1. Solidariedade passiva
Há solidariedade, define a lei, sempre que na mesma obrigação concorrer "mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à divida toda" (CC, art. 264). Somente estará configurada se prevista em disposição legal ou de negócio jurídico (CC, art. 265), bilateral ou unilateral.
A solidariedade poderá ainda ocorrer no âmbito extracontratual, quando mais de uma pessoa concorrer para a produção do dano, ou quando a pessoa for responsável pelo obrigado – CC, art. 942, §ú c.c 932. Estão todos e cada um obrigados pessoalmente a reparar o dano integralmente (Aguiar Dias, 1960, p. 856); chega a haver aqui, ao contrário do que ocorre na responsabilidade solidária contratual do art. 265, uma presunção de solidariedade entre os agentes que produzem um dano único (cf. Aguiar Dias, 1960, p. 860) – na responsabilidade civil extracontratual a solidariedade acaba sendo a regra (cf. Cavalieri Fº., 2005, p. 87): CC, art. 942 e §ú; CDC, arts. 7º, §ú, 25, §1º, e 34.
"Em face do lesado, quer haja causas cumulativas, quer haja subseqüência de causas ou mera coincidência de causas, qualquer dos responsáveis é obrigado a reparar todo o dano, cabendo a este, se for o caso, agir contra os coobrigados para ressarcir-se do que por eles pagou, segundo as regras das relações internas da solidariedade" (Cavalieri Fº., 2005, p. 86).
A regra da responsabilidade solidária entre os causadores do dano é aplicável quando houver pluralidade de co-participantes no mesmo e único fato gerador do dano (causalidade plural comum), e também quando houver concurso de fatos de várias pessoas (causalidades complexas).
Quanto às ditas causalidades complexas, Noronha (2003, p. 653-654) ressalva as hipóteses de causalidade cumulativa. O autor diferencia as hipóteses de causalidade colateral e de co-causalidade (causalidade concorrente propriamente dita), em oposição à causalidade cumulativa. "Só nas primeiras pode ser dito que todos os co-responsáveis são co-autores da mesma ofensa". Na causalidade cumulativa, cada um dos responsáveis age independentemente e causa uma parte delimitada do dano, de modo que "a responsabilidade de cada um deverá ficar restrita à parte do dano efetivamente causado por ele".
Não se exige que os co-responsáveis pelo dano tenham agido em comunhão de vontades para a produção do dano, o que ademais somente ocorreria na ação dolosa, sendo impossível na ação culposa, e irrelevante para fins de responsabilidade objetiva. A comunhão de vontade para a realização do ato tampouco é relevante, que poderá ter sido realizado de forma comissiva por um e omissiva por outro agente. Nem mesmo se exige a simultaneidade das ações. Que um responda por culpa e outro objetivamente, pouco importa (cf. Aguiar Dias, 1960, p. 860-861).
A solidariedade é, portanto, uma relação subjetiva, não estando relacionada ao objeto, como ocorre com a obrigação indivisível (Caio Mário, 1997, v. II, p. 57; Paulo Lôbo, 2005, p. 148); tem por causa o título, e não a natureza da prestação, como normalmente ocorre na indivisibildiade (Caio Mário, 1997, v. II, p. 57).
Pontes de Miranda (1971, t. 22, §2755) defende que na obrigação solidária há uma pluralidade de obrigações reunidas numa única relação jurídica para a "realização de um mesmo interesse" – "Se não há fim comum não há solidariedade" (Paulo Lôbo, 2005, p. 149). Satisfeito esse interesse ao único credor por qualquer dos co-devedores, ou pelo devedor a qualquer dos co-credores, a obrigação estará extinta, pois "em razão da unicidade do crédito e da autonomia de cada obrigação é que o credor pode exigir o cumprimento integral da prestação comum de um dos devedores, ou parte dela" (Paulo Lôbo, 2005, p. 157-158).
Há uma única pretensão, correspondente a tantas obrigações quanto forem os devedores, que poderão ser, portanto, distintas – CC, art. 266 –, apesar de em regra o objeto ser o mesmo para todos os co-obrigados. As obrigações poderão divergir: quanto ao objeto [01]; quanto ao termo de exigibilidade, ao lugar da prestação, à condição, à garantia. Pode haver ainda, por convenção, ordem quanto à exigibilidade das obrigações (PONTES DE MIRANDA, 1971, t. 22, §2755).
"A posição de cada credor solidário ou de cada devedor solidário não necessita ser igual ou uniforme, qualificada como solidariedade pura e simples. Um co-devedor pode estar submetido a uma condição suspensiva ou resolutiva para adimplir a prestação, diferentemente dos demais. Pode um co-devedor estar vinculado a determinado prazo para o adimplemento, enquanto os demais sujeitam-se a outro. Pode um co-devedor obrigar-se a pagar em um lugar, distinto dos demais. Essas peculiaridades individuais podem também ser aplicáveis aos co-credores solidários" (Paulo Lôbo, 2005, p. 152).
Indo além, Noronha (2003, p. 656 e 658) admite que os co-responsáveis por danos extrapatrimoniais possam estar obrigados por valores máximos diferentes, porque a fixação do valor da reparação destes danos poderia variar "segundo diversos fatores, incluindo circunstâncias como o grau de censura imputável ao responsável e a sua situação econômica", de modo que a solidariedade existiria somente "até ao montante máximo da reparação comum".
Sendo distintas as obrigações dos devedores solidários, a existência e a eficácia de cada uma serão verificadas separadamente, de modo que o vício de validade ou a ineficácia de uma não atinge a(s) outra(s). Assim, cada devedor solidário "tem as objeções comuns e as suas objeções, as exceções comuns e as exceções pessoais, direitos formativos comuns e próprios, como o de compensação" (PONTES DE MIRANDA, 1971, t. 22, §2754), porém a oposição de exceções que forem pessoais e a um devedor não aproveita a outro co-devedor – CC, art. 281, parte final.
Assim, havendo pluralidade de devedores solidários – em razão de lei ou de negócio jurídico, bilateral ou unilateral (cf. Paulo Lôbo, 2005, p. 157-158) –, cada um está sujeito a prestar o todo, até que haja o adimplemento total do débito – CC, art. 275; "a idéia fundamental é que o credor não pode receber mais que uma vez a prestação que é devida, mas pode exigi-la a qualquer devedor em sua totalidade" (Paulo Lôbo, 2005, p. 148).
Havendo inadimplemento parcial da obrigação, todos os co-obrigados ficam sujeitos aos efeitos da mora, inclusive pelo pagamento dos juros correspondentes, pois "cada devedor solidário pode evitá-la realizando a prestação no tempo devido" (Paulo Lôbo, 2005, p. 161), mas os devedores não culpados pela mora têm direito de regresso em face do culpado quanto ao acréscimo – CC, art. 280.
Mais, nas relações em que haja solidariedade passiva, a resolução do contrato por inadimplemento absoluto, caso a prestação ainda interesse ao credor – CC, art. 395, §ú –, somente será ocorrerá se verificada a mora de todos os devedores. "Enquanto houver um devedor solidário que não esteja em mora (pois, como vimos, as obrigações solidárias são autônomas e podem conter termos finais distintos), e seja solvente, não haverá inadimplemento da obrigação" (Paulo Lôbo, 2005, p. 161).
Não obstante, sendo o caso de inadimplemento absoluto, a solidariedade subsiste em relação ao pagamento do equivalente – CC, art. 279. As perdas e danos, porém, somente podem ser cobradas do culpado – CC, art. 279, parte final; mas, sendo o caso de responsabilidade objetiva, prevalece a solidariedade inclusive quanto às perdas e danos, ressalvado o direito de regresso dos demais co-devedores em relação ao devedor culpado.
Outrossim, diz a lei que a obrigação de indenizar se transmite com a herança – CC, art. 943. Assim, no caso de o devedor solidário falecer, se houver apenas um herdeiro, ele assume a posição do falecido; se mais de um, assumem em conjunto a posição do devedor solidário, mas cada um deles estará obrigado no limite de seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível, caso em que cada um dos herdeiros ficará obrigado pela prestação integral, juntamente com os demais co-devedores solidários – CC, art. 276.
Aos sucessores a titulo particular, a princípio, "não passa a qualidade de sujeito passivo da ação de reparação do dano, senão quando expressamente estipulada a transmissão dos ônus" (Aguiar Dias, 1960, p. 864).
1.1 A relação entre os co-responsáveis
Adimplida a obrigação, seja de forma voluntária ou por ultimação de execução forçada, "cessa a solidariedade em face do credor assim satisfeito. Mas os efeitos da obrigação persistem entre os devedores quando um ou alguns realizaram a prestação, pois a estes é conferido o direito de exigir dos demais o rateio do valor correspondente" (Paulo Lôbo, 2005, p. 163).
Não há que se falar em sub-rogação, porque não há transferência do crédito do credor ao devedor solidário que adimple a obrigação. Diversa é a solução dada no sistema alemão – BGB, §426 [02] – onde há sub-rogação para que o devedor solidário adimplente possa ir contra os co-devedores como o credor iria.
"Apurados os valores das quotas individuais, excluindo a sua, tem direito de regresso contra cada um, no limite da quota respectiva. Não há, como se vê, sub-rogação da solidariedade, pois se esta a ele se transferisse poderia cobrar o valor que pagou inteiramente de qualquer dos co-devedores" (Paulo Lôbo, 2005, p. 164).
O co-devedor que satisfizer a dívida por inteiro só tem o direito de exigir de cada um dos co-obrigados a sua cota, presumindo-se iguais as cotas de todos se não houver estipulação legal ou contratual em sentido contrário – CC, art. 283.
No campo da responsabilidade civil a variação das cotas pode se fundar "na desigual situação dos responsáveis em matéria de culpa, ou na diferente distribuição do risco para a verificação dos danos" (Cavalieri Fº., 2005, p. 87), havendo hipótese em que a lei veda expressamente o direito de regresso: CC, art. 934 [03].
Aguiar Dias (1964, p. 38) e Noronha (2003, p. 656-657), entendem que tanto quando se tratar de responsabilidade objetiva como subjetiva – em face do credor – o critério ideal para determinar a cota de cada um dos co-responsáveis seria a proporção em que o fato praticado por cada co-responsável concorreu para o evento – é o critério da causalidade, adotado pelo art. 13, §ú, do CDC. Porém, quando se trata de responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência o critério da gravidade da culpa de cada um dos co-responsáveis, sendo inclusive agasalhado em alguns dispositivos legais, tal como no art. 15, §3º, do Decreto nº 2.681/1912: havendo várias estradas de ferro com culpa pela perda ou avaria de mercadoria, "a responsabilidade será dividida proporcionalmente ao grau da culpa, atentas as circunstâncias que acompanharem o fato".
Assim, a desigualdade nas cotas dos co-devedores na relação interna pode resultar na situação de quem adimpliu a obrigação tenha o direito de se ressarcir por inteiro, ou, em situação inversa, pode ser que apenas um dos co-responsáveis possa ser cobrado. É a hipótese do CC, art. 285: se a dívida solidária interessar exclusivamente a um dos co-devedores solidários, nas relações internas ele não poderá cobrar cota de nenhum outro co-devedor – pois ele solve obrigação sua (cf. Cavalieri Fº., 2005, p. 88), e somente dele pode ser cobrado o ressarcimento por quem adimpliu a obrigação.
Quando um dos co-responsáveis estiver insolvente, a sua cota será repartida, proporcionalmente, entre os demais, inclusive aquele que houver adimplido a obrigação e o que eventualmente tenha sido exonerado pelo credor – CC, art. 283 e 284.
É importante ressaltar que o cálculo das cotas de cada um dos co-devedores é feito com base não no valor nominal da dívida, mas naquilo que foi efetivamente pago ao credor, com os acréscimos convencionais ou legais. Se o devedor que adimpliu a dívida não tiver, por culpa sua, oposto as exceções comuns de que tinha conhecimento ou deveria conhecer a ele caberá por inteiro o valor que deixou de ser abatido, repartindo-se o saldo.
2. As regras de solidariedade passiva no CDC
No sistema do CDC estabeleceu-se a regra da solidariedade na responsabilidade pela reparação dos danos sofridos pelo consumidor – CDC, art. 7º, §ú – "deixando firmada a obrigação de todos os partícipes pelos danos causados, nos moldes também do Código Civil (art. 942)" (Rizzatto Nunes, 2005, p. 140). Assim, são solidariamente responsáveis todos os que tenham intervindo de alguma forma, direta ou indiretamente, na relação de consumo, contribuindo em qualquer fase, seja na produção, oferta, distribuição, ou venda.
Há aqui eco do disposto no §830, do BGB [04] alemão de 1896 (cf. Cláudia Lima Marques, 2003, p. 188-189), segundo o qual há responsabilidade solidária quando dentre diversos agentes não for possível determinar a proporção do dano atribuível a cada um deles. Mas o CDC vai adiante, pois dispensa a análise do caso concreto para atribuir a solidariedade na responsabilidade pelo simples fato de haver relação de consumo.
Assim, ao consumidor caberá eleger contra quem buscará a reparação de seu dano: se contra um, alguns, ou todos – CPC, art. 46.
O CDC elege a solidariedade passiva entre os fornecedores "como diretriz fundamental para facilitar a defesa do consumidor", sendo "um dos mais poderosos instrumentos de tutela do consumidor" (Paulo Lôbo, 2005, p. 151-152), sobretudo quando falarmos em responsabilidade pelo mal cumprimento do contrato – art. 18. Quando se tratar de hipótese de responsabilidade extracontratual, aplicar-se-á a regra dos art. 7, §ú e 25, §1º, que afirmam a solidariedade de todos os autores da ofensa frente à reparação do dano, sejam fornecedores ou terceiros (cf. Paulo Lôbo, 2005, p. 152). Da mesma forma, há responsabilidade solidária do fornecedor de produto ou serviço pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos – art. 34.
"O CDC permite assim a visualização da cadeia de fornecimento através da imposição da solidariedade entre os fornecedores. O CDC impõe a solidariedade em matéria de defeito do serviço (art. 14 do CDC) em contraponto aos arts. 12 e 13 do CDC, com responsabilidade objetiva imputada nominalmente a alguns agentes econômicos. Também nos arts. 18 e 20 a responsabilidade é imputada a toda a cadeia, não importando quem contratou com o consumidor. Segundo o parágrafo único do art. 7º, tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo, disposição que vem repetida no art. 25, §1º" (Cláudia Lima Marques, 2003, p. 188).
Não obstante a existência de regra específica quanto à solidariedade na responsabilidade pelo produto ou serviço viciado – arts. 18, caput e 19, caput –, o §1º, do art. 25, faz referência tanto aos casos de acidente de consumo como de vício do produto ou serviço. Essa referência, porém, não traz nenhum acréscimo, pois a incidência do art. 18 em conjunto com o art. 7º, §ú já exaure a questão, garantindo ao consumidor a opção de buscar o ressarcimento de seu dano contra qualquer integrante da cadeia de consumo ou mesmo um terceiro que tenha de qualquer forma contribuído para causar o dano.
Na hipótese de acidente de consumo, se o dano é causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, serão responsáveis solidários também o fabricante, construtor ou importador da peça e o que realizou a sua incorporação – CDC, art. 25, §2º. Essa regra é de grande utilidade sobretudo para o montador ou construtor, pois "abre uma porta para que atue regressivamente, em especial contra o fabricante ou importador da peça ou componente" (Herman Benjamin, in Juarez de Oliveira (coord.), 1991, p. 127); o consumidor, no mais das vezes não consegue identificar quem produziu a peça.
Assim, "está claro no sistema do CDC que a responsabilidade quer por defeitos, quer por vícios é sempre solidária" (Rizzatto Nunes, 2005, p. 140).
A solução da solidariedade não muda se os responsáveis tiverem agido independentemente uns dos outros (co-causalidade, ou causalidade concorrente propriamente dita) (cf. Noronha, 2003, p. 655); pouco importa "que os atos que ocasionaram o dano tenham sido distintos ou não" (Thereza Alvim, 1995, p. 171).
Indo mais adiante, os §§2º, 3º, do art. 28, do CDC, incluem no rol de responsáveis pessoas que nem mesmo teriam participado na cadeia de consumo, "estabelecendo ampla responsabilização entre os componentes dos vários conglomerados que exploram o mercado" (Rizzatto Nunes, 2005, p. 361). Cuidam da responsabilidade das sociedades controladas [05], consorciadas [06] e integrantes de grupo societário [07].
Quanto ao grupo societário, para que se configure a hipótese é imprescindível a formalização do Grupo através da aprovação, registro e publicação da convenção, nos termos da Lei nº 6404/1976, arts. 269 a 271.
O consórcio não tem personalidade jurídica própria, de modo que, em princípio, as consorciadas somente se obrigam em nome próprio, sem presunção de solidariedade – art.278, §1º, da Lei nº 6404/1976. Porém, decorrendo a responsabilidade de relação de consumo, as demais sociedades consorciadas responderão solidariamente. Fábio Ulhoa ressalta que para que haja essa comunicabilidade da responsabilidade, impõe-se que a obrigação seja relativas ao objeto do consórcio (in Juarez de Oliveira (coord.), 1991, p. 145).
Uma ressalva deve ser feita: quanto às sociedades integrantes de grupos societários e as sociedades controladas (§2º) a responsabilidade é subsidiária, isto é, somente poderão ser acionadas após o exaurimento das tentativas de obter a reparação do dano por parte do fornecedor primariamente responsável – quer se trate de sociedade de comando ou filiadas (Denari, 2005, p. 238); para Fábio Ulhoa, tal exaurimento somente estará configurado após encerrada a liquidação do processo falimentar sem que o crédito do consumidor tenha sido integralmente satisfeito (loc. cit.). Fábio Ulhoa entende, ainda, por força dessa regra, que as regras de responsabilidade não se estendem reuniões de fato – "Apenas a sociedade pertencente a um Grupo adequadamente formalizado possui responsabilidade subsidiária pelas obrigações das demais integrantes em matéria de defesa do consumidor (loc. cit.). Quanto às demais a responsabilidade é solidária.
A regra do §4º, atribuindo responsabilidade às sociedades coligadas [08] por culpa, vem somente para impedir uma leitura extensiva dos §§2º e 3º que buscasse também atribuir responsabilidade solidária e objetiva às sociedades coligadas – essas somente respondem por culpa (nesse sentido: Fábio Ulhoa, loc. cit.).
Uma vez adimplida a obrigação, aplica-se a regra de repartição da responsabilidade entre os co-responsáveis – CDC, art. 13, §ú –, de modo que aquele que adimplir a obrigação de indenizar os danos sofridos pelo consumidor "poderá exigir dos demais responsáveis, se houverem, a devolução da quantia desembolsada além da medida de sua responsabilidade e que também aos outros competia arcar em razão da solidariedade" (James Marins, 1995, p. 75), vedada a denunciação da lide – CDC, art. 88.
Ademais, aplicam-se às relações de consumo as regras sobre solidariedade previstas no Código Civil, salvo aquela contida no art. 282, que prevê a renúncia à solidariedade pelo credor em favor de um, alguns, ou todos os devedores, haja visto o flagrante conflito com o disposto no caput, do art. 25, do CDC: "É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores." (cf. Thereza Alvim, 1995, p. 171).
Por fim, a regra geral de solidariedade comporta duas exceções no Código.
Em razão do acidente de consumo, a princípio, o comerciante não é responsável. Somente terá responsabilidade, solidária com os demais atores da relação de consumo, quando configurada uma das hipóteses do art. 13, do CDC: o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados (I e II); não conservar adequadamente os produtos perecíveis (III).
Na hipótese de vício de quantidade de produto, o fornecedor imediato, ou fornecedor-contratante, será o único responsável quando o dano resultar de pesagem ou medição por instrumento que "não estiver aferido segundo os padrões oficiais" (CDC, art. 19, §2º).
3. Bibliografia
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PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado, t. 22. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971.
QUEIROZ, Odete Novais Carneiro. Da responsabilidade por vício do produto e do serviço. São Paulo: RT, 1998.
ROCHA, Silvio Luís Ferreira. Responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro. 2ª ed. São Paulo: RT, 2000.
Notas
- "Há solidariedade entre obrigações com objetos diferentes, se, em virtude de convenção, ou de lei, a execução por um devedor solidário extingue a obrigação do outro" (PONTES DE MIRANDA, 1971, t. 22, §2755).
- BGB § 426: (...) (2) Soweit ein Gesamtschuldner den Gläubiger
befriedigt und von den übrigen Schuldnern Ausgleichung verlangen kann, geht
die Forderung des Gläubigers gegen die übrigen Schuldner auf ihn über. Der
Übergang kann nicht zum Nachteil des Gläubigers geltend gemacht werden.
(O devedor solidário que satisfaz o credor pode exigir dos demais devedores o ressarcimento, passando a ele a posição do credor contra os demais devedores. A transmissão não pode ser efetuada em prejuízo do credor).
- Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.
- BGB § 830: (1) Haben mehrere durch eine gemeinschaftlich begangene
unerlaubte Handlung einen Schaden verursacht, so ist jeder für den Schaden
verantwortlich. Das Gleiche gilt, wenn sich nicht ermitteln lässt, wer von
mehreren Beteiligten den Schaden durch seine Handlung verursacht hat. (…).
(Tendo um dano sido causado por ato ilícito cometido por várias pessoas, há responsabilidade de cada um deles pelo total. O mesmo se dá quando não é possível determinar dentre vários participantes qual o dano causado por cada ação).
- Lei nº 6404/1976, art. 243, § 2º Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores.
- Lei nº 6404/1976, art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo.
- Lei nº 6404/1976, art. 265. A sociedade controladora e suas controladas podem constituir, nos termos deste Capítulo, grupo de sociedades, mediante convenção pela qual se obriguem a combinar recursos ou esforços para a realização dos respectivos objetos, ou a participar de atividades ou empreendimentos comuns.
- Lei nº 6404/1976, art.243, §1º São coligadas as sociedades quando uma participa, com 10% (dez por cento) ou mais, do capital da outra, sem controlá-la.