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Novo tipo penal de estupro contra pessoa vulnerável

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5. Estupro contra pessoa vulnerável, em todas as suas Formas típicas, É Crime Hediondo

Nos termos da nova redação dada ao inciso VI, do art. 1º, da LCH, há indicação expressa de que o estupro de pessoa vulnerável – figura penal até então inexistente na legislação brasileira – é considerado crime hediondo, seja em sua forma típica simples, seja em suas duas formas típicas pelo resultado lesão corporal ou morte da vítima (art. 217-A, caput e §§ 1º, 3º e 4º).


6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A redação dada ao art. 213, do CP, pela Lei 12.015/09, manteve a descrição da conduta anterior catalogada como estupro, mas acrescentou-lhe a descrição antes usada para tipificar o crime de atentado violento ao pudor, que com isso perdeu sua autonomia tipológica.

O "estupro de vulnerável" é a nova infração penal caraterizada pela conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso contra menor de 14 anos ou contra vítima portadora de doença mental ou que não tenha condições de oferecer resistência ao ato sexual violentador.

Com a criação de um segundo tipo penal de estupro, o Direito Penal brasileiro passou a conviver com duas figuras criminosas diferenciadas e autônomas: o estupro comum (art. 213) e o estupro contra pessoa vulnerável (art. 217-A), que deve ser classificado como um crime especial.

O estupro, a exemplo das demais infrações sexuais, é conduta ilícita que visa garantir a integridade e a liberdade sexual. O objeto jurídico desta infração penal é, portanto, a dignidade sexual.

A carga punitiva – oito a quinze anos de reclusão – prevista para o crime de estupro contra pessoa vulnerável, em sua modalidade típica qualificada, é proporcionalmente bem mais rigorosa do que as penas cominadas para o tipo básico de estupro comum.

A dicção dada ao conteúdo do art. 217-A não se refere mais à presunção de violência ou de grave ameaça como elemento normativo do novo tipo penal. Para a realização objetiva desta nova infração penal, basta que o agente tenha conhecimento de que a vítima é menor de 14 anos de idade ou é portadora de incapacidade física ou mental de resistência ao ato sexual ou libidinoso.

Na jurisprudência, predomina o entendimento de que o consentimento da vítima menor de 14 anos não afasta a presunção de inocência, cuja norma visa a proteger o menor até essa idade, considerando-o incapaz de consentir.

Com a nova situação penal, a presunção de vulnerabilidade da vítima menor de 14 anos ou por qualquer outra causa incapaz de resistir ao ato sexual ou libidinoso deve continuar sendo a regra geral, que somente pode ser afastada em casos excepcionais, quando o agente atuar em inevitável erro de tipo.

A Lei 12.015/09 aclarou possível dúvida que ainda pairasse sobre a classificação do estupro como crime hediondo. A nova redação do inciso VI, do art. 1º, da LCH, indica de forma expressa que o estupro de pessoa vulnerável é considerado crime hediondo, seja em sua forma típica simples, seja em suas formas típicas qualificadas pelo resultado (art. 217-A, caput e §§ 1º, 3º e 4º).


7. NOTAS

( 1 ) HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1958, v. 8, p.

( 2 ) O rigor do controle penal prescrito para o autor de estupro de pessoa vulnerável pode ser constatado nos casos de um beijo lascivo ou de um ato apalpar os órgãos sexuais de um menor de 14 anos. Tais exemplos podem parecer "casos de compêndio acadêmico". Mas, os meios de comunicação social divulgaram com destaque a prisão em flagrante de um turista italiano, por ter beijado na boca sua filha de 8 anos de idade e "acariciado as partes íntimas da garota". O fato teria ocorrido no deque da piscina de um hotel em que estava hospedado, na cidade de Fortaleza, no Ceará. Passados cinco dias da prisão, a justiça ainda não havia apreciado um pedido de Habeas Corpus. Folha de S. Paulo, A15, 06.09.2009.

( 3 Para os autores do CP, "o fundamento da ficção legal de violência, no caso dos adolescentes, é a innocentia consilii do sujeito passivo, ou seja, a sua completa insciência em relação aos fatos sexuais, de modo que não se pode dar valor algum ao seu consentimento" (EM/1940, n. 70).

( 4 ) No direito positivo brasileiro, "considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade". (art. 2º, do ECA).

( 5 ) HC 93263 / RS - Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA. Julgamento:  19/02/2008. DJe-065. DIVULG 10-04-2008. PUBLIC 11-04-2008. EMENT VOL-02314-05, PP-00950. No mesmo sentido: HC 94818 / MG - Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE. Julgamento:  24/06/2008.           DJe-152 DIVULG 14-08-2008 PUBLIC 15-08-2008. EMENT VOL-02328-04 PP-00719.

( 6 ) NORONHA, Magalhães. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, v. 3, p. 224.

( 7 ) HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, ob. cit., v. 8, p. 239; JESUS, Damásio de. Direito Penal. Direito Penal. São Paulo: Saraiva, v. 3, p. 133; MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, v. 2, p. 440.

( 8 ) HC 73.662-MG, Rel. min. Marco Aurélio. Jgto. 21.05.1996. DJU 20.09.1996, p. 1028.

( 9 ) HC 79.788/MG. Rel. min. Nelson Jobim. Jgto. 02.05.200. DJU 17.08.2001, p. 52.

( 10 ) HC 81.268/DF. Rel. min. Sepúlveda Pertence. Jgto. 16.10.2001. DJU 16.11.2002, p. 08.

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( 11 ) O art. 224 e seu parágrafo único, do CP (agora, revogado), cominava pena de oito a doze anos e de 12 a 25 anos de reclusão para os casos de estupro com lesão corporal grave ou com morte da vítima, respetivamente.

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Sobre os autores
João José Leal

Promotor de Justiça aposentado. Ex-Procurador-Geral de Justiça de Santa Catarina. Professor de Direito Penal aposentado.

Rodrigo José Leal

Professor de Direito Penal da Universidade Regional de Blumenau - FURB e na Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Doutor em Direito pela Universidade de Alicante/Espanha. Mestre em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB. Graduado pela Furb.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, João José ; LEAL, Rodrigo José. Novo tipo penal de estupro contra pessoa vulnerável. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2263, 11 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13480. Acesso em: 26 abr. 2024.

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