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Da (im)possibilidade de restrição de uso do toalete no ambiente de trabalho.

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08/04/2009 às 00:00
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7 – Do assédio moral e da configuração do dano moral individual e coletivo

A conduta empresarial, na forma como descrita nos autos do processo acima qualificado, e no informativo TST, de 10.03.2009, [23] demonstra nitidamente tratar-se da ocorrência do chamado assédio moral.

O assédio moral nas relações de trabalho, segundo a doutrina, caracteriza-se pela exposição dos trabalhadores a situações humilhantes, constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho, sendo mais comum nas relações hierárquicas autoritárias, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, dirigidas aos subordinados, desestabilizando a relação das vítimas com o ambiente de trabalho. [24]

A conduta descrita no caso concreto redundou inafastavelmente em situação vexatória e humilhante a que foram submetidos os trabalhadores da empresa demandada, dirigida aos empregados de baixo escalão (certamente, os de maior grau hierárquico não sofriam o mesmo controle), fazendo com que os mesmos se sentissem desestabilizados no ambiente laboral, ao constatarem que, ao sinal de qualquer desarmonia em seus sistemas orgânicos, ficariam na dependência de autorização para se utilizarem do toalete.

Desta forma, não só o empregado demandante faria jus à reparação de seu dano moral, mas toda a coletividade de trabalhadores submetida a tal conduta.

Presente, portanto, o dano moral coletivo, assim entendido como a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, constituindo a "violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos" [25], atraindo a legitimidade dos arrolados no art. 5º da Lei n. 7347/1985 para a propositura da ação civil pública, em especial, o sindicato da categoria profissional e o Ministério Público do Trabalho.

Bastaria um simples ofício ao Ministério Público do Trabalho, já pelas instâncias ordinárias da Justiça do Trabalho, para que o Parquet competente implementasse as medidas necessárias à cessação da conduta empresarial, por meio de sua atuação preventiva e repressiva, como órgão agente, em sede administrativa ou judicial, buscando a tutela inibitória de tais atos empresariais.


Conclusão

Procuramos demonstrar, com supedâneo nas diversas normas citadas, em abalizada doutrina, e em toda a gama de valores constitucionais fundamentais de nossa comunidade que, com todo o respeito à decisão tomada pelos Em. Ministros de nossa Corte Especializada, poderia ter sido outro o desfecho do caso concreto em apreço.

Não faltariam argumentos portentosos e vasto respaldo constitucional e legal para que a colenda Turma não só ressarcisse o dano individual que estava sendo levado a juízo, mas, ainda, em uma postura pró-ativa, consentânea com a moderna jurisdição, condenasse a empresa em elevado valor, valendo-se do escopo pedagógico-preventivo e punitivo do dano moral. Desta forma, estaria contribuindo para que os direitos fundamentais de nossos trabalhadores deixem de ser impunemente vilipendiados, com o argumento, na moda em tempos de crise global, de que o Capital não pode ser obstaculizado, nem mesmo pela dignidade e integridade moral daqueles que dão suporte à sua atividade econômica.


Referências Bibliográficas

CAIXETA, Sebastião Vieira. "O assédio moral nas relações de trabalho". In. Revista do Ministério Público do Trabalho. Ano XIII. n. 25. Brasília: Procuradoria Geral do Trabalho, 2003.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004.

GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal: dos crimes contra a pessoa. Vol. 8. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999.

MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. São Paulo: LTr, 2004.

MENDES, Gilmar Ferreira, Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco, Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006.

----------- A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 7. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007. .

SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direitos Fundamentais e o Contrato de Trabalho. São Paulo: LTr, 2005.


Notas

  1. Disponível em
  2. http://ext02.tst.gov.br/pls/ap01/ap_red100.resumo?num_int=474403&ano_int=2008&qtd_acesso=6125345. Acesso em 17.03.2009.

  3. Disponível em http://ext02.tst.gov.br/pls/no01/no_noticias.Exibe_Noticia?p_cod_noticia=9017&p_cod_area_noticia=ASCS. Acesso em 17.03.2009.
  4. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado, Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, n. 1, p. 77. Apud MENDES, Gilmar Ferreira et alli, Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 368. Não grifado no original.
  5. SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direitos Fundamentais e o Contrato de Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 83/84.
  6. GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal: dos crimes contra a pessoa. Vol. 8. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 86.
  7. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 4. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2006. p. 60.
  8. Idem. p. 41.
  9. Idem. p. 54/55.
  10. Idem. p. 45.
  11. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 266.
  12. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 7. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2007. p. 401.
  13. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Livraria Almedina, 1987. p. 273-274. Apud SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia... . p. 401
  14. Curso de Direito Constitucional. p. 269.
  15. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Livraria Almedina, 1987. p. 284. Apud SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia... p. 403.
  16. Curso de Direito Constitucional. p. 270.
  17. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia... p. 402.
  18. MENDES, Gilmar Ferreira, Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco, Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 270.
  19. Idem.
  20. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia... p. 404-405.
  21. Disponíveis em www.stf.jus.br. Acesso em 17.03.2009.
  22. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo:LTr, 2004. p. 629.
  23. DELGADO, op. cit. p. 393/394.
  24. Disponível em http://ext02.tst.gov.br/pls/no01/no_noticias.Exibe_Noticia?p_cod_noticia=9017&p_cod_area_noticia=ASCS. Acesso em 17.03.2009.
  25. CAIXETA, Sebastião Vieira. "O assédio moral nas relações de trabalho". In. Revista do Ministério Público do Trabalho. Ano XIII. n. 25. Brasília: Procuradoria Geral do Trabalho, 2003. p. 93.
  26. BITTAR FILHO, Carlos Alberto. "Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro". In Revista de Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais. n. 12. p. 55, out/dez. 1994. Apud MEDEIROS NETO, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo. São Paulo: LTR, 2004. p. 137.
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Sobre o autor
Armando Cruz Vasconcellos

Auditor Fiscal do Trabalho (RJ). Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Direito e Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VASCONCELLOS, Armando Cruz. Da (im)possibilidade de restrição de uso do toalete no ambiente de trabalho.: Fundamentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2107, 8 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12594. Acesso em: 29 mar. 2024.

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