SUMÁRIO: 1. Apresentação; 2. A Decisão do Superior Tribunal de Justiça; 3. Os temporários e a inefetividade constitucional; 4. Duas opiniões conflitantes; 5. O caso do Tribunal de Contas dos Municípios; 6. As origens do controle de constitucionalidade; 7. "Ex tunc" ou "ex nunc"? 8. Segurança jurídica ou excepcional interesse social? 9. Considerações Finais.
1.Apresentação
Em setembro de 2.008, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 25.652/PB, decidiu, por unanimidade (5ª Turma), com fundamento no princípio da "segurança jurídica", que não mais poderiam ser exonerados os servidores públicos que haviam assumido cargos efetivos, na Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba, sem prévio concurso público. Em sua decisão, o Superior Tribunal de Justiça disse que, após o prazo decadencial de cinco anos, previsto no art. 55 da Lei nº 9.784/99, a Administração Pública não mais poderá invalidar os seus próprios atos.
Essa decisão constitui, na minha opinião, mais um retrocesso, do ponto de vista da efetividade constitucional, porque contribuirá para que continue sendo desrespeitada a norma constitucional que exige o concurso para o ingresso no serviço público, em todas as suas esferas, e também os princípios da moralidade, da igualdade e da impessoalidade.
Nossa jurisdição constitucional, apesar de contar com inúmeros instrumentos para o controle da regularidade das normas infraconstitucionais, constantes de nosso complexo sistema de controle de constitucionalidade, tem sido extremamente incompetente no desempenho de sua tarefa. Na prática, a Constituição tem sido desrespeitada, transformando-se em uma verdadeira folha de papel, no dizer de Lassalle. A Constituição real é outra, muito diferente da Constituição escrita. A finalidade, talvez, de tantos direitos e garantias constantes da Constituição escrita, poderia ser a de dissimular as verdadeiras intenções dos detentores do poder. O Estado de Direito, entre nós, ainda não é muito mais do que uma miragem.
A idéia da supremacia constitucional e da necessidade de um controle da regularidade da lei inconstitucional, adotada por nós desde a Constituição de 1.891, cristalizou-se definitivamente com uma decisão da Suprema Corte norte-americana, de 1.803, da qual falaremos a seguir. Toda lei que contrariasse a Constituição seria nula e não poderia produzir, portanto, qualquer efeito jurídico.
Essa decisão do Superior Tribunal de Justiça, no entanto, apesar de não negar a inconstitucionalidade da Lei estadual, disse que, devido às circunstâncias, e à prevalência do princípio da segurança jurídica, "o próprio interesse da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido de forma irregular." Em outras palavras, a lei inconstitucional deverá produzir efeitos, para que sejam considerados efetivos os servidores públicos não concursados da Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba.
Também deve ser ressaltado que, a partir de 1.999, com a Lei nº 9.868, que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade, e com a Lei nº 9.882, que dispõe sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, o Supremo Tribunal Federal passou a dispor do poder de "modular" os efeitos da decisão de inconstitucionalidade, enorme poder, aliás, contestado por alguns autores, que entenderam que os "onze velhinhos", que nem ao menos foram eleitos pelo povo, passariam a formar uma "Assembléia Constituinte Permanente". Através das ADIns. nºs 2.154, 2.231 e 2.258, a Confederação Nacional das Profissões Liberais e a Ordem dos Advogados do Brasil questionaram, entre outros pontos, a constitucionalidade do art. 27 da Lei nº 9.868 e do art. 11 da Lei nº 9.882, o que será objeto de um de nossos tópicos, a seguir. A questão que nos interessa, da "modulação" dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, não foi julgada até o momento, e a verdade é que o Supremo Tribunal Federal tem hoje o poder de decidir, "tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social", que uma lei inconstitucional deverá prevalecer, durante um certo período de tempo, contra a nossa Lei Fundamental.
Este artigo pretende aprofundar um pouco o tema dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Seria possível que uma lei inconstitucional não fosse nula? Se a lei inconstitucional pode produzir efeitos, para que serve a Constituição? O que significa, finalmente, a supremacia constitucional? O que significam, na verdade, os requisitos da "segurança jurídica", e do "excepcional interesse social", para que possam justificar a prevalência de uma norma inconstitucional?
2. A Decisão do Superior Tribunal de Justiça
O Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 25.652/PB (Veja aqui a Decisão), "para assegurar o direito dos impetrantes de permanecerem nos seus respectivos cargos nos quadros da Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba e de preservarem as suas aposentadorias."
De acordo com essa decisão, "o art. 55 da Lei 9.784/99 funda-se na importância da segurança jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno qüinqüenal, mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício."
No entanto, o art. 55 dessa Lei diz, apenas, que:
"Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração."
Na verdade, deveria ter sido citado, também, pelo Superior Tribunal de Justiça, o art. 54 dessa Lei:
"O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé."
Simples assim, portanto. Para o Superior Tribunal de Justiça, agora a norma da Lei nº 9.784/99 vale mais do que o art. 37 da Constituição Federal de 1.988, que exige o concurso público, e apenas excepcionalmente admite a contratação temporária. Será que a falta do concurso público é um "defeito sanável", na dicção do art. 55, citado nessa decisão? Será que a própria exigência do concurso público não se destina a proteger o interesse público e a moralidade na administração? Como poderia ser convalidado o ato administrativo, ou seja, a nomeação dos servidores temporários, para cargos efetivos, sem concurso público?
Depois de cinco anos, os servidores temporários não mais poderão ser afastados de "seus cargos". Contudo, não se trata de "ato administrativo vicioso", como na interpretação equivocada do Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de ato nulo, porque fundado em uma lei inconstitucional e trata-se, também, de improbidade administrativa, que deveria ser punida.
Desde quando descumprir a Constituição pode gerar segurança jurídica? De onde será que eles tiraram essa "brilhante" idéia? Segurança jurídica dos temporários? Ou segurança dos políticos que os nomearam, e que nunca respondem pela sua improbidade, inutilmente tipificada nas leis? E quem se preocupa, aliás, com a segurança jurídica dos milhares de jovens que desejariam fazer concursos públicos, em todo o Brasil? E de tantos outros, que após serem aprovados em concursos públicos, têm os seus direitos preteridos, porque as autoridades preferem continuar nomeando servidores temporários?
Na minha opinião, essa é mais uma decisão absurda, porque conflita com os princípios fundamentais de nosso ordenamento constitucional, conforme tentarei justificar em seguida.
3. Os temporários e a inefetividade constitucional
Em todo o Brasil, existem aproximadamente 400 mil servidores temporários, e talvez o Congresso Nacional aprove, brevemente, uma Proposta de Emenda Constitucional, a PEC nº 054/99, conhecida já como o "Trem da Alegria dos Temporários", para garantir os "direitos" e a "segurança jurídica" desses servidores.
No Estado do Pará, existiam recentemente 20 mil temporários, em todos os órgãos estaduais, inclusive nos Tribunais de Contas e no Ministério Público. A Assembléia Legislativa tinha 280 servidores temporários, muitos deles com sobrenomes idênticos aos de conhecidos políticos e autoridades.
A este respeito, aliás, seja-me permitido fazer uma digressão, para dizer que, recentemente, fiquei sabendo de uma nova modalidade de nepotismo cruzado, que bem retrata a nossa maestria na utilização do "jeitinho", até mesmo na área jurídica, quando se trata da proteção de interesses não protegidos pela lei "dura, literal, inflexível". A modalidade mais corriqueira, todos a conhecem, seria que o parente do juiz, por exemplo, fosse acolhido no gabinete de um deputado, ou de um membro do Tribunal de Contas, em troca da nomeação do parente do deputado como assessor do juiz. A nova modalidade de nepotismo cruzado, à qual me refiro, e que nem sei se é realmente nova, ou se a informação é mesmo verídica, consistiria em nomearem parentes de advogados como assessores de juízes, de deputados, etc., em troca de favores semelhantes nos escritórios desses causídicos.
Mas voltemos aos nossos temporários. Tudo começou, no Pará, com a Lei Complementar nº 7/91, que autorizou a contratação dos servidores temporários. Depois, a Lei Complementar nº 11/93 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.93. A Lei Complementar nº 19/94 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.95. A Lei Complementar nº 30/95 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.98. A Lei Complementar nº 36/98 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.2002. A Lei Complementar nº 40/2002 tentou efetivar os servidores temporários. A Lei Complementar nº 43/2002 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.2004. A Lei Complementar nº 47/2004 autorizou a prorrogação dos contratos até 31.12.2006. Contra esta última Lei Complementar, o Procurador-Geral da República ajuizou uma ADIn (Veja a ADI 3391). Essa ADIn foi considerada prejudicada, e arquivada, pelo Supremo Tribunal Federal, em Decisão de março de 2.007, tendo em vista que o prazo da prorrogação prevista nessa Lei já se havia exaurido. Embora, evidentemente, os temporários paraenses continuassem no pleno exercício de suas atribuições, como certamente continuam, muitos deles, até esta data. Mas, enfim, o Supremo Tribunal Federal não tinha nada a ver com isso, porque as regras processuais são "duras, literais e inflexíveis" e devem ser cumpridas. A Constituição, nem tanto...
Há mais de três anos, o Governo do Estado do Pará foi obrigado a assinar um termo de ajustamento de conduta, com o Ministério Público do Trabalho, para se comprometer a realizar concursos públicos e demitir os temporários. (Veja aqui o acordo)
Mas, apesar disso, a questão ainda está longe de ser resolvida, e freqüentemente, surgem denúncias, na imprensa, de que continuam sendo contratados mais servidores temporários. Bem a calhar, quando este artigo estava sendo concluído, a imprensa local publicou esta denúncia de um concursado, preterido e não nomeado.
Se alguém estiver interessado em saber maiores detalhes a respeito da questão dos temporários, pode visitar a minha Página dos Temporários.
Em suma: ninguém respeita a exigência constitucional do concurso público. Como, aliás, não são respeitadas inúmeras outras normas constitucionais.
No entanto, se existe em nossa Constituição um princípio realmente importante, este deveria ser o da supremacia constitucional. Toda Constituição existe para se tornar efetiva, porque as normas constitucionais representam decisões soberanas do povo – ao menos em teoria -, e por essa razão a Constituição deve ser respeitada, para que outros interesses não se sobreponham à vontade popular. No caso, com essa decisão do Superior Tribunal de Justiça, evidentemente, os interesses dos políticos e dos servidores temporários por eles apadrinhados.
Infelizmente, isso não ocorre apenas no Pará ou na Paraíba, cujos temporários foram "efetivados" pela Decisão "histórica" do Superior Tribunal de Justiça, mas em todo o Brasil. Quatrocentos mil servidores temporários!!! Muito conveniente, para que os cargos públicos possam servir como moeda de troca. Os poderosos têm utilizado a Constituição de maneira hipócrita, apenas para dissimular as suas verdadeiras intenções, e para escapar a todos os controles. A Constituição não é respeitada, e serve apenas como forma de legitimar o exercício do poder.
"É difícil polir e civilizar o despotismo, isto é, darmos polis e civitas àqueles que continuam a não distinguir o Estado da casa, a confundir o governo político e civil com o governo doméstico, para utilizarmos as palavras de Montesquieu." (José Adelino Maltez, Professor da Universidade Pública Portuguesa)
Deve ser ressaltado, também, que tudo isso não é novidade, porque a Constituição de 1.988 já tem uma norma, em suas Disposições Transitórias, exatamente o art. 19, que dispõe (ou dispunha):
"Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal, e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37 da Constituição, são considerados estáveis no serviço público."
Aliás, a Constituição de 1.967 tinha, também, um dispositivo semelhante, no § 2º de seu art. 177:
"São estáveis os atuais servidores da União, dos Estados e dos Municípios, da Administração centralizada ou autárquica, que, à data da promulgação desta Constituição, contem, pelo menos, cinco anos de serviço público."
Talvez seja melhor ficarmos por aqui, ou esta pesquisa histórica poderá levar-nos, talvez, a Pero Vaz de Caminha, com sua Carta ao Rei Dom Manoel. Ou, quem sabe, à própria Arca de Noé...
Portanto, a Constituição não é respeitada, no Brasil, apesar do nosso inexcedível arsenal de instrumentos, destinados à sua defesa, como as Ações Diretas de Inconstitucionalidade, as Representações estaduais, a Representação Interventiva, a Ação Declaratória de Constitucionalidade, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, e etc...
É como diria o ilustre Professor José Joaquim Calmon de Passos:
..."para não dizerem que não falei de flores, vou referir-me às plumas e paetês que ornamentam nossa fantasia democrática. Nossas liberdades políticas têm a seu serviço um inexcedível arsenal de instrumentos...." (Tutela Jurisdicional das Liberdades, in Revista Eletrônica de Direito do Estado, nº 16 - Out/dez- 2008)
4. Duas opiniões conflitantes
O Ilustre Jurista Zeno Veloso, em artigo publicado na imprensa local, elogiou, porém, essa Decisão do Superior Tribunal de Justiça, favorável aos temporários, e criticou a "interpretação dura, literal, inflexível" dos "legalistas ao extremo". De acordo com o Dr. Zeno, essa Decisão do Superior Tribunal de Justiça foi uma decisão histórica. (Veja aqui o artigo)
Não concordo com o ilustre jurista, porque, na minha opinião, essa Decisão do Superior Tribunal de Justiça não trouxe nenhuma novidade. Ela não é histórica, absolutamente. Há mais de quinhentos anos, que os cargos públicos, no Brasil, tem sido distribuídos dessa maneira. E ninguém foi punido, até esta data, por descumprir a Constituição, ao que se saiba.
A Constituição Imperial de 1.824, no entanto, garantia a todos o acesso aos cargos públicos (art. 179, nº XIV), "sem outra diferença que não seja a dos seus talentos e virtudes." A exigência explícita do concurso surgiu na Constituição de 1.934, cujo art. 170, § 2º, dispunha: "A primeira investidura nos postos de carreira das repartições administrativas e nos demais que a lei determinar, efetuar-se-á depois de exame de sanidade e concurso de provas e títulos."
Assim, todas as nossas Constituições se preocuparam, sempre, em ornamentar a sua fantasia com as "plumas e paetês" da igualdade de todos perante a lei...
No Pará, existem, ou existiam, aproximadamente, vinte mil temporários, como já foi dito, e que foram contratados a partir da edição da Lei Complementar nº 7/91, e eles estavam em todos os órgãos, no Legislativo, no Executivo e no Judiciário, bem como nos Tribunais de Contas e no Ministério Público.
Para o Dr. Deusdedith Brasil,
"...ninguém mexe com ninguém. Com efeito, o Estado contrata "trabalhadores temporários" - administração direta e indireta -, o Ministério Público – fiscal da lei – contrata "trabalhadores temporários" e o Tribunal de Contas do Estado – que julga as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos das unidades dos poderes do Estado – contrata "trabalhadores temporários". Sendo cúmplices, nem o Ministério Público pode exercer sua função institucional de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública e pelos direitos assegurados na Constituição Federal, nem o Tribunal de Contas tem isenção para julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiro, bens e valores públicos das unidades dos poderes do Estado." (Deusdedith Brasil, advogado, em artigo publicado na imprensa local)
Também discordo da opinião do Dr. Zeno porque entendo que a Constituição existe para ser respeitada. Se isso é ser "legalista ao extremo", paciência. Mas não acho possível, nem razoável, que o Superior Tribunal de Justiça decida contra a letra clara da Constituição e contra alguns de seus princípios mais importantes – igualdade, moralidade, impessoalidade – com fundamento, apenas, em um artigo de lei ordinária, torcido e esticado para se adaptar ao caso concreto. Mas, além disso, ressalta ainda a questão da cláusula de reserva de plenário, porque a decisão é apenas da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.
Assim, alegando defender o "interesse público" e a "segurança jurídica", essa Turma afirmou, em sua Decisão, unânime, aliás, que os atos que efetivaram os recorrentes, contrariando o art. 37, II, da Constituição Federal, "é induvidosamente ilegal" (sic):
"Os atos que efetivaram os ora recorrentes no serviço público da Assembléia Legislativa da Paraíba, sem a prévia aprovação em concurso público e após a vigência da norma prevista no art. 37, II da Constituição Federal, é induvidosamente ilegal, no entanto, o transcurso de quase vinte anos tornou a situação irreversível, convalidando os seus efeitos, em apreço ao postulado da segurança jurídica, máxime se considerando, como neste caso, que alguns dos nomeados até já se aposentaram (4), tendo sido os atos respectivos aprovados pela Corte de Contas Paraibana."
Não resta dúvida de que "os atos que efetivaram os ora recorrentes"... "são induvidosamente inconstitucionais". Eles são inconstitucionais, e não ilegais. E, sendo assim, nenhum juiz ou tribunal poderia deixar de aplicar a norma constitucional.
Se os servidores já se aposentaram, os atos deveriam ser revistos, porque eles teriam direito à aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social (INSS) e não pelo Regime Oficial, pelo simples fato de que não eram servidores efetivos. É a norma do caput do art. 40 da Constituição Federal:
"Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo."
Os servidores não eram efetivos, porque não eram concursados. Essa é a norma constitucional, do art. 37, II. Não deveria ser esquecida a punição, é claro, das autoridades responsáveis pela recorrente, evidente, conivente e indecente improbidade administrativa.
O "interesse público" e a "segurança jurídica" não podem ser as senhas mágicas para que qualquer juiz, turma ou tribunal autorize, no Brasil, indiscriminadamente, o descumprimento da Constituição. Veremos, em um tópico posterior, que o Supremo Tribunal Federal pode, por maioria de dois terços de seus membros, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, restringir os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, ou decidir que ela somente tenha eficácia a partir de um determinado momento. Veremos, também, que mesmo por maioria qualificada de dois terços e mesmo pelo Supremo Tribunal Federal, o "guardião da Constituição", esse poder, a chamada "modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade", tem sido questionado, pela doutrina e no próprio Supremo Tribunal Federal, através de três Ações Diretas de Inconstitucionalidade.