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A representação eleitoral prevista no art. 30-A da Lei das Eleições.

Aspectos processuais e estudo sobre a constitucionalidade do dispositivo

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20/05/2009 às 00:00
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2 SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 30-A DA LEI ELEITORAL

As reformas promovidas pela Lei 11.300/2006 foram polêmicas desde a sua edição, iniciando o debate acerca da possibilidade de sua aplicação já para o pleito eleitoral daquele ano, tendo em vista o teor do art. 16 da Constituição Federal, conhecido como Princípio da Anualidade da Lei Eleitoral, que assim dispõe:

Art. 16 A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua aplicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.

Ora, se a lei foi editada em maio de 2006, ano no qual se realizaram as Eleições Gerais, não poderia, em hipótese alguma, ter sido aplicada para aquele pleito.

No mesmo esteio transcrevem-se as palavras de Adriano Soares da Costa (2006), in verbis:

A Lei nº 11.300/2006 foi editada no ano das eleições, razão pela qual não poderia ter eficácia para o pleito de 2006, por expressa determinação constitucional. [...]

Ora, essas normas disciplinam o processo eleitoral, não podendo ter a sua aplicação realizada no pleito de 2006, por evidente imposição constitucional. Lamentavelmente, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu, às vezes por maioria e outras à unanimidade, quais desses dispositivos editados seriam aplicáveis já nas eleições de outubro próximo, obviando a vedação constitucional, o que fará muitas ações desbordarem no Supremo Tribunal Federal, justamente sob a alegação de vacatio legis. A lei ingressa em vigor na data de sua publicação, mas não incide por determinação constitucional: seus efeitos ficam postergados por norma de sobredireito.

O TSE não tomou conhecimento do clamor constitucional, decidindo, através da Resolução 22.205/2006, quais dispositivos daquela Lei teriam aplicabilidade ao pleito de 2006, por considerar que estes não alterariam o processo eleitoral, mas apenas gerariam disciplina extra aos concorrentes.

Interessante observar que o art. 2º, da Lei 11.300/2006 já previu, desde logo, que caberia ao TSE regulamentar a aplicação das reformas ao pleito de 2006, o que se faz manifestamente em contradição ao princípio da anualidade previsto no art. 16 da Constituição Federal.

Considerando-se em especial a proximidade do pleito aliada à insegurança que poderia trazer novas alterações no processo eleitoral, nenhuma ação direta de inconstitucionalidade foi intentada, como assim relembra Fábio Luis Guimarães (2006):

Embora regulamentado o art. 2º da Lei nº 11.300/2006 pelo TSE, nenhum dos legitimados do art. 103 da Constituição Federal de 1988 animou-se a discutir a legitimidade constitucional desta regra. Em parte, pela insegurança que uma decisão agora traria ao processo eleitoral. Por outro lado, a deliberação altera parcialmente o processo eleitoral, para buscar uma igualação das forças econômicas que venham a atuar em prol de cada candidatura, cujo empreendimento parece receber "simpatia" popular suficiente para ser mantida.

Fato é que, nenhum dos legitimados perseguiram a inconstitucionalidade da Resolução 21.205/2006 do TSE, transformando a polêmica em fato consumado, em parte, pelos benefícios que as novas alterações idealizavam trazer ao processo eleitoral, em parte pelo apoio popular que teve a minirreforma política de 2006.

Em meio à polêmica discussão acerca da constitucionalidade da aplicação dos dispositivos da Lei 11.300/2006 às Eleições Gerais daquele ano, surgiu também a divergência a sobre a constitucionalidade do art. 30-A, que inovou ao criar nova possibilidade de perda de mandato eletivo, o que é discutido com maiores detalhes nos tópicos que seguem.

2.1 A Constitucionalidade do Art. 30-A da Lei Eleitoral

A discussão acerca da constitucionalidade do art. 30-A da Lei Eleitoral surge em decorrência do disposto no art. 14, §9° da Constituição Federal, que prevê:

Art. 14 omissis

[...]

§9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício da função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

Sendo a prescrição de casos de inelegibilidade concedidos somente à própria Constituição Federal ou à Lei Complementar, nos termos do supracitado dispositivo constitucional, resta discutir se a negação ou a cassação do diploma de que trata o §2º, do art. 30-A da Lei 9.504/97 é ou não caso de inelegibilidade, e, se não o for, qual a natureza jurídica de tal sanção.

Discussão semelhante foi suscitada em relação ao art. 41-A da Lei 9.504/97, incluída pela Lei 9.840/99, que instituiu a cassação do registro ou do diploma de candidato por captação ilícita de sufrágio, tendo o Supremo Tribunal Federal decidido pela constitucionalidade do art. 41-A, sob a alegação de que não se vê a aplicação da cassação do registro ou do diploma como forma de inelegibilidade, mas sim, mera sanção administrativa-eleitoral, sem aplicação de qualquer impedimento pretérito ou futuro para se concorrer a mandatos eletivos.

Desde os primeiros pleitos que se realizaram após a vigência do art. 41-A que o Tribunal Superior Eleitoral manteve o entendimento de que não havia no art. 41-A consubstanciada previsão de inelegibilidade, como se demonstra dos diversos arestos transcritos abaixo, em ordem cronológica:

(AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 3.042/MS – Rel. Min. Sepúlveda Pertence - Sessão 19.03.02)

CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (L. 9504/97, ART. 41-A) – REPRESENTAÇÃO JULGADA PROCEDENTE APÓS A ELEIÇÃO – VALIDADE DA CASSAÇÃO IMEDIATA DO DIPLOMA: INAPLICÁVEL O ART. 22, XV, DA LC 64/90, POR NÃO IMPLICAR DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE

(RESPE 21.248/SC – Rel. Min. Fernando Neves – Sessão 03.06.03)

Recurso especial - Investigação judicial - Prefeito - Abuso do poder - Art. 22 da Lei Complementar nº 64/90

Não-caracterização - Doação de telhas e pregos a eleitor - Captação vedada de sufrágio - Art. 41-A da Lei nº 9.504/97 - Configuração - Constitucionalidade - Cassação de diploma - Possibilidade.

Gravações clandestinas - Prova ilícita - Provas dela decorrentes - Contaminação.

Ausência de ofensa aos arts. 22 e 23 da Lei Complementar nº 64/90 e aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, da proporcionalidade e da não-admissão das provas ilícitas. Art. 5º, incisos LIV, LV e LVI, da Carta Magna.

[...]

6. A jurisprudência deste Tribunal Superior está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei das Eleições, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a imediata cassação de registro ou de diploma (Acórdãos nos 19.644 e 3.042).

(RCED 612/Distrito Federal – Rel. Min. Carlos Velloso – DJ 16.09.05)

ELEITORAL. ELEIÇÕES 2002. GOVERNADOR. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA (ART. 262, IV, C.C. OS ARTS. 222 E 237 DO CÓDIGO ELEITORAL). ABUSO DO PODER ECONÔMICO: INDÍCIOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA COM RECURSOS PÚBLICOS. PRELIMINARES. PRECEDENTES.

[...]

III - A jurisprudência da Corte está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a imediata cassação de registro ou diploma (Precedentes/TSE).

(RESPE 25215/RN – Rel. Min Caputo Bastos – DJ 09.09.05)

Art. 41-A da Lei nº 9.504/97. Constitucionalidade. Captação de sufrágio. Hipótese. Inelegibilidade. Não-configuração. Princípio da não-culpabilidade. Violação. Improcedência. Art. 22, VII, da Lei Complementar nº 64/90. Produção. Outras provas. Faculdade. Julgador. Condenação. Instâncias ordinárias. Reexame. Fatos e provas. Impossibilidade.

1. O entendimento consolidado nesta Casa é no sentido da constitucionalidade do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, entendendo-se que a cassação do registro ou do diploma prevista nessa disposição não implica declaração de inelegibilidade, na medida em que o escopo do legislador é o de afastar imediatamente da disputa aquele que, no curso da campanha eleitoral, praticou a captação de sufrágio vedada pela legislação eleitoral.

O Supremo Tribunal Federal pôs fim à controvérsia acerca da constitucionalidade do art. 41-A ao julgar ADI nº 3592-4, promovida pelo Diretório Nacional do Partido Socialista Brasileiro no ano de 2006. Naquele julgamento, o STF decidiu, à unanimidade, que as sanções previstas no art. 41-A não se constituem em novas hipóteses de inelegibilidades. O acórdão é transcrito abaixo:

(ADI 2662-2/DF – Min. Gilmar Mendes – Plenário 26.10.2006)

EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. Art. 41-A da Lei n° 9.504/97. Captação de sufrágio. 2. As sanções de cassação do registro ou do diploma previstas pelo art. 41-A da Lei nº 9.504/97 não constituem novas hipóteses de inelegibilidade. 3. A captação ilícita de sufrágio é apurada por meio de representação processada de acordo com o art. 22, incisos I a XIII da Lei Complementar n° 64/90, que não se confunde com a investigação judicial eleitoral, nem com a ação de impugnação de mandato eletivo, pois não implica a declaração de inelegibilidade, mas apenas a cassação do registro ou do diploma. [...] 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

Neste ponto faz-se necessária uma breve parada para que se justifique porque se analisar a constitucionalidade do art. 30-A a partir da declaração de constitucionalidade do art. 41-A da Lei Eleitoral. Os dispositivos são de todo semelhantes, conquanto culminam ao infrator penalidade de cassação do registro ou do diploma, se já outorgado, ambos foram instituídos através de lei ordinária, o que implica que ao art. 30-A será aplicada a mesma interpretação jurisprudencial atribuída ao art. 41-A, ou seja, que ele é constitucional, à medida em que não gera inelegibilidade, posto que somente tem como previsão a cassação do registro ou do diploma, mera sanção eleitoral, no entendimento do TSE e do STF.

Assim sendo, a partir da análise da jurisprudência do STF e do TSE em relação ao art. 41-A, por semelhança de situações, conclui-se pela constitucionalidade do art. 30-A.

2.2 A Inconstitucionalidade do Art. 30-A da Lei Eleitoral

Mas a discussão não deve parar nesse ponto. Tendo-se como base a teoria da inelegibilidade formulada por Adriano Soares da Costa, é de se afirmar, com todas as palavras, haver no dispositivo em tela, declaração de inelegibilidade, como se discutirá adiante, o que implica em inconstitucionalidade do art. 30-A (e mesmo do art. 41-A), por infringir o art. 14, §9º da Lei Magna.

De início é preciso que se façam breves considerações acerca do conceito de inelegibilidade.

Adriano Soares da Costa (2006) define inelegibilidade a partir de diversos ângulos. Em uma acepção preliminar aborda a inelegibilidade pelo seu caráter negativo, caracterizando-a como sendo o "estado jurídico de ausência ou perda de elegibilidade" (COSTA, 2006, p.217). Para ele as inelegibilidades podem ser classificadas em dois tipos distintos, quais sejam, inelegibilidade inata e inelegibilidade cominada. Esta última, por sua vez, pode ser dividida em cominada simples (para essa eleição) ou potenciada (para eleição futura).

Inelegibilidade inata, na conceituação de Marcos Ramayana (2005, p.137), "é aquela que advém da ausência de uma ou mais condições de elegibilidade". Em continuação afirma que "a classificação é muito criticada, porque equipara a condição de elegibilidade às inelegibilidades". Prossegue o doutrinador distinguindo a inelegibilidade cominada como sendo "uma restrição sancionatória aplicada em determinada eleição, em virtude da prática de fato com revestimento de ilicitude eleitoral".

Em relação às inelegibilidades cominadas pode-se dizer que a simples é aquela na qual se aplica um impedimento de participar do pleito atual, não se estendendo para as eleições futuras. Já a cominada potenciada prevê uma aplicação de inelegibilidade com extensão no tempo, podendo haver, em uma única situação, o acúmulo de casos de inelegibilidade cominada simples e potenciada.

Analisando por este prisma, tem-se que a inelegibilidade vem a ser qualquer impedimento que o nacional, alistável perante a Justiça Eleitoral, possua, que o impeça de concorrer a mandato eletivo, seja de caráter transitório, para aquela eleição, seja de caráter futurista, para eleições subsequentes.

Opera-se, a partir deste ponto, a constatação da inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei 9.504/97, dentre eles o art. 30-A, e de qualquer outra lei ordinária, que tenha como efeito a cassação do registro ou do diploma de candidato, posto que em desacordo com o contido no art. 14, §9º, da Constituição Federal, tendo como base fundamental a teoria das inelegibilidades construída por Adriano Soares da Costa(2006).

As palavras do próprio Adriano Soares (2006, p.222) ilustram as constatações feitas acima:

As espécies de inelegibilidade cominada, por sua veze (sic), combinam-se entre si, saturando a operatividade dêontica de sua construção legislativa. De fato, há a possibilidade de ser cominada a inelegibilidade para a eleição em que o fato ilícito se deu ("essa" eleição), sem percussão futura, como ocorre nas hipóteses de cassação do registro de candidatura na captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n° 9.504/97) ou nos casos de condutas vedadas aos agentes públicos (art. 73 da Lei n° 9.504/97).

Abordando especificamente a penalidade prevista no art. 30-A, Adriano Soares da Costa (2006) reafirma seu entendimento de que este é inconstitucional posto ser

inegável, portanto, que a sanção de cassação de diploma dos eleitos, ou o impedimento a que seja emitido em seu favor, é espécie de inelegibilidade cominada simples, razão pela qual o art. 30-A padece da mesma inconstitucionalidade do art. 41-A e do art. 73 da Lei n° 9.504/97.

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Joel José Cândido (2006, p.499) corrobora as mesmas opiniões, quando, ao analisar o art. 41-A e a sua inclusão no ordenamento jurídico afirma que

em relação à eventual cassação de registro ou do diploma, a Lei n° 9.840/1999 em nada melhorou o que já constava da lei anterior. Ao contrário, trouxe inconstitucionalidade que naquela não havia, à medida que a cassação do diploma erege-se em inelegibilidade, sanção política absolutamente incompatível com a lei ordinária.

Especificamente ao tratar do art. 30-A manifesta-se o renomado eleitoralista que o dispositivo foi instituído com o intuito de conferir vantagem maior ao ordenamento jurídico, mas, "ao contrário, trouxe problemas, pois, como se sabe, a sanção de inelegibilidade, mesmo que só para uma eleição, não pode jamais estar prevista em lei ordinária (CF, art. 14, §9º). Pois este inconveniente veio ocorrer aqui." (CANDIDO, 2006, p.470).

Thales Tácito Cerqueira (2008, p.782) assim se manifesta:

As inelegibilidades devem ser previstas no próprio texto constitucional ou em lei complementar, pois versam sobre restrições aos direitos políticos.

Não resta dúvida de que a cassação de registro ou diploma prevista na Lei n° 9.840/99 (arts. 41-A e 73 da Lei n° 9.504/97) são causas de inelegibilidades cominadas simples (para essa eleição).

Mais adiante, porém, o festejado doutrinador, inexplicavelmente se enverga a aceitar a constitucionalidade do art. 30-A, conforme se depreende do trecho transcrito abaixo:

Para evitar dúvida de constitucionalidade, entendemos que o §2º deve ser combinado com o §° do art. 30-A, ou seja, ser feito por representação (art. 96 da Lei n° 9.504/97 no tocante aos requisitos) mas com o rito da AIJE (art. 22 da LC n° 64/90) [...]

Com essas considerações, concordamos com a constitucionalidade do art. 30-A. (CERQUEIRA, 2008, p.837)

2.3 Análise do autor

Aparentemente não haverá trégua na discussão em curto prazo, até mesmo porque se observa uma construção sólida na teoria das inelegibilidades de Adriano Soares da Costa, em contraposição a uma jurisprudência eleitoral que, questionada, muitas vezes, reverte-se a cada eleição, em virtude da rotatividade dos membros dos órgãos dessa Justiça especializada.

Nas notas à 6ª edição de seu livro intitulado Instituições de Direito Eleitoral, Adriano Soares da Costa manifesta, de forma brilhante, acerca do atual status quo que se observa, ante a inércia do Legislativo Federal e a ânsia de atuação da Justiça Eleitoral.

[...] a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral iniciou a pôr em prática um projeto claro, objetivo e tenaz de suplantar esse estado de coisas, buscando dotar o ordenamento jurídico eleitoral de uma efetividade que ele não possuía, sobretudo, a partir do advento do inicialmente inofensivo art. 41-A da Lei n° 9.504/97, que foi transformado numa poderosa arma na busca de resultados concretos. A pedra de toque dessa mudança de rumos foi justamente a separação conceitual entre a sanção de inelegibilidade, prevista no regime da Lei Complementar 64/90, e a sanção de cassação de registro de candidatura, prevista na Lei das Eleições.

Esse divórcio conceitual foi a mais espetacular construção da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, em que pese a ausência de justificativa teórica sólida que a ensejasse. A diferença foi firmada com base numa tomada de posição autoritativa, ad hoc e dogmática, sem possibilidade de discussão ou argumentos em contrário. (COSTA, 2006)

Em que pese reconhecer a importância das decisões do TSE em sede de representações pelos arts. 41-A, 73 e outros, e, em breve, pelo art. 30-A, da Lei das Eleições, prefere optar este autor, pelo resguardo da ordem constitucional, que confere a cada poder sua autonomia e independência, devendo cada um deles exercer suas atribuições com eficácia e celeridade, para que outro não venha, a pretexto de suprir lacunas de competências alheias, ferir o princípio da separação dos poderes, insculpido no art. 2º da Constituição Federal.

Sem embargo, acredita este autor que se está diante de mais uma inconstitucionalidade criada pelo legislador, por ferir a previsão contida no art. 14, §9º, da Constituição Federal.


3 CONCLUSÃO

Como foi visto, as mudanças da Lei Eleitoral promovidas pela minirreforma política de 2006 foram significativas, impondo àqueles que se envolvem diretamente nos processos eleitorais, a obrigatoriedade de adquirir conhecimentos, por parcos que sejam, de administração financeira, sob pena de vir a prejudicar o candidato ao cargo eletivo, no caso de cometimento de irregularidade ante os dispositivos de arrecadação e aplicação de recursos de campanha.

Em que pese o descrédito de toda a sociedade em relação à ineficiência dos meios de fiscalização dos recursos aplicados nas campanhas eleitorais, percebe-se que há algo novo no processo eleitoral, tendo, a partir das eleições de 2006, a possibilidade de ser cassado registro, negado ou cassado diploma àqueles que vierem a infringir os dispositivos da Lei Eleitoral.

As mudanças que são esperadas com as alterações de 2006, devem ser compatíveis com aquelas que ocorreram com a inclusão do art. 41-A na Lei Eleitoral, que iniciou com imenso descrédito, e alcançou efetividade ao longo dos anos, tendo papel destacado no atual ordenamento jurídico brasileiro.

Ainda acerca do art. 30-A da Lei Eleitoral, o que se estende também ao estudo do art. 41-A, é de se concluir que os dois dispositivos não estão em conformidade com a ordem constitucional, uma vez que afrontam a previsão contida no art. 14, §9º, da Lei das Eleições, por terem implementado declaração de inelegibilidade por intermédio de lei ordinária, quando somente é permitido através de lei complementar. Mas a polêmica parece já estar consolidada em sede jurisprudencial, o que deverá ser mantido por algum tempo, até que fatos novos sejam acrescentados à discussão.

Conclui-se, portanto, pela inconstitucionalidade do dispositivo criado, alertando-se ainda nesse momento, a arriscada intervenção que o TSE tem promovido no ordenamento jurídico, o que pode ferir o princípio da separação dos poderes, de que trata o art. 2º da Constituição Federal.


4 REFERENCIAS

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SCHLICKMANN, Denise Goulart. Financiamento de campanhas eleitorais: um estudo comparativo das normas jurídicas – regulamentação da arrecadação, aplicação de recursos e prestação de contas à Justiça Eleitoral. Curitiba: Juruá, 2006.

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Sobre o autor
Francisco Márcio de Oliveira

Especialista em Direito Eleitoral pela UNISUL/LFG. Bacharel em Direito pela UERN Professor de Direito Eleitoral da Faculdade de Ciências e Tecnologia Mater Christi Servidor do TRE-RN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Francisco Márcio. A representação eleitoral prevista no art. 30-A da Lei das Eleições.: Aspectos processuais e estudo sobre a constitucionalidade do dispositivo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2149, 20 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12821. Acesso em: 27 abr. 2024.

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