Tive o privilégio de ver publicado na revista do egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, relativa ao período julho-97/julho-98, e na "Decisório Trabalhista", de fev/97, pags. 38/40, artigo de minha lavra tratando das horas extras nos regimes 12 X 24, 12 X 36, 24 X 24 e 24 X 48, conhecidas sistemáticas de jornada alongada seguida de um determinado número de horas de folga.
Fui levado a discorrer sobre o tema em face da divergência que grassava no fórum quanto ao real número de horas extras derivadas de tais sistemas de trabalho. Propunha-me a apontar fórmulas que, de modo simples, ajudassem na dissipação da controvérsia.
Foi quando, a partir de operações elementares, cheguei aos seguintes resultados:
REGIME 12 x 24 = enseja 20 horas extras.
REGIME 12 x 36 = Se houver AC ou CCT, não haverá hora extra. Sem AC ou CCT, é devido o adicional de horas extras relativo a 60 h/mês.
REGIME 24 x 24 = importa em 140 horas extras.
REGIME 24 X 48 = importa em 20 horas extras.
Recentemente, consultando o site do Tribunal Superior do Trabalho, deparei-me com notícia acerca de decisão da colenda Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), pertinente a uma trabalhadora que esteve submetida ao sistema 12 x 36, o qual tinha previsão em acordo coletivo. Essa decisão, proferida nos autos do E-RR-804453/2001.0, confirmou o entendimento esposado na tabela acima (o de que no regime 12 x 36, se houver AC ou CCT, não haverá hora extra), sendo mencionado na matéria publicada pela assessoria jurídica do TST que o Ministro Aloysio Veiga, eminente relator, considerara que "enquanto o trabalhador que cumpre 44 horas semanais trabalha 220 horas por mês, o do regime de 12 X 36 trabalha, no máximo, 192 horas".
Assim como o Ministro Aloysio Veiga, eu também, no artigo publicado há mais de 10 anos, considerei que "o trabalhador que cumpre 44 horas semanais trabalha 220 horas por mês". Esse, aliás, foi e é o entendimento esposado em muitos acórdãos e por muitos autores, entre os quais relaciono JOSÉ SERSON, Juiz do Trabalho de São Paulo, no conhecido "Curso de Rotinas Trabalhistas", LTr, 32ª edição, pg. 146, e ANTÔNIO GOMES DAS NEVES, no seu "Manual de Cálculo Para Liquidação de Sentença Trabalhistas", LTr, 2ª edição, pg. 48.
Todavia, hoje estou convencido de que tal entendimento, data vênia, mostra-se equivocado e merece ser corrigido.
Mas onde reside o propalado equívoco?
O engano está justamente em partir do pressuposto de que "o trabalhador que cumpre 44 horas semanais trabalha 220 horas por mês".
Para facilitar a compreensão do leitor, tentarei evidenciar o equívoco a partir de trechos do "Manual de Cálculo", do citado ANTÔNIO GOMES DAS NEVES. Na página 48 desse livro o autor assevera:
Jornada legal depois da CF/88.
Diária - no máximo 8 (oito) horas.
Semanal – no máximo 44 (quarenta e quatro) horas.
Mensal – no máximo 220 (duzentos e vinte) horas.
Porém, no tópico "5.4.5 – Formas de apuração do número de horas extras", inserto na página 50 da mesma obra, o ilustre autor apresenta a seguinte fórmula:
Encontrar o número de semanas que compõe o mês:
Nº de semanas no mês = 30:7 = 4,2857
Onde:
30 (trinta) – corresponde ao número de dias do mês;
7 (sete) – correspondente ao número de dias na semana.
Nestes termos, multiplicando-se o número de horas extras trabalhadas na semana por 4.2857 (número de semanas no mês), temos o número de horas extras no mês. – negritei.
Não resta dúvida que a fórmula acima apresentada está perfeita. Mas se o indigitado autor afirma taxativamente que 4,2857 é o número de semanas do mês, mostra-se, data venia, paradoxal a sua afirmação anterior de que quem trabalha no módulo normal de 44 horas labora 220 horas mensais. Afinal, o resultado da multiplicação de 44 x 4,2857 não é 220. É 188,57 (arredondando, 189).
Aliás, não se compreende como é que o mencionado autor (e muitos outros) ao apontar o número de horas semanais da "jornada legal depois da CF/88" informa 44 e, quando indica o número mensal acusa 220. Por que ele conta as horas do RSR no módulo mensal e não faz o mesmo em relação ao módulo semanal? Pouca gente atenta para esse detalhe. Ou melhor, para esse outro equívoco.
Com efeito, 220 não é o número de horas mensalmente trabalhadas por quem tem jornada de 8 horas e módulo semanal de 44 horas. 220 é, na verdade, o número pelo qual deverá ser dividida a remuneração do autor, para a apuração do valor de cada hora por ele trabalhada, desde que cumpra jornada de 8 horas diárias em módulo de 44 horas na semana.
Ou seja, nessas 220 horas estão inseridas as 8 (oito) horas de domingo as quais, no módulo de 44 previsto no art. 7º, XIII, da CF/88, não são trabalhadas.
Portanto, o número de horas efetivamente trabalhadas ao mês por quem tem jornada semanal de 44 horas é, em média, 189 (44 x 4,2857 = 189, com o arredondamento).
Destarte, já com os necessários ajustes, apresento, a seguir, as fórmulas que nos levam aos números de horas extras nos sistemas de trabalho mencionados no título deste artigo.
HORAS EXTRAS
REGIME 12 X 36
Usando o mesmo raciocínio utilizado no regime 12 x 24, tem-se que o empregado, no regime 12 x 36, labora ¼ das horas de um mês (12 + 36 = 48 e 12 é ¼ de 48) e folga 3/4. Como são 720 horas a cada mês, o empregado trabalha 180 horas. Não há, a princípio, horas extras, já que o trabalho normal mensal é de 189 horas.
REGIME 12 X 48
Usando o mesmo raciocínio utilizado em relação aos sistemas antes mencionados, tem-se que o empregado que trabalha no sistema 12 x 48 labora 1/5 das horas de um mês, ou seja, 144 horas a cada mês. Explico: 12h de trabalho + 48h de folga = 60 horas. Pode-se afirmar que de cada 60 horas vividas, o empregado trabalha 12. Ou seja, 1/5 das horas vividas. Analisando-se o quadro mensal e usando de igual proporção, tem-se que este mesmo empregado trabalha 1/5 das horas vividas em um mês. Como um mês é composto de 720 horas (24h x 30d = 720h), conclui-se que ele trabalhava 144 horas/mês, número equivalente a 1/5 de 720.
Nesse caso, tal como no sistema 12 x 36, não haveria, a princípio, horas extras.
REGIME 24 X 24
Com a mesma metodologia, tem-se que o empregado trabalha metade (½) das horas de um mês (24 + 24 = 48 e 24 é ½ de 48) e folga na outra metade. Como são 720 horas a cada mês, o empregado, no regime 24 x 24, labora 360 horas, o que resulta em 171 horas extras mensais (360 – 189 = 171).
REGIME 24 X 48
Tem-se que o empregado trabalha 1/3 das horas de cada mês (24 + 48 = 72 e 24 é 1/3 de 72). 1/3 de 720 é igual a 240. São, tal como no 12 x 24, 51 horas extras/mês.
Mas o leitor deverá está intrigado: por que o articulista, ao tratar dos sistemas 12 x 36 e 12 x 48, deixou entrever que haveria horas extras se, pelos cálculos utilizados, não haveria labor além das 189 horas normais mensais?
A resposta é simples e pode ser colhida do que está posto no art. 7º, XIII, da CF/88.
No caso de empregado que trabalha no sistema "12 x 36" ou no "12 x 48", vai interessar se existe ou não acordo ou convenção coletiva de trabalho estabelecendo tais regimes. Se houve a pactuação prevista no art. 7º, XIII, da Constituição Federal, certamente não se poderá falar em horas extras. Se, entretanto, esses regimes não foram ajustados mediante acordo ou convenção coletiva (ou se isso não foi provado nos autos), orienta a jurisprudência mais avisada que tem incidência o E. 85. do TST, de modo que seriam devidas não propriamente horas extras, mas tão somente o adicional de horas extras (50%) relativo às horas excedentes da oitava diária. Respaldam esse entendimento os arestos a seguir transcritos, verbis:
HORAS EXTRAS - JORNADA DE TRABALHO 12 x 36 - NOSOCÔMIOS - INEXISTÊNCIA DE LABOR EXTRAORDINÁRIO QUANDO RESPEITADA A JORNADA ORDINÁRIA SEMANAL - O labor dentro da jornada de trabalho de 12 x 36, em nosocômios, deriva de norma coletiva que, referendada pelo sindicato obreiro, expressamente autoriza a implementação de tal sistema, já pacificamente identificado pela jurisprudência regional como mais benéfico, tanto para o empregador como para o trabalhador neste peculiar ramo de atividade empresarial. Não havendo, assim, o extrapolamento da jornada ordinária máxima semanal, legalmente estabelecida, como retratam os incontroversamente fidedígnos cartões-ponto vindos à colação, não há que se falar em labor extraordinário. Recurso obreiro a que se nega provimento.
(TRT 9ª R. - RO 13.756/96 - 2ª T. - Ac. 14.640/97 - Rel. Juiz Arnor Lima Neto - DJPR 06.06.1997).
O regime de 12 horas de trabalho seguido de 36 horas de descanso, adotado em hospitais e entidades assemelhadas, não encontra óbice legal e não implica o pagamento de horas extras, quando há norma coletiva prevendo a sua adoção - inteligência do artigo 7º, inciso XIII, da Constituição Federal.
(PROC. Nº TRT - 00061-2002-003-06-00-3 - 2ª Turma, Juiz Relator : Ivanildo da Cunha Andrade, TRT 6ª R - Publicado no D.O.E. em 13/12/2002).
"O art. 7, inciso XIII, da Constituição Federal, faculta a implantação de jornada de labor superior a quarenta e quatro horas semanais mediante negociação coletiva (ACT ou CCT). Inexistindo norma coletiva contemplando a compensação de jornada, o empregado que trabalha em escala de 12 horas de serviço por 36 de descanso faz jus tão somente ao adicional concernente às horas extras excedentes da oitava nos dias de efetivo trabalho porquanto não excede a jornada máxima mensal, prestando, em média, 180 horas de labor. Incidência da Súmula nº 85 do TST
(RR 243.717/96.5, Ac. 1ª T- João Orestes Dalazen - TST, apud "Trabalho & Doutrina, nº 20, pag.204 ).
"Regime de revezamento 12 x 36 horas - Adicional devido sobre as horas trabalhadas acima da jornada regular. 12. x 36 - O regime de revezamento 12 x 36 horas é uma prorrogação compensada; restando inobservada a formalidade legal, é devido o adicional sobre horas trabalhadas acima da jornada regular "
(TST - 1ª T - Ac. 2.195/91 - Rel. Min. Fernando Vilar - DJU 09.08.91, pag. 10.475. ) - negritei.
Com efeito, quem trabalha no regime "12 x 36" sem o respaldo de acordo ou convenção coletiva tem direito ao adicional de horas extras relativamente a 60 horas mensais (180 : 12 = 15 x 4h que superam a oitava diária = 60). O valor apurado nesse caso é idêntico ao devido por 20 horas extras mensais, já que três adicionais de 50% equivalem a uma hora extra (1,5 h, normal).
E quem trabalha no regime "12 x 48" sem o respaldo de acordo ou convenção coletiva tem direito ao adicional de horas extras relativamente a 48 horas mensais (144 : 12 = 12 x 4h que superam a oitava diária = 48). O valor apurado será, nesse caso, igual ao devido por 16 horas extras/mês.
A propósito, tenho por equivocado o entendimento de alguns juízes que, calculando sobrelabor, usam de contar as horas decorrentes da ficção jurídica criada pelo § 1º do art. 73, da CLT.
Não resta dúvida que referido dispositivo pertine tão somente ao trabalho noturno. Não cabe outra exegese. Só se pode considerar (computar) a "hora ficta" nele tratada quando se está apurando as horas sobre as quais incidirá o adicional noturno. Jamais quando se conta horas extras. Data venia, parece ilógico contar 13 horas de trabalho, por exemplo, no sistema 12 x 24. Se fosse para ser assim, deveríamos ter um esdrúxulo 13 x 24. Chancelando esse equívoco, a Justiça contraria a mens legis, impondo dupla e descabida oneração ao empregador.
Por fim, ciente de que os corridos dias hodiernos imprimiram o gosto pela consulta a tabelas, apresento a síntese dos argumentos acima lançados:
TABELA DE HORAS EXTRAS SEGUNDO O REGIME DE TRABALHO
REGIME 12 x 36 = Se amparado em ACT ou CCT, não haverá hora extra. Sem ACT ou CCT, é devido o adicional de horas extras relativo a 60 h/mês.
REGIME 12 X 48 = Se amparado em ACT ou CCT, não haverá hora extra. Sem ACT ou CCT, é devido o adicional de horas extras relativo a 48 h/mês.
REGIME 24 x 24 = são 171 horas extras/mês.
REGIME 24 X 48 = são 51 horas extras/mês.