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Lançamento por homologação: abordagem acerca do "dies a quo" da decadência tributária

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01/10/2000 às 00:00
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1 - PROLEGÔMENOS.

O presente trabalho intenta trazer a lume uma análise interpretativa acerca dos enunciados normativos que tratam da decadência do direito de lançar tributo sujeito a lançamento por homologação, enfocando, especificamente, a definição do termo inicial para a contagem do prazo decadencial nas exações cuja apuração e quantificação do quantum debeatur obedecem ao procedimento acima aludido.

Tendo em conta o atual momento da civilização, onde as relações econômico-financeiras merecedoras de tratamento tributário se dão em níveis crescentes, tanto de ocorrência, quanto de complexidade, e, outrossim, haja vista o notório desaparelhamento da máquina arrecadatória estatal, despreparada para identificar com segurança e precisão a concreção das hipóteses de incidência tributária, o lançamento por homologação logrou alcançar um estágio de crescente importância, podendo-se inclusive identificá-lo como a regra geral para a efetiva contextura factual, comprazendo-se o nominado lançamento de ofício a restritas situações corporificadas em espécies particulares de impostos e/ou na sua aplicação subsidiária por conta da invalidade/inexatidão da atividade antecipadora do contribuinte.

Do quadro acima alinhavado pode-se inferir a importância do tema escolhido, pois, em sendo a decadência uma forma extintiva do crédito tributário (CTN, art. 156, inc. V), ultimada pela inércia da administração ao não proceder, em tempo hábil, a sua constituição, a definição do dies a quo para a contagem da dilação legal enseja o aparelhamento do aplicador do direito com vistas ao alcance da diretiva normativa vincada ao acatamento do princípio da segurança jurídica, o que, sobremaneira, interessa ao contribuinte que, assim, ver-se-ia afastado de uma situação de indefinição, verdadeira "espada de Dâmocles", configurada na perene possibilidade de ver-se coagido ao cumprimento de uma obrigação eternizada.


2 - PLANO DA EXPOSIÇÃO.

A fim de alcançar o objetivo traçado, inicialmente procuraremos definir o lançamento passando ao largo das discussões acerca da sua natureza (com acatamento da teoria que o define como ato e procedimento jurídicos) e apresentando as espécies elencadas no vigente Digesto Tributário.

A seguir abordaremos sucintamente a decadência nas lindes tributárias, conceituando-a e identificando o alcance da sua corporificação até o momento da ocorrência do ato jurídico-administrativo do lançamento.

Posteriormente alistaremos os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais relativos à decadência nos lançamentos por homologação, com destaque para a orientação interpretativa dada à matéria por iterativas decisões do Egrégio Superior Tribunal de Justiça e às severas críticas que tal lineamento vem recebendo pelos nossos mais autorizados tributaristas.

Entronizados com os posicionamentos estabelecidos nos itens anteriores, estabeleceremos o nosso entendimento sobre o assunto, indicando sobremaneira o dies a quo do lapso decadencial nos chamados lançamentos por homologação.

Ao cabo, concluiremos o esforço laborativo-intelectual apresentando as nossas inferências sobre a temática desenvolvida.


3 - DO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO.

Nascida a obrigação tributária com a ocorrência do fato gerador(1), aproposita-se à administração a necessária realização de um ato que a individualize, trazendo à monta a caracterização do fato e sua subsunção à norma (identificação da matéria tributável), determinando o sujeito passivo vinculado à relação jurídica e, finalmente, quantificando a prestação pecuniária, tudo isso sob os auspícios de um devido procedimento administrativo regulador da sua produção. O ato em referência consubstancia-se no lançamento tributário, definido pelo CTN, em seu artigo 142, nos seguintes termos:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

Alberto Xavier, ao propor uma definição de lançamento afirma ser o ato administrativo de aplicação da norma tributária material que se traduz na declaração da existência e quantitativo da prestação tributária e na sua conseqüente exigência(2), ilação vergastada por Souto Maior Borges que entende não apropriada a sua designação como ato de aplicação do direito na medida em que não consegue captar um outro aspecto do fenômeno: a função de criação do direito(3). É de observar, no entanto, que o eminente Professor pernambucano não afastou a caracterização do lançamento como ato administrativo, verberando tão-somente a insuficiência da definição proposta por entender que o fenômeno do lançamento tem um alcance mais dilargado, notadamente no que pertine ao procedimento inerente à sua formalização. É esse posicionamento doutrinário do ínclito mestre nordestino que serve de mote à definição de lançamento proposta neste trabalho, uma vez que, inobstante a existência de um ato administrativo a especificar o conteúdo da obrigação tributária, esse só poderá ser alcançado se a administração tributária cumprir o iter legalmente adotado(4), donde avulta a duplicidade conceitual do lançamento, qual seja, de ato e de procedimento administrativos.

Emerge do exposto, outrossim, a natureza declaratória do lançamento e, por decorrência, o equívoco daqueles que defendem uma pretensa natureza constitutiva do ato em desate, limitando-se a uma interpretação literal do dispositivo destacado, cuja atecnia(5) é contundente, pois, conforme vimos, a obrigação nasce com a ocorrência do fato gerador, limitando-se o lançamento a individualizar os seus componentes (vínculo jurídico, sujeitos e prestação), tornando exigível o crédito tributário.

3.1 - MODALIDADES DE LANÇAMENTO.

O vigente digesto tributário elenca três espécies de lançamento, tendo em vista o grau de participação do sujeito passivo no seu procedimento de formação, quais sejam: o lançamento por declaração, o lançamento de ofício e, finalmente, o lançamento por homologação.

O lançamento por declaração é aquele que vincula a autoridade administrativa a desincumbir-se do mister de lançar (de ofício) tão-somente após o sujeito passivo (ou terceiros legalmente obrigados) prestar a declaração necessária a identificar a matéria de fato que a lei do tributo considere relevante a fim de que a Fazenda Pública efetivamente quantifique o crédito, ou seja, pressupõe a colaboração do particular com a administração tributária. A declaração fornecida pelo sujeito passivo (ou por terceiros) consubstancia-se em obrigação formal ou instrumental (obrigação acessória para o CTN, art. 113, §2º), haja vista consistir em obrigação de fazer lato sensu em prol da arrecadação ou fiscalização tributárias.

Até o advento do Decreto-lei nº 1.967/82, o exemplo clássico de lançamento por declaração era o do Imposto sobre a Renda, que passou a se sujeitar ao lançamento por homologação(6), cabendo fazer menção ao Imposto Sobre Transmissão inter vivos de Bens Imóveis e Direitos a eles relativos, bem como o Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural, a título exemplificativo de tributos sujeito à modalidade de lançamento ora aludida.

A segunda modalidade de lançamento, qual seja, o lançamento de ofício, também chamado direto, patenteia-se como sendo aquele em que a autoridade administrativa ultima a sua efetivação sem qualquer participação do sujeito passivo, haja vista deter o Fisco as informações capazes de identificar a ocorrência do fato gerador e pormenorizar os demais aspectos da incidência tributária.

No tratamento dado pelo Código Tributário Nacional acerca do lançamento, vislumbra-se majoritariamente o caráter de complementariedade/subsidiariedade dessa modalidade, uma vez que o artigo 149 do citado estatuto material oportuniza identificar hipóteses em que se perfazem ao lançamento direto por conta da insuficiência, inexatidão, omissão, dolo, fraude ou simulação no cumprimento das atividades exercidas com vistas aos lançamentos por declaração e homologação, quais sejam, a prestação de informações fidedignas e a realização de atividades voltadas à apuração do montante do tributo, respectivamente.

O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores e o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana configuram-se como exemplos clássicos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício previsto no artigo 149, inciso I, do CTN.

Por fim, calha traçar breves comentários acerca do denominado lançamento por homologação, previsto no art. 150, caput, do CTN, e que se lastreia em ato homologatório da autoridade administrativa acerca da atividade anteriormente exercida pelo sujeito passivo, cuja efetividade pode culminar na antecipação do pagamento do tributo, sob os auspícios de expressa autorização legal(7), antevendo-se, portanto, que o grau de participação do particular nesta espécie de lançamento atinge nível de suficiência capaz de compor a pretensão tributária, limitando-se a autoridade administrativa competente tão-somente a uma atividade de controle a posteriori do procedimento de apuração exercido.

Vislumbrou o legislador tributário, com a criação do lançamento por homologação, uma forma de contornar a problemática da estrita vinculação do ato de lançamento à autoridade administrativa (daí a impossibilidade no direito pátrio de se falar no impropriamente denominado "autolançamento"(8)) a despeito da existência de tributos cuja natureza exige a sua apuração, quantificação e, conforme o caso, o seu recolhimento, sem prévia manifestação da administração (exs.: tributos sujeitos à retenção na fonte e os impostos indiretos, tais como o ICMS e o IPI). A doutrina, no entanto, quase que unissonamente(9), denuncia a insuficiência da construção normativa engendrada pelo legislador tributário, identificando contradições e incoerências no tratamento da matéria, conforme pode-se inferir da análise dos excertos seguintes:

"O conjunto de normas que o Código dedicou ao lançamento por homologação só cria perplexidades, em face de disposições nas quais infirma as premissas nas quais teria de buscar apoio(10)."

"Em conclusão do que se expôs verifica-se que nunca há lugar a um verdadeiro lançamento na figura do "lançamento por homologação": não há lançamento no "auto-lançamento" pretensamente efetuado pelo contribuinte, como pressuposto do pagamento, pois não existe um ato administrativo; não há lançamento na "homologação expressa", pois essa nada exige, apenas confirma a legalidade de um pagamento efetuado, a título de quitação; e não há lançamento na "homologação tácita", que também não é um ato administrativo, mas um simples silêncio ou inércia produtor de efeitos preclusivos(11)."

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Apesar de reconhecer estarem as críticas supracitadas muito bem fundamentadas pelos autores destacados, não nos cabe, nos limites determinados neste trabalho, aprofundar a temática, bastando para tanto unicamente lobrigar a regulamentação substancial dessa matéria com fincas a estabelecer um delineamento lógico-sistemático que oriente o intérprete no momento de se identificar o dies a quo da contagem do prazo decadencial.


4 - A DECADÊNCIA NO DIREITO TRIBUTÁRIO.

A decadência é um instituto de direito material que traz em seu bojo a ação deletéria do tempo em relação a direito potestativo(12) por conta da incúria de seu titular, ultimando a plena realização do princípio da segurança do direito, ditado pela manutenção da estabilidade das relações jurídicas, e em prol do interesse pela preservação da harmonia social. Trata-se inequivocamente de uma fiel concretização do vetusto brocardo latino dormientibus non sucurrit jus.

Na messe tributária a decadência se evidencia pela preclusão do direito do sujeito ativo da relação obrigacional vir a praticar o ato administrativo de lançamento, culminando na extinção do crédito fiscal, em decorrência da sua inatividade no prazo estipulado. Do exposto, salta aos olhos ser o lançamento o "divisor de águas" a traçar o átimo limiar entre a decadência e a prescrição, uma vez que a partir dele só se pode cogitar da contagem de prazo prescricional, revelando-se como decadencial a dilação anterior. Nesse sentido calha destacar o seguinte excerto do inesquecível Fábio Fanucchi, verbis:

A decadência pode ser bem distinguida da prescrição tributária, pois têm início em instantes diversos. A cogitação de decadência principia com o fato gerador verificado materialmente; a de prescrição, com a declaração formal dessa verificação.(13)

A matéria, no ordenamento jurídico-tributário pátrio, exige tratamento específico via espécie legislativa qualificada pelo quorum privilegiado da maioria absoluta (art. 146, inciso III, alínea "b", da CR/88), deslindado pelo Código Tributário Nacional (recepcionado com o status de Lei Complementar) em seus artigos 173 e 150, conforme transcrição a seguir:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos, contados:

I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;

II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.

Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.

§ 1º omissis

§ 2º omissis

§ 3º omissis

§ 4º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

Em vista dos enunciados normativos aqui especificados, acaso a administração tributária não realize a contento o ato de lançamento no prazo estipulado, forçosamente estará extinto o crédito tributário (art. 156, inciso V, do CTN), nascendo, concomitantemente, o direito do sujeito passivo a repetir o indevido pagamento vinculado ao cumprimento de uma prestação caduca(14). Observe-se, por complemento, que a decadência tributária não diverge da prescrição no que concerne aos efeitos da sua configuração, haja vista que o dispositivo acima mencionado estabelece a extinção do crédito tributário em ambas, ou seja, tanto a decadência como a prescrição evidenciam o surgimento de direito à repetição do pagamento indevido(15), afastando-se, por ser cabível tão-somente nas cercanias do direito privado, a construção doutrinária que expunge com veemência tal hipótese(16).


5 - MANIFESTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS e DOUTRINÁRIAS.

Conforme previsto no plano de exposição deste trabalho, iremos destacar a diretiva jurisprudencial atualmente seguida pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, a qual pontifica como início da contagem do prazo decadencial no lançamento por homologação o primeiro dia útil do exercício seguinte ao em que se extinguiu o direito potestativo de a administração rever ou homologar a atividade exercida pelo sujeito passivo. Nesse sentido desponta sobranceiro o aresto prolatado em sede do Recurso Especial nº 58.918-5-RJ, relatado pelo eminente Ministro Humberto Gomes de Barros, cuja ementa segue transcrita:

TRIBUTÁRIO – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO – DECADÊNCIA – PRAZO (CTN ART. 173).

I – O Art. 173, I do CTN deve ser interpretado em conjunto com seu Art. 150, § 4º.

II – O termo inicial da decadência prevista no Art. 173, I do CTN não é a data em que ocorreu o fato gerador.

III – A decadência relativa ao direito de constituir crédito tributário somente ocorre depois de cinco anos, contados do exercício seguinte àquele em que se extinguiu o direito potestativo de o Estado rever e homologar o lançamento (CTN, Art. 150, § 4º).

IV – Se o fato gerador ocorreu em outubro de 1974, a decadência opera-se em 1º de janeiro de 1985.

Ao proferir o seu voto o insigne relator expôs a tese que fundamentou o seu entendimento sedimentado nos seguintes argumentos:

"...

Examinado isoladamente, o texto legal deixa margem a duas interpretações.

Com efeito, a utilização do verbo poder, em seu modo condicional, autoriza o entendimento de que o prazo começa a partir do momento em que seria lícito à administração fazer o lançamento. Por igual, o termo "poderia", permite dizer que o prazo somente começa , depois que já não mais é lícita a prática do lançamento.

A dificuldade desaparece, quando se examina o Art. 173, em conjunto com o preceito contido no art. 150, § 4º do CTN.

O Art. 150 trata do lançamento por homologação.

Seu parágrafo 4º estabelece o prazo para a prática deste ato.

Tal prazo é de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador.

O Parágrafo 4º adverte para a circunstância de que, expirado este prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se definitivo o lançamento.

Vale dizer que o lançamento apenas de pode considerar definitivo em duas situações:

a - depois de expressamente homologado;

b - cinco anos depois de ocorrido o fato gerador, sem homologação expressa.

Na hipótese de que agora cuidamos, o lançamento poderia ter sido efetuado durante cinco anos, a contar do vencimento de a cada uma das contribuições.

Se não houve homologação expressa, a faculdade de rever o lançamento correspondente a mais antiga das contribuições (outubro/74) estaria extinta em outubro de 1979.

Já a decadência ocorreria cinco anos depois "do primeiro dia do exercício seguinte" à extinção do direito potestativo de homologar (1º de janeiro de 1980). Ou seja: em primeiro de janeiro de 1985.

Ora, a inscrição da dívida verificou-se em maio de 1983 (cf. fl. 47).

Não houve decadência.

Provejo o recurso, para que a execução retome seu curso."

O juízo expendido na decisão destacada malfere frontalmente a linha normativa fincada na contagem qüinqüenal do prazo decadencial tributário, uma vez que ocorrido o fato gerador restaria à autoridade administrativa competente em aditamento ao prazo para homologação da atividade de pagamento antecipado pelo sujeito passivo, cinco anos, contados do primeiro dia útil do exercício seguinte ao do término do prazo anterior, para efetivamente lançar o tributo, o que ao final computaria, no mínimo, dez anos de dilação a fim de que se extinguisse o direito potestativo da administração tributária. No entanto, ele tem alcançado anuência tanto em sua Corte de origem como nos Egrégios Tribunais Regionais Federais.

Ao reverso da ilação propugnada no aresto em questão, a doutrina vem veementemente identificando incoerências e ilogicidades em sua base argumentativa, pugnando, conseqüentemente, pela sua profligação. Nesse sentido, tendo em vista os seus arrazoados, bem como a coerência e profundidade expositiva, destaco os seguintes trechos de artigos doutrinários:

"A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do artigo 150 determinar que se considera "definitivamente extinto o crédito" no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar "definitivamente extinto o crédito"? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer a sua "ressurreição" no segundo.

Bem melhor interpreta a lei o Tribunal Federal de Recursos, na sua Súmula 219 ao subordinar ao pressuposto de "não haver antecipações do pagamento" a aplicação do prazo de cinco anos em função do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorreu o fato gerador previsto no artigo 173 do Código Tributário Nacional.(17)"

"Nem se diga que tal conclusão resultaria da interpretação sistemática das normas do § 4º do art. 150 e do art. 173 do CTN. A harmonização entre essas duas disposições, de longa data feita pela doutrina e pela jurisprudência, está em que o primeiro cuida da decadência nas hipóteses em que o contribuinte declara e recolhe o imposto antecipadamente, pois tal conduta permite à autoridade fiscal ter ciência de que o fato gerador ocorreu, o que é imprescindível para caracterizar a inércia que leva à caducidade do direito; já o art. 173 disciplina o instituto em outras hipóteses, sempre levando em conta o momento da ciência da administração quanto à ocorrência do fato tributário, a saber, nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por declaração e naqueles em que, embora a modalidade seja a de lançamento por homologação, o contribuinte não procede ao "autolançamento" como a lei determina, impedido que o fato gerador chegue ao conhecimento da autoridade fiscal.

Mas o dissenso entre o entendimento que prevaleceu no acórdão comentado e a norma do art. 150, § 4º do CTN verifica-se não só por ter o Aresto deixado de reconhecer, na extinção do crédito tributário pelo decurso do qüinqüênio nele estabelecido, a própria decadência do direito, mas também por ter desconsiderado o fato gerador como termo inicial do prazo de caducidade, dissenso esse que leva indiretamente ao ferimento da norma contida no art. 146, III da CF(18)."

"Pois enfim se a decadência, vemos pela boa doutrina, fala de um prazo, cometido em lei para que um direito potestativo se exerça, prazo que nasce junto com o próprio direito, fica inconcebível que a decadência do direito potestativo da Fazenda realizar o lançamento só vá se iniciar 5 (cinco) anos depois dele ter nascido.

Não se pode conceber que a caducidade qüinqüenal que o CTN decidiu por conferir aos lançamentos tributários só vá começar a ser contada justamente quando o direito potestativo de realizar o lançamento esteja a ponto de falecer.(19)"

"O raciocínio seria idêntico àquele que desenvolvemos em relação ao prazo para repetição do indébito.

Ocorre que em relação à repetição do indébito, o CTN diz que o prazo começa da extinção do crédito, e esta realmente só se opera com a homologação, ainda que tácita. Já em relação à decadência do direito de lançar, têm-se dois prazos da mesma natureza, vale dizer, dois prazos de decadência, de sorte que o raciocínio que leva à soma dos mesmos leva também à reprodução infinita deles, compondo um verdadeiro "looping".

Realmente, se o prazo de decadência fosse contado a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o tributo poderia ser lançado, e se se tiver como exercício em que o tributo poder ser lançado aquele último do prazo de decadência, tem-se uma seqüência infinita de reaberturas de prazos decadenciais.(20)"

A par das numerosas críticas dirigidas ao entendimento jurisprudencial aqui enfocado, vem-se firmando uma forte corrente em nossas cortes revendo o posicionamento interpretativo vergastado, conforme pode-se inferir na ilação propugnada pela Segunda Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. TRIBUTOS SUJEITOS AO REGIME DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.

Nos tributos sujeitos ao regime do lançamento por homologação, a decadência do direito de constituir o crédito tributário se rege pelo art. 150, § 4º, do Código Tributário Nacional, isto é, o prazo para esse efeito será de 5 anos a contar da ocorrência do fato gerador; a incidência da regra supõe, evidentemente, hipótese típica de lançamento por homologação, a que pagamento do tributo não for antecipado, já não será caso de lançamento por homologação hipótese em que a constituição do crédito tributário deverá observar o disposto no art. 173, I, do CTN. Recurso Especial não conhecido.

(RESP. nº 169.246/SP, AC. 2ª TURMA. DECISÃO DE 04/06/1998. RELATOR: MIN. ARI PARGENDLER. PUBL. DJ 29.06.1998, P. 153)(21).
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Sobre o autor
Aílson Francisco Rolim

técnico judiciário na Justiça Federal de Pernambuco, pós-graduando em Direito Tributário pela UFPE

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROLIM, Aílson Francisco. Lançamento por homologação: abordagem acerca do "dies a quo" da decadência tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1314. Acesso em: 28 mar. 2024.

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Trabalho apresentado ao Curso de Especialização Lato Sensu em Direito Tributário da UFPE, na disciplina Normas Gerais de Direito Tributário

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