a variedade de incidentes processuais e recursais – demoraria anos.

Com tal opção, a credibilidade na justiça e no judiciário aumenta, sobretudo se o Juiz, ao cabo da audiência de instrução, proceder ao julgamento da lide, vale dizer, proferir a sentença de mérito, como um dos objetivos primordiais da lei n.º 9.099/95.


Nota

1 Sendo o veículo importado, e existindo na cidade apenas uma concessionária, admite-se a apresentação de somente um orçamento ou de apenas uma nota fiscal expedidos pela respectiva revendedora.


Abstract: The present study aims to demonstrate the importance of establishing the Special Traffic Court in the District of São Luís Island for the on-site resolution of conflicts arising from motor vehicle collisions.

Keywords: Special Court. Traffic. Motor vehicle. Driver. Collision. On-site conflict resolution.

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Sobre o autor
José Eulálio Figueiredo de Almeida

Professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Desembargador do TJMA. Membro da Academia Maranhense de Letras Jurídicas. Especialização em Processo Civil pela UFPE. Especialização em Ciências Criminais pelo UNICEUMA. Doutor em Direito e Ciências Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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