Artigo Destaque dos editores

Da inconstitucionalidade do inciso XXIV do artigo 4º da Lei Complementar distrital nº 395/2001.

Representação judicial de agentes políticos por procuradores do Distrito Federal

Exibindo página 1 de 4
Leia nesta página:

Palavras-chave: Lei Complementar distrital n. 395, de 31 de julho de 2001 (Lei de Organização da Procuradoria-Geral do Distrito Federal). Artigo 4º, inciso XXIV. Dispõe sobre a representação judicial do Governador e Secretários de Estado em processos cíveis e criminais decorrentes de atos praticados no exercício funcional. Inconstitucionalidade formal e material.

Resumo: O artigo procura demonstrar a inconstitucionalidade de lei distrital ao capitular hipótese de representação judicial inovadora, em processos cíveis e criminais, de agentes políticos por Procuradores do Distrito Federal. A representação das partes nos feitos judiciários é matéria de direito processual, de competência legiferante privativa da União (art. 22, I, Constituição Federal de 1988). A competência dos Procuradores do DF é restrita à representação em juízo da pessoa jurídica de direito público distrital, não podendo ser ampliada para compreender o patrocínio de interesses processuais pessoais de agentes políticos ou de servidores públicos comissionados ou de carreira (art. 132, caput, Carta Magna de 1988). A incidência dos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do próprio interesse público, vetores da Administração Pública (art. 37, caput, Lei Maior de 1988), afasta a imputação do exercício de representação judicial de natureza privada a advogados públicos.


1. Introdução

Cinge-se este artigo ao cotejo dos efeitos jurídicos do disposto no art. 4º, inciso XXIV, da Lei Complementar distrital n. 395, de 31 de julho de 2001 (dispõe sobre a Lei de Organização da Procuradoria-Geral do Distrito Federal), que reza:

Art. 4° Compete à Procuradoria-Geral do Distrito Federal:

....................................................................................................

XXIV - efetuar, desde que manifestado interesse, a defesa do Governador, Secretário de Estado e de ex-ocupantes desses cargos em processos judiciais propostos em virtude de atos praticados no exercício da respectiva função e que tenham seguido orientação prévia da Procuradoria-Geral do Distrito Federal.

Proceder-se-á, nas linhas seguintes, à análise da constitucionalidade do dispositivo legislativo distrital.


2. A representação das partes em juízo no processo civil ou criminal é matéria de direito processual, de competência legiferante privativa da União

Impende assinalar, de início, que o disposto no art. 4º, inciso XXIV, da Lei Complementar distrital n. 395, de 31 de julho de 2001 (dispõe sobre a Lei de Organização da Procuradoria-Geral do Distrito Federal), cuida de matéria de direito processual, ao veicular regras sobre a representação das partes no processo civil e criminal, permitindo que Procuradores do Distrito Federal, ex lege, atuem como representantes judiciais dos agentes políticos distritais.

Na verdade, a defesa judicial de autoridades e servidores por parte de advogados públicos foi veiculada, mais recentemente, no direito brasileiro, ao que consta, por meio da Lei federal n. 9.028 e pela então Medida Provisória de nº 1.549-33/97.

Calha pontuar, em princípio, que os preceptivos dos arts. 22, da Lei federal nº 9.028/95, e 50, da então Medida Provisória de nº 1.549-33/97, tratam de direito processual.

Assim capitula o art. 22, da Lei Federal nº 9.028, de 12-04-1995:

"Art. 22. O artigo 36 do Código de Processo Civil passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos:

§ 1º Caberá ao Advogado-Geral da União patrocinar as causas de interesse do Poder Público Federal, inclusive as relativas aos titulares dos Poderes da República, podendo delegar aos respectivos representantes legais a tarefa judicial, como também, se for necessário, aos seus substitutos nos serviços de Advocacia-Geral".

Mais tarde, editou-se a Medida Provisória nº 1.549, de 12.8.97, que, expressamente, alterou o art. 22 da Lei Federal nº 9.028/95. Prescreve o seguinte o art. 50 da Medida Provisória nº 1.549/97:

"Art. 50. O art. 22 da Lei nº 9.28, de 12 de abril de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação: art. 22. Cabe à Advocacia-Geral da União, por seus órgãos, inclusive os a ela vinculados, nas suas respectivas áreas de atuação, a representação judicial dos titulares dos Poderes da República, de órgãos da Administração Pública Federal direta e de ocupantes de cargos e funções de direção em autarquias e fundações publicas federais, concernente a atos praticados no exercício de suas atribuições institucionais ou legais, competindo-lhes, inclusive, a impetração de mandado de segurança em nome desses titulares ou ocupantes para defesa de suas atribuições legais".

Ora, o primeiro ponto a merecer destaque é que a Lei Federal nº 9.028/95, que alterou as competências da Advocacia-Geral da União (AGU), rezou expressamente que estava a modificar o art. 36, do Código de Processo Civil - CPC. Assim sendo, não há como deixar de reconhecer, conquanto haja também disposição respeitante às atribuições institucionais da AGU, que se cuida de matéria de direito processual. Tanto se está diante de norma processual que o art. 22, da Lei federal nº 9.028/95, afirmou, textualmente, que dava nova redação ao art. 36 do Código de Processo Civil.

Ora, será possível negar o caráter processual de um preceito legislativo que veicula, de modo expresso, alteração no próprio CPC? O art. 36 modificado está inserto no Capítulo III do Código de Processo Civil, que diz respeito à representação judicial das partes por seus procuradores ou advogados constituídos.

Pois bem, a Lei 9.028/95 modificou o art. 36, do CPC, quando outorga ao Advogado-Geral da União a representação judicial dos titulares dos Poderes da República (pessoas físicas que, antes da modificação das regaras do art. 36, do CPC, pela lei em referência, somente poderiam ser representadas por mandato ad judicia). Ao tratar do tema da representação das partes no processo civil (art. 36, CPC, dos procuradores), não há a menor dúvida de que a sobredita lei dispôs sobre matéria de direito processual. Ademais, frise-se, qualquer questionamento fica sepultado quando é o próprio art. 22, da Lei Federal nº 9.028, de 12.4.95, que estabelece: "O art. 36 do Código de Processo Civil passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos".

A Lei nº 9.028/95, por dispor sobre o tema da representação judicial de parte (titulares dos Poderes da República) no processo civil e porque o seu art. 22 expressamente acrescenta parágrafos ao art. 36 do CPC, versa, portanto, sobre direito processual, insista-se.

No tocante à então Medida Provisória nº 1.549/97, note-se que o seu art. 50 assevera: "Art. 50. O art. 22 da Lei nº 9.028, de 12 de abril de 1995, passa a vigorar com a seguinte redação". Do exame do texto, percebe-se que o art. 50, da medida provisória em alusão, ampliou o que previa o art. 22 da Lei nº 9.028/95. Observe-se: o art. 50 da Medida Provisória nº 1.549/97 alargou o disposto no art. 22 da Lei nº 9.028/95, mas a MP versa sobre a mesma matéria do dispositivo legal alterado, isto é, sobre representação das partes em juízo e sobre o acréscimo às regras do art. 36 do CPC, ou seja, sobre direito processual. A medida provisória adicionou preceito ao Código de Processo Civil quando ampliou a modificação originada ao CPC pela Lei nº 9.028/95 (esta expressamente acresceu itens ao art. 36 do CPC).

O art. 22, da Lei federal nº 9.028/95, previu que a Advocacia-Geral da União exercerá a representação judicial dos titulares dos Poderes da República, ao passo que o art. 50, da Medida Provisória nº 1.549/97, estendeu a mesma representação judicial para, além dos titulares dos Poderes da República, os órgãos da Administração Direta e para diretores de autarquias e fundações públicas federais.

Logo, não se requer muito esforço para concluir, reafirme-se, que a medida provisória apenas alargou o conteúdo normativo do art. 22, da Lei federal n. 9.028/95, todavia cuidando da mesma matéria: a representação das partes em juízo (capitulo III, do Código de Processo Civil, dos procuradores). Por isso, é cristalino que o art. 50, da Medida Provisória nº 1.549/97, ao tão-somente ampliar o disposto no art. 22, da Lei nº 9.028/95 (que, de sua parte, alterou o art. 36 do CPC), ocupou-se, sim, de matéria própria de direito processual, a não ser que se negue, da mesma forma, que a Lei federal nº. 9.028/95 trate de tema alusivo a processo, o que, de todo caso, seria temerário e juridicamente inviável, porquanto é o próprio texto legal (art. 22) que afirma alterar o art. 36 do Código de Processo Civil. Indague-se novamente, para destacar: Como seria admissível alegar que uma norma alteradora do CPC não trate de processo civil?

Supor, equivocadamente, que se cuida apenas de norma de direito administrativo, particularmente sobre a atribuição de carreira do serviço público, parece, permissa venia, uma visão extremamente míope e errônea dos próprios dispositivos legais e de sua finalidade (propiciar a representação judicial dos titulares dos Poderes da República por advogados da União, em vez de advogados constituídos por mandato para o foro). Fosse assim, por que seria necessário dispor que se alterava dispositivo do próprio Código de Processo Civil?

Preceitua o art. 12, I, do CPC: "Art. 12. Serão representados em juízo, ativa e passivamente: I - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios, por seus procuradores". Quem poderia negar conteúdo processual ao ad. 12, I, do Código de Processo Civil, somente pelo fato de o preceito também tratar da atribuição funcional dos Procuradores do Distrito Federal, dos Estados e da União, no sentido de representar as respectivas pessoas jurídicas de direito público em juízo? Quem diria que o aludido inciso I do art. 12 do CPC não seria uma norma processual, mas de direito administrativo? Esse artigo do estatuto processual civil diz respeito à representação judicial das partes no processo, questão eminentemente de direito processual.

O art. 50, da Medida Provisória nº. 1.549/97, pois, refere-se à representação judicial dos titulares dos Poderes da República e outros pelos advogados da União. O art. 12, I, do CPC (norma visivelmente processual) concerne, do mesmo modo, à representação judicial da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios por seus Procuradores.

Destarte, se o art. 50 da Medida Provisória nº. 1.549/97 versa sobre a mesma matéria do art. 12, I, do CPC (representação judicial), antolha-se evidente que o dispositivo da medida provisória (art.50) é uma norma de direito processual. Senão, repita-se, impor-se-ia ao jurista também negar aspecto processual ao disposto no art. 12, I, do CPC, o que não se pode fazer, por evidente. Se duas normas tocam rigorosamente no mesmo assunto (representação judicial) e uma delas tem caráter nitidamente processual (art. 12, I, CPC), é claro que a outra também assume conotação processual.

Não se está dizendo, de modo algum, que todas as disposições da medida provisória tenham conteúdo processual, mas, especificamente quanto ao art. 50 da MP, é inegável reconhecer o caráter processual desse dispositivo, ao alterar a Lei nº. 9.028/95, que, a seu turno, modificava o próprio art. 36 do Código de Processo Civil.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Inferir-se, todavia, que não se estaria supostamente na presença de normas de processo se revelaria insustentável, até mesmo com respeito à doutrina de Amaral Santos e Pontes de Miranda, que ensinam: "Para nós, a norma é de direito processual quando regula o exercício da função jurisdicional ou disponha sobre a constituição, o desenvolvimento e a terminação da relação jurídica processual". Ora, considerando a cátedra doutrinária, resta incontroverso o caráter processual do art. 50 da Medida Provisória nº. 1.549/97 e do art. 22 da Lei nº. 9.028/95: a norma é processual quando disponha sobre a constituição e o desenvolvimento da relação processual.

Na hipótese, trata-se do poder de falar por alguém perante a Justiça, da prerrogativa de representar judicialmente a parte de um processo civil, o que é intitulado capacidade postulatória. Vale transcrever a cátedra do clássico José Frederico Marques:

As partes, ainda quando tenham plena capacidade de estar em juízo, não podem, de regra, praticar pessoalmente os atos com que se instaura e desenvolve o processo. Necessitam, para isso, do patrocínio ou assistência de profissional do direito – o advogado – que tem o ius postulandi, ou poder de agir e falar em nome das partes em juízo. Por isso, o Código de Processo Civil, no art. 36, estatui: "A parte será representada em juízo por advogado legalmente habilitado. Ser-lhe-á lícito, no entanto, postular em causa própria, quando tiver habilitação legal." [...] A capacidade postulatória é conferida, portanto, a pessoas devidamente habilitadas, a fim de que não falte às partes a assistência técnica de que necessitam no curso do processo. [01]

O preceito do art. 4º, XXIV, da Lei Complementar distrital n. 395/2001 meramente trata da concessão de capacidade postulatória aos Procuradores do Distrito Federal para defender agentes políticos, os quais deveriam ser representados, judicialmente, por meio de advogado, salvo na hipótese de modificação do texto do artigo 36, do Código de Processo Civil, o que não poderia ser procedido mediante lei ordinária distrital, senão por lei federal. De fato, prescreve a Constituição Federal:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.

Relembrando as lições da teoria geral do processo, é sabido que, para que se constitua e se desenvolva validamente a relação jurídica processual, urge estejam presentes as condições da ação e os pressupostos processuais. Dentre os pressupostos processuais, inclui-se a capacidade processual, esta composta, em sua subdivisão, pela capacidade postulatória. A parte, de regra, salvo quando possuir habilitação legal, deverá estar representada em juízo por advogado, um procurador constituído por mandato para o foro, que a representará judicialmente. As regras legais sobre a representação da parte em juízo, portanto, classificam-se como normas de direito processual. Alumia a matéria o professor e ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Fux (destaques não originais):

"As regras que tratam desses temas, vale dizer, defesa, contestação, litisconsórcio, partes, capacidades das partes, etc., são normas que compõem o direito processual." [02]

Constatado pelo juiz da causa que a parte, no caso o agente político, não está representada devidamente, por falta de capacidade postulatória, haja vista que não tem efeito jurídico de alteração do CPC o disposto em lei distrital outorgante da representação judicial dos sobreditos agentes públicos por Procuradores do DF, cumpre-lhe determinar o saneamento da irregularidade, o que somente se daria por meio de procuração ad judicia, hipótese em que se cuidaria de típica advocacia particular, e não de exercício advocatício público ex lege, proveniente de previsão legal, como é o caso da defesa judicial dos Estados e do DF por seus Procuradores de carreira. E nenhum procurador público pode ser compelido a exercer a advocacia particular de forma gratuita ou contra sua vontade, à míngua de celebração de contrato específico de prestação de serviços de advocacia.

Considere-se: a origem da legitimidade da representação judicial da parte no processo civil segue o sistema dúplice: voluntária (o litigante constitui o seu advogado por procuração) ou legal (a autorização postulatória decorre de lei). O primeiro caso, o mais comum, segue a regra estatuída nos artigos 36 e 37, do CPC: a parte será representada por advogado, enquanto o segundo caso promana de preceito legal, como é o caso do art. 12, I, do Código de Processo Civil.

Em conseqüência, a representação da parte em juízo pressupõe norma processual autorizativa. Se a pessoa física que ocupa o cargo de diretor do Banco Central é demandada, por responsabilidade pessoal, corno ré de uma ação popular, essa parte deverá estar representada por advogado, constituído por procuração ad judicia. Para que um Advogado da União (na qualidade de representante judicial da entidade federativa) representasse a autoridade no processo e agisse em nome da pessoa natural e não no da União, sem procuração, seria mister que existisse uma norma que acrescesse previsão desse teor ao Código de Processo Civil – no caso a Lei federal n. 9.028/1995.

A regra geral do CPC (representação judicial da parte por advogado) só pode ser excepcionada por meio de previsão legal expressa, leia-se: mediante norma de direito processual expressa. Ora, se o Advogado da União somente está legitimado ex lege a representar a pessoa jurídica de direito público (quando esta estiver em juízo em nome próprio), cumpria fosse adicionado dispositivo autorizador por lei extravagante ao estatuto processual, isto é, uma norma de caráter processual, enquanto permissivo legal para o exercício de capacidade postulatória em favor de autoridade administrativa, a título de representação judicial ex lege.

Se se interpretasse que a Medida Provisória nº. 1.549/97 não passaria de um enunciado de direito administrativo, forçoso seria convir que a MP, conseqüentemente, não legitimaria a representação judicial dos titulares dos Poderes da República, no processo civil, por Advogados da União, o que culminaria na completa inocuidade da norma federal, que não surtiria efeitos no motivo pelo qual foi criada: fazer as vezes de permissivo legal para a atividade postulatória excepcional dos Advogados da União em favor das pessoas a serem representadas, nos termos do art. 50 da sobredita medida provisória. Daí, sob todos os ângulos, constata-se que o preceito do art. 50 da MP deve ser interpretado, sob pena de ineficácia, como matéria de direito processual.

Calha lembrar as lições da hermenêutica do direito, no sentido de que as normas jurídicas devem ser interpretadas de forma a produzirem seus efeitos esperados, e não para restarem sem eficácia. É de Carlos Maximiliano a lição: "Prefira-se a inteligência dos textos que torne viável o seu objetivo, ao invés da que os reduza à inutilidade" [03]. O mesmo jurista ajunta:

Não se presumem, na lei, palavras inúteis. Literalmente, devem-se compreender as palavras como tendo alguma eficácia [...] interpretem-se as disposições de modo que não pareça haver palavras supérfluas e sem força operativa. [04]

Assim sendo, nesse plano de análise, a outorga da representação judicial das pessoas físicas dos agentes políticos aos Procuradores do Distrito Federal, porque sem embasamento na lei processual, reclamaria um anterior acréscimo de regra ao Código de Processo Civil, pois que, hoje, os Procuradores só podem representar a entidade federada Distrito Federal, por expressa previsão de lei de processo (art. 12, I, CPC) e da própria Constituição Federal (art. 132), ao passo que as pessoas físicas somente serão representadas por seus advogados constituídos por mandato ad judicia. A exceção à regra dependeria de que fosse adicionado ao CPC a previsão de o Procurador do Distrito Federal, nessa qualidade, sem procuração, representar os agentes públicos em juízo, inovando-se, por exemplo, o capitulado nos arts. 12 ou 36, do Código de Processo Civil.

Diante disso, soa equivocada, salvo melhor juízo, a conclusão de que seria permitido, como efetivamente o fez a Lei Complementar distrital n. 395/2001 (art. 4º, XXIV), cometer aos Procuradores do Distrito Federal, mediante lei local, idênticas atribuições àquelas irnputadas à Advocacia Geral da União, nos moldes do tratamento dado à AGU pela Medida Provisória no. 1.549/97 e pela Lei nº 9.028/95.

Destarte, exaustivamente provado que tanto a Medida Provisória nº. 1.549/97 como a Lei nº. 9.028/95 veiculam matéria de direito processual, segue que a imputação das mesmas responsabilidades aos Procuradores do Distrito Federal, com fundamento nas normas federais que alteraram o Código de Processo Civil, em se tratando de tema concernente a processo, implicaria a modificação ou acréscimo de dispositivo ao CPC, o que não é permitido por meio de lei distrital (art. 4º, XXIV, Lei Complementar/DF n. 395/2001), haja vista que é da competência legislativa privativa da União legislar sobre direito processual (art. 22, I, da Constituição Federal de 1988).

Assinale-se, por fim, que a redação da Lei federal n. 9.028/1995 foi alterada pela Lei federal n. 9.649/1998:

Art. 22. A Advocacia-Geral da União e os seus órgãos vinculados, nas respectivas áreas de atuação, ficam autorizados a representar judicialmente os titulares e os membros dos Poderes da República, das Instituições Federais referidas no Título IV, Capítulo IV, da Constituição, bem como os titulares dos Ministérios e demais órgãos da Presidência da República, de autarquias e fundações públicas federais, e de cargos de natureza especial, de direção e assessoramento superiores e daqueles efetivos, inclusive promovendo ação penal privada ou representando perante o Ministério Público, quando vítimas de crime, quanto a atos praticados no exercício de suas atribuições constitucionais, legais ou regulamentares, no interesse público, especialmente da União, suas respectivas autarquias e fundações, ou das Instituições mencionadas, podendo, ainda, quanto aos mesmos atos, impetrar habeas corpus e mandado de segurança em defesa dos agentes públicos de que trata este artigo. (Redação dada pela Lei nº 9.649, de 1998) (Vide Medida Provisória nº 22.216-37, de 2001)

§ 1º O disposto neste artigo aplica-se aos ex-titulares dos cargos ou funções referidos no caput, e ainda: (Incluído pela Lei nº 9.649, de 1998) (Vide Medida Provisória nº 22.216-37, de 2001)

I - aos designados para a execução dos regimes especiais previstos na Lei no 6.024, de 13 de março de 1974, nos Decretos-Leis nos 73, de 21 de novembro de 1966, e 2.321, de 25 de fevereiro de 1987; e (Incluído pela Lei nº 9.649, de 1998) (Vide Medida Provisória nº 22.216-37, de 2001)

Reluz, novamente, o texto legal ao capitular que a Advocacia-Geral da União e seus órgãos ficam autorizados a representar judicialmente autoridades e servidores comissionados e efetivos da Administração Pública, o que nada mais é do que típica alteração legislativa de natureza processual, com o fim de conceder especial capacidade postulatória aos advogados públicos, com modificação do Código de Processo Civil nesse teor, tudo para robustecer, ao final, a conclusão de que se cuida de norma de direito processual.

Enfim, se a matéria é referente a direito processual, somente lei federal (art. 22, I, Constituição Federal de 1988) poderia dispor sobre a representação judicial dos agentes públicos locais pelos Procuradores do Distrito Federal, enquanto regra a ser necessariamente acrescentada ao Código de Processo Civil, modo por que se conclui pela inconstitucionalidade do art. 4º, XXIV, da Lei Complementar distrital n. 395/2001.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Antonio Carlos Alencar Carvalho

Procurador do Distrito Federal. Especialista em Direito Público e Advocacia Pública pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Advogado em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Antonio Carlos Alencar. Da inconstitucionalidade do inciso XXIV do artigo 4º da Lei Complementar distrital nº 395/2001.: Representação judicial de agentes políticos por procuradores do Distrito Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1977, 29 nov. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12015. Acesso em: 27 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos