Ab initio, urge-se transcrever o que dispõe o item III da Instrução Normativa nº 16 do Preclaro Tribunal Superior do Trabalho que assim dispõe, ad litteram:
O agravo não será conhecido se o instrumento não contiver as peças necessárias para o julgamento do recurso denegado, incluindo a cópia do respectivo arrazoado e da comprovação de satisfação de todos os pressupostos extrínsecos do recurso principal.""3ºIII -
Ocorre que a exigência de cópia do Recurso a ser conhecido não encontra esteio no Art. 897 da CLT que regulamenta a matéria, vejamos, ipsis litteris:
Art. 897. Cabe agravo, no prazo de 8 (oito) dias:
§ 5º. Sob pena de não conhecimento, as partes promoverão a formação do instrumento do agravo de modo a possibilitar, caso provido, o imediato julgamento do recurso denegado, instruindo a petição de interposição:
I - obrigatoriamente, com cópias da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação, das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado, da petição inicial, da contestação, da decisão originária, da comprovação do depósito recursal e do recolhimento das custas;
Assim, é de bom alvitre novamente enumerar de maneira sistemática as exigências legais relativas à formação do instrumento para julgamento do agravo:
- Decisão agravada;
- Certidão da respectiva intimação;
-- Procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado;
- Petição inicial;
- Contestação;
- Decisão originária;
- Comprovação do depósito recursal;
- Recolhimento das custas;
Observa-se claramente que, a legislação vergastada, diferentemente do que prevê o art. 544, § 1º, do CPC, não prevê a exigência da cópia do recurso a ser conhecido, o que somente é previsto na Instrução Normativa do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.
Neste trilhar, o inciso II do § 5º do Art. 897 da CLT também prevê a FACULDADE de se juntar outras peças que o agravante considerar úteis ao deslinde da matéria, dentre elas, a cópia do Recurso de Revista cujo seguimento fora negado, expressis verbis:
Art. 897. § 5º. II - facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis ao deslinde da matéria de mérito controvertida.
Nesse espeque, não se pode dar à lei um entendimento que contrarie frontalmente seus propósitos conforme a magistral lição do festejado hermeneuta Carlos Maximiliano, verbo ad verbum:
"Deve o Direito ser interpretado inteligentemente: não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis. Também se prefere a exegese de que resulte eficiente a providência legal ou válido o ato, à que torne aquela sem efeito, inócua, ou este, juridicamente nulo". [01]
Neste diapasão, a confiança do cidadão na segurança jurídica constitui um elemento fundamental e indispensável do Estado de direito, e a presente instrução normativa ultrapassa aquilo que a legislação prevê, melhor dizendo, contraria o que é previsto pela CLT, sendo ofensiva ao princípio da segurança jurídica.
Neste espeque, vale transcrever as palavras de Paulo de Barros Carvalho que sobre a segurança jurídica escreveu, in verbis:
O princípio da segurança jurídica é decorrência de fatores sistêmicos, dirigido à implantação de um valor específico, qual seja, o de coordenar o fluxo das interações inter-humanas, no sentido de propagar no seio da comunidade social o sentimento de previsibilidade quanto aos efeitos jurídicos da relação da conduta. Tal sentimento tranqüiliza os cidadãos, abrindo espaço para o planejamento de ações futuras, cuja disciplina jurídica conhecem, confiantes que estão no modo pelo qual a aplicação das normas do direito se realiza. [02]
Em razão da omissão da legislação trabalhista, tal exigência é insuportável, inclusive porquanto ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
É o que se observa no inciso II do Art. 5º da Constituição Federal, verbo ad verbum:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
Nesse passo, colaciona-se as lições de Luiz Nunes de Almeida que de forma magistral escreveu, expressis verbis:
"para restringir, suprimir ou modificar direitos, liberdades ou garantias, e sempre que autorizar ação discricionária da Administração, deverá, necessariamente, fazê-lo por meio de lei que compreenda um minimum de critérios objetivos, que possam servir de limites da liberdade de escolha da Administração [e da Justiça], de tal modo que os cidadãos possam contar com um quadro legal claro e seguro quanto à previsibilidade das opções da Administração e, ao mesmo tempo, que os tribunais possam ter elementos objetivos suficientes para emitir um julgamento sobre a legalidade das decisões administrativas." [03]
Em abordagem direta sobre o princípio da Segurança jurídica e a existência de normas vagas e cláusulas gerais, adverte Canotilho, in verbis:
", as cláusulas gerais podem encobrir uma ‘menor valia’ democrática, cabendo, pelo menos, ao legislador, uma reserva global dos aspectos essenciais da matéria a regular. A exigência da determinabilidade das leis ganha particular acuidade no domínio das leis restritivas ou de leis autorizadoras de restrição." [04]
A lei tratada é de caráter restritivo, devendo portando seu aplicador ter peculiar cuidado quanto a sua aplicação, sendo inaceitável do ponto de vista democrático a ampliação de sua restritividade por conta de um ato administrativo, por maior caráter normativo que a citada instrução normativa possa ter.
Nas relações travadas pelos cidadãos e os poderes públicos deve-se observar o princípio da segurança jurídica que exige a clareza do direito, porque sem ela o destinatário da lei não tem como conhecer razoavelmente o comando normativo, o que compromete a perspectiva de previsibilidade e certeza de seu respeito.
Com efeito, observa-se que tal restrição ao seguimento dos recursos atenta contra a separação dos poderes e, portanto, contra o próprio Estado de Direito.
Na hipótese em análise, a legislação trabalhista é clara, diferente da exigência contemplada na Instrução Normativa que contraria a exigência legal trazendo confusão ao sistema, ofendendo os princípios da segurança jurídica e da confiança legitima.
Portanto, merece reforma a citada instrução normativa no sentido de qualificar-se como facultativa a exigência da juntada da cópia do Recurso a ser conhecido pelo preclaro Tribunal Superior do Trabalho.
Bibliografia:
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação no direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984
ZIMMER, Willy. Relatório na XVª Mesa Redonda Internacional realizada em Aix-en-Provence, em setembro/1999, sobre o tema "Constitution et sécurité-juridique". In: Annuaire Internacional de Justice Constitutionnelle, XV, 1999. Paris: Economica, 2000.
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2001.
ALMEIDA, Luís Nunes de. Relatório na XVª Mesa Redonda Internacional realizada em Aix-en-Provence, em setembro/1999, sobre o tema "Constitution et sécurité-juridique". In: Annuaire Internacional de Justice Constitutionnelle, XV, 1999. Paris: Economica, 2000.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo, Saraiva, 13ª edição, 2000
Notas
- MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação no direito. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984.
- CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, p. 95.
- ALMEIDA, Luís Nunes de. Relatório na XVª Mesa Redonda Internacional realizada em Aix-en-Provence, em setembro/1999, sobre o tema "Constitution et sécurité-juridique". In: Annuaire Internacional de Justice Constitutionnelle, XV, 1999. Paris: Economica, 2000. p. 254-255
- CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2001. p. 257.