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O trabalho infanto-juvenil proibido: prevenção e erradicação

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05/07/2009 às 00:00
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3 PREVENÇÃO E ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTO-JUVENIL PROIBIDO

O trabalho infanto-juvenil proibido, considerado aquele realizado por crianças e adolescentes com idade inferior a 16 anos não sofre incentivo apenas de questões econômicas, mas também dos padrões culturais.

Como foi dito no item 1.1, historicamente sempre houve uma grande preocupação com a delinqüência e a criminalidade de crianças e adolescentes, e o trabalho assim foi tido como meio de ocupar as crianças e evitar a ociosidade. Por isso, e inclusive hoje, o trabalho infanto-juvenil é visto por muitas pessoas não só com naturalidade, mas até como uma necessidade. Muito se ouve dizer que os pequenos devem aprender desde cedo a ter responsabilidades e a valorizar o que têm (ou não!), sendo o trabalho o melhor instrumento.

Essa percepção social é comum não só na zona urbana, mas principalmente na zona rural, onde o menor é engajado especialmente na pequena produção agrícola familiar.

De todo modo, o fato de que o trabalho infantil prejudica a criança ainda não é entendido pela família e pela sociedade e, assim, o combate a ele não tem ocupado o merecido lugar de destaque. Trata-se de um dogma fortemente enraizado na cultura de muitos povos, inclusive em nosso país, e que torna a realidade se não invisível, no mínimo ofuscada, dificultando a adoção e a cobrança de políticas públicas eficazes.

De qualquer sorte, muitos estudos vêm surgindo no mundo científico, no sentido de comprovar que o trabalho infantil traz inúmeros prejuízos ao desenvolvimento dos pequenos trabalhadores: baixa escolaridade, evasão escolar, baixa qualificação profissional, problemas físicos em decorrência de esforço físico acima do limite suportável, bem como por contato com produtos químicos etc., sem falar em traumas psicológicos pela baixa auto-estima e pela necessidade de adquirir maturidade antes do tempo devido.

Na realidade, as crianças trabalhadoras perdem a infância e todos os benefícios que esta lhes poderia proporcionar, deixando de ser crianças quando nem adultos podem ser.

A criança que trabalha não só tira o lugar de um adulto, como também fica impedida de receber educação e profissionalização suficientes para ocupar um futuro posto de trabalho com salário digno.

Dentro dessas idéias é que surgiram, a partir da década de 90, com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, mobilizações governamentais e não-governamentais para a prevenção e erradicação do trabalho infantil, como forma de combate à pobreza, de desenvolvimento da educação e de garantia dos direitos humanos, adquirindo status de questão social importante.

3.1 Estratégias e Mecanismos Institucionais de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil [27]

Dentre as estratégias e mecanismos instituídos pelo Governo, destaca-se a criação, em 1990, de um conselho federal e, a partir daí os conselhos estaduais e municipais, para defender os direitos da criança e do adolescente.

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) é de composição paritária, focaliza sua ação na implementação da política de atenção integral para a infância e a adolescência e tem por escopo: (i) elaborar normas gerais da política nacional para atendimento dos direitos da criança e do adolescente; (ii) apoiar os conselhos estaduais e municipais, órgãos estaduais e municipais e entidades não-governamentais, para dar eficácia às diretrizes estabelecidas pelo ECA; (iii) avaliar as políticas estaduais e municipais e a atuação dos conselhos estaduais e municipais; (iv) acompanhar as estruturas públicas e privadas destinadas ao atendimento das crianças e adolescentes, propondo, quando necessário, modificações; e (v) gerir o Fundo nacional para a criança e o adolescente, estabelecido pelo art. 6º do ECA.

No âmbito do trabalho, as principais diretrizes são: (i) a erradicação do trabalho infantil para os menores de 14 anos; (ii) a proteção do adolescente trabalhador; (iii) a promoção de ações de fiscalização; e (iv) o estímulo aos programas de geração de renda.

Os Conselhos Estaduais e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente são autônomos, de composição paritária e têm por função principal: (i) deliberar e formular uma política de proteção integral da infância e da juventude; e (ii) articular os diversos órgãos públicos com a iniciativa privada, para instituir um sistema de proteção integral. O Conselho Tutelar atua na órbita municipal como órgão permanente e autônomo, não-jurisdicional, de natureza predominantemente operativa.

Destaca-se, ainda, a criação, em 1994, do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), que constitui o mais amplo e importante espaço de discussão, especialmente por seu caráter democrático, e tem por principal objetivo discutir as ações sugeridas para prevenir e erradicar o trabalho infantil e para dar cumprimento à legislação nacional que proíbe o trabalho a menores de 16 anos de idade, como também intervir em áreas com concentrado número de crianças trabalhando em atividades que comprometam sua freqüência na escola. O Fórum viabiliza uma melhor articulação entre as diversas organizações governamentais e não-governamentais na atuação contra o trabalho infantil.

3.2 Ações, Planos e Programas [28]

3.2.1 Governamentais

Na área da educação, diversos programas estão sendo desenvolvidos pelo Governo Federal, dos quais cita-se os seguintes: "Toda Criança na Escola", "Educação Profissional Básica", "Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental", "Alfabetização de Jovens e Adultos", "Aceleração da Aprendizagem", como também o "Plano de Valorização do Ensino Fundamental e do Magistério", este último visando melhorar a qualidade de ensino.

De outro lado, o Ministério da Saúde, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), vem buscando adotar medidas que alertam as famílias, a sociedade e os próprios jovens sobre a nocividade do trabalho precoce. Além disso, juntos, os Ministérios da Saúde, do Trabalho, da Educação e do Desporto e as agências governamentais de fomento à pesquisa (CNPq, CAPES, FINEP) firmaram um termo de compromisso técnico para apoiar projetos e pesquisa sobre o trabalho infantil, para, a partir desses estudos, tornar efetivas as ações de atenção à saúde das crianças e dos adolescentes trabalhadores.

No que diz respeito à assistência social, da mesma forma, vem sendo desenvolvidos programas direcionados ao combate ao trabalho infanto-juvenil proibido. São eles: o "Programa Brasil Criança Cidadã", que é composto pelo "Programa de Erradicação do Trabalho Infantil" (PETI), este com especial atenção ao trabalho em zonas rurais, e ao trabalho infantil executado em atividades perigosas, penosas, insalubres ou degradantes. O PETI é um programa de transferência direta de renda do Governo Federal para famílias de crianças e adolescentes envolvidos no trabalho precoce e está sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Outra importante atuação do Governo Federal foi a instituição do "Bolsa Criança Cidadã", programa que busca criar condições materiais para que as famílias pobres possam prover suas necessidades básicas e permitir o ingresso ou o regresso das crianças e dos adolescentes trabalhadores à escola. Os requisitos exigidos são a freqüência regular ao ensino formal e às atividades socioeducativas oferecidas no período complementar, e o abandono da atividade laboral.

Nessa linha de combate ao trabalho infantil, cabe referir, ainda, o "Programa Nacional de Direitos Humanos" (PNDH), que é um conjunto de medidas para proteger a integridade física, o direito à liberdade e o direito à igualdade perante a lei, e que contempla iniciativas que fortalecem a atuação das organizações da sociedade civil para criar uma cultura de direitos humanos. Da mesma forma, não se pode deixar de citar o "Programa Comunidade Solidária" que foi criado como uma estratégia de combate à fome, à miséria e à exclusão social, sendo que as famílias são beneficiadas, ainda, pelo "Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos", que também ataca os problemas de subsistência.

3.2.2 Não-Governamentais

Muitas das ações de combate ao trabalho infantil estão sendo, hoje, feitas em parceria com entidades da sociedade civil, dada a dimensão do problema e seus enormes desafios.

O "Conselho da Comunidade Solidária", por exemplo, está sendo viável em razão da parceria estabelecida entre o Ministério da Justiça, o CONANDA e o UNICEF. Ele procura identificar os pontos de resistência à implementação do ECA e a valorizar os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tutelares.

Outro importante programa é o chamado "Programa Empresa Amiga da Criança", desenvolvido pela Fundação Abrinq, criada em 1990 pela Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos. Veja-se:

O Programa incentiva o investimento social privado em ações para a infância e adolescência e apóia as empresas na qualificação de suas ações, para que estejam em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente.

(...)

Ao ser reconhecida como "Amiga da Criança", a empresa pode utilizar o selo em suas embalagens e demais materiais de divulgação - como site, papelaria, notas fiscais, adesivos, cardápios, etiquetas, luminosos, sacolas, malas diretas, banners e anúncios, entre outros. [29]

Vale ressaltar que a Fundação Abrinq lançou uma máxima aos empresários, no sentido de que se as empresas têm responsabilidade na exploração da mão-de-obra infantil, serão também co-responsáveis pela sua erradicação.

3.2.3 Em Nível Internacional

Não se poderia deixar de mencionar, também, que em nível internacional, 71 chefes de Estado e representantes de 80 países assumiram o compromisso, durante o Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, realizado em 1990, na sede das Nações Unidas, assinando a "Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, a Proteção e o Desenvolvimento da Criança", comprometendo-se a implementar a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças. Consta nesse documento, no 20º item, o seguinte:

Concordamos em agir conjuntamente, em cooperação internacional - assim como em nossos respectivos países. Comprometemo-nos agora a cumprir um programa de dez pontos para a proteção da criança e para a melhoria de sua condição de vida:

(...)

(6) Trabalharemos por programas de redução do analfabetismo, e que garantam oportunidades educacionais para todas as crianças, independentemente de sua origem e sexo; que preparem a criança para o trabalho produtivo e para as oportunidades de aprendizagem para toda a vida, isto é, pela educação profissionalizante, e que permitam que a criança cresça até a idade adulta num contexto cultural e social propício e protetor. [30]

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Sem a pretensão de esgotar a abordagem desses planos, programas e ações que vem sendo desenvolvidos em prol da erradicação do trabalho infanto-juvenil proibido, o que, de fato, trata-se de assunto que deve ser discutido cada vez mais pela comunidade internacional, e incentivados os acordos bilaterais ou multilaterais que visem o combate a esse mal que acomete o mundo, hoje globalizado, destaca-se, finalmente, o "Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC)", vinculado à OIT e implantado no Brasil desde 1992. Segundo consta no portal da OIT, nos 10 primeiros anos de atuação do IPEC, mais de 800.000 crianças foram retiradas do trabalho, em função de uma mobilização social que envolveu Governos Municipais, Estaduais e Federal, demais Entidades do Poder Público, Organizações de Trabalhadores, Organizações de Empregadores, demais Entidades da Sociedade Civil Organizada, Movimentos Sociais e Organismos Internacionais. [31]

Por fim, impõe-se fazer referência à notícia publicada no dia 19 de junho do corrente ano, no portal da OIT, acerca do acordo interinstitucional firmado entre a Câmara dos Deputados e a Organização Internacional do Trabalho para o desenvolvimento de ações conjuntas destinadas à prevenção e eliminação do trabalho infantil. Segundo a Diretora do Escritório da OIT no Brasil, Laís Abramo, livrar o país do trabalho infantil significa "priorizar a educação e apoiar a implementação efetiva do Plano de Desenvolvimento da Educação, para que a educação das crianças e adolescentes seja de qualidade e em tempo integral". [32]


CONCLUSÃO

A exploração da mão-de-obra infanto-juvenil é fato. Tem raízes que se prolongam por todo o território do nosso país, muito embora mais arraigadas em algumas regiões, como aquelas onde se concentra o maior índice de miséria.

Famílias inteiras dependem do esforço conjunto de todos os seus membros. Não lhes sobra opção de escolha entre o "luxo" da educação e a necessidade de sobrevivência. Assim, crianças e adolescentes são levados a ingressar no mundo adulto do trabalho para ter um prato de comida, às vezes nem isso, sofrendo as conseqüências do labor penoso, degradante e, porque não dizer, cruel.

A realidade é esta e precisa ser enfrentada com muito empenho por toda a sociedade, se pretende um futuro digno para todos, distante da pobreza, da marginalidade, da discriminação, da criminalidade, enfim, uma vida diferente para as novas gerações que estão por vir.

Muito se tem feito nas últimas duas décadas, não se pode negar. Tem-se hoje uma Constituição que confere a todas as crianças e adolescentes status de cidadãos credores de proteção em caráter absoluto e prioritário. Trata-se de garantia amparada nos princípios da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito, e da proteção integral, e que iluminam e orientam a legislação ordinária, as decisões judiciais, os atos governamentais, de execução de políticas públicas, sociais e de fiscalização, dando o apoio necessário na luta em combate à prevenção e à erradicação desse mal que caminha junto com outras dificuldades por que passa, atualmente, o nosso país.

Não se pode deixar, também, de enaltecer o trabalho que vem sendo realizado pelo Ministério Público do Trabalho, que criou, no ano 2000, a Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente, e que tem o apoio e a parceria de instituições como a OIT, UNICEF, Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público Federal, entre outros.

No entanto, é preciso haver, ainda, uma maior conscientização de toda a comunidade brasileira, no sentido de que o dever expresso no artigo 227 da Constituição da República é, realmente, um dever não só da família, mas também da sociedade e do Estado, ou seja, é preciso um esforço conjunto e irrestrito para que todas as crianças e adolescentes tenham condições de usufruir de uma infância e de uma adolescência dignas, com amplo acesso à educação, à saúde, ao lazer, à profissionalização, à cultura, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Às crianças e aos jovens de hoje e de amanhã é preciso dar condições favoráveis ao seu completo desenvolvimento físico, moral, psicológico, intelectual e emocional, para que se alcance, tanto quanto possível, o ideal de justiça social, a paz e a felicidade tão almejados por todos. É louvável o esforço despendido até aqui, mas é preciso mais, muito mais!

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Sobre a autora
Gaysita Schaan Ribeiro

Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos / UNISINOS (1992). Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela UNISINOS (2009). Pós-graduanda em Direito Imobiliário Aplicado pela Escola Paulista de Direito / EPD. Pós-graduanda em Direito Digital pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul / FMP. Inscrita na OAB/RS sob n.º 31.724. Sócia de Schaan Advogados Associados S/S. Membro do Comitê Público da ANPPD®. Membro da Comissão Especial de Proteção de Dados e Privacidade da OAB/RS Subseção Canela/Gramado-RS. CV: http://lattes.cnpq.br/1823639803996519

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Gaysita Schaan. O trabalho infanto-juvenil proibido: prevenção e erradicação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2195, 5 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13093. Acesso em: 22 nov. 2024.

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