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Juizados especiais ambientais, sonho ou realidade?

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26/08/2008 às 00:00
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7. A necessidade de especialização dos juizados especiais em matéria ambiental.

Embora a referida pesquisa seja restrita à Justiça Federal e, ainda, à determinada região do país, se pode deduzir que apesar do progresso alcançado com a nova sistemática processual, algumas barreiras precisam ser ultrapassadas para que sejam exauridas as possibilidades oferecidas pelo novo sistema. Tudo indica que as a matéria ambiental, pela peculiaridade que encerra, exige uma maior especialização para que se evite, por exemplo, a formalização de transações sem que a reparação do ou de um dano ambiental seja priorizado, tal como ocorreu nos processos avaliados na pesquisa acima referida.

Nesse passo, à luz das diretrizes norteadoras dos Juizados Especiais Criminais, o Poder Judiciário do Estado do Mato Grosso do Sul, criou "... o "JUVAM" - Juizado Volante Ambiental, o qual tem competência para as causas relativas ao meio ambiente, no âmbito civil e penal, além das execuções advindas das multas do órgão municipal e estadual do meio ambiente... Foram implantados na Comarca da Capital (Cuiabá), Barra do Garças, Cáceres e Rondonópolis. Em Cuiabá firmou-se um convênio com a FEMA para fornecer os veículos e equipamentos e nas Comarcas a Prefeitura se encarregou dos meios necessários, ficando a cargo do Poder Judiciário somente os funcionários." [30]

E não é só. A necessidade da criação dos Juizados Especiais Ambientais vem ganhando corpo, na medida em que é matéria de destaque nas discussões do FONAJE (Foro nacional dos Juizados Especiais) especialmente no último encontro (XXII edição), realizado em Manaus, AM, na semana de 24 a 26/10/2007.

Como conseqüência, o assunto passou a ganhar também destaque nos encontros levados a efeito pelos Tribunais de Justiça Estaduais como, por exemplo, o de São Paulo que promoveu, em 29/10/2007, o "primeiro encontro de varas de Juizados Especiais", ocasião em que "os magistrados discutiram as metas e prioridades das varas, bem como medidas de racionalização de procedimentos, atendimento ao público e celeridade processual. Foram debatidos também temas que surgiram durante o FONAJE (Fórum Nacional de Juizados Especiais), como a criação de juizados especiais ambientais, a aplicação de penas direcionadas à proteção e reparação ambiental e a redação de acórdãos segundo os princípios de simplicidade, objetividade e celeridade dos Juizados Especiais." [31]

O assunto também mereceu relevo no Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, que fez publicar em seu sítio eletrônico, no dia 23/11/2007, sob o título, "Juizados se renovam com fóruns de discussões" que no já referido Fórum Nacional dos Juizados Especiais, "Entre os destaques das discussões, foram objetos de debates temas referentes à proteção do meio ambiente, tais como a criação e instalação de juizados especiais ambientais, considerando a importância que esta questão tem alçado na atualidade. Nas discussões foram assinaladas as conseqüências da imputação penal na hipótese de violação às regras da proteção ambiental, sem prejuízo da devida indenização." [32]

Também no meio acadêmico o assunto tem recebido atenção como se observa, por exemplo, no ciclo de palestras sobre Juizados Especiais promovido no mês de agosto de 2007 pela turma do 5º ano de Direito do Univag Centro Universitário, que incluiu dentre os temas a serem debatidos, os Juizados Especiais Ambientais. [33]

Assim, embora se deva reconhecer que os movimentos ainda são pontuais e tímidos, é perfeitamente possível afirmar que a criação de Juizados Especiais Ambientais em nível nacional começa a deixar de representar mero sonho e passa a se aproximar, cada vez mais, da realidade.

A legislação ambiental brasileira é moderna e como tal é reconhecida internacionalmente. Porém, a doutrina reclama, a nosso ver com razão, que "Não obstante a existência de vasta legislação ambiental, tem-se verificado a demora na prestação jurisdicional e administrativa, por muitas razões, entre as quais: elevado índice de litigiosidade, número insuficiente de servidores públicos, falta de capacitação específica destes em alguns segmentos, complexidade das questões a serem dirimidas, inclusive com a necessidade de pareceres técnicos, altos custos, possibilidade de interposição de muitos recursos judiciais na legislação processual civil." [34]

Ora, os Juizados Especiais, mediante a especialização de varas em matéria ambiental, podem vir a representar um importante meio de oferta de Justiça Ambiental, suprindo vários dos itens apontados na doutrina como necessários à efetivação da legislação específica de proteção ao meio ambiente. O procedimento, como se observou até aqui, é passível de permitir o maior acesso à justiça e capaz de proporcionar maior celeridade na prestação jurisdicional. A especialização, de sua vez, dotará servidores – se não pela formação técnica específica, então pelo contado diário e exclusivo com a matéria – de capacitação para o trato das questões específicas, voltadas à necessária preservação do meio ambiente.


8. Considerações finais.

Apesar do avanço da legislação e a evolução que o novo procedimento vem progressivamente proporcionado, são bem presentes as deficiências que entravam a implementação plena do sistema concebido pelos Juizados Especiais, em especial no que se refere à efetivação da legislação ambiental. O território nacional é vasto e dá azo a diversas dificuldades. No país se podem vislumbrar territórios altamente industrializados, premiados com as mais modernas tecnologias e, em contrapartida, outros muito próximos do isolamento, destituídos dos mais elementares meios de comunicação. A par disso tudo, a máquina administrativa do Estado ainda não se adequou de maneira a permitir que a sistemática processual preconizada pelos Juizados Especiais se desenvolva com a agilidade e eficiência para as quais foi concebida. A falta de integração institucional permite que os diversos órgãos e segmentos envolvidos, que deveriam almejar um mesmo fim, ajam de forma isolada dificultando o trâmite das ações e comprometendo a agilidade.

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Daí é de se entender que os Juizados Especiais Ambientais, existentes em número reduzido, dada à especialização que encerram, podem reunir reais condições de se firmarem, pois como sendo derivados dos Juizados Especiais Criminais, tais como estes, contemplam a nova sistemática processual penal, capaz de proporcionar a esperança de se alcançar à efetividade da justiça em matéria de infrações ambientais, se não pela punição como primeiro objetivo, então pela reparação direta ou indireta dos danos.

Proporcionarão, ainda, maior possibilidade de interação entre os órgãos governamentais, de vez que os serventuários – voltados unicamente para questões de natureza ambiental – saberão trilhar com muito mais destreza os caminhos da burocracia em busca das informações necessárias ao andamento dos processos, restando, assim, ultrapassadas importantes dificuldades relacionadas tanto na pesquisa antes mencionada, como também na doutrina consultada, que apontam como responsáveis pela morosidade no trâmite das ações a inexistência de interatividade institucional e a falta de capacitação na prestação jurisdicional para o trato das questões ambientais.

É, sem sombra de dúvida, necessária a aceleração da instalação da varas de Juizados Especiais especializadas em matéria ambiental, com o fito de tornar a realidade da oferta de Justiça Ambiental já ofertada, porém de forma ainda tímida e regional, numa realidade nacional.


9 – Referências Bibliográficas.

ARENHARDT, Bianca Georgia Cruz. Responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica – ação, processo e procedimento. In FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Direito Ambiental em Evolução 3. Curitiba: Juruá, 2002, p. 81-109.

BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

<http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

FIGUEIRA JÚNIOR, J. D.; LOPES, Maurício A. R. Comentários às Leis dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

JESUS, Damásio E. de. Juizados especiais criminais, ampliação do rol dos crimes de menor potencial ofensivo e estatuto do idoso. Disponível em:

www.mundojuridico.adv.br. Acesso em 06 de dezembro de 2007.

JUCOVSKY, Vera Lucia R. S. Instrumentos jurídicos de participação da sociedade na proteção do meio ambiente no Brasil. In FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Direito Ambiental em Evolução 5. Curitiba: Juruá, 2007, p. 341-357.

LECEY, Eládio. Novos direitos e juizados especiais. A proteção do meio ambiente e os juizados especiais criminais. Revista de Direito Ambiental. São Paulo: n. 15. p. 9-17, 1999.

TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. O meio ambiente, a urbanização e a prevenção dos conflitos no Brasil. Os direitos humanos no sistema Interamericano. O Judiciário e o Voluntariado. In Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre: Síntese, v.2, n. 10, mar.-abr., 2001, p. 118-126.

TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais. São Paulo: RT, 2002.

TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Estaduais Federais Cíveis e Criminais. 4 ed. São Paulo: RT, 2005.


Notas

  1. FIGUEIRA JÚNIOR, J. D.; LOPES, Maurício A. R. Comentários às Leis dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 453.
  2. FIGUEIRA JÚNIOR, J. D.; LOPES, Maurício A. R. Comentários às Leis dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 453.
  3. FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais. 3 ed. São Paulo: RT, 2005, p.220.
  4. TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Estaduais Federais Cíveis e Criminais. 4 ed. São Paulo: RT, 2005, p. 418.
  5. TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Estaduais Federais Cíveis e Criminais. 4 ed. São Paulo: RT, 2005, p. 419.
  6. Idem p. 420.
  7. Ibidem. 467.
  8. TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Estaduais Federais Cíveis e Criminais. 4 ed. São Paulo: RT, 2005, p. 467.
  9. Idem, p. 376.
  10. FIGUEIRA JÚNIOR, J. D.; LOPES, Maurício A. R. Comentários às Leis dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 467.
  11. JESUS, Damásio E. de. Juizados especiais criminais, ampliação do rol dos crimes de menor potencial ofensivo e estatuto do idoso. Disponível em: <www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em 06 de dezembro de 2007.
  12. Posteriormente, em 2001 somou-se às referidas legislações a Lei 10.259, que instituiu os Juizados Especiais Federais, Cíveis e Criminais.
  13. FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 217-218
  14. TOURINHO NETO, F. C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais. São Paulo: RT, 2002, p. 487.
  15. ARENHARDT, Bianca Georgia Cruz. Responsabilidade penal ambiental da pessoa jurídica – ação, processo e procedimento. In FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Direito Ambiental em Evolução 3. Curitiba: Juruá, 2002, p. 98.
  16. FREITAS, Vladimir Passos de Freitas. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 221.
  17. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  18. Imazon – "Instituição de pesquisa, sem fins lucrativos, fundada em 1990 com a missão de estimular práticas sustentáveis de uso dos recursos naturais na Amazônia, através de pesquisa aplicada sobre os problemas da exploração dos recursos naturais, formação de cientistas e disseminação ampla dos resultados dos estudos."
  19. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  20. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  21. Idem.
  22. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  23. Idem.
  24. Ibidem.
  25. Ibidem.
  26. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  27. Idem.
  28. Ibidem.
  29. BRITO, Brenda Brito; BARRETO, Paulo. Aplicação da Lei de Crimes Ambientais pela Justiça Federal no Setor Florestal do Pará. Disponível em:

    <http://www.amazonia.org.br/arquivos/159559.pdf>. Acesso em 29 de dezembro de 2007.

  30. Disponível em <http://www.tj.mt.gov.br/>. Acesso em 22/12/2007.
  31. Disponível em <http://www.tj.sp.gov.br/noticias/News_View.aspx?Articleid=288&Tipo=1>. Acesso em 22.12.2007.
  32. Disponível em <http://www.tj.ms.gov.br/>. Acesso em 22/12/2007.
  33. Disponível em <http://www.univag.com.br/>. Acesso em 22/12/2007.
  34. JUCOVSKY, Vera Lucia R. S. Instrumentos jurídicos de participação da sociedade na proteção do meio ambiente no Brasil. In FREITAS, Vladimir Passos de (coord.). Direito Ambiental em Evolução 5. Curitiba: Juruá, 2007, pág. 343.
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Sobre o autor
Luís Oscar Six Botton

Advogado, Especialista em Direito Empresarial, Especialista em Direito Ambiental e Mestrando em Direito Econômico e Socioambiental da Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BOTTON, Luís Oscar Six. Juizados especiais ambientais, sonho ou realidade?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1882, 26 ago. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11645. Acesso em: 26 abr. 2024.

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