CAPÍTULO 9
O Estado, diz Espinosa, peca quando faz ou tolera coisas que podem causar a sua ruína. [54]
Jorge L. O. Silva [55]na introdução do seu livro aborda que "com o fenômeno da degradação dos valores éticos e morais, as pessoas passaram a sofrer diferentes tipos de violência". Nos ensina que "a história da violência sempre esteve presente na sociedade, a ponto de Durkheim afirmar que o crime é um fenômeno social normal e necessário ao próprio desenvolvimento da sociedade. No entanto, vivemos a era da banalização dos sentimentos humanos, produto de um mundo individualista, narcisista e materialista,... , onde o semelhante é visto apenas como um objeto a ser manipulado em direção ao objetivo a ser alcançado".
Marie-France Hirigoyen [56], observa que "a lei continua sendo um anteparo, ao esclarecer as pessoas de que essas atitudes existem e são inaceitáveis. Ela permite levantar uma dupla preocupação: com a impunidade por parte do agressor e com a vingança por parte da vítima. Punir o autor da agressão é uma forma de afirmar que o que as pessoas vivenciaram é profundamente inaceitável, mesmo que nunca seja possível reparar completamente nem compensar totalmente uma injustiça. Não se trata de maneira alguma de um perdão barato. Salienta que apesar de tudo, a justiça jamais poderá reparar o sofrimento das vítimas. É, pois, importante não nos limitarmos aos regulamentos e às leis, sob o risco de cairmos na juridicidade excessiva; é preciso insistir na prevenção".
CAPÍTULO 10
Sônia A. C. Mascaro Nascimento [57]conceitua o assédio como sendo um "termo utilizado para designar toda conduta que cause constrangimento psicológico ou físico à pessoa. Dentre suas espécies, verificam-se pelo menos dois tipos de assédio que se distinguem pela natureza: o assédio sexual e o moral. Este caracteriza-se por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções". Diz ainda que "o assédio moral é de natureza psicológica, enquanto o sexual é de natureza sexual".
A natureza jurídica do assédio "pode se inserir no âmbito do gênero ‘dano moral’ ou mesmo do gênero da ‘discriminação’", segundo Sônia Mascaro Nascimento".
Reginald Felker [58] relata que "O assédio moral, como uma das espécies do gênero ‘dano moral’ está intimamente ligado aos Direitos Humanos. Observa Luiz Salvador [59]que ‘A concepção contemporânea de direitos humanos é caracterizada pela universalidade e indivisibilidade destes direitos. Universalidade porque clama pela extensão universal dos direitos humanos, ou seja: a condição de pessoa é o requisito único para a dignidade e titularidade de direitos. Indivisibilidade porque a garantia dos direitos, quer civis ou políticos é condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e culturais e vice-versa Ou seja: quando um deles é violado, os demais também o são’".
Nos ensina Ronaldo Alves de Andrade [60] que "embora admitindo a natureza jurídica da indenização do dano moral como reparatória de dano; não podemos deixar de enxergar certo caráter de pena, aliás eficaz, onde a indenização funciona como meio coibitivo de ofensa aos direitos da personalidade, mormente naqueles casos nos quais o direito atingido assume caráter extremamente subjetivo à sua caracterização... medida educativa para desestimular lesão a direitos da personalidade". Contudo alerta para o fato de que esta indenização "não pode obedecer ao princípio da restitutio integrum, porque resultando o dano moral da lesão a direito da personalidade, impossível restituir o lesado às mesmas condições que tinha antes da ocorrência da lesão. Da mesma forma, impossível substituir a restitutio integrum por indenização equivalente, pois os direitos da personalidade não comportam aferição econômica... Portanto, definitivamente, a indenização do dano moral não tem caráter de indenização equivalente ao dano sofrido, mas compensatória.... tem caráter satisfativo, na medida que visa compensar a vítima pelos danos sofrido" [61].
Carlos Cezar Barbosa [62] observa que "enquanto a reparação por danos materiais colima a recomposição do patrimônio do ofendido (pelos danos emergentes e pelos lucros cessantes), a reparação por danos morais tem duplo objetivo: o oferecimento de compensação financeira à vítima, pela dor, no amplo sentido, suportada, e a aplicação de sanção ao infrator, para que se o desestimule a prosseguir na prática de atos lesivos a outrem".
CAPÍTULO 11
Tratar deste tema, assédio moral, é antes de mais nada tratar da própria dignidade humana que encontra-se tutelada por inúmeras legislações. É possível falar que o assédio moral, fato gerador do dano moral, é juridicamente tutelado sob os auspícios do direito da personalidade.
Reginald Felker [63] relata que "o fato do assédio moral no trabalho é antiqüíssimo, mas sua inserção no mundo jurídico é recente. Após os trabalhos do alemão, radicado na Suécia, Heinz Leymann, a partir de 1984, os psicólogos, os médicos do trabalho e os juristas passaram a se ocupar do fenômeno, que hoje está aflorando nas legislações, jurisprudência e doutrina de inúmeros Países do Mundo Civilizado (ou pelo menos que se tem como tal)".
Reginald Felker [64], traz uma valiosa explanação da Evolução Histórica do dano moral. Relata que "desde o mais antigo Código encontrado, o ‘Código de Hamurabi’ encontra-se regras estabelecidas onde a compensação moral está vinculada a penalidade como nas regras de Talião. Ele percorre pelo ‘Código de Manu’, ‘Código Mosaico’, a ‘Lei das XII Tábuas’, ‘Código de Napoleão’, Código Civil Alemão de 1896, Código Civil da Suíça de 1907, Constituição Mexicana de 1917, o Código Civil Italiano de 1942, o Código do Peru de 1984, Código Civil Português de 1967, Código Civil Boliviano de 1975, Código Civil Chileno de 1855 com redação promovida em 1992 e o Código Civil Espanhol de 1889 com novo texto aprovado em 1974".
A idéia da compensação em virtude da lesão sofrida por dano moral se faz presente em todas essas legislações, o que fica evidenciado que a matéria é tão antiga quanto o próprio homem.
Yussef Said Cahali [65] relata que "com o advento da nova Carta Magna, lembra Clayton Reis, ‘inúmeras legislações vêm sendo editadas no País, ampliando o leque de opções para a propositura de ações nessa área. É o Código de Proteção ao Consumidor que no seu artigo 6º., incs. VI e VII admitiu a reparação de danos patrimoniais e morais. No mesmo sentido filiou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu art. 17, combinado com o art. 201, V, VIII e IX, assegurou à criança e ao adolescente o direito à integridade física, psíquica e moral. Portanto, a partir do momento em que a lei assegura o direito à integridade física e moral do menor, admite a reparação de eventual dano à sua imagem ou aos seus bens extrapatrimoniais’.".
Segundo Reginald Felker [66] "diversos Estados e Municípios têm legislado (ANEXO 2) sobre a matéria procurando eliminar, ou pelo menos reduzir a incidência de assédio moral no serviço público, através da implantação de medidas preventivas e punitivas". Aponta que "a pioneira terá sido a legislação do Município de Iracemápolis, pela Lei Municipal n.1.163/2000, de 24 de abril de 2000, que dispôs expressamente sobre o assédio moral nas dependências do local de trabalho conceituando o assédio moral no Art. 1º. "Ficam os servidores públicos municipais sujeitos às seguintes penalidades administrativas na prática de assédio moral, nas dependências do local de trabalho: I – Advertência. II – Suspensão, impondo-se ao funcionário a participação em curso de comportamento profissional. III – Demissão. Parágrafo Único – Para fins do disposto nesta Lei, considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um individuo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à estabilidade do vínculo empregatício do funcionário, tais como: marcar tarefas com prazos impossíveis, passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um funcionário só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços." Em Iracemápolis foi instituído o dia 02 de maio como "dia de reação ao assédio moral".
Ainda segundo Reginald Felker as
"diversas leis municipais e estaduais, com pequenas variações de redação, caracterizam o assédio moral, como todo o gesto, determinação, ação ou palavra, que vise atingir a auto-estima, a segurança e a autodeterminação do servidor, violando a sua intimidade, procurando humilhá-lo e constrangê-lo, causando, ao mais, danos ao ambiente de trabalho, inclusive na prestação de serviço ao público.
São especificados, na lei, os atos repetitivos caracterizadores do assédio moral, como sendo: marcar tarefas a serem cumpridas em prazos impossíveis; designar atribuições estranhas ao cargo, emprego ou função; passar da área de responsabilidade para o exercício de funções triviais; tomar créditos de idéias, propostas, projetos ou trabalhos de outros; excluir o servidor, ignorando-o, só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações; espalhar rumores e comentários maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços; torturar psicologicamente, com comentários discriminatórios; expor o servidor, por defeitos físicos ou mentais adversos; manifestar desprezo; restringir o exercício da livre opinião e manifestação de idéias.
As punições também são, em regra, as mesmas: advertência escrita, suspensão, multa e demissão. Em alguns casos se tem estipulado, além da penalidade imposta, também a participação em um curso de aprimoramento profissional, onde contará com conteúdos programáticos versando sobre ética profissional e relações interpessoais, numa tentativa de reeducação.
Esta legislação tem previsto, normalmente, também, a forma de procedimento, que deverá ser por iniciativa da parte ofendida, por queixa ou representação ao superior hierárquico; a instauração do procedimento, de ofício, pelo superior há de contar com a anuência da vítima.
Ao ofensor se deverá conceder amplo direito de defesa.
A intenção desse trabalho não é abarcar toda a legislação sobre o assédio moral. Ela vem se multiplicando a passos largos principalmente no âmbito do direito do trabalho como podemos verificar. Seria inócua tal tentativa; contudo cremos que todo o arcabouço legislativo vigente nos assegura a possibilidade de empreendermos uma luta contra o assédio moral nas mais diversas áreas seja na forma preventiva, reparatória e punitiva.
CAPÍTULO 12
Nosso objetivo é chamar a atenção para o fato de que o assédio moral nas instituições de ensino precisa ser observado e perseguido e que há leis no sentido de coibi-lo. Acreditamos que a educação precisa ser a chave mestra para a conquista de uma sociedade justa e saudável. Por muito que tenham evoluído as práticas pedagógicas, a educação ainda guarda o ranço do autoritarismo, espalhando terror e violência. É preciso o exercício do contraditório nas escolas. Alunos são suspensos e expulsos. Os pais e alunos, na prática, parecem que nada podem fazer. Alunos levam bilhetinhos com reclamações para seus lares muitas vezes injustamente. A instituição ao ser questionada raramente admite o erro, o que causa mal estar na família como um todo e o sentimento de injustiça no aluno. É deplorável o estado dos pais e das crianças que chegam ao consultório psicológico em busca de ajuda. É muita dor. Dor da impotência, da insignificância, do não ser e nada poder fazer.
Karyna Batista Sposato [67] chama a atenção para o direito penal juvenil. Guardadas as devidas proporções e peculiaridades, ousaremos fazer um paralelo com a sua observância que, as regras democráticas do devido processo legal não são respeitadas. Ela relata que "a partir do procedimento e do modo de funcionar da justiça juvenil, podem ser observadas as mais graves distorções". Em outro momento ela menciona que "a discricionariedade, característica marcante historicamente do funcionamento da justiça da infância e juventude em nosso país, especialmente no que tange à atribuição da autoria de atos infracionais aos adolescentes e conseqüente imposição de medidas socioeducativas, revela um sistema altamente arbitrário e totalizante, em nome de suposta "proteção". É certo que ela se refere a atribuição da autoria de atos infracionais, mas o que queremos ressaltar é a similaridade do comportamento arbitrário nas instituições que tem a criança como objetivo primeiro. Nesse sentido encaixa-se também a família e a escola e outras afins.
"A vitimização, os maus-tratos, a tortura impingidos na infância, sob o pretexto, muitas vezes, de educar, levam a uma internalização dessa prática como ‘normal’, e é, freqüentemente, responsável por uma visão de mundo permeada por uma normatização da violência no imaginário social da criança e do adolescente que, mais tarde, se transfere para o seu mundo adulto. Com isto se quer dizer que as ações violentas passam a ser entendidas como ações normais, uma vez que a sua formação básica foi marcada pela pedagogia do medo." [68]
O art. 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente refere-se aos maus-tratos que segundo o Dr. Haim Grunspun [69] podem ser físicos, abusos sexuais, emocionais e intoxicações propositais. Destes chamamos a atenção para os maus-tratos emocionais que "pertencem mais à categoria de omissão e correspondem a situações crônicas no relacionamento entre adultos, crianças e adolescentes. Ignorar, rejeitar, aterrorizar, isolar, negar bem-estar de que os outros familiares usufruem são as atitudes mais freqüentes. São considerados como falhas não orgânicas que impedem o progresso no desenvolvimento da criança ou adolescente. Podem ser familiares ou institucionais, como na escola, p.ex.".
O artigo 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que "A criança e o adolescente têm direito à educação, visando o pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:... II – direito de ser respeitado por seus educadores; III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores...". O pedagogo Antônio da Costa [70] diz que "esse respeito, sem dúvida, é a base sobre a qual se assenta a integridade física, psicológica, moral e cultural do educando, um dado que deverá ser levado em conta na estrutura curricular e no quotidiano relacionamento entre crianças, adolescentes e adultos na vida escolar... Ao abrir a possibilidade do exercício ativo da contestação por parte do educando, o Estatuto da Criança e do Adolescente contribui para uma efetiva democratização das práticas escolares, levando à condição de sujeito de direitos ao interior mesmo do processo pedagógico.".
Myriam Puglieses de Castro, pesquisadora, relata que "quem negligencia, discrimina, explora, age com violência, crueldade e/ou oprime a criança e o adolescente viola os seus direitos básicos deve ser punido, seja quanto atenta, seja quando age, ou quando se omite, permitindo a ação que viola seus direitos fundamentais, deve ser punido, portanto, conforme os termos da lei". [71]
"O desrespeito ao direito à dignidade da criança e do adolescente poderá dar margem a ações civis públicas, que serão propostas pelo Ministério Público, que tem a incumbência de zelar por estes direitos, ou aos crimes previstos no Estatuto." [72]
Quando falamos em instituição de ensino nos referimos a educação. Alexandre de Moraes [73] diz que "a Constituição Federal proclama que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". Art. 22, ‘Compete privativamente à União legislar sobre: XXIV – diretrizes e bases da educação nacional’.".
É na escola que precisamos assegurar os princípios fundamentais da Carta Magna, não apenas visando uma punição aos assediadores, mas, sobretudo elaborando política de prevenção, com o fim de assegurar a formação do indivíduo para que ele se torne um cidadão ético e equilibrado para ser capaz de contribuir com a evolução da humanidade.
Nesse sentido, João Marques [74] relata que Jason Albergaria ensina que: "... o investimento da educação da criança e do adolescente é de alta rentabilidade a longo prazo, porque determinará a promoção humana da criança e do adolescente e, conseqüentemente, o progresso ou o avanço ético da própria sociedade".
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA, Lei n.8.069, de 13 de julho de 1990, estabelece que no seu Art. 3º, "A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade"; no Art. 5º, "Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais"; no Art. 17, "O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais"; e no Art. 18, "É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor".
A Lei no. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Nela encontramos os dispositivos que nos asseguram a proteção constitucional que pode ser direcionada ao assédio moral também. Estabelece-se que, Art. 13, "Os docentes incumbir-se-ão de: III – zelar pela aprendizagem dos alunos"; Art. 22, "A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores". Art. 27, "Os conteúdos curriculares da educação básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes: - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática"; Art. 29, "A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade". Art. 32, "O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: (Redação dada pela Lei nº 11.274, de 2006) II – a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III – o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV – o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social". Art. 35, "O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades: II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico".
A Constituição Federal estabelece, como citado no início de trabalho, que Art. 205, "A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". Art. 206, "O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte o saber"; Art. 227, "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
Os serviços educacionais são de natureza pública. O direito à educação encontra-se no rol de direitos fundamentais e portanto se caracteriza como direito público e subjetivo. As instituições de ensino na modalidade particular são entidades que prestam serviço público por delegação.
O art. 37 da Constituição Federal institui que § 6º - "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". "O texto constitucional prevê, também, instrumentos de controle das ações ou omissões do Poder Público ou do particular que atua mediante delegação, que coloquem sob ameaça ou que lesionem, efetivamente, os direitos do administrado, no plano individual ou no plano coletivo. São os chamados direitos instrumentais, cuja característica marcante, no dizer de Vicente Greco Filho, é a ‘efetividade, para que certas situações específicas encontrem rápida solução’". [75]
Estes instrumentos encontram-se elencados no art. 5º. da Constituição Federal como por exemplo, o Mandado de Segurança. Os instrumentos reafirmam o texto constitucional no tocante ao fato de que: art. 5º. Inc. XXXV – "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". É direito de todo o cidadão recorrer ao Poder Judiciário para deduzir sua pretensão. O legislador constituinte de 1988 colocou à disposição da sociedade remédios, como é o caso do mandado de segurança, de injunção e da ação civil pública e, também previu a responsabilidade objetiva do Estado pelos danos causados aos administrados.
Carlos César Barbosa [76] demonstra a "utilidade do mandado de segurança para a garantia do direito de defesa do aluno, quando da imposição de medida punitiva por parte do estabelecimento de ensino. Observem-se, a propósito, as seguintes ementas:
Ensino. Disciplina escolar. Aluno a que aplicada transferência compulsória pelo Conselho da Escola, independentemente de parecer da comissão de professores. Infração ao disposto no Decreto no. 10.623, de 26.10.1977, art. 63. Direito de defesa não respeitado. Infração do disposto da Constituição Federal, art. 5º. LV. Mandado de Segurança concedido contra o ato. Reexame necessário e apelação do Estado não providos. TJSP – AC 62.1768-5 – Sorocaba – 4ª. C.jan. de 1999 de dir. público – rel. jacobina Ribeiro – 4.2.1999 – v.u.
Ensino. Cancelamento de matrícula de aluno universitário, com base em mera suspeita de irregularidade do seu certificado de 2º. Grau. Documento, porém, formalmente em ordem, gozando de presunção júris tantum de validade. Possibilidade da medida somente após a instauração do devido processo administrativo, assegurada ampla defesa ao interessado. Segurança concedida. Recurso de ofício improvido. AC 42.735-5 – São Paulo – 7ª. C. jul. de 1998 de dir. público – rel. Lourenço Abbá Filho – 21.9.1998. – v.u.
Ainda segundo Carlos Cezar Barbosa, com estes julgados verificamos que existe submissão das instituições de ensino às normas constitucionais. Toda conduta que venha a restringir o direito do aluno ao ensino, como por exemplo, suspensões ou expulsões, deve ser precedida de processo administrativo, assegurando-se ampla defesa ao aluno.
O mesmo autor se refere a várias ementas que demonstram acidentes que aconteceram em escolas públicas e demonstra que pela teoria da responsabilidade objetiva, a Administração foi condenada à reparação de danos, independentemente da demonstração de culpa dos agentes públicos.
"É defensável a tese de que, se o Estado não se apresenta como responsável direto ou solidário ao particular autorizado à prestação de serviços educacionais, pelos danos causados por este a terceiros, no contexto da atividade, pelo menos responde subsidiariamente caso o delegado não apresente a solvência necessária para reparar danos eventualmente causados." [77] Observar-se que não freqüentam "os tribunais, pedidos de reparação moral contra o Estado", segundo Carlos C. Barbosa. [78]
Os serviços educacionais são serviços públicos essenciais e devem se apresentar contínuos e eficientes. Na falha desses serviços a responsabilidade é do Estado, bem como o dever de reparar os danos que vierem a ocorrer. "A ineficiência do serviço pode comprometer os objetivos traçados pelo Estado, na sua Carta Política, a serem atingidos pela educação, quais sejam: o desenvolvimento da pessoa, o seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho." [79]
Carlos Cezar Barbosa alerta para o fato de "que o processo educacional exige a interação do aluno, de modo que seu desinteresse pode comprometer o aprendizado. Contudo, isso não elide a obrigação de resultado assumida pela instituição de ensino, cabendo a ela, nesse caso, além de desenvolver estímulos para o progresso do aluno, obstar a certificação de conclusão do curso respectivo até que, efetivamente, sejam atingidos os resultados adequados." Diz ainda que "a comprovada ineficiência do bacharel para a aprovação em exames como a OAB denuncia que o resultado dos serviços prestados pela instituição de ensino não foi atingido, abrindo espaço à reparação de danos".
Observamos com o exposto neste capítulo que a educação é um serviço essencial do Estado. Assim sendo, tem o Estado o dever de garantir de forma intacta a sua obrigação sob a teoria objetiva da responsabilidade civil. Ser o guardião da educação implica em proteger os direitos da personalidade e é de senso comum que estes uma vez lesionados pode comprometer toda uma sociedade independentemente da reparação dos danos morais e materiais.
As ementas a seguir têm o intuito de demonstrar como têm sido julgadas as pretensões decorrente do dano moral experimentado por alunos em instituições de ensino, bem como incentivar a ida ao Poder Judiciário para reclamar direito lesado que tanto reflete negativamente não só na vida daquele que sofreu o dano moral mas no âmbito da sociedade:
Responsabilidade civil. Dano moral. Menor submetida no interior do colégio em que estudava a constrangimento, acusada de furto por colegas que a revistaram em sala de aula. Omissão do estabelecimento de ensino Dever de indenizar. É o estabelecimento de ensino responsável pela incolumidade física e moral de seus alunos, impondo-se, por isto, o dever de indenizar o dano moral decorrente do constrangimento sofrido por menor impúbere, acusada de furto e submetida a revista com violação de sua intimidade. Omissão dos responsáveis pela manutenção da disciplina do colégio, que se mostraram incapazes de coibir o abuso. Acidente de consumo que induz à ocorrência de responsabilidade objetiva por culpa presumida, sem embargo de configurada também a culpa subjetiva, na forma do art. 1.521, IV, do Código Civil. Provimento do recurso, para reconhecer o dever de indenizar. TJRJ–Apelação Civil–5ª.C.Civ.–j.6.6.2000 – v.u.
Indenização. Aluno da faculdade que vê seu curso interrompido por razões de instituição, que não logrou matricular para o semestre letivo seguinte número que entendia suficiente de interessados. Fato que não autoriza o descumprimento do contrato de prestação de serviços. Transferência requerida em função da impossibilidade de continuar o curso, causada pela entidade. Indenização devida das despesas decorrentes da transferência, inclusive de locomoção, matrícula e mensalidades, além de danos morais pela frustração de seu objetivo primeiro. Recurso não provido.TJSP-AC272.796-1–São Paulo-2ª.CD Priv.–rel.des.Linneu Carvalho–j.12.11.1996–v.u.