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A organização sindical e os princípios democráticos

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30/09/2009 às 00:00
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CAPÍTULO 3 A ORGANIZAÇÃO SINDICAL E A DEMOCRACIA

A Constituição Federal de 1988 foi elaborada com o objetivo de instituir um Estado Democrático de Direito, visando assegurar a liberdade, a igualdade, a justiça e os exercícios de direitos sociais e individuais.

Para tanto foi necessária a elaboração de uma Constituição extensa, devido ao fato de que o governo anterior era constituído por uma ditadura militarista, e as instituições brasileiras (aqui consideradas não do ponto de vista meramente jurídico, mas também do ponto de vista político) não estavam fortes o suficiente para garantir um Estado Democrático sem intensa regulação constitucional.

Partia-se do princípio de que com uma Constituição forte, que protegesse os direitos e garantias fundamentais de forma absoluta, não existindo nem mesmo a possibilidade de supressão delas (através das cláusulas pétreas), dificultar-se-iam as tentativas de mutação do Estado Democrático (por exemplo, transformando-o em outra ditadura através do próprio processo legislativo), o que só poderia ocorrer com a derrubada da ordem jurídica vigente e a criação de uma nova ordem (o que de fato seria muito complicado de se realizar), garantindo assim a democracia.

Apesar da idéia inicial da Constituição ser a garantia de um Estado Democrático de Direito, muitas de suas regras não a realizam completamente, por terem sido elaboradas tendo como fundamento idéias antigas, provenientes de outros modelos estatais.

O terceiro capítulo deste trabalho tem o objetivo de discutir o modelo de organização sindical vigente, procurando estabelecer se ele está de acordo com os princípios democráticos, além de analisar a proposta de mudança que está em discussão no Congresso Nacional, através da Proposta de Emenda à Constituição de número 369.

O capítulo foi dividido em três seções: a primeira analisa os fundamentos dos princípios democráticos, explicando alguns conceitos e teorias que dão suporte à idéia democrática lato sensu; a segunda define o que se entende por princípios democráticos, e analisa o modelo de organização sindical vigente sob esta ótica; e a terceira sessão analisa a Proposta de Emenda à Constituição 369, que busca adequar o modelo de organização sindical aos princípios democráticos.

3.1 DEMOCRACIA, LIBERDADE E IGUALDADE

A democracia é forma, através da qual se buscam determinados objetivos. A República Federativa Brasileira foi constituída como sendo um Estado Democrático de Direito, de modo que a realização do poder estatal tem como fundamento a vontade do povo.

Utilizando-se da forma democrática foi estabelecido que a liberdade e a igualdade eram objetivos que deveriam ser buscados pela República Federativa do Brasil e, alçados como valores supremos, servem como guias para todas as ações governamentais.

Democracia, liberdade e igualdade devem andar juntas, para que o poder emanado do povo garanta a vida em uma sociedade livre e desigual, sem o perigo da imposição de valores por uma minoria que a pretexto do bem maior desvirtue todas as conquistas alcançadas no campo da justiça social.

3.1.1 Conceito de democracia

O conceito de democracia é antigo, e inicialmente pressupunha a idéia de uma praça, onde os próprios cidadãos de um Estado tomavam as decisões a ele referentes. Era o poder realizado diretamente pelo povo, assim entendidos os indivíduos que possuíam a cidadania de determinado Estado [98].

A democracia em si não consiste na possibilidade de todos os homens votarem, mas sim na possibilidade de todos aqueles considerados como cidadãos votarem. Os critérios de seleção de cidadania de diferentes Estados muitas vezes estabelecem regras exclusivas, onde somente uma parte da população possui a cidadania, e mesmo assim não se pode dizer que este tipo de sistema não é democrático.

Pontes de Miranda [99] define democracia como "a participação do povo na ordem estatal: na escolha dos chefes, na escolha dos legisladores, na escolha direta ou indireta dos outros encarregados do poder público". O conceito de povo aqui utilizado é o mesmo de cidadão, ou seja, aquele que a ordem estatal admite como parte do Estado, concedendo-lhe direitos políticos.

Diante desta definição, é possível entender democracia como forma de Estado, que tem como fonte de poder a participação dos cidadãos. No Brasil, o modelo democrático é estabelecido pela Constituição Federal e utilizado para alcançar determinados objetivos, como a liberdade, a igualdade e a justiça.

3.1.2 Liberdade

A liberdade é um dos objetivos buscados pela Constituição da República Federativa do Brasil, estando prevista desde o seu preâmbulo. Ocorre que o termo "liberdade" possui várias acepções, e para que possa ser realizada a discussão de como a liberdade pode ser realizada dentro de um Estado, é necessária primeiramente a compreensão de seu conceito.

Segundo o dicionário Aurélio [100], o vocábulo liberdade significa:

[Do lat. libertate.] S. f. 1. Faculdade de cada se decidir ou agir segundo a própria determinação: Sua liberdade, ninguém a tolhia. 2. Poder de agir, no seio de uma sociedade organizada, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas: liberdade civil; liberdade de imprensa; liberdade de ensino. 3. Faculdade de praticar tudo quanto não é proibido por lei. 4. Supressão ou ausência de toda a opressão considerada anormal, ilegítima, imoral: Liberdade não é libertinagem; Liberdade de pensamento é um direito fundamental do homem 5. Estado ou condição de homem livre: dar liberdade a um prisioneiro, a um escravo. 6. Independência, autonomia [...]

A liberdade então consiste em autonomia da vontade, na realização daquilo que o indivíduo deseja, sem que ocorra nenhuma restrição. Sob o ângulo político, este conceito consiste na adequação das normas reguladoras de condutas com a vontade do povo [101].

Já dentro do campo jurídico, liberdade consiste em tudo aquilo que não for proibido por lei [102]. Este conceito de liberdade não cabe na análise da presente monografia, pois é uma liberdade estritamente formal, já que a lei pode proibir muitas coisas que não são exatamente o desejo dos cidadãos, e mesmo assim haveria, pelo menos juridicamente, certas liberdades.

Ao menos teoricamente, a liberdade também não implica democracia, e nem mesmo igualdade, tendo em vista que ela consiste em possibilidade de ação. Dentro de um Estado, é livre aquele que pode agir e, mesmo que tal Estado não seja democrático, ou nem mesmo igualitário (diante de uma escolha dos cidadãos por critérios excludentes, por exemplo, por raça), ele ainda pode ser livre, desde que seus cidadãos possam agir conforme sua vontade.

3.1.3 Igualdade

A igualdade, assim como a liberdade, nada significa se tal conceito não for devidamente preenchido. Para tanto é necessário definir quem serão os iguais, e com relação a que coisas [103], de modo que a igualdade também pode ser vista tanto do ponto de vista formal como material.

Por muito tempo, nos Estados Unidos da América, após a abolição da escravidão (Emenda Constitucional 13/1865) [104] e da promulgação dos direitos de cidadão (Emenda Constitucional 14/1868) [105], os negros, apesar de constitucionalmente serem considerados como iguais, não podiam freqüentar os mesmos locais que os brancos. Como em teoria os direitos deveriam ser iguais, eram construídas escolas exclusivas para negros, para que os "direitos" fossem garantidos. Neste caso particular, a igualdade era somente formal (constitucionalmente), pois as leis infraconstitucionais estabeleciam a distinção entre as pessoas através do critério racial.

A doutrina igualitária busca o tratamento igual de todos os seres humanos [106], e tem como ponto de partida o fato de que cada homem é uma entidade biológica semelhante ao outro, não havendo distinções significativas devido a raça ou camada social. Segundo Pontes de Miranda [107]

A idéia de igualdade dos homens assenta em que todos eles são entes humanos – portanto, em semelhanças indiscutíveis. A ciência afirma que o sangue não é diferente segundo as raças; nem segundo o grau de civilização; nem segundo a classe ou camada social.

E diante desta idéia de igualdade que foi criada a República Federativa do Brasil, sendo inaceitável qualquer discriminação entre os seres humanos, independentemente de raça, sexo ou classe social.

3.1.4 A relação entre liberdade, igualdade e democracia

Liberdade, igualdade e democracia são três conceitos diferentes, que podem aparecer de forma singular, mas normalmente possuem um vínculo. A supressão da liberdade de determinada parte da população reduz a igualdade, já que o não-livre não possui os mesmos direitos daquele que é livre [108].

A democracia, como forma que é, pode contribuir tanto para o aumento da liberdade como para o aumento da igualdade. A utilização da participação popular no processo de decisão Estatal pode levar a decisões onde as liberdades individuais dos cidadãos são ampliadas, do mesmo modo que pode ocorrer a determinação de uma maior distribuição de renda para aqueles que mais necessitam (igualdade econômica).

É claro que, através da mesma democracia, é possível seguir o outro caminho, cortando-se as liberdades e diminuindo a igualdade entre os homens. Mas a democracia é o meio mais fácil de se buscar a liberdade e igualdade, pois a outra opção consiste na vedação da participação da população na ordem estatal, levando à concentração do poder, que por si só já pressupõe uma desigualdade entre aqueles que detêm o poder e os cidadãos comuns, que não possuem as mesmas liberdades daqueles, e nada podem fazer (dentro da legalidade) para retirá-los do poder.

3.2 A ORGANIZAÇÃO SINDICAL E OS PRINCÍPIOS DEMOCRÁTICOS

Democracia, liberdade e igualdade, como princípios constitucionais que são, devem ser observadas para a formação de toda e qualquer instituição que venha a ser modelada dentro do ordenamento jurídico brasileiro.

Com a organização sindical não poderia ser diferente. Instituição voltada a defesa dos interesses dos trabalhadores, seu modelo deveria pautar-se dentro de tais idéias, de modo que a representação realizada pelo sindicato deveria ser legítima.

A legitimidade sindical só é alcançada quando os trabalhadores acreditam que o sindicato possua de fato o interesse em defendê-los, e para tanto é necessário que haja o envolvimento dos trabalhadores que, somente participando ativamente da vida do sindicato poderão determinar o rumo que ele deverá seguir.

3.2.1 Princípios democráticos

O conceito estabelecido neste trabalho para democracia é forma, através da qual se buscam determinados objetivos. Atualmente, dentro da maioria das concepções de Estado (inclusive o Brasil), a democracia anda de mãos dadas com a liberdade e a igualdade.

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John Rawls [109] afirma que um dos fins mais importantes de uma democracia constitucional é o oferecimento de uma concepção política de justiça, e explica os princípios fundamentais deste conceito:

(1) Cada pessoa tem um direito igual a um sistema plenamente adequado de liberdades básicas iguais para todos, que seja compatível com um mesmo sistema de liberdades para todos.

(2)As desigualdades sociais e econômicas devem satisfazer a duas condições:

(a) elas devem primeiro ser ligadas a funções e a posições abertas a todos, em condições de justa (fair) igualdade de oportunidades e

(b)devem proporcionar o maior benefício aos membros mais desfavorecidos da sociedade. [110]

É dentro desta idéia que devem ser entendidos os princípios democráticos, ou seja, a busca pela liberdade e igualdade (como a garantia das liberdades de forma igual para todos), através do exercício do poder pelo povo.

3.2.2 A garantia dos princípios democráticos na organização sindical

Historicamente o sindicato surgiu devido à necessidade dos trabalhadores se organizarem para enfrentar os abusos do empregador, transformando-se em uma entidade destinada à defesa de direitos e de resistência, buscando melhorar as condições de vida do trabalhador.

Retirando o conceito de democracia do âmbito estatal e transplantando-o para os sindicatos, é possível perceber que tais instituições tiveram seu surgimento de forma democrática, tendo em vista que a reunião de trabalhadores de determinado local serviu de base para o aparecimento de um movimento de resistência contra os empregadores.

Assim o sindicato, enquanto entidade de fato, possuía todos os princípios democráticos, já que sua forma de organização partia eminentemente da iniciativa dos trabalhadores, que eram livres dentro da instituição sindical, e também iguais, pois não se buscava melhorar a condição de vida de uma pessoa específica dentro do sindicato, mas sim do grupo de trabalhadores que a ele pertenciam.

Com o tempo, os Estados passaram a reconhecer os sindicatos, inserindo-os dentro do ordenamento jurídico, o que se deu de duas formas: dentro de Estados de concepção liberal, os sindicatos eram entidades livres, e continuavam tendo tais princípios democráticos garantidos; já dentro de Estados de concepção corporativista, que tem como fundamento a tentativa de supressão da luta de classes, os sindicatos foram organizados como entidades do próprio Estado, rigidamente regulados, havendo pouca ou quase nenhuma liberdade de atuação.

Dentre algumas técnicas de desenho jurídico dos sindicatos que constituem o sistema corporativista estão: a unicidade sindical; a sindicalização por categoria; a ligação entre sindicato e Estado e a proibição da greve e do lock- out [111].

O modelo de organização sindical atual no Brasil ainda tem raízes profundas provenientes do modelo criado no governo de Getúlio Vargas, que por sua vez foi baseado na Carta del Lavoro, da Itália Fascista [112].

Poderia um modelo com raízes nos modelos corporativistas não atentar contra os princípios democráticos?

Para responder esta questão, é necessária uma análise crítica do modelo atual tendo como referência tais princípios.

3.2.3 O modelo atual da organização sindical brasileira e os problemas relacionados com os princípios democráticos

O modelo de organização sindical no Brasil pode ser resumido como um modelo onde vige a liberdade de administração, o princípio da unicidade sindical, a representação por categoria, a organização hierárquica confederativa e custeio de suas atividades através de vários meios, entre eles a contribuição sindical.

Tal sistema é contraditório, pois apesar de ter sido criado visando a busca de uma maior liberdade sindical, persistiu com fortes traços dos sistemas corporativistas, prejudicando a realização dos princípios democráticos dentro do âmbito sindical

Os maiores problemas do modelo de organização sindical atual relacionados com a realização dos princípios democráticos são decorrentes do princípio da unicidade sindical e do modo como é realizado o financiamento dos sindicatos.

3.2.3.1 O princípio da unicidade sindical. Este princípio está previsto no inciso II do artigo 8º da Constituição Federal, e proíbe a criação de mais de uma entidade sindical que representativa de determinada categoria profissional ou econômica. Fere frontalmente a liberdade, pois impede a criação de outro sindicato no mesmo local em que já exista um da mesma categoria, podendo acarretar uma série de problemas.

A questão aqui é que os sindicatos têm poder para influenciar a vida de pessoas que nem mesmo são a eles filiadas. Isso agride os princípios democráticos até mesmo além do âmbito da organização sindical, pois submete pessoa alheia ao sindicato a uma decisão por ele tomada.

A unicidade sindical enrijece o sistema, pois não há como mudar a instituição que representa os trabalhadores de determinada categoria, a não ser internamente, pois a Constituição expressamente proíbe a criação de outros sindicatos.

Brito Filho [113] explica que este princípio persistiu na Constituição de 1988 devido à atuação de boa parte do movimento sindical, pois ajudou na criação de determinadas elites que passaram a se beneficiar do modelo de organização sindical, e como não querendo acabar com seus privilégios, lutaram contra a mudança para o sistema pluralista.

3.2.3.2 A contribuição sindical. São várias as formas utilizadas pelo sistema para que o sindicato seja subsidiado: contribuição associativa, contribuição assistencial, contribuição confederativa e contribuição sindical.

A contribuição sindical tem um caráter específico que a diferencia de todas as demais: ela tem natureza jurídica de tributo, pois não depende da vontade do trabalhador, e mesmo aqueles não filiados ao sindicato são obrigados a pagar.

É fácil perceber que este instituto fere a liberdade do trabalhador em custear um determinado órgão, que deveria ter natureza jurídica privada (pois é voltado à defesa dos interesses de determinado grupo). Aliás, a utilização deste modelo de financiamento pode até mesmo comprometer a própria independência do sindicato, já que o dinheiro é repassado aos sindicatos pelo Estado (artigo 589, § 1º da Consolidação das Leis do Trabalho [114]).

3.2.3.3 As implicações do princípio da unicidade sindical com o financiamento através da contribuição sindical. A utilização do princípio da unicidade sindical com o modelo de financiamento através de tributação acaba levando a uma situação paradoxal, onde até mesmo os dirigentes dos sindicatos procuram evitar a entrada de mais associados.

Esta situação ocorre pelo fato de que somente internamente poderá haver mudança no sindicato, pois não há nenhum meio externo de modificar as regras do jogo dentro da organização sindical, já que não é possível a criação de um novo sindicato na mesma base sindical.

Além disso, não há necessidade de muitos associados para angariar recursos para o sindicato, já que esses estão de certa forma garantidos, pois o financiamento se dá através da arrecadação da contribuição sindical tanto dos associados como dos não associados.

Como a renda está garantida, e o aumento do número de filiados pode levar a uma maior resistência, os dirigentes sindicais podem até mesmo buscar a realização de ações para evitar novos associados, já que para eles quanto maior o número de integrantes no sindicato maior a chance de disputas internas.

Outro problema que também vem ocorrendo, devido ao princípio da liberdade de associação (que permite o desmembramento de um sindicato com base territorial maior que um município) conjuntamente com o sistema atual de financiamento, é a proliferação de sindicatos, apesar da taxa de sindicalização ter permanecido a mesma. Isso se dá devido ao fato de que cada sindicato criado vai ter uma certa verba proveniente do governo, independentemente do número de filiados.

Em 1988, havia 9120 sindicatos no Brasil, entre sindicatos de empregadores (3.140) e de trabalhadores (5.980). Em 2001 o número de sindicatos de trabalhadores praticamente dobrou, passando a 11.416, enquanto o número de associados cresceu somente 22%, mostrando uma diminuição do tamanho médio dos sindicatos [115].

Percebe-se então que o único papel que o princípio da unicidade sindical exerce é do ferir os princípios democráticos, pois diante do sistema atual ele não garante nem mesmo a existência de sindicatos fortes, já que existe a possibilidade de desmembramento, com a garantia de recebimento de financiamento por parte do governo.

3.3 A EMENDA CONSTITUCIONAL 369 E OS PRINCÍPIOS DEMOCRÁTICOS

Elaborado com base em idéias liberais, mas apresentando resquícios do modelo corporativista, o modelo de organização sindical atual não apresenta a melhor forma para a representação e garantia dos interesses dos trabalhadores.

Tendo como ponto de partida este problema e alguns outros relativos às relações trabalhistas, foi instituído o Fórum Nacional do Trabalho, com o objetivo de elaborar soluções para os atuais problemas jurídicos na esfera trabalhista brasileira.

Chegou-se à conclusão que não seria possível o aperfeiçoamento do modelo atual sem uma mudança na Constituição Federal, e para tanto foi elaborada uma Proposta de Emenda à Constituição, que atualmente encontra-se em tramitação no Congresso Nacional.

3.3.1 O Fórum Nacional do Trabalho

Como mencionado acima, diante dos problemas do atual sistema sindical brasileiro, bem como da estrutura legal das relações de trabalho, foi instituído o Fórum Nacional do Trabalho pelo Decreto nº 4796, de 30 de Julho de 2003 [116], com o objetivo de elaborar projetos legislativos de reforma sindical e trabalhista.

Para facilitar a realização dos trabalhos, o Fórum foi dividido em oito grupos temáticos: organização sindical, negociação coletiva, sistema de composição de conflitos individuais e coletivos, legislação do trabalho e micro e pequenas empresas, autogestão e informalidade.

Após quase dois anos de discussão chegou-se à elaboração de uma Proposta de Emenda à Constituição e de um Anteprojeto de Lei de Relações Sindicais, que têm o objetivo de modernizar as regras das relações trabalhistas.

A Proposta de Emenda à Constituição de número 369 foi apresentada à Câmara dos Deputados no dia 04 de Março de 2005, e ainda encontra-se em tramitação no Congresso Nacional [117].

3.3.2 A PEC 369 e o modelo de organização sindical

Diante das contradições do modelo atual de relações trabalhistas e de organização sindical percebeu-se a necessidade de uma mudança Constitucional para que sejam aperfeiçoados os princípios democráticos.

Com relação ao modelo de organização sindical, a Proposta de Emenda à Constituição 369, se aprovada, modificará dois pontos cruciais na Constituição Federal, que passará a ter o seguinte texto:

Art. 8 É assegurada a liberdade sindical, observado o seguinte:

I - o Estado não poderá exigir autorização para fundação de entidade sindical, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção nas entidades sindicais;

II - o Estado atribuirá personalidade sindical às entidades que, na forma da lei, atenderem a requisitos de representatividade, de participação democrática dos representados e de agregação que assegurem a compatibilidade de representação em todos os níveis e âmbitos da negociação coletiva; [...]

IV - a lei estabelecerá o limite da contribuição em favor das entidades sindicais que será custeada por todos os abrangidos pela negociação coletiva, cabendo à assembléia geral fixar seu percentual, cujo desconto, em se tratando de entidade sindical de trabalhadores, será efetivado em folha de pagamento;

V - a contribuição associativa dos filiados à entidade sindical será descontada em folha de pagamento; [...]

O primeiro ponto a ser tratado é a supressão do princípio da unicidade sindical, que pode ser percebido através da leitura da proposta para a redação do inciso II do artigo 8º da Constituição Federal.

Não há mais a proibição constitucional de que somente um sindicato poderá existir em determinada base sindical, e a Constituição delega a lei ordinária a regulamentação da obtenção de personalidade sindical, de acordo com regras para obtenção de representação.

A mudança é interessante, pois abre a possibilidade dos trabalhadores, caso insatisfeitos com o sindicato a que pertencem, fundarem outro sindicato, sem terem que disputar poder internamente no sindicato de origem.

Esta possibilidade contribui tanto para os princípios democráticos, dando mais liberdade para os trabalhadores, como fortalece os próprios sindicatos já existentes que, para não perderem associados, necessitam trabalhar em seu favor, pois podem correr o risco até mesmo de deixar de existir caso muitos trabalhadores sintam-se insatisfeitos com sua atuação.

A longo prazo, a expectativa é que os sindicatos se tornem fortes, pois somente os mais bem organizados e administrados sobreviverão, atendendo de forma mais eficiente às necessidades dos trabalhadores.

O segundo ponto a ser tratado é a exclusão do imposto sindical (também conhecido como contribuição sindical), contribuindo para a liberdade dos trabalhadores, que não ficam obrigados a financiar uma instituição na qual não acreditam.

Esta exclusão também é importante para definitivamente transformar o sindicato em uma instituição de natureza jurídica privada, como este deve ser, pois retira qualquer possibilidade de atuação estatal no financiamento das entidades sindicais.

Assim, a Proposta de Emenda à Constituição 369 mantém somente a contribuição associativa (paga somente pelos associados) e a decorrente de negociação coletiva, onde efetivamente há uma atuação sindical que abrange aqueles que dela irão usufruir.

Tal modelo também contribui para uma melhoria da eficiência dos sindicatos, pois estes precisarão buscar novos membros para se financiarem, além de trabalhar visando o bem-estar do trabalhador, para que não percam associados.

Do mesmo modo, a longo prazo, a tendência é que os sindicatos fiquem mais fortes, desaparecendo aqueles que não atendem as expectativas dos trabalhadores, e permanecendo aqueles bem organizados, que realmente buscam lutar pelos interesses dos trabalhadores.

Percebe-se que estas duas mudanças contribuem incisivamente para a realização dos princípios democráticos: o poder pode ser transferido livremente, através da criação de novos sindicatos (necessitando somente atender as regras estabelecidas em lei para obtenção de representatividade), e o trabalhador também é livre para se filiar ao sindicato que bem entender, sem ser obrigado a pagar por um serviço que não utiliza, como não ocorre no modelo atual.

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Sobre o autor
Tiago Andreotti e Silva

Bacharel em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco. Bacharel em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Mestrando em International Legal Studies pela New York University.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Tiago Andreotti. A organização sindical e os princípios democráticos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2282, 30 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13546. Acesso em: 26 dez. 2024.

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