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As decisões judiciais como objeto da arguição de descumprimento de preceito fundamental

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25/09/2009 às 00:00
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4. Conclusões

Por todo o exposto, podem ser extraídas as seguintes conclusões:

a)A Constituição da República de 1988 introduziu no ordenamento jurídico brasileiro a argüição de descumprimento de preceito fundamental, transferindo ao legislador infraconstitucional a atribuição de regulamentá-la e aperfeiçoar-lhe a aplicabilidade.

b)Nesse sentido, em 03 de dezembro de 1999 foi editada a Lei nº 9.882, dando conformação legal e definindo as regras procedimentais da argüição de descumprimento de preceito fundamental.

c)No que se refere às decisões judiciais, seu tratamento no âmbito da argüição de descumprimento de preceito fundamental deve ser realizado em dupla dimensão, pois podem tanto ser objeto de pedido liminar de suspensão de seus efeitos, quanto de pedido final de mérito.

d)Quando as decisões judiciais forem objeto de pedido liminar em arguição de descumprimento de preceito fundamental, o Supremo Tribunal Federal poderá, por decisão da maioria absoluta de seus membros, deferir o pedido liminar. Nos casos de extrema urgência ou de perigo de lesão grave, ou ainda, em período de recesso, a liminar poderá ser concedida pelo relator, ad referendum do Tribunal Pleno. Neste sentido, as liminares concedidas pelo Supremo Tribunal Federal nas argüições de descumprimento de preceito fundamental nºs 10, 33, 47, 53, 54, 77, 79 e 130, nas quais foram liminarmente suspensos os efeitos de decisões judiciais. Ressalte-se que, em tais casos as decisões judiciais não figuravam como objeto central da impugnação, havendo, tão-somente pedido de suspensão liminar de seus efeitos.

e)No que se refere ao cabimento de argüição de preceito fundamental que tenha por objeto principal um conjunto de decisões judiciais, o cerne da controvérsia reside na interpretação a ser dada à norma prevista no artigo 4º, § 1º, da Lei nº 9.882, de 1999, segundo a qual não será admitida a argüição de descumprimento de preceito fundamental quando houver qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade.

f)Inicialmente, o entendimento do Supremo Tribunal Federal foi no sentido de que a argüição de descumprimento de preceito fundamental somente seria admitida após o esgotamento de todos os meios judiciais aptos a sanar a lesividade.

g)Ocorre que, quando do julgamento da ADPF n. 33, o Supremo Tribunal Federal modificou seu entendimento, passando a entender que a aplicação do requisito subsidiariedade deve restringir-se aos demais processos objetivos previstos no sistema constitucional.

h)Tal entendimento foi confirmado em decisão monocrática proferida na ADPF nº 114, na qual se entendeu que seria possível o ajuizamento de argüição de descumprimento de preceito fundamental contra um conjunto de decisões judiciais, desde fosse suscitada lesão ao interesse público e a questão não pudesse ser resolvida com a agilidade e uniformidade necessárias nas outras vias processuais disponíveis à Administração Pública.

i)No julgamento da ADPF nº 117 foi reforçado o entendimento de necessidade de cumulação dos requisitos interesse público e necessidade de rápida e uniforme solução da controvérsia.

j)Ao conhecer da ADPF nº 101 o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que é cabível a argüição de descumprimento de preceito fundamental para impugnação de um conjunto de decisões judiciais conflitantes, desde que: a) não seja cabível ação direta de inconstitucionalidade ou ação declaratória de constitucionalidade; b) haja lesão ao interesse público; c) a questão não possa resolvida com a agilidade e uniformidade necessárias nas vias processuais comuns; d) ocorra ameaça princípio da segurança jurídica.

k)Conseqüentemente, sempre que exista um conjunto de decisões judiciais conflitantes e, cumulativamente, estejam presentes todos os requisitos elencados na alínea "j" destas conclusões, será cabível a argüição de descumprimento de preceito fundamental.

l)A decisão proferida na argüição de descumprimento de preceito fundamental não alcançará as decisões judiciais conflitantes já transitadas em julgado.


Referências

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 13. ed. Belo Horizonte. Del Rey, 2007, p. 430.

NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 310.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 83.

TAVARES, André Ramos. Repensando a ADPF o complexo modelo brasileiro de controle da constitucionalidade. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/andre_ramos2.pdf> Acesso em: 05 abr. 2009.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF 3 QO, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 18/05/2000, DJ 27-02-2004 PP-00020 EMENT VOL-02141-01 PP-00001.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF 33, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 07/12/2005, DJ 27-10-2006 PP-00031 EMENT VOL-02253-01 PP-00001 RTJ VOL-00199-03 PP-00873.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 101, Relator (a):  Mina. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, decisão 11-03-2009, DJ 16-03-2009.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 114, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, decisão monocrática de 21-06-2007, DJ 27-06-2007.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 117, Relator(a):  Min. EROS GRAU, decisão monocrática de 16-10-2007, DJ 22-10-2007.

BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Pet 1140 AgR, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, TRIBUNAL PLENO, julgado em 02/05/1996, DJ 31-05-1996 PP-18803 EMENT VOL-01830-01 PP-00001.

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Notas

  1. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 83.
  2. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Pet 1140 AgR, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, TRIBUNAL PLENO, julgado em 02/05/1996, DJ 31-05-1996 PP-18803 EMENT VOL-01830-01 PP-00001.
  3. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 13. ed. Belo Horizonte. Del Rey, 2007, p. 430.
  4. Neste sentido: NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 310.
  5. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF 3 QO, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 18/05/2000, DJ 27-02-2004 PP-00020 EMENT VOL-02141-01 PP-00001.
  6. TAVARES, André Ramos. Repensando a ADPF o complexo modelo brasileiro de controle da constitucionalidade. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/andre_ramos2.pdf> Acesso em: 05 abr. 2009.
  7. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF 33, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 07/12/2005, DJ 27-10-2006 PP-00031 EMENT VOL-02253-01 PP-00001 RTJ VOL-00199-03 PP-00873.
  8. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 114, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, decisão monocrática de 21-06-2007, DJ 27-06-2007.
  9. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 117, Relator(a):  Min. EROS GRAU, decisão monocrática de 16-10-2007, DJ 22-10-2007.
  10. BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF n. 101, Relator (a):  Mina. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, decisão 11-03-2009, DJ 16-03-2009.
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Sobre a autora
Gisele de Assis Campos

Advogada. Especialista em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Gisele Assis. As decisões judiciais como objeto da arguição de descumprimento de preceito fundamental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2277, 25 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13567. Acesso em: 18 abr. 2024.

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