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Créditos de insumos para PIS e COFINS e a locação de bens móveis

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3.Princípio Constitucional da Isonomia

Como senão bastasse a violação ao princípio da não cumulatividade, é preciso considerar, para fins de creditamento do PIS e COFINS, o princípio constitucional da isonomia ou igualdade tributária previsto no artigo 150, II, da Constituição Federal abaixo transcrito:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

...

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos..."

Francisco Campos defende que:

"A lei será igual para todos e a todos se aplicará com igualdade. É um direito incondicional e absoluto. Não tolera limitações, não admite exceção, seja qual for o motivo invocado; lei alguma, nenhum poder, nenhuma autoridade poderá direta ou indiretamente, de modo manifesto ou sub-reptício, mediante ação ou omissão, derrogar o princípio da igualdade." [14]

Ives Gandra da Silva Martins, ao tratar da isonomia, destaca que:

"... todos aqueles que se encontrem em situação equivalente, por força do relevantíssimo princípio constitucional, não podem ser tratados de forma desigual, risco de o tratamento administrativo ou legislativo macular, ferir, tisnar de inconstitucional tal ação do Poder Público.

Tratamento administrativo ou legislativo desigual gera a mais grave de todas as violações à ordem jurídica, que é a inconstitucionalidade. E exatamente para evitar interpretações convenientes ao aumento de arrecadação ou a privilegiar amigos ou aliados, assim como exegeses coniventes de ações menos dignas ou mais suspeitas da administração, é que o legislador acrescentou a incisiva proibição, não ofertando qualquer amparo a tais interpretações ‘pro domo sua’ da Administração." [15]

Vê-se, portanto, que, estando os contribuintes em situação equivalente, não há como prevalecer tratamento tributário desigual. Ao restringir o aproveitamento dos créditos sobre os insumos necessários àquelas empresas cuja atividade é a locação de bens móveis, sendo permitido que os demais contribuintes que exercem atividades em outros setores da economia possam se creditar dos insumos utilizados em suas atividades que, por conseguinte, gerarão receitas (fato gerador do PIS e COFINS), tais como os industriais, comerciais e prestadores de serviços, o legislador infraconstitucional trata as primeiras empresas de forma diferenciada, o que fere de morte o princípio da isonomia que rege nosso sistema tributário.

A utilização da não cumulatividade por determinados contribuintes em detrimento de outros que se encontram em situações equivalentes é suficiente para a violação do princípio da isonomia. Se o legislador constituinte nada dispôs a respeito da limitação da não cumulatividade, com exceção da definição dos setores de atividade econômica para os quais tal sistemática poderá ser utilizada, o que está expresso nos artigos 8º da Lei nº 10.637/02 e 10 da Lei nº 10.833/03, é inconstitucional a edição de qualquer norma que não esteja em adequação com o texto constitucional.

O Tribunal Regional Federal da 1º Região, ao analisar a isonomia em relação ao PIS e COFINS na Apelação Cível nº 2006.33.00.016639-0/BA, assim se manifestou:

"TRIBUTÁRIO. PIS/COFINS. NÃO-CUMULATIVIDADE. ART. 195, § 12, DA CF/1988 - EC 42/2003. LEIS 10.637/2002, 10.833/2003 e 10.925/2004. VEDAÇÃO DE TRATAMENTO DESIGUAL A CONTRIBUINTES EM SITUAÇÕES EQUIVALENTES. ART. 150, II, DA CF/1988. 1. A EC 42/2003 - art. 195, § 12, da CF/1988 - e as Leis 10.637/2002, 10.833/2003 e 10.925/2004 estabeleceram hipóteses de não-cumulatividade para as contribuições para o PIS e para a COFINS. Essas Leis majoraram significativamente as alíquotas das contribuições, com a contrapartida da não-cumulatividade, gerando hipótese de créditos para os contribuintes. 2. A efetivação da não-cumulatividade do PIS e da COFINS pressupõe a necessária previsão de deduções que digam respeito a operações anteriores do contribuinte, que possam ser aproveitadas posteriormente. As deduções previstas nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 não configuram benesse fiscal, mas verdadeiro pressuposto da não-cumulatividade, no intuito de compensar o aumento da alíquota das contribuições para o PIS e a COFINS.

3. O art. 8º da Lei 10.925/2004 previu a não-cumulatividade para o contribuinte que tenha como insumo ou matéria-prima de origem animal ou vegetal previsto no NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul), desde que o produto final seja destinado à alimentação humana ou animal.

4. Em razão do princípio da isonomia tributária, que veda ao ente tributante instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente - art. 150, II, da Constituição Federal de 1988 -, não se pode admitir o aumento significativo da alíquota das contribuições, sem a necessária contrapartida da não-cumulatividade. 5. A isonomia tributária não permite que sejam excluídos da não-cumulatividade prevista para as contribuições ao PIS e à COFINS os produtores que adquirem seus insumos ou matérias-primas de origem animal de pessoas físicas ou de cooperado pessoa física, pelo simples fato de não terem produto final destinado à alimentação humana ou animal, sem qualquer justificativa para tanto. 6. Aplicável o crédito presumido criado pelo art. 8º, caput e § 3º, da Lei 10.925/2004, que permite às pessoas jurídicas que produzam mercadorias de origem animal ou vegetal, classificadas nos capítulos lá especificados da NCM, a dedução nas contribuições para o PIS e COFINS, tal como especificado na norma.

7. Apelação cível e remessa oficial a que se nega provimento." [16] (grifamos). 

No processo acima, o Sindicato da Indústria do Curtimento de Couros e Peles no Estado da Bahia questionou a impossibilidade das empresas filiadas utilizarem créditos de PIS e COFINS oriundos da compra de insumos de pessoas físicas, sendo que as empresas que produzem mercadorias destinadas à alimentação são beneficiadas por um crédito presumido das contribuições.

Destaque-se o seguinte trecho do voto Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso (relatora) acerca da isonomia:

"A isonomia tributária não permite que sejam excluídos da não-cumulatividade prevista para as contribuições ao PIS e à COFINS os produtores que adquirem seus insumos ou matérias-primas de origem animal de pessoas físicas ou de cooperado pessoa física, pelo simples fato de não terem produto final destinado à alimentação humana ou animal, mas destinado ao vestuário.

Em matéria tributária, as distinções podem se dar em função da capacidade contributiva ou por razões extra-fiscais que estejam alicerçadas constitucionalmente, como na determinação de tratamento favorecido para as micro empresas e empresas de pequeno porte (art. 146, III, d, da CF) — PAULSEN, Leandro, in Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 9ª edição, editora Livraria do Advogado, Porto Alegre, 2007, p. 194.

Não se admite que contribuintes em situações equivalentes tenham tratamento desigual (art. 150, II, da CF/1988). Tal como asseverado pela Exma. Juíza sentenciante, com propriedade, que adequando-se o conceito de isonomia ao de ‘situação equivalente, a equivalência revela igualdade mais ampla. Referida igualdade exige absoluta consonância, ou seja, situações iguais na equivalência, mas diferentes na forma, não podem ser tratadas diversamente. A equivalência estende à similitude das situações a necessidade de tratamento igual pela política impositiva, afastando a tese de que os desiguais devem ser tratados, necessariamente, de forma desigual, pois os desiguais, em situação de aproximação devem ser tratados, pelo princípio da equivalência, de forma igual, em matéria tributária, visto que a igualdade absoluta, na equivalência, não existe, mas apenas a igualdade na equiparação de elementos (fl. 182).

A situação de equivalência do apelado com aqueles expressamente previstos como autorizados ao regime de não-cumulatividade é patente. As Leis 10.637/2002, 10.833/2003 e 10.925/2004 não apresentaram elementos que legitimassem o tratamento diferenciado entre os contribuintes que estejam em situação equivalente. Não há permissão constitucional para a discriminação efetivada, de que somente aqueles produtores cujo produto final seja destinado à alimentação humana ou animal fazem jus ao creditamento dos insumos.

Portanto, deve ser mantida a sentença para reconhecer a aplicabilidade, aos associados do autor, do crédito presumido criado pelo art. 8º, caput e § 3º, da Lei 10.925/2004, que permite às pessoas jurídicas que produzem mercadorias de origem animal ou vegetal, classificadas nos capítulos lá especificados da NCM, a dedução nas contribuições para o PIS e COFINS, de um crédito presumido (de 60% a 35%) calculado sobre o valor dos bens e serviços utilizados como insumo na fabricação de produtos destinados à venda ou à prestação de serviços, adquiridos de pessoas físicas ou recebidos de cooperado pessoa física." (grifamos).

É mister destacar também que as pessoas jurídicas que realizam a atividade de locação de bens também não foram tratadas de forma isonômica em relação a pessoas jurídicas industriais e prestadoras de serviços, pois o artigo 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 permitiu o crédito dos encargos de depreciação e amortização de "máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços" (grifamos), mas restringiu o crédito de insumos apenas nos casos de "prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes..." (grifamos).

Como no caso do princípio da não cumulatividade, a impossibilidade do creditamento dos insumos utilizados na atividade de locação de bens móveis, para fins de cálculo do PIS e COFINS, viola também o princípio da isonomia tributária.


4. A Lei Complementar nº 95/98 e os Créditos de Insumos Relacionados e Utilizados na Locação de Bens Móveis

A análise de impossibilidade do creditamento dos insumos na atividade de locação de bens móveis passa também pela adequação das disposições contidas nas Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 com as normas previstas pela Lei Complementar nº 95/98, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, além de estabelecer normas para a consolidação dos atos normativos que menciona.

O artigo 5º da Lei Complementar nº 95/98 diz expressamente que "a ementa será grafada por meio de caracteres que a realcem e explicitará, de modo conciso e sob a forma de título, o objeto da lei".

Não encontramos, por exemplo, na ementa da Lei nº 10.637/02 [17] nada que se permita concluir que a não cumulatividade do PIS e da COFINS seja aplicável somente a uma ou algumas categorias econômicas como, por exemplo, os industriais ou prestadores de serviços.

O artigo 7º da Lei Complementar nº 95/98, por sua vez, estabelece que:

"Art. 7º O primeiro artigo do texto indicará o objeto da lei e o respectivo âmbito de aplicação, observados os seguintes princípios:

I - excetuadas as codificações, cada lei tratará de um único objeto;

II - a lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão;

III - o âmbito de aplicação da lei será estabelecido de forma tão específica quanto o possibilite o conhecimento técnico ou científico da área respectiva;

IV - o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subseqüente se destine a complementar lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa."

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O artigo 1º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/01 determina que as contribuições ao PIS e COFINS têm como fato gerador o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, sendo que o total das receitas compreende a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica.

Cotejando o artigo 7º da Lei Complementar nº 95/98, que explicita o objeto da lei e o seu respectivo âmbito de aplicação, e o artigo 1º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/01, mais uma vez não encontramos regra que limite a aplicação da não cumulatividade para determinada ou determinadas categorias econômicas.

Pedro Guilherme Accorsi Lunardelli analisa a questão com grande maestria:

"51. O objeto desta Lei, portanto, refere-se à contribuição ao PIS devida pelas pessoas jurídicas em geral, não havendo qualquer referência ao tipo de atividade que as mesmas exerçam. Sendo assim, deste objeto não se deduz que o regime da não-cumulatividade aplicar-se-ia apenas às comerciais e às industriais.

52. Em outras palavras, a especificidade de que trata esta Lei nº 10.637/02 não é em relação ao tipo de atividade exercida pelas pessoas jurídicas que nela se enquadram, mas sim à forma de não-cumulatividade que, no caso, está para a redução da base de cálculo desta contribuição." [18]

O artigo 11, II, b, da Lei Complementar nº 95/98, por sua vez, reza que:

"Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas:

...

II - para a obtenção de precisão:

...

b) expressar a idéia, quando repetida no texto, por meio das mesmas palavras, evitando o emprego de sinonímia com propósito meramente estilístico..."

Quando o artigo 3º das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03 [19] fala que a "pessoa jurídica" poderá descontar créditos calculados em relação ao disposto nos incisos seguintes, vê-se que o legislador utilizou a mesma expressão "pessoa jurídica" contida no artigo 1º das mesmas Leis, o que comprova a sua intenção de fazer com que a não cumulatividade atinja toda a qualquer pessoa jurídica, exceto aquelas previstas nos artigos 8º da Lei nº 10.637/02 e 10 da Lei nº 10.833/03.

Ainda que o objetivo do legislador fosse o de estabelecer distinção para a não cumulatividade do PIS e COFINS em razão da atividade econômica exercida pela pessoa jurídica, haveria a necessidade de se respeitar o § 9º, do artigo 195, da Constituição Federal [20], que apenas autoriza a diferenciação em função das alíquotas ou bases de cálculo. Como a base de cálculo do PIS e COFINS está expressamente definida no artigo 1º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 para todas as categorias de contribuintes, nota-se que o legislador não quis fazer este tipo de distinção.

Além disso, o mesmo artigo 11 da Lei Complementar nº 95/98, em seu inciso III, c e d, manda que, para a obtenção de ordem lógica, um dispositivo legal deve:

"c) expressar por meio dos parágrafos os aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida;

d) promover as discriminações e enumerações por meio dos incisos, alíneas e itens."

Se, portanto, cabe aos parágrafos apontar as exceções à regra estabelecida, temos que as únicas exceções à regra da não cumulatividade são aquelas elencadas nos §§ 2º e 3º, do artigo 3º, das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03 [21]. Daí infere-se que as empresas que locam bens móveis não foram incluídas entre as exceções à regra da não cumulatividade, motivo pelo qual não lhes é vedado o direito de crédito sobre os insumos utilizados em sua atividade.

Fazemos menção novamente à lição de Pedro Guilherme Accorsi Lunardelli, para quem "não compete aos incisos estabelecer exceções à regra contida no caput de um artigo, posto que isto é função dos parágrafos. No entanto, cabe-lhes prescrever discriminações que devem ser compreendidas como a ação de discernir, de diferenciar ou de distinguir que, neste contexto da LC nº 95/98, não se confunde com a ação de excepcionar, posto qual é restrita aos parágrafos." [22]

A análise das disposições contidas nas Leis nºs 10.637/02 e 10.833/01 em conjunto com a Lei Complementar nº 95/98 levam-nos a concluir que as vedações a não cumulatividade encontram-se previstas nos §§ 2º e 3º, do artigo 3º das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, bem como nos artigos 8º da Lei nº 10.637/02 e 10 da Lei nº 10.833/03.

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Sobre o autor
Gilberto de Castro Moreira Junior

Doutor em Direito Tributário pela USP. Professor de Direito Tributário. Advogado em São Paulo (SP). Autor do livro "Bitributação Internacional e Elementos de Conexão" (Aduaneiras, 2003). Coordenador do livro "Direito Tributário Internacional" (MP Editora, 2006). Co-autor de livros e autor de artigos em revistas especializadas e periódicos. Membro do Comitê Científico da Associação Paulista de Estudos Tributários - APET. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário - IBDT. Membro do Instituto de Direito do Comércio Internacional e Desenvolvimento - IDCID. Membro Examinador do Exame de Ordem e do Tribunal de Ética (OAB-SP). Diretor da Ernst & Young.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA JUNIOR, Gilberto Castro. Créditos de insumos para PIS e COFINS e a locação de bens móveis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2287, 5 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13619. Acesso em: 22 nov. 2024.

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