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A Lei nº 11.101/05 aplicada ao caso de recuperação judicial da Varig

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4 COSIDERAÇÕES FINAIS

Não se pode dizer que o processo de recuperação da VARIG trouxe de volta a velha forma da empresa, até porque esse não era o objetivo da recuperação e sim a manutenção de uma unidade produtiva e da continuidade das operações, podendo-se encontrar aí o êxito da operação.

O caso relatado foi a grande prova de eficácia da Lei de Recuperação de Empresas, cujas nuances ainda não são tão conhecidas, vista sua imaturidade no âmbito jurídico. Com o tempo é que essa Lei se moldará à realidade, já que os casos diferem e indicam o melhor caminho. Destaca-se o problema da exigüidade dos prazos estabelecidos na legislação, vez que a complexidade de certos casos como o da VARIG demandam maior tempo para o desenvolvimento e resolução de problemas.

Outro ponto que deverá ser estudado com mais parcimônia e acredito que, futuramente, será objeto de Lei, mormente se considerados os projetos já em tramitação em nossas casas legislativas, diz respeito a exigência de certidões negativas de débitos tributários e a impossibilidade de seu parcelamento como previsão no Plano de Recuperação. A existência desses entraves de natureza puramente política, limita em demasia a eficácia da recuperação.

Não obstante, merece aplauso a iniciativa da criação de Varas especializadas em questões empresariais e do tratamento diferenciado à pequena e micro-empresa, demonstrando a legítima preocupação em adequar o sistema falimentar brasileiro à dinamicidade exigida nas relações econômicas.


REFERÊNCIAS

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Notas

  1. Máxima vênia ao entendimento de Humberto Theodoro Júnior [2006], que considera a recuperação judicial um processo contencioso, vez que configurada uma lide entre devedor e credores, em virtude do inadimplemento das obrigações do credor, pensamos ser tal concepção um apego demasiado à forma, dado que se devedor e credores contendores fossem, conforme a síntese do mestre mineiro, o instituto da recuperação judicial pouca eficácia teria, em se considerando que para o sucesso da recuperação o essencial é o nuto da negociação entre as partes. Logo, entendemos o processo de recuperação judicial como uma parceria, na qual credores e devedores fazem concessões mútuas com o escopo de manter ativa a unidade empresarial.
  2. O pioneirismo mencionado não denota a inexistência de outras empresas no ramo da aviação. Destaque-se a atuação da NYRBA do Brasil, sucedida pela PANAIR, e a Cruzeiro do Sul. Sobre a PANAIR, note-se que ela enfrentou um processo falimentar de cunho notadamente político [ocorreu na ditadura militar] que favoreceu a VARIG, porque ela passou a operar em linhas internacionais, a controlar os escritórios internacionais e a logística já existente na PANAIR. Sobre esse caso, vale a leitura da obra de Alejandra Saladino, O Caso Panair: silêncios e enquadramentos no Marimbás Air Force e de Nair Palhano, Nas asas da história: lembranças da Panair do Brasil.
  3. Tal disposição é um assombro legal remanescente do Decreto-Lei n.º 669/69, de autoria do general Costa e Silva, editado à toque de caixa para impedir a concordata da PANAIR do Brasil.
  4. Os ordenamentos jurídicos alienígenas, notadamente, os sistemas de procedência direta do Direito Romano possuem no dizer de Lisboa [et al, 2005] uma maior preocupação com a defesa dos interesses do credor. No Brasil, por exemplo, no escólio do art. 2º, inciso III, do Decreto Lei 7.661/45, a simples convocação dos credores para a negociação do débito caracterizava-se falência, evidenciando, portanto o caráter pró-credor da antiga legislação falimentar brasileira. Bebendo da fonte norte-americana, onde há um balanceamento entre os interesses de credores e devedores, visando à recuperação da empresa, a legislação falimentar brasileira inovou, pecando, todavia, na questão dos créditos tributários, que nos Estados Unidos são preferidos depois de pagos os créditos extra-concursais e concursais privados. Em outro ponto, o sistema falimentar inglês, na elucidação de Lisboa [et al, 2005], possui o viés pró-credor, facilitando o encerramento da atividade empresária e a alienação dos ativos para a satisfação dos créditos, semelhante ao que se dava na LFC brasileira.
  5. Conforme importante anotação de Aloísio Araújo et Bruno Funchal [2006] o processo falimentar brasileiro antes da LRE era considerado um dos mais demorados e ineficientes do mundo. Perfazendo-se uma média de tempo entre o início e o fim do processo de falência nos países componentes da América Latina e Caribe [ALC], Oriente Médio e Norte da África [OMNA], Europa e Ásia Centra [EAC], Leste Asiático e Pacífico [LAP] [todos com menos de 4 anos, em média] e Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE] [menos de 1 ano], o Brasil ficou em último lugar com uma média de 10 anos, ficando atrás dos países componentes do Sul Asiático [SAS] e da África Subsaariana [ASS], onde a média de tempo é de menos de 6 anos.
  6. Ressalve-se o caso da pequena empresa, no qual o juiz pode efetuar a recuperação judicial sem a audição dos credores [Art. 72, da LRE].
  7. A paridade dos credores não implica numa relação de igualdade, já que há créditos que se sobrepõem aos demais como os reais e trabalhistas.
  8. A legislação falimentar anterior trazia o papel do síndico que administrava os bens do falido, agindo independentemente das partes [credores e devedor] já que atuava para a preservação do interesse da empresa. Na legislação falimentar hodierna há a previsão do administrador judicial, que com o mesmo papel de salvaguardar a empresa, deve gerenciar o seu processo de recuperação, buscando a manutenção da fonte produtiva. Para tanto a LRE estabelece no artigo 21 que será necessariamente revestido de tal incumbência profissional idôneo com formação em direito, economia, administração de empresas ou contabilidade, sendo possível também o exercício de tal múnus por pessoa jurídica especializada em tal atividade e apartada de qualquer relação com os credores, de forma a não comprometer o exercício da gestão.
  9. A Lei 11.101/05 estabelece a criação do Comitê de credores [arts. 26 a 34], – cuja composição será feita por um representante dos empregados, um da classe de credores com garantia real ou privilégios especiais e um representante da classe de credores quirografários, subordinados ou com privilégios gerais – tendo as prerrogativas de aprovar, fiscalizar e se posicionar sobre o plano de recuperação e sua execução. Há a previsão também da formação da Assembléia Geral de Credores [AGC], órgão deliberativo com a função de decidir o destino da empresa e discutir sobre o plano e a realização dos ativos, entre outras incumbências.
  10. Importante se notar que tal disposição, através de uma interpretação teleológica, aplica-se aos contratos de trato sucessivo que se iniciaram antes da recuperação judicial da empresa, sendo por ilação inválida a cláusula resolutiva expressa que vede a revisão contratual, se procedida a recuperação judicial por a empresa contratante. Nesse ponto somos favoráveis ao entendimento de Paulo Penalva Santos [2005] que assevera a necessidade de ser respeitada a função social do contrato, assim factível a revisão dos contratos como forma de não tornar letra morta o instituto da recuperação judicial. Vale a ressalva de que a Lei 11.101/05 exclui do plano de recuperação os contratos de leasing, alienação fiduciária em garantia, adiantamento e contrato de câmbio.
  11. Cf. Gladston Mamede. [2005] que considera que a suspensão de todas as ações e execuções em face do devedor tem por objetivo garantir a eficácia da intervenção judicial na empresa, seja para garantir a sua efetiva recuperação, seja para, na falência, garantir que todos credores tenham igual acesso aos bens do empresário ou da sociedade empresária, evitando que alguns por estarem com processos mais adiantados ou por terem demandas tramitando de forma mais célere, pudessem satisfazer-se plenamente em seus créditos, deixando menos patrimônio para os que chegassem depois. Ademais, permite também ao devedor um lapso no qual pode negociar seus créditos, sendo bastante eficiente tal medida para a saúde da unidade produtiva.
  12. Convém criticar tal disposição inserta no bojo da LRE porque se trata de uma proposição iníqua que favorece a Fazenda Pública, excluindo o crédito fiscal da recuperação judicial. É cediço que um dos impedimentos relevantes ao desarrolho da atividade empresária é a excessiva carga tributária brasileira, que provoca, no mais das vezes, a insolvência do empresário e fomenta a sonegação fiscal. Pensamos que se equivocou o legislador em não incluir o crédito fiscal na recuperação judicial. Salutar notar que há um projeto de Lei no Senado Federal, de n.º 245/04, de cuja autoria é do Senador potiguar Fernando Bezerra, que busca a criação de um programa de recuperação fiscal federal para os devedores fiscais em processo de recuperação judicial.
  13. §4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em nenhuma hipótese excederá o prazo de 180 [cento e oitenta] dias contando do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.
  14. Os créditos trabalhistas são limitados a 150 salários mínimos por credor e os acidentários. Aqueles que superam essa medida são considerados créditos quirografários e não têm privilégios sobre os demais.
  15. Em virtude da supremacia do executivo fiscal a cobrança do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação, não havendo, portanto, a necessidade da Fazenda Pública realizar a habilitação de seus créditos, conforme a leitura do artigo 187 do CTN, alterado pela Lei Complementar n.º 118/05. Havendo mais de um ente público com crédito tributário a receber, deve ser observada a seguinte ordem, respectivamente, União e autarquias, Estados, Distrito Federal, Territórios e autarquias e Municípios e suas autarquias [CTN, art. 187 c/c art. 29 da LEF].
  16. Não obstante, conforme afirma Finkestein [2006], a LRE prediz que o juiz deve determinar ao Registro Público de Empresas a anotação da recuperação judicial no registro correspondente; a partir de então, em todos os atos, contratos e documentos firmados pelo devedor sujeito ao procedimento de recuperação judicial deverá ser acrescida, após o nome empresarial, a expressão "Em recuperação judicial". Essa é uma forma de resguardar os novos parceiros de negócios, visto que terão plena consciência da situação da empresa com a qual estão contratando.
  17. Art. 60 Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observando o disposto no art. 142 desta lei.
  18. Parágrafo único. O objeto de alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observando o disposto no § 1º do art. 141 desta lei.

  19. A permissibilidade acolhida pelo legislador de vedar a sucessão de dívidas tributárias e de outra natureza da parte da unidade produtiva alienada veio a contento da necessidade de se encontrar soluções eficazes e exeqüíveis para a recuperação da empresa. Procurou-se, através dessa medida, atrair o investidor que se interessasse pelo bem ofertado sem impedimentos fiscais ou trabalhistas, gerando, por conseqüência, divisas para a empresa em recuperação.
  20. Concessões de pouso e decolagem [slots] e horários de vôo [hotrans].
  21. STJ. CC 61.272/RJ, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/04/2007, DJ 25/06/2007 p. 213
  22. Volo do Brasil, uma empresa criada pelo fundo de investimentos americano Matlin Patterson e empresários brasileiros para atender à exigência da legislação brasileira, que limita em 20% a participação estrangeira em companhias aéreas.
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Sobre o autor
Vinícius Fernandes Costa Maia

Bacharelando em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Analista Jurídico da Alesat Combustíveis S.A.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAIA, Vinícius Fernandes Costa. A Lei nº 11.101/05 aplicada ao caso de recuperação judicial da Varig. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2063, 23 fev. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12374. Acesso em: 25 abr. 2024.

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