RESUMO
Nos Estados Democráticos de Direito, a Constituição está em posição de supremacia no ordenamento jurídico. Quando normas infraconstitucionais violam a constituição, o poder judiciário é provocado para expulsá-las do ordenamento.
A Constituição Federal de 1988 da República Federativa do Brasil estabeleceu regras para escolha de Ministros do Tribunal de Contas da União e determinou que os Estados membros seguissem as mesmas regras. Ela também limitou em sete o total dos Conselheiros dos Tribunais de Contas dos Estados. Desse total, quatro deveriam ser escolhidos pelo Poder Legislativo Estadual e três pelo Chefe do Poder Executivo.
No que se refere aos três Conselheiros escolhidos pelo Chefe do Poder Executivo, um Conselheiro poderá ser de sua livre escolha e dois, deverão ser dentre os ocupantes do cargo de Auditor e de Membro do Ministério Público Especial junto ao TCE. Esses dois cargos devem ser providos por meio de concurso público específico.
Assim, as Constituições Estaduais deveriam estabelecer o mesmo tipo de regras para escolha desses sete Conselheiros dos Tribunais de Contas dos Estados. No entanto, diversos Estados desobedeceram às regras desse processo de escolha dos Conselheiros, isto é, as Constituições Estaduais violaram as regras da Constituição Federal.
Para assegurar a supremacia da Constituição Federal, várias Ações Diretas de Inconstitucionalidades foram propostas contra essas desobediências. Ao julgar as ADIs, o STF reiteradamente afirmou que as Constituições Estaduais deveriam respeitar as regras de escolhas acima enumeradas. Os acórdãos dessas ADIs resultaram na edição da súmula n.º 653 aprovada em 24/09/2003. O enunciado da súmula é o seguinte: "No Tribunal de Contas Estadual, composto por sete conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do poder Executivo Estadual, cabendo a este indicar um dentre auditores e outro dentre membros do Ministério Público, e um terceiro a sua livre escolha".
A Constituição do Estado de Mato Grosso promulgada em 1989 foi uma das várias constituições estaduais que em sua redação original não obedeceu às regras de escolha de Conselheiros estabelecidas na Constituição Federal. A desobediência estava no fato de que não havia previsão de que o chefe do poder executivo escolheria um conselheiro dentre Auditores e um dentre membros do Ministério Público.
Contra essa desobediência foi ajuizada ADI no STF que julgou inconstitucionais normas relativas à escolha de conselheiros. Em 1993, a Assembléia Legislativa emendou a Constituição do Estado de Mato Grosso para compatibilizar o seu texto com o da Constituição Federal no que tange ao processo de escolha de conselheiros.
A Constituição do Estado de Mato Grosso também passou a prever que o TCE-MT deveria enviar projeto de lei propondo a criação dos cargos de auditor e de procurador do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas. Contudo, o TCE-MT, durante treze anos, omitiu-se em enviar referido projeto de lei. Apenas no final de 2006, o projeto foi enviado à Assembléia.
Em janeiro de 2007, projeto de lei foi votado e resultou na lei que, enfim, criou os cargos de Auditor Substituto de Conselheiro e de Procurador do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas. Também em 2007, foram realizados concursos para provimentos desses dois cargos. Entretanto, até agosto de 2008, não ocorreram ainda as nomeações dos aprovados nesses concursos.
Como conseqüência disso, até agosto de 2008, o Chefe do Poder Executivo ainda não havia escolhido nenhum Auditor nem Procurador do Ministério Público Especial para ocupar o cargo de conselheiro.
Além disso, desde a promulgação da Constituição Estadual até agosto de 2008, as escolhas dos Conselheiros de responsabilidade do Chefe do Poder Executivo excederam o limite ali estabelecido. O resultado disso é que, na composição do TCE-MT em 31 de agosto de 2008, há quatro conselheiros providos de forma inconstitucional em clara afronta à já citada Súmula n.º 653.
O art. 102, I, "i" da Constituição Federal e os arts. 13 a 18 da Lei n.º 8.038/90 prevêem a ação de Reclamação perante o STF como meio de preservar a autoridade das súmulas do STF. Assim, a presente monografia defende que é necessário e adequado o ajuizamento de ação de reclamação perante o STF para garantir a autoridade da Súmula n.º 653 e para que seja restabelecida a ordem constitucional imposta pela Carta Magna de 1988 na escolha e nomeação dos membros que compõem o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, com a conseqüente anulação das nomeações.
Palavras-chave:
Inconstitucionalidade - Escolha - Nomeação - Conselheiros - Tribunal de Contas. Reclamação. Ordem constitucional.
ABSTRACT
In the Democratic States ruled by law, the Constitution is in the position of supremacy in the juridical system. When infra-constitutional norms violate the constitution, the judiciary power is provoked to expel them from the juridical system.
The Federal Constitution of the Federative Republic of Brazil established rules to the selection of Ministers of the Union Court of Audit e mandated that the members states should follow the same rules. It also limited to seven the total number of Councilors in the Courts of Audit of each state. From that total, four councilors should be chosen by the State Legislative and three by the Executive Power.
Among the three Councilors that the Governor can choose, one is freely nominated by the Governor and two must be chosen from the Court''s staff - one from the team of Auditors and one from the TCE-MT Public Prosecutor''s Office. Both the position of Auditors and that of the Prosecutor shall be filled only by means of specific public contest
Accordingly, the State Constitutions should establish the same type of rules to the selection of those seven Councilors. However, several States disobeyed the rules of that process of selection of Councilors, i.e., the State Constitutions violated the rules of the Federal Constitution,
In order to enforce the supremacy of the Federal Constitution, several direct actions of unconstitutionality DAI were filled against those violations. When the STF judged those DAI, the STF repeatedly affirmed that the State Constitutions should respect the rules of selection above enumerated. The decision of those DAI resulted in the edition of the STF binding rule n. º653 approved on 24/09/2003. The text of that rule is as follows: "In the State Court of Audit, composed of seven Councilors, four shall be selected by the State Legislative and three by the State Governor who has the duty to select one from the team of Auditors of State Court of Audit and one from the Court of Audit''s Public Prosecutor''s Office and one freely"
The State Constitution of Mato Grosso enacted in 1989 was one of those several State Constitutions that in its original text did not obeyed the rules of selection of the Councilors established by the Federal Constitution. That disobedience was due to the fact that in the State Constitution there was no norm mandating that the State Governor should select one Councilor from the team of Auditors of State Court of Audit and one from the Office of the Public Prosecutor of the Court of Audit.
Against that disobedience, a DAI was filled before the Supreme Court that judged unconstitutional those norms related to the selection of Councilors. In 1993, the State Assembly amended the State Constitution of Mato Grosso in order to make its text compatible with that of the Federal Constitution with regard to the procedure of selection of Councilors.
The State Constitution of Mato Grosso then started to demand that the State Court of Audit should send a proposal of bill to the State Legislative Assembly proposing the creation of public position of Auditor and proposing the creation of public position of the TCE Public Prosecutor. However, after thirteen years, the State Court of Audit did not perform such duty. Just in the end of 2006, the proposal of bill was sent to the Assembly.
On January 2007, the proposal of bill was voted and resulted in a law that, after all, created the public position of Auditor and created the public position of the TCE Public Prosecutor. Also in 2007, were made public contests to fill those two positions. However until august 2008, the winners of those contests were not yet nominated.
As a result, until august 2008, the State Governor had selected no Auditor or no TCE Public Prosecutor to the position of Councilor.
Besides that, since the enactment of the State Constitution until august 2008, the number of Councilor selected by the Governor exceeded the limit. The consequence of that excess is that in composition of the TCE on august, 31 2008, there are four Councilors nominated by means of violation of the constitution and of the STF binding rule.
The article 102, incise I item "i" of the Federal Constitution and the articles 13 to 18 of the Law n.º8.038/90 authorize the use of the Complaining Action before the STF as an instrument to preserve the authority of the STF binding rule. In this context, the present monograph defends that is necessary and adequate the filling of the Complaining Action before the STF in order to guarantee the authority of the STF binding rule n. º653 and in order to be re-established the constitutional order imposed by the Magna Charta of 1988 with regard the selection and nomination of the members of the Court of Audit of Mato Grosso and the consequent voiding of the unconstitutional nominations,
KEY WORDS: COURT OF AUDIT, COUNCILLOR, CONSTITUTION, COMPLANING
SUMÁRIO:
INTRODUÇÃO. Problema. Objetivo Geral. Objetivos Específicos:. Procedimentos Metodológicos. Métodos:Técnicas:Embasamento Teórico. CAPÍTULO I . SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO:. 1.1 – Direito Constitucional Organizatório:1.2 – Vinculação do Legislador e do Executivo à Constituição. 1.3 – Controle de Constitucionalidade:1.3.1 – Controle difuso ou aberto (via de exceção ou defesa):1.3.2 – Controle Abstrato (concentrado) ou via de ação direta:1.4 – Tipos de Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI:1.5 – Ação de Reclamação junto ao STF – Supremo Tribunal Federal:. 1.5.1 – Natureza Jurídica da Reclamação. CAPÍTULO II . TRIBUNAIS DE CONTAS. 2.1 – Jurisdição dos Tribunais de Contas. 2.2 – Estrutura e composição dos Tribunais de Contas. 2.3 – Competência. CAPÍTULO III. PROCEDIMENTOS DE ESCOLHA DOS CONSELHEIROS DOS TRIBUNAIS DE CONTAS . 3.1 – Comparação entre os procedimentos de escolha de Conselheiros do Tribunal de Contas determinados pelas Constituição Federal e Estadual:3.1.1 – Redação dos artigos 49 a 50 da Constituição Estadual de Mato Grosso, anteriores à EC nº 06/93.3.1.2 – Entendimento do STF quanto à inconstitucionalidade de dispositivos da Constituição do Estado de MT. 3.1.3 – Redação dos artigos 49 a 50 da Constituição Estadual de Mato Grosso posterior à EC nº 06/93. 3.2 – Previsão na Lei Orgânica do TCE-MT que vigorou até 2006. CAPÍTULO IV . OMISSÕES DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MATO GROSSO – TCE-MT:4.1 – Da Omissão do TCE-MT que prevaleceu até 2006 na apresentação de projeto de lei criando o cargo de Auditor e de membros do Ministério Público Especial. 4.2 – Das implicações da demora em se criar cargos de Auditor e Membros do Ministério Público Especial:4.3 – Formas de provimento do Auditor e do Procurador no TCU.CAPÍTULO V .DA COMPOSIÇÃO ATUAL DO TCE-MT, QUATRO CONSELHEIROS FORAM ESCOLHIDOS DE FORMA INCONSTITUCIONAL. 5.1 – Membros do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso. 5.2 - Forma de nomeação dos Conselheiros atualmente em exercício.5.3 - Inconstitucionalidades no provimento de 04 (quatro) Conselheiros. 5.3.1 – Não-cumprimento da regra de prevalência e de proporcionalidade 69 5.3.2 – Não-escolha de Conselheiros dentre Auditores e Membros do Ministério Público Especial. 5.4 – Da Ação de Reclamação Perante o STF:5.4.1 – Possibilidade Jurídica e interesse processual. 5.4.2 – Legitimidade Ativa e Passiva. 5.4.3 – Conclusão:CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIAÍNDICE DOS QUADROS:
Quadro 1 - Normas da Const. Federal (X) Const. Estadual ao tratar dos Tribunais de Contas
Quadro 2 - Redação original da Constituição Estadual X a dada pela Emenda Const. n.º 06/93
Quadro 3 - Lei Orgânica do TCE-MT X Constituição Estadual X Constituição Federal
Quadro 4 - Processo de escolha de Ministro do TCU estipulado pelo artigo 105 da Lei n.º 8.443/1992
Quadro 5 - Composição atual (dezembro/2005) dos Conselheiros do TCE-MT
Quadro 6 - Procuradores do Ministério Público Estadual atuando no TCE-MT
Quadro 7 - Demonstrativo dos atos de escolha/indicação e de nomeação dos Conselheiros do TCE-MT
Quadro 8 - Conselheiros escolhidos após a Constituição Estadual de 1989após a C.E./89 que já foram aposentados e os que estão em exercício
Quadro 9 - Demonstrativo da proporcionalidade atual (dezembro/05) dos Conselheiros do TCE-MT
Quadro 10 - Vagas no Quadro de Conselheiros após a promulgação da Constituição Estadual de 1989 e Formas de Provimento
INTRODUÇÃO
Com a nova Constituição Federal de 1.988 sopraram ventos favoráveis à proteção de interesses coletivos, difusos, públicos, ou seja, políticas retrógradas e ineficientes começaram a dar lugar aos ares da modernidade, decorrentes, ainda, da recente industrialização do país.
Princípios como a moralidade e a transparência na gestão pública deixaram de ser utopia, para se tornarem exigência do modelo econômico vigente na atualidade.
Desta feita, o Brasil precisou iniciar profundas reestruturações nos poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, o que culminou na elaboração de diversas leis e, até mesmo, reformas, ainda, em andamento.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº101/2000) tornou inconcebível a administração pública sem controle, devendo os cortes de gastos públicos e a probidade administrativa serem prioridades na atualidade.
Necessário faz-se, ainda, enfrentar algumas questões que, durante muito tempo, se constituíram verdadeiros tabus, tal como, uma composição mais técnica dos Conselheiros dos Tribunais de Contas. Não se trata de desprezar a participação política, que se revela essencial, mas sim de promover um maior equilíbrio entre o critério técnico e o político, combinado à exeqüibilidade do mandamento constitucional.
Este estudo trata, prioritariamente, da nomeação e conseqüente composição do quadro de Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso que, frontalmente, infringe a Carta Magna, em face de não-nomeação de 2/3 dos Conselheiros escolhidos pelo Governador, dentre os cargos de Auditor e membros do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas.
Neste trabalho não será questionado se o procedimento de escolha de conselheiros previsto na Constituição Federal é justo ou não e ou qual seria a melhor forma de escolha dos Conselheiros do Tribunal de Contas.
O trabalho é dividido em quatro capítulos. No primeiro capítulo é abordada a jurisdição, a competência e a composição dos Tribunais de Contas.
No segundo capítulo, é feita uma comparação entre os procedimentos de escolha dos conselheiros determinados pela Constituição Federal e os estabelecidos pela Constituição do Estado de Mato Grosso, conjugado com a Lei Orgânica do Tribunal de Contas deste Estado.
Após esse confronto, é demonstrado, no terceiro capítulo, o principal motivo da inconstitucionalidade verificada no processo de escolha dos Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, derivada da omissão deste órgão em regulamentar o procedimento de escolha dos Conselheiros e inserir em sua estrutura organizacional os cargos de Auditor e Procurador junto ao Tribunal.
Em seguida, será demonstrada a situação atual: Da composição do quadro de Conselheiros existentes e análise dos procedimentos de escolha de cada um, mediante com o que determina a Constituição Federal.
Finalmente, serão apontadas na conclusão, as medidas necessárias para que sejam efetivados os preceitos constitucionais na composição dos Conselheiros do Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso.