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Estágio e ensino jurídico à luz do direito educacional

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Recentemente, com a entrada em vigor da Lei de Estágio (Lei nº 11.788/08), tem se discutido muito a aplicabilidade da mesma diante do Estatuto da OAB (Lei nº 8.906/94), que regulamenta o estágio profissional de advocacia. No tocante ao estagiário, devidamente reconhecido como tal perante a OAB, a solução estaria na aplicação conjunta da Lei geral do Estágio com a Lei especial 8.906/94, específica da atividade de estágio de advocacia. Segundo esta última, o estágio somente pode ser realizado nos dois últimos anos do curso jurídico e não durante os anos iniciais do curso superior, como previsto, em termos gerais, no art. 3º, inciso I, da Lei n. 11.788/08. Após os dois anos, tanto pode o estagiário continuar a desenvolver sua atividade na mesma instituição concedente do estágio, mas, a partir de então, na condição de empregado, como pode celebrar novo vínculo de estágio com outra instituição sem vinculação empregatícia. Em qualquer caso, permanece a sua inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, como estagiário, conforme o art. 9º da Lei n. 8.906/94. O estágio profissional de advocacia não dispensa inscrição do estagiário feita no Conselho Seccional em cujo território se localize seu curso jurídico.

Deve-se buscar, portanto, a aplicação harmônica das duas leis, pois, em caso de conflito entre as duas, prevalecerá o Estatuto da Advocacia.

O debate e o aprofundamento no estudo do Instituto do Estágio no ensino jurídico remetem-nos ao Direito Educacional, que proporcionará respostas a vários questionamentos, como o que fora relatado aqui. Como esse novo ramo do Direito se dedica ao estudo de normas, princípios, leis e regulamentos que versam sobre as relações entre alunos, professores, instituições de ensino, gestores, Estado e outros envolvidos, mediata ou imediatamente, no processo ensino-aprendizagem, analisaremos o Estágio em uma dimensão maior a partir das diretrizes curriculares do curso de graduação em Direito, instituída pela Resolução nº 09 / 2004 do Conselho Nacional de Educação (MEC).

As diretrizes curriculares do Direito prevêem a existência de eixo de formação prática, nos projetos pedagógicos dos cursos jurídicos, que integre a prática aos conhecimentos teóricos e dogmáticos desenvolvidos ao longo do curso. O Estágio Supervisionado, conforme o art. 7º da Resolução nº 09, é componente curricular obrigatório e deve se encontrar sob responsabilidade do Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), que compreende a prática real e simulada das diversas profissões jurídicas existentes, como advocacia pública e privada, magistratura, Ministério Público e outras. A prática real, voltada às atividades especificamente advocatícias, é operacionalizada normalmente nos Serviços de Assistência Judiciária (SAJ) das Instituições Superiores de Ensino (IES) e abrange tanto os serviços forenses como os de consultoria e assessoria jurídicas.

Em geral, o Estágio deve ser realizado na própria IES através do NPJ, podendo, em parte (até 50% da carga horária total prevista em regulamento próprio do Estágio Supervisionado), ser exercido em outras instituições conveniadas e sob supervisão da Coordenação de Estágio, como escritórios de advocacia, órgãos do Pode Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, ou em departamentos jurídicos de empresas. A supervisão da IES implica permissão de visita a esses locais para verificação das condições de desenvolvimento das atividades do Estágio, bem como o recebimento de relatórios a respeito do desempenho do estagiário.

A Resolução nº 09, em seu art. 7º, parágrafo 2º, permite a reprogramação das atividades de Estágio desenvolvidas no âmbito das IES, de acordo com os resultados teórico-práticos apresentados pelo aluno até a conclusão do mesmo. Esse dispositivo representa um avanço pedagógico nas diretrizes curriculares, uma vez que permite a criação de um sistema de avaliação continuada, tendo como referência o desenvolvimento de competências e habilidades adquiridas pelo discente nas atividades práticas e simuladas das principais profissões jurídicas no cumprimento do Estágio Supervisionado, como a redação de peças processuais, prestação de serviços jurídicos, visitas orientadas a órgãos judiciários, análise de autos findos, prática de atividades de mediação, conciliação e arbitragem, simulação de Audiências e Júri.

Logo, não se pode confundir Estágio Curricular Supervisionado com Estágio profissionalizante na IES, pois este, voltado para a advocacia (SAJ), é parte integrante daquele que é componente obrigatório da estrutura curricular do curso de graduação em Direito. Ainda que o aluno não possa cumprir o Estágio profissionalizante ofertado pela IES onde estuda, por já exercer atividade profissional incompatível com o referido Estágio, ele deverá obrigatoriamente realizar o Estágio Curricular na própria Instituição de Ensino para se tornar bacharel em Direito.

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Sobre o autor
Leonardo José de Pádua Rivas

advogado, pós-graduado em Direito de Empresa pela Puc Minas, professor de Direito, membro da Comissão de Ensino Jurídico e assistente da Escola Superior de Advocacia da OAB/MG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIVAS, Leonardo José Pádua. Estágio e ensino jurídico à luz do direito educacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2257, 5 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13468. Acesso em: 19 abr. 2024.

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