5. Espécies de contrato de leasing e suas aplicações empresariais
A doutrina nacional subdivide o contrato de leasing em quatro espécies distintas, quais sejam: leasing tradicional ou financeiro; lease back; leasing impróprio ou self leasing; e leasing operacional ou renting.
A seguir, analisaremos as características inerentes a cada tipo de leasing, demonstrando suas vantagens à empresa que dele se utilize, bem como as conseqüências jurídicas da celebração do contrato.
5.1. Leasing tradicional ou financeiro
O leasing financeiro é caracterizado quando o arrendador adquire bens de terceiros para alugá-los a uma pessoa, a fim de que ela os utilize, por prazo determinado, mediante pagamento de prestações periódicas, e tenha a opção de comprá-los, ao fim do período de locação, por meio do pagamento de um valor residual.
O valor residual garantido, quando não antecipado e cobrado juntamente com as prestações do contrato, geralmente é bem inferior ao valor de mercado do bem.
Este tipo de contrato de leasing é utilizado em larga escala junto à pessoas físicas consumidoras que, no intuito de adquirir automóveis ou bens de valor expressivo, tornam-se arrendatárias dos bens, para, ao final, exercerem seu direito de compra.
O saudoso professor de Direito Civil da USP, Dr. Carlos Alberto Bittar, in "Contratos Comerciais" (Ed. Forense Universitária, 1990, p. 112), explicita que:
"No leasing financeiro, ou puro, especializa-se a instituição na atividade de aquisição de bens de certos fabricantes, para colocação no mercado pelo sistema exposto, funcionando essa intermediação como impulsionadora das vendas dos produtos visados. Porque constitui ação de financiamento, é privativa das instituições do setor, sociedades anônimas que se sujeitam a controle próprio, em que se destaca a fiscalização do Banco Central, no qual se devem registrar. Exige-se-lhes departamento técnico especializado nas operações de leasing, ficando ademais as empresas subordinadas às regras próprias da lei que regula as instituições financeiras (Lei nº 4.595, de 31.12.64), inclusive o requisito de capital mínimo."
Resta nítido que o arrendante sempre será instituição financeira, interessada na contratação de leasing para gerar margem de lucro através dos juros cobrados ao arrendatário.
Quanto às vantagens mais relevantes para uma empresa arrendatária de um contrato de leasing financeiro, destacam-se o pequeno comprometimento de capital a curto prazo e a possibilidade de devolução do bem ao término do contrato, não necessitando comprar o bem já depreciado.
O leasing financeiro é expressamente previsto em toda a legislação sobre arrendamento mercantil já citada.
5.2. Lease back
Esta espécie de contrato de leasing é caracterizada quando o fornecedor e o arrendatário são a mesma pessoa, ou seja, o arrendatário, visando capitalizar-se, vende o bem a uma instituição financeira, para que esta arrende o mesmo à empresa então vendedora, ora arrendatária.
Pela perspectiva jurídica, o arrendatário só percebe vantagens, tendo em vista que, se previsto no contrato de compra e venda a obrigação do comprador arrendar o bem para o vendedor, o arrendatário jamais perderia a posse direta sobre o bem, podendo inclusive recomprá-lo ao final do contrato de lease back.
Quanto ao aspecto operacional, este tipo de contratação é mais interessante para empresas que incluam no objeto do contrato bens de grande valor, pois o aporte de capital inicial é considerável, visando a reestruturação econômica da empresa ou mesmo a expansão de suas atividades comerciais, desde que direcionado o capital aportado para tais fins.
É essencial à saúde financeira da empresa arrendatária que o bem arrendado seja fonte de renda, ajudando no custeio do contrato de lease back, caso contrário, o preço do contrato pode vir a se tornar excessivo frente ao orçamento empresarial, ensejando o crescimento do risco de inadimplência, que por sua vez gera todos os efeitos a ela inerentes, inclusive a busca e apreensão do bem pela arrendante.
O lease back encontra arrimo no Decreto-Lei nº 1.892/81, embasado jurisprudencialmente, pelo que citamos a ementa da Apelação Cível 90.01.03169-2/BA do Tribunal Regional Federal da 1ª Região:
"TRIBUTARIO. IMPOSTO SOBRE A RENDA. BENEFICIO FISCAL. DEC.-LEI N. 1.892/81. LEASE BACK (ARRENDAMENTO MERCANTIL).
1. O DEC.-LEI N. 1.892/81 NÃO IMPEDE QUE A EMPRESA VENDA O IMOVEL E CELEBRE, NO MESMO INSTRUMENTO, O CONTRATO DE LEASE BACK (ARRENDAMENTO MERCANTIL), COM OPÇÃO DE REAQUISIÇÃO, APOS O DECURSO DO PRAZO DE DEZ ANOS.
2. APELAÇÃO PROVIDA."
5.3. Leasing impróprio ou Self Leasing
O Leasing Impróprio ou Self Leasing é como um lease back travestido, isto é, uma empresa vende seus bens para outra sociedade do mesmo grupo econômico, que por sua vez arrenda os referidos bens à empresa vendedora.
A rigor, a legislação vigente só permite a venda e arrendamento de bens entre sociedades do mesmo grupo econômico, no conceito dado pelo art. 1.097. do Código Civil de 2002, nos casos de leasing financeiro, em que necessariamente há a figura de uma instituição financeira como arrendante.
Este tipo de contratação não é abarcado pela Lei nº 6.099/74, que o exclui de seus benefícios fiscais, expressamente no caput do art. 2º, qual seja:
"Art 2º Não terá o tratamento previsto nesta Lei o arrendamento de bens contratado entre pessoas jurídicas direta ou indiretamente coligadas ou interdependentes, assim como o contratado com o próprio fabricante."
Por sua vez, o art. 13. do Anexo I da Resolução nº 2.309/96 do CMN proíbe expressamente a contratação de self leasing, salvo em caso de leasing financeiro, senão vejamos:
"Art. 13. As operações de arrendamento mercantil contratadas com o próprio vendedor do bem ou com pessoas a ele coligadas ou interdependentes somente podem ser contratadas na modalidade de arrendamento mercantil financeiro, aplicando-se a elas as mesmas condições fixadas neste Regulamento."
A principal razão para a proibição legal é a possibilidade de se contornar limites legais para imobilização de capital e evitar o pagamento de tributos por uma instituição financeira arrendatária.
Quando as instituições financeiras adquirem bens através do arrendamento mercantil, o status jurídico de deter somente a posse, e não a propriedade do bem, permite que elas ultrapassem o índice máximo de imobilização estabelecido pelas instituições fiscalizadoras do regime bancário.
Apesar da vedação legal, muitas empresas, independentemente de serem instituições financeiras, se utilizam do self leasing para fins operacionais, vendendo seus bens a uma sociedade sem sócios em comum, que não integre o mesmo grupo econômico da vendedora (art. 1.097. do Código Civil de 2002), porém integrante de fato, com cláusula de arrendamento mercantil dos bens objetos da compra e venda.
Esta estratégia jurídica cria uma blindagem patrimonial à empresa arrendatária, pois em caso de execução patrimonial, ou mesmo ordem judicial que determine qualquer tipo de constrição dos bens da empresa, esta poderá provar que não possuem bens para satisfazer seus credores, restando inócua a ordem judicial pela dificuldade da constatação do self leasing (que aparentemente é um leasing tradicional ou operacional), preservando-se o patrimônio de fato da empresa devedora.
5.4. Leasing Operacional ou Renting
É um contrato de leasing que, além das disposições contidas no modelo de leasing tradicional, prevê cláusula de assistência técnica quanto aos bens arrendados.
Nesta espécie de leasing, o arrendante e o fornecedor do bem são a mesma pessoa, pelo que a lucratividade da arrendante é baseada primordialmente na verba obtida pela manutenção do bem e, em segundo plano, pelos juros e demais despesas incluídas nas parcelas do contrato de leasing.
Insta ressaltar que o arrendante não necessita ser uma instituição financeira nesta espécie de leasing.
Normalmente, o leasing operacional envolve bens que o arrendatário não tem interesse de adquirir, em função, por exemplo, da rápida obsolescência, como nos casos de bens de tecnologia, ou da sua necessidade apenas pelo período de vigência do contrato.
6 CONCLUSÃO
O contrato de leasing, por sua natureza, possui peculiaridades que trazem vantagens jurídicas e operacionais, tanto ao arrendante, como ao arrendatário, seja este pessoa física ou jurídica, consumidor ou não.
Percebe-se, no entanto, que a contratação das diversas modalidades de contrato de leasing no Brasil ainda se encontra inexpressiva frente à larga utilização deste tipo de instrumento jurídico em outros países, notadamente os de economia mais desenvolvida.
O ordenamento jurídico brasileiro ainda não tratou de consolidar uma legislação condensada e substancial acerca do contrato de arrendamento mercantil e suas implicações jurídicas, tanto no âmbito cível, como tributário e comercial.
Apesar de incentivos governamentais, notadamente no plano tributário, para as empresas que contratem por meio de leasing, este modelo de contratação só passará a ser utilizado exponencialmente a partir da edição de uma norma jurídica clara e objetiva sobre o tema, rechaçando a insegurança jurídica advinda da mercê do entendimento do Poder Judiciário quanto aos casos concretos que exsurgem do leasing.
Assim, por tratar-se de uma espécie contratual extremamente importante para a circulação de riquezas e para o incremento da economia, cabe ao Poder Legislativo disciplinar melhor a matéria para o avanço da contratação e produção econômica nacional.
Até que isto aconteça, toda empresa há de balancear o risco da contratação do leasing (fiscais, econômicos, operacionais e jurídicos) com as vantagens oriundas desta modalidade contratual.
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DE LEASING. Contrato de Leasing – Conceitos básicos característicos do arrendamento mercantil que devem constar dos contratos. Disponível em: https://www.leasingabel.com.br/site/. Acesso em 10 de mar. de 2009.
BITTAR, Carlos Alberto. Novos Contratos Empresariais. São Paulo: RT, 1990.
BITTAR, Carlos Alberto. Contratos Comerciais. São Paulo: Ed. Forense Universitária, 1990.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em https://www.stj.jus.br. Acesso em 10 de mar. de 2009.
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO. Disponível em https://www.trf1.jus.br. Acesso em 10 de mar. de 2009.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Contratos em Espécie e Responsabilidade Civil. São Paulo: Ed. Atlas, 2001.
Notas
1 Para fins de leitura, trataremos "empresa" independentemente de sua forma de constituição, somente destacando as conseqüências jurídicas quanto pertinente a cada tipo de sociedade, seja limitada, por ações, dentre outras.