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A importância da atividade de inteligência na área jurídica militar

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21/10/2009 às 00:00
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5- ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA NO JUDICIÁRIO MILITAR

Na condução de um processo criminal, compete ao juiz a busca, quase nunca inalcançável, da verdade real. O que existe, na realidade, é a verdade processual trazida aos autos pelos sujeitos processuais, por intermédio dos meios probatórios nominados (estabelecidos no processo penal - CPPM) ou inominados (sem nomenclatura na lei), dentre os quais podemos citar: a delação, o reconhecimento fotográfico, o reconhecimento de voz e a própria atividade de inteligência. Não obstante, o juiz deve, para bem desempenhar sua função e fundamentar sua decisão, esmerar-se no aprimoramento da coleta de provas, notadamente àquelas nas quais participa ativamente (interrogatório e oitivas do ofendido e testemunhas). Vale dizer, utilizar-se de técnicas já consolidadas em outros institutos como, por exemplo, as técnicas de entrevistas (operações de inteligência ).

Na Justiça Militar, uma vez instaurado o processo, esta tarefa compete aos Conselhos de Justiças (Permanentes ou Especiais), compostos por um juiz togado e quatro juízes militares. Desse modo, além do juiz-auditor, os juízes militares também participam das inquirições.

Ressalte-se que, infelizmente, tal procedimento passa ao largo da grande maioria da magistratura brasileira, seja por desconhecimento ou mesmo por ausência de reflexão sobre o assunto.

Uma das técnicas preconizadas pela entrevista, aplicada à inteligência, consiste na eliminação de ruídos que obstruem à comunicação, por ocasião da entrevista. Os apontados basicamente são: as barreiras psicológicas e dificuldades de linguagem. No caso do juiz, estes obstáculos podem ocorrer durante as audiências, oportunidade em que são ouvidos: réus /testemunhas /ofendidos. Com efeito, o fato de um cidadão sentar-se à frente de um juiz para prestar depoimento, seja em que condição for, é, sem dúvida, um fato gerador de apreensão para a maioria das pessoas. A tensão é redobrada quando ocorre diante de um Conselho de Justiça. (na presença de cinco juízes).

O fato agrava-se, contudo, quando o juiz utiliza expressões eruditas ou abusa do "juridiquês" no ato de inquirir. Este proceder, por parte do magistrado, bloqueia, por completo, a comunicação e a espontaneidade do declarante (réu, testemunha ou ofendido) e, por conseguinte, sua eventual boa vontade de colaboração. Este ruído pode pulverizar a coleta de uma relevante prova (depoimento ou confissão), prejudicando assim o alcance da verdade.

A técnica de entrevista adota os seguintes princípios básicos que, se utilizado pelo judiciário, em muito auxiliaria na busca da verdade. São eles: ouvir com atenção, perguntar corretamente e registrar adequadamente

Ouvir com atenção é ser paciente e tolerante. Perguntar e registrar corretamente significa, para a citada técnica, além da utilização do vocabulário acessível ao inquirido, não interromper o raciocínio do entrevistado quando este se dispõe a falar. Sugere-se, assim, que, num exercício de memorização, o juiz proceda a consignação a termo somente ao final da inquirição e não, como geralmente acontece, após cada pergunta.

Em outra vereda, a justiça penal em muito avançaria, no critério eficiência, caso adotasse alguns procedimentos inerentes às atividades de inteligência stricto sensu e contra-inteligência (segurança orgânica), consistentes em, respectivamente, criação de um banco de dados com capacidade de armazenar as imensas quantidades de informações que circulam em seu âmbito. Ademais disso, faz-se necessário estabelecer um significado para as mais relevantes, posto que, conforme doutrinou Platt, ( 1967, p. 117-173 ): "fatos nada significam" quando não relacionados a outros fatos ou postos em destaques o seu significado.

No seguimento da segurança orgânica, as atenções do judiciário estariam voltadas basicamente para as regras de custódia e transmissão de documentos e processos, restrições físicas de acesso aos prédios e arquivos para pessoas não autorizadas, investigações do pessoal contratado antes da concessão de credencias de acesso às informações classificadas, bem como proteção do pessoal, instalação, comunicações e informática.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do que foi exposto, demonstrou-se que a atividade de inteligência constitui-se num valioso e imprescindível auxílio para área jurídica em geral,notadamente a penal.

Com efeito, a inteligência propriamente dita permitirá que os citados ramos jurídicos, utilizando-se de técnicas e ferramentas adequadas, trabalhem as volumosas quantidades de informações com que cotidianamente se deparam, quer referentes ao seu trabalho forense, quer quanto ao estabelecimento e execução de sua estratégia institucional (orçamento, materiais e recursos humanos).

No que pertine à área de contra-inteligência, a preocupação estaria voltada para a salvaguarda da segurança orgânica dos órgãos, a segurança de seus membros, as informações sigilosas, enfim, a proteção dos seguintes vetores: dados, informações, conhecimentos, proteção pessoal, documental e material, bem como as áreas de instalações.

Ainda no espectro da inteligência, temos as operações que poderão auxiliar no descortino de autoria(s) de crime(s) cuja sofisticação constitui-se num significativo complicador para as atribuições da Polícia Judiciária Militar (PJM) e do Ministério Público Militar.

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De fato, atividade de inteligência, além de ser de fundamental importância para a produção de conhecimentos, permite uma melhor compreensão quanto à evolução dos acontecimentos sociais contrários à ordem pública.

De certo, nesse palco de atividade, devem participar, além dos atores principais (analistas e agentes de operações de inteligência), os representantes da Polícia Judiciária Militar, Ministério Público Militar e a própria Justiça Militar.

É inegável que a doutrina e a metodologia, inerentes ao emprego das atividades de inteligência, se constituem num suporte inestimável para o desenvolvimento das atribuições da Polícia Judiciária Militar, do Ministério Público Militar e Justiça Militar. Só assim, as referidas instituições poderão ser abastecidas com dados e amplos conhecimentos, oportunos e seguros, os quais servirão de embasamento indispensável às etapas do processo decisório e, algumas vezes, na elucidação de alguns fatos criminosos (operações de inteligência).

Não se pode esquecer que, no mundo moderno, o emprego da atividade de inteligência vem se constituindo num fator indispensável de assessoria para tomada de decisões nos setores de mais altos níveis.


REFERÊNCIAS

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__________.Congresso Nacional. Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Brasília, 23 ago 2006.

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Sobre o autor
Luciano Moreira Gorrilhas

Procurador de Justiça Militar

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GORRILHAS, Luciano Moreira. A importância da atividade de inteligência na área jurídica militar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2303, 21 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13715. Acesso em: 26 abr. 2024.

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