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A utilização do sistema de registro de preços por órgãos que não participaram da licitação.

Uma análise do art. 8º do Decreto nº 3.931/2001

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04/02/2009 às 00:00
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4. A Adequada utilização do Sistema de Registro de Preços

O Sistema de Registro de Preços vem a ser um instrumento de considerável avanço na gestão de recurso públicos, as vantagens obtidas são inúmeras, porém, não se pode admitir a distorção do instituto de forma a romper com os princípios constitucionais da Administração Pública nem tampouco os princípios gerais das licitações públicas.

O Sistema de Registro de Preços não deve ser transformado num estímulo à formação de monopólios por empresas detentoras de Atas de Registro de Preços. Tais empresas se especializam em potencializar contratações e multiplicar lucros às custas de lobby perante órgãos e entidades da Administração Pública para adesão à Atas de Registro de Preços, resultando em desrespeito à supremacia do interesse público.

Deve-se ressaltar, no entanto, que o Sistema de Registro de Preços pode e deve continuar a ser utilizado pelos gestores públicos como ferramenta de gestão. Para tanto, basta a limitação da utilização da Ata de Registro de Preços apenas pelos órgãos que efetivamente participaram desde o início da licitação coordenada pelo órgão gerenciador.

Aliás, essa é a previsão do próprio Decreto Federal nº 3.931/01, em seu Art. 2º, Inc. III, verbis:

Art. 2º. Será adotado, preferencialmente, o SRP nas seguintes hipóteses:

(...)

III – quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo;

A realização de uma única licitação composta por necessidades de órgãos diversos, através do SRP, preserva e mantém a aplicação de todos os princípios da Administração Pública, bem como reforça os princípios das licitações públicas. Dando especial destaque a obtenção da eficiência administrativa por intermédio da racionalização dos processos administrativos de contratações.

O entendimento da Corte de Contas deve ser acatado pelos gestores públicos para correta aplicação das normais gerais de licitação [17]. Nesse sentido, bem atuou o ministro Augusto Sherman Cavalcanti ao demonstrar a relevância das conseqüências advindas da utilização da Ata de Registro de Preços por órgãos não participantes da licitação que deu origem aos preços registrados.

Destaca-se que o descompasso existe apenas na utilização das Atas de Registro de Preços por órgãos não participantes, de modo que para os órgãos participantes verificam-se claramente as vantagens a serem alcançadas com a utilização do Sistema de Registro de Preços, de forma que sua aplicação na Administração Pública deve ser amplamente divulgada e incentivada não só na esfera federal, como também nas esferas estadual e municipal.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A importância do estudo das licitações públicas no Brasil decorre principalmente da necessidade do Estado em recorrer a iniciativa privada para realizar as mais diversas contratações, em decorrência disso, vultosos recursos financeiros são gastos e o procedimento administrativo para realização de tais despesas é o processo licitatório, conforme regra estabelecida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

O presente estudo destacou que a licitação pública tem como objetivo principal selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública, guardando igualdade de condições entre todos aqueles interessados em contratar com o Poder Público. Tal objetivo não pode ser afastado pelo gestor público, sob pena de contrariedade às disposições constitucionais e conseqüente não realização do interesse público.

A discussão principal acerca da utilização do Sistema de Registro de Preços foi focada na celeuma provocada pela utilização de Atas de Registro de Preços por órgãos não participantes da licitação, a qual deu origem aos preços registrados. O problema originado pelos "órgãos caronas" consiste no desrespeito aos princípios gerais da Administração Pública e das licitações públicas.

Ficou demonstrado que o Art. 8º do Decreto Federal nº 3.931/01, ao instituir a figura do "carona", contrariou princípios que fundamentam o ordenamento jurídico vigente no país, sobretudo àqueles que alicerçam a Administração Pública, quais sejam: a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

Conforme o estudo que ora se finda, a freqüente adesão de órgãos à Atas de Registro de Preços acaba por multiplicar as quantidades contratadas, proporcionando fantástico ganho de escala às empresas detentoras de preços registrados sem que tais quantitativos estivessem claramente definidos no Edital do certame licitatório que deu origem ao registro de preços.

Por outro lado, a Administração Pública não realiza certames licitatórios, não oferecendo oportunidade a potenciais interessados em celebrar os contratos, bem como dá ensejo que uma licitação para contratação de um quantitativo previamente estabelecido se torne uma contratação muito superior.

Tal ofensa aos princípios jurídicos poderá ser contornada de maneira simples, através da correta utilização do Sistema de Registro de Preços pela Administração Pública. Para tanto, faz-se necessário à vedação da utilização de Atas de Registro de Preços por órgãos que não participaram da licitação, ou seja, defende-se a utilização das Atas de Registro de Preços apenas pelos órgãos participantes a fim de consagrar a dupla finalidade do processo licitatório, qual seja, a seleção da proposta mais vantajosa para o Poder Público e o oferecimento de igual oportunidade a todos os interessados em celebrar o contrato.

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Somente dessa forma estará consagrada a transparência de um certame licitatório, no qual todos os licitantes conhecem a magnitude da potencial contratação, bem como com quais órgãos tais contratos poderão ser firmados. A clareza de tais disposições no Edital certamente ensejará uma competição mais isonômica e justa, proporcionando a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública, alcançando por fim o principal objetivo de todo processo licitatório.


REFERÊNCIAS

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Notas

  1. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Celso Bastos, 2002, p. 80.
  2. MEIRELLES, Helly Lopes. Licitação e contrato administrativo. São Paulo: RT, 1991. p. 62
  3. FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Carona em sistema de registro de preços: uma opção inteligente para redução de custos e controle. Disponível na Internet: http://www.jacoby.pro.br/utilpub/CAC58T8N.doc. Acesso em: 17 de dezembro de 2008.
  4. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 468.
  5. TÁCITO, Caio. O princípio da legalidade: ponto e contraponto. Revista de Direito Administrativo. V. 206. Rio de Janeiro: Renovar. 1996. p. 2.
  6. NIEBUHR, Joel de Menezes. "Carona" em Ata de Registro de Preços: atentado veemente aos princípios de direito administrativo. Revista Zênite de Licitações e Contratos – ILC. Ano XIII. Nº 143. Curitiba: Zênite. 2006. p. 13.
  7. NIEBUHR, Joel de Menezes. "Carona" em Ata de Registro de Preços: atentado veemente aos princípios de direito administrativo. Revista Zênite de Licitações e Contratos – ILC. Ano XIII. Nº 143. Curitiba: Zênite. 2006. p. 13.
  8. KELLEMEN, Peter. Brasil para principiantes, venturas e desventuras de um brasileiro naturalizado. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 1964. p. 9.
  9. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2005.
  10. CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
  11. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2005.
  12. NIEBUHR, Joel de Menezes. "Carona" em Ata de Registro de Preços: atentado veemente aos princípios de direito administrativo. Revista Zênite de Licitações e Contratos – ILC. Ano XIII. Nº 143. Curitiba: Zênite. 2006.
  13. GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 400.
  14. DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 32.
  15. Tribunal de Contas da União. Processo TC – 004-709-2005-3. Relator: Augusto Sherman Cavalcanti, Brasília, 20 de abril de 2005. Diário Oficial da União, Brasília, 29 de abril de 2005.
  16. Tribunal de Contas da União. Processo TC – 004-709-2005-3. Relator: Augusto Sherman Cavalcanti, Brasília, 25 de maio de 2005. Diário Oficial da União, Brasília, 03 de junho de 2005.
  17. Súmula 222 do Tribunal de Contas da União: "As decisões do Tribunal de Contas da União, relativas à aplicação de normas gerais de licitação, sobre as quais cabe privativamente à União legislar, devem ser acatadas pelos administradores dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios."
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Sobre o autor
Thiago Dellazari Melo

Bacharel em Direito, Mestrando em Direito pela UFPE, Professor Substituto da UFPE, Gestor de Licitações do Comando da Aeronáutica em Recife - PE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Thiago Dellazari. A utilização do sistema de registro de preços por órgãos que não participaram da licitação.: Uma análise do art. 8º do Decreto nº 3.931/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2044, 4 fev. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12291. Acesso em: 29 mar. 2024.

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