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Reforma tributária ambiental.

Análise constitucional e elaboração de propostas

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6 CONCLUSÃO

Como buscamos demonstrar neste estudo, o direito fundamental ao meio ambiente é forma de proteção não somente do bem jurídico fundamental ambiental, como também da vida humana. Mais do que a vida, a proteção ambiental é essencial para a tutela da dignidade da vida, isto é, da dignidade humana. Trata-se de direito entendido como prestacional e difuso, mas que também contém em si o chamado status negativo, pois demanda condutas omissivas do Estado e da sociedade, consistente no dever geral de não impactar negativamente o meio ambiente. Diversos efeitos jurídicos decorrem do direito em questão, porém, mais importante do que a análise de sua eficácia jurídica é a busca de meios para sua plena efetivação.

Os meios tradicionais do Estado Social de Direito para prover os direitos prestacionais, difusos e sociais, mostraram-se, ao menos no Brasil, insuficientes para a efetivação dos direitos a que se comprometeu concretizar. O Estado mostrou-se incapaz de, por si só, efetivar tais direitos, o que representa uma das facetas de sua falência, a dita "crise do Estado Social". Neste país, o Welfare State mostrou-se não só ineficiente, custoso, mas, antes disso, inapto para efetivar concretamente direitos sociais e difusos, os quais permaneceram como meras promessas constitucionais. Dentro desse quadro, e considerando a alteração substancial da sociedade por meio da denominada "Revolução das Comunicações", e o surgimento da chamada "sociedade participativa", tornou-se imperiosa a reformulação do próprio Estado, que tende a ganhar influxos da teoria ("princípio") da subsidiariedade.

No Brasil, porém, não se pode adotar totalmente o modelo de Estado Subsidiário concebido em nações ocidentais. Aqui, não se havendo sequer realizado o Estado Social, não se pode permitir que o Estado simplesmente abandone sua função de efetivação material de direitos sociais e difusos. Entretanto, precisa o Estado se unir com a sociedade e com os agentes econômicos para que estes ajudem-no a cumprir seu programa constitucional. Essa atividade participativa, que não foge do objetivo de efetivar valores sociais e humanos e que não substitui propriamente a atividade estatal, mas sim a complementa, proporciona não o nascimento de um Estado Subsidiário em sua concepção pura, senão de um Estado Social Participativo, que também pode ser chamado de Estado Social Cooperativo.

Esse novo Estado Social deve atuar na economia por meio de indução, não somente a fim de alcançar objetivos econômicos, mas também (e principalmente) para alcançar fins sociais, em especial, a efetivação de direitos sociais e difusos. O meio mais apropriado para tal intervenção é a tributação extrafiscal, a qual, se guiada por finalidades sociais e ambientais, é informada pela extrafiscalidade socioambiental, e, se tiver escopo meramente ambiental, é caracterizada pela chamada extrafiscalidade ambiental. Se essa tributação extrafiscal tiver por objetivo inibir alguma atividade lícita, porém meramente tolerada pelo Estado, que contenha em si desvalor social relevante, mas não suficiente para sua proibição, diz-se ser caso de tributação extrafiscal proibitiva. Se, diversamente, a atividade econômica for importante para a efetivação de valores sociais, é apropriada a tributação extrafiscal promocional.

A tributação extrafiscal ambiental é realizada por meio da instituição ou de tributos ambientais em sentido estrito, ou de tributos ambientais em sentido amplo. Os primeiros são intrinsecamente proibitivos e incidem sobre atividades que geram impacto ambiental, sendo a medida desse impacto a base de cálculo do tributo. Já os últimos podem ser proibitivos ou promocionais, e o traço que lhes é característico é a presença da extrafiscalidade ambiental.

No Brasil, parece ser mais adequada a adoção de tributos ambientais em sentido amplo, por meio do aproveitamento dos impostos ordinários de nosso sistema tributário, agora permeados por desígnios ambientais. A proposta de criação de tributos novos especificamente ambientais – tributos ambientais em sentido estrito – está na contramão do movimento incorporado na PEC 233/2008, referente à reforma tributária proposta pelo Governo Federal. O presente momento político, porém, é compatível com a introdução na Constituição de normas tributárias guiadas pelo propósito de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente.

Essas inovações na Carta Máxima, para serem constitucionais, devem derivar de uma ponderação do bem jurídico ambiental com a liberdade econômica e a isonomia tributária, sob o parâmetro da proporcionalidade. Ultrapassado esse obstáculo, a tributação extrafiscal socioambiental é legítima e constitucional, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal no julgamento da AC 1.657/RJ. Porém, devemos advertir que a tributação proibitiva só pode incidir sobre atividades lícitas. Se a atividade ofender gravemente os bens jurídicos fundamentais tutelados pelo direito ao meio ambiente e, assim, não for tolerada pelo Estado, a abordagem normativa adequada é punição por meio de normas penais, e não a inibição por meio de normas tributárias.

Estudamos as principais normas tributárias do Brasil que são informadas, de uma forma ou doutra, pela extrafiscalidade ambiental. Observamos serem muito deficitárias as leis estaduais e federais tributárias do Brasil no que diz respeito à tributação ambiental. Estamos certos ser este um caso de ofensa à proibição de insuficiência, que é vetor do princípio constitucional da proporcionalidade. Deveras, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios têm em mãos instrumento poderosíssimo para a efetivação do direito fundamental ao meio ambiente, mas não o utilizam. Ainda assim, inspirados nas leis e projetos de leis já existentes, tomamos a liberdade de propor algumas sugestões para serem incorporadas à PEC 233/2008. As principais são as seguintes:

i) Instituir imunidades objetivas no regramento do IPI em face dos seguintes produtos: (a) os que utilizam, em seu processo de produção, 50% ou mais de materiais recicláveis; (b) automóveis movidos por combustível não-poluente (como a energia elétrica ou solar); (c) veículos de transporte coletivo; (d) máquinas, equipamentos e aparelhos anti-poluentes.

ii) Instituir a obrigatoriedade da seletividade ambiental no IPI, IVA-F, II, IE e no novo ICMS.

iii) Instituir imunidades objetivas no âmbito do regramento constitucional do IVA-F, II, IE e do novo ICMS, em relação aos seguintes produtos (ou operações): (a) produtos extrativistas explorados com responsabilidade ambiental; (b) materiais recicláveis; (c) produtos que utilizam, em seu processo de produção, 50% ou mais de materiais recicláveis; (d) automóveis movidos por combustível não-poluente (como a energia elétrica ou solar); (e) veículos de transporte coletivo; (f) máquinas, equipamentos e aparelhos anti-poluentes; (g) conversão de energia eólica e solar.

iv) Determinar como obrigatório que o legislador institua a tributação extrafiscal proibitiva relativa ao IVA-F, ao II e ao novo ICMS para as atividades econômicas de exploração de madeira, de criação de gado bovino e de plantação de soja na Amazônia Legal, desde que o produto seja originário desta região e se destine a Estados situados fora da Região Amazônica, ou ao exterior.

v) Impor ao legislador infraconstitucional que tribute de modo majorado, no ITR, as propriedades rurais que explorem a atividade de extração de madeira, de criação de gado bovino e de cultivo de soja na Amazônia Legal, a fim de desestimular novos investimentos nessas atividades na Região Amazônica.

vi) Determinar ao legislador ordinário do ITR e do IPTU que deduza as áreas verdes da base de cálculo desses impostos.

vii) Criar imunidade tributária subjetiva, no campo do imposto de renda, que favoreça cooperativas que exerçam, com responsabilidade ambiental, a atividade extrativista na Amazônia Legal.

viii) Criar imunidade tributária objetiva no âmbito do IPVA, que incida sobre a propriedade de veículos automotores alimentados por combustíveis que não geram impacto ambiental negativo, como a energia elétrica e a solar, além de determinar que a alíquota dos impostos instituídos sejam proporcionais à intensidade de poluição ambiental gerada pela queima do combustível que alimenta o motor.

ix) Impor que a repartição de receita do ICMS distribuído entre os municípios seja feita com base em critérios ambientais (como, p. ex., a área ocupada por unidades de conservação instituídas e preservadas, além de outras áreas verdes e terras indígenas que tenham o meio ambiente preservado, o saneamento ambiental, o tratamento das águas dos rios, do lixo, a instituição de coleta seletiva urbana etc.) e com percentual mínimo de distribuição previsto no Texto Constitucional (p. ex., 10%); trata-se do chamado "ICMS Ecológico", que também pode adotar alguns critérios sociais, como os índices de educação e saúde.

x) Estabelecer a repartição dos Fundos de Participação dos Estados – FPE – e dos Municípios – FPM – com base nos mesmo critérios do "ICMS Ecológico".

As medidas relacionadas à tributação extrafiscal proibitiva das atividades de pecuária bovina, de exploração de madeira e de plantação de soja na Amazônia Legal, inseridas no regramento do IVA-F, do novo ICMS e do ITR, podem ser, eventualmente, contrabalançadas com a redefinição dos limites territoriais da Amazônia Legal, a fim de não prejudicar empreendedores de boa-fé já estabilizados em algumas localidades e de adequar o texto legal à realidade nacional.

As medidas aqui propostas certamente teriam ampla oposição de agentes econômicos interessados em atividades socioambientalmente inadequadas e de agentes políticos pouco comprometidos com o meio ambiente. Portanto, não há outro momento para a realização da reforma tributária ambiental que propomos que não o da reformulação de todo o sistema tributário nacional. Este momento é agora, ano de 2008, em que apresentou o Governo Federal a PEC 233/2008, que corporifica sua proposta de reforma tributária. Se as proposições aqui apresentadas forem acolhidas pelo Congresso Nacional, cremos que estaremos muito mais próximos da plena efetivação do direito fundamental ao meio ambiente no Brasil.


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Sobre o autor
Anselmo Henrique Cordeiro Lopes

Procurador da República. Mestre e Doutor (cum laude) em Direito Constitucional pela Universidad de Sevilla. Ex-Procurador da Fazenda Nacional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Anselmo Henrique Cordeiro. Reforma tributária ambiental.: Análise constitucional e elaboração de propostas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1949, 1 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11925. Acesso em: 5 nov. 2024.

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