5. pagamento do intervalo de refeição descumprido
Desde a edição da Lei nº 8.923, de 27/07/1994, inserindo o parágrafo 4º ao artigo 71 da CLT, a melhor interpretação quanto ao pagamento do intervalo de refeição descumprido sempre foi no sentido de pagar-se tão somente o período remanescente que poderia ser parcial ou total, conforme destaca Maurício Godinho [10] ao asseverar:
"Ora, isso significa que, desde 27.07.1994, o desrespeito ao intervalo mínimo intrajornada de 1 hora (ou de 15 minutos, em jornadas contínuas entre 4 e 6 horas diárias) implica o pagamento do período de desrespeito pelo empregador, como se fosse tempo trabalhado e acrescido do adicional de horas extras. No exemplo supra, relativo à jornada entre 8:00 às 16:00 horas, sem intervalo, o obreiro receberá o período de desrespeito, portanto, como se fosse tempo trabalhado e extraordinário (1 hora, no caso). Se o desrespeito for menor – apenas 30 minutos, por exemplo –, ele receberá tais minutos como se fossem tempo efetivo extraordinário laborado."
Ocorre que, o TST adotou uma interpretação mais restritiva ao editar, em 11/08/2003, a Orientação Jurisprudencial nº 307, in verbis:
"Nº 307 INTERVALO INTRAJORNADA (PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO). NÃO CONCESSÃO OU CONCESSÃO PARCIAL. LEI Nº 8.923/94 (DJ 11.08.2003)
Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não concessão total ou parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT)."
Depreende-se da interpretação consolidada pelo TST por meio de sua Seção Especializada em Dissídio Individuais que a remuneração do intervalo de refeição descumprido far-se-á mediante o pagamento integral do período correspondente, não levando em consideração o eventual cumprimento parcial, ou seja, ainda que a empresa conceda parcialmente o intervalo para refeição e descanso, porém, sem cumprir os requisitos legais, sujeitar-se-á ao pagamento integral do intervalo acrescido do adicional de 50%, destacando-se inclusive que o TST ignorou o fato de se tratar de multa para atribuir natureza salarial.
6. portaria nº 42/2007 do ministério do trabalho e emprego
Prestigiando o processo negocial e a atuação dos sindicatos na defesa dos interesses de seus representados, o Ministério do Trabalho e Emprego, em 28 de março de 2007, expediu a Portaria nº 42 de modo a simplificar o processamento e regulamentação legal atinente à redução do intervalo para repouso ou alimentação previsto no artigo 71 § 3º da CLT, deste modo, revogando a Portaria nº 3.116/89.
A novel Portaria em seus artigos 1º e 2º estabelece os seguintes requisitos:
- Celebração de convenção ou acordo coletivo de trabalho;A
B - aprovação em assembléia geral;
C – que os empregados não estejam submetidos a regime de trabalho prorrogado;
D - o estabelecimento empregador atenda às exigências concernentes à organização dos refeitórios e demais normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho; e
E - estabelecimento de cláusula que especifique as condições de repouso e alimentação que serão garantidas aos empregados, vedada a indenização ou supressão total do período (art. 2º).
Uma vez cumpridos os requisitos acima e depositado o instrumento normativo na Gerência Regional do Trabalho (antiga DRT), observadas as formalidades insculpidas no artigo 612 e seguintes da CLT, a empresa estará autorizada legalmente a usufruir da redução do intervalo intrajornada destinado à refeição e descanso.
Por óbvio, conforme inclusive prescreve a portaria em seu artigo 3º, a qualquer tempo, a Fiscalização do Trabalho poderá verificar in loco as condições em que o labor é exercido, principalmente sob o aspecto da segurança e saúde no trabalho, adotando as medidas legais pertinentes a cada situação encontrada e, se o caso, suspender a redução do intervalo até que haja a devida regularização referente ao descumprimento dos requisitos preconizados no já mencionado artigo 1º.
Interessante observar que a Portaria nº 42 é ato administrativo do Ministro do Trabalho e Emprego, ou seja, atende ao disposto no artigo 71 parágrafo 3º da CLT, o qual estabelece excepcionalmente a redução do intervalo mínimo de 1 hora destinado a repouso ou refeição, desde que haja autorização ministerial, hipótese, frise-se, excepcionada pelos próprios acórdãos que lastrearam a edição da orientação jurisprudencial nº 342.
Por pertinente, registramos o pensamento de Eduardo Gabriel Saad [11] que ao analisar referida orientação jurisprudencial enfatiza que:
"Temos pensamento em contrário à jurisprudência cristalizada nessa Orientação Jurisprudencial. Senão, vejamos tanto a doutrina como a maciça jurisprudência pesquisada afirmam invariavelmente, que a redução do intervalo intrajornada causa dano à saúde do trabalhador. Todavia, tal afirmação é feita sem esclarecer em qual estudo ou pesquisa cientifica está ela escorada. Ora, se fosse efetivamente prejudicial a saúde do trabalhador, jamais o legislador ordinário iria autorizar o Ministério do Trabalho e Emprego a reduzir esse intervalo de repouso e alimentação. Esta é a maior demonstração de que esta redução não causa dano à saúde por si só.
(...)
Esse nosso raciocínio, como já dito, não encontra, lamentavelmente, ressonância, atualmente, na jurisprudência do TST.
Com a edição da sobredita Portaria n. 42/2007, auguramos que o egrégio TST faça uma profunda revisão da Orientação Jurisprudencial SDI-1 n. 342, cancelando-a. Sublinhe-se que, não foi ainda discutida até este ano de 2007 no Supremo Tribunal Federal a questão de mérito relativa aos aspectos inconstitucionais da jurisprudencial contida na atual Orientação Jurisprudencial SDI-1 n. 342, do TST." (Grifamos)
7. CONCLUSÃO
Diante do quanto exposto, a priori, temos que a linha mestra da jurisprudência dominante do TST evolui para uma interpretação restritiva do disposto no artigo 71 da CLT sob o argumento básico de tratar-se de norma de ordem pública que objetiva a defesa da vida e da integridade dos trabalhadores, via de consequência não se sujeitando a eventual transação mediante negociação coletiva.
Entretanto, tal entendimento não elimina a exceção contida no parágrafo 3º do mencionado artigo, o que pressupõe a sua validade jurídica.
Dentro deste contexto, a questão a ser enfrentada é saber se a Portaria nº 42/2007 vai de encontro à orientação jurisprudencial nº 342 editada em junho de 2004.
Concessa venia, temos que referida portaria não contraria a OJ 342, uma vez que foi editada pelo Ministro do Trabalho e Emprego, que tem autoridade para tal, e de forma expressa impõe a observância de todos os requisitos legais necessários à garantia da incolumidade física e psicológica do trabalhador, sob pena de suspensão da redução do intervalo até a sua regularização, conforme previa a revogada Portaria nº 3.116/89.
A única diferença é que o Ministro do Trabalho e Emprego parte da premissa de que as partes interessadas (empresa e sindicato) têm maturidade e responsabilidade para celebrarem norma coletiva que atenda os interesses de ambas as partes, observados os requisitos legais, e, portanto, sem a necessidade prévia de aval da Fiscalização do Trabalho, ou seja, houve somente uma inversão operacional, sem que isto implique em descumprimento ao artigo 71 § 3º da CLT ou afronta à orientação jurisprudencial nº 342 do TST.
Em assim sendo, desde que observados os requisitos legais atinentes à redução de intervalo, não há se falar em infração administrativa e consequentemente na remuneração do intervalo de 1 hora com o adicional de 50%, não se olvidando que a matéria é de cunho constitucional e até a presente data não houve manifestação da Excelsa Corte.
Além disto, a interpretação dada pelo TST ainda é passível de modificação, a uma pela aposentadoria recente de vários ministros e posse de outros, o que deverá refletir no posicionamento jurisprudencial e a duas por não haver declaração de inconstitucionalidade do artigo 71 § 3º da CLT, até porque em sintonia com a garantia da higidez física e psicológica do trabalhador.
Outrossim, uma posição mais conservadora e sem qualquer risco futuro implica na implantação do intervalo de 1 hora para refeição e descanso, o que nem sempre atende aos aspectos operacionais da produção.
Notas
- Curso de direito de trabalho, 3ª ed., São Paulo: LTr, 2004, p. 918.
- Comentários aos precedentes normativos e às orientações jurisprudenciais do TST, 2ª ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 458.
- MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 141.
- DE OLIVEIRA, Francisco Antonio. Comentários aos precedentes normativos e às orientações jurisprudenciais do TST, 2ª ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 458.
- Curso de direito de trabalho, 3ª ed., São Paulo: LTr, 2004, p. 919.
- Processo nº TST–RR–60.869/2002-900-02-00.6, recorrente Marcel Rodrigues Rodrigues, recorrida Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S/A, 5ª turma, DJ 06/02/2004. Disponível em: <http://www.tst.jus.br>. Acesso em: 18 mar. 2009.
- Processo nº TST–E–RR–480.867/98.9, embargante Abase-Assessoria Básica de Serviços Ltda., embargado Manoelito Mendes Rodrigues, 5ª turma, DJ 27/08/2004. Disponível em: <http://www.tst.jus.br>. Acesso em: 18 mar. 2009.
- Júris Síntese IOB, CD-Rom nº 74, São Paulo: Editora Thomson-IOB, novembro-dezembro/2008.
- Júris Síntese IOB, CD-Rom nº 74, São Paulo: Editora Thomson-IOB, novembro-dezembro/2008.
- Curso de direito de trabalho, 3ª ed., São Paulo: LTr, 2004, p. 928.
- SAAD, Eduardo Gabriel et al. CLT comentada. 41ª ed., São Paulo: LTr, 2008, p. 160-161.