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Júri: a controvérsia na quesitação da inimputabilidade e dos excessos culposo e exculpante

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10/08/2009 às 00:00
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CONCLUSÃO

A reforma do procedimento do júri surpreendeu a comunidade jurídica desafiando, além da simples leitura de seus artigos (da Lei 11.689/08), a interpretação consentânea com o direito processual penal moderno, não sendo demasia afirmar que a adequação interpretativa da doutrina e dos tribunais resultará em intensos debates, mas que de todos eles, com certeza, resultará em conclusões que atendam aos preceitos de um verdadeiro direito processual constitucional.

Trago, como dito acima, a minha contribuição para este debate.


Notas

  1. VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
  2. Código Penal, art. 18 - Diz-se o crime: (...) culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. (inciso II)

É incontroversa, hoje, a competência da Justiça do Trabalho para a tutela dos direitos de personalidade do trabalhador, bem como da indenização por danos morais individuais e coletivos (art. 114, I e VI da CF), deixando de ter um caráter eminentemente patrimonialista, compensatória, presente em décadas passadas.

Para Xisto Tiago de Medeiros Neto, o dano moral coletivo corresponde à lesão injusta e intolerável a interesses ou direitos titularizados pela coletividade [36]. Trata-se de lesão da esfera moral ou extrapatrimonial a um círculo de valores da sociedade, ocasionando sentimentos negativos no seio social. A violação dos direitos fundamentais dos trabalhadores provoca sentimentos de repulsa, desvalor, descrença, desesperança, descrédito.

O dano moral coletivo é um mecanismo importante para inibir lesões de ordem transindividual e vem se sedimentando na jurisprudência trabalhista, com condenações em vultosas quantias que tem por fulcro impedir a disseminação de condutas ilegais. No seu dimensionamento, são considerados, dentre outros, a gravidade, a extensão, a natureza do dano, o patrimônio do infrator e a repercussão na sociedade. A indenização tem caráter punitivo, reparatório e pedagógico, não se confundindo ou compensando com os danos individualmente sofridos.

A reparação genérica é ressaltada pelo caráter transindividual dos valores em jogo, fundamentais para a organização social e o bem comum. O dano moral coletivo independe da comprovação de culpa, pois se evidencia pelo próprio fato violador (ipso facto). Tais valores são revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, previsto na Lei 7.898/90 c/c art. 13 da Lei 73.47/85, como forma de compensar os danos sofridos.

Os danos morais coletivos, no âmbito do processo trabalhista, são, via de regra, revertidos ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), em razão da inexistência de fundo específico para recomposição dos danos sofridos.


7.Litispendência e coisa julgada nas ações coletivas

Verifica-se a litispendência, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. Para que uma ação seja idêntica à outra é necessário que possuam as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (§ 2º do art. 301 do CPC).

O instituto tem por fulcro evitar decisões judiciais conflitantes e o desperdício de atividade jurisdicional (§1º do art. 301 do CPC). O art. 104 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que:

As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

Não há litispendência entre as ações que tutelem interesses difusos ou coletivos e as ações individuais, em razão da diversidade dos pedidos (naquelas, normalmente, pleitea-se o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer e/ou condenação genérica, enquanto que, na ação individual, o pedido refere-se à condenação pelos danos individualmente sofridos).

O autor individual pode pedir a suspensão do seu processo, no prazo de trinta dias, conforme dispõe o art. 104 do CDC, da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva que verse sobre direitos coletivos e individuais homogêneos, a fim de ser beneficiado pelos efeitos da coisa julgada.

No caso de prosseguimento da ação individual, o autor assume os riscos da demanda autônoma, não sendo beneficiado pela decisão que acolha a tutela genérica do direito vindicado.

Caso suspenso o processo individual e julgado improcedente o pedido na ação que verse sobre direitos individuais homogêneos, retomar-se-á o curso da ação individual, salvo se o mesmo interveio na ação coletiva, quando será alcançado pelos efeitos da coisa julgada (art. 103, §2º do CDC).

O art. 472 do Código de Processo Civil estabelece que a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. No processo coletivo, essa regra clássica prevista no CPC não se adapta às exigências e peculiaridades relativas aos interesses metaindividuais.

Na realidade, tanto a CLT como o Código de Processo civil mostram-se insuficientes e inadequados para a tutela dos direitos transindividuais, notadamente quanto aos efeitos da sentença (restrita às partes formais do processo) e da qualidade da coisa julgada.

A coisa julgada tem assento na necessidade de segurança e estabilidade das relações sociais. O art. 103 do Código de Defesa do Consumidor versa acerca da coisa julgada coletiva, in verbis:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

A improcedência por deficiência de prova não faz coisa julgada para os co-legitimados de ação em defesa de interesse difusos e coletivos (coisa julgada secundum eventum probationis), podendo o mesmo autor ou qualquer outro co-legitimado ajuizar outra ação com idêntico fundamento e novas provas [37].

Caso procedente, a decisão fará coisa julgada erga omnes (difusos) ou ultra partes (coletivos), in utilibus, cabendo apenas ao interessados promover a liquidação e execução da sentença coletiva (art. 103, §2º do CDC)

Nas ações coletivas para a tutela de direitos individuais homogêneos, a coisa julgada terá efeitos erga omnes, em benefício do interessado. Caso seja julgada improcedente, por ser infundada a pretensão ou ainda por insuficiência de provas, não inibirá a possibilidade de ajuizamento de ação individual.

Adotou-se o sistema de coisa julgada secundum eventum litis, de acordo com o resultado, somente para beneficiar os interessados individuais e não para prejudicá-los.

Havendo ação individual em curso, é possível o seu prosseguimento, em face da inexistência de litispendência, mas o autor assume os riscos pelo resultado individual desfavorável, pois não será beneficiado com o provimento da sentença coletiva, excetuando a regra do transporte in utilibus em benefício do autor individual.

Se suspenso o processo no prazo legal, será alcançado pela coisa julgada favorável na ação coletiva. Se procedente por insuficiência de prova, haverá coisa julgada erga omnes, arcando o réu com o prejuízo decorrente do ônus de que não conseguiu desincumbir.

Julgada improcedente por outros motivos, que não a insuficiência de provas, fará coisa julgada erga omnes ou ultra partes para os co-legitimados, observando-se que não há impedimento de ajuizamento de ações individuais pelos interessados (art. 103, incisos I e II do CDC).

Caso o indivíduo tenha assistido o autor coletivo, será atingido pela coisa julgada, impedindo que renove o pleito em outra ação.


8.Procedimento. Ação civil coletiva

As normas processuais previstas no Código Consumerista aplicam-se, no que for cabível, à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, nos termos do artigo 21 da Lei 7.347/85, com a redação dada pelo art. 117 da Lei 8.078/90.

O procedimento adotado nas ações coletivas, no âmbito da Justiça do Trabalho, encontra-se prevista na Constituição Federal, na lei 7.347/85 (LACP), 8.078/90 (CDC) e lei complementar 75/93 (LOMPU). Carlos Henrique Bezerra Leite [38] intitula esse novo subsistema de acesso coletivo dos trabalhadores ao Judiciário como "jurisdição trabalhista metaindividual".

Somente em caráter subsidiário, no que for omisso e compatível com a tutela coletiva, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e o Código de Processo Civil (art. 769 da CLT) serão aplicados.

O rito a ser adotado é o ordinário e não o sumário (Lei 9.957/2000), aplicável somente aos dissídios individuais puros, cujo valor da causa não exceda a 40 vezes o salário mínimo.

O juiz pode conceder mandado liminar de natureza satisfativa, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo (art. 12 da lei 7.437/85), desde que presentes o periculum in mora e o fumus boni juris.

O art. 84, § 3° do CDC, aplicável por força do art. 21 da LACP, preceitua que, sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu. O juiz pode conceder a medida cautelar de ofício, pois, ao contrário do art. 273 do CPC, o art. 12 da LACP não exige o requerimento da parte, não incidindo aqui o princípio dispositivo.

No processo do trabalho, as decisões interlocutórias não são impugnadas de imediato (art. 893, §1º da CLT), inaplicável, portanto, o recurso de agravo previsto no art. 12, in fine, da Lei 7.347/85. No entanto, havendo violação de direito líquido e certo, por ato ilegal ou abusivo, é cabível a impetração de mandado de segurança.

A execução trabalhista é regida pela LACP e CDC e, no que for omissa, é regulada pela CLT, e, subsidiariamente, pela lei de execução fiscal e CPC, nesta ordem.

O art. 15 da lei 7.347/85 prevê que, decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.

O art. 97 do CDC estabelece que a liquidação e a execução de sentença poderão ser promovidas pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitimados de que trata o art. 82.

A execução poderá ser coletiva, sendo promovida pelos legitimados de que trata o art. 82 do CDC, abrangendo as vítimas cujas indenizações já tiveram sido fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do ajuizamento de outras execuções. A execução coletiva far-se-á com base em certidão das sentenças de liquidação, da qual deverá constar a ocorrência ou não do trânsito em julgado.

É competente para a execução o juízo: I - da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de execução individual; II - da ação condenatória, quando coletiva a execução. (art. 98, §§1º e 2º do CDC).

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O art. 11 da LACP dispõe que, na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor.

Os arts. 3º e 13 e parágrafo único assim dispõem:

Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

Parágrafo único. Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária.

O art. 84, §§ 1º e 2º do CDC estabelece:

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

§ 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da multa (art. 287, do Código de Processo Civil).

O Código de Defesa do Consumidor prescreveu um novo procedimento para a tutela específica dos interesses individuais homogêneos, surgindo a expressão "ação civil coletiva".

A ação civil coletiva, espécie do gênero ação civil pública está prevista no capítulo II do CDC. Ela visa a uma reparação concreta pelos danos individualmente sofridos pelos lesados, mediante uma condenação genérica de obrigação de indenizar.

A doutrina diverge acerca da possibilidade de manejo de ação civil coletiva na tutela de direitos individuais homogêneos na Justiça do Trabalho, ou ainda, se seria o único instrumento cabível para a proteção dos mesmos interesses.

Para Renato Saraiva, a ação civil pública e a ação civil coletiva constituem expressões sinônimas, utilizadas com a mesma finalidade, qual seja para a proteção de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, não havendo que falar, portanto, em duas ações autônomas com objetivos distintos [39].

O art. 91 do CDC prescreve que os legitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em nome próprio e no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos.

Os legitimados são os mesmos da ação civil pública em defesa de interesses difusos e coletivos e está prevista no art. 82 do CDC.

Proposta a ação civil coletiva, será publicado edital no órgão oficial, a fim de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte dos órgãos de defesa do consumidor. Em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados. Cabe aos substituídos processualmente promover a liquidação, que será por artigos, dentro do prazo de um ano, demonstrando o dano sofrido e o nexo causal com a conduta lesiva (art. 94 e 95 do CDC).

Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização devida. O produto da indenização devida reverterá para o fundo criado pela Lei n.° 7.347, de 24 de julho de 1985. (art. 100 e parágrafo único do CDC)

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Sobre o autor
Aramis Nassif

desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASSIF, Aramis. Júri: a controvérsia na quesitação da inimputabilidade e dos excessos culposo e exculpante. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2231, 10 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13302. Acesso em: 26 abr. 2024.

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