5.CONCLUSÃO
Os atos administrativos discricionários por muito tempo foram compreendidos como um campo de liberdade insindicável para a atuação da Administração Pública, de tal forma que se afigurava praticamente impossível o controle jurisdicional, salvo quando se tratasse de infringência à lei. Predominava a concepção de que haveria uma violação ao princípio da separação de poderes.
Ocorre que paulatinamente foi surgindo uma modificação no entendimento da doutrina e da jurisprudência, que passou a admitir o controle judicial com fulcro em abuso ou desvio de poder, ausência de motivação e, com a teoria da força normativa dos princípios, a qual engessou a idéia de que estes são normas de observância obrigatória, também se fortaleceu o fundamento principiológico.
Sob este prisma, algumas teorias ganharam destaque na doutrina, são elas: (a) princípio da juridicidade administrativa, ou legalidade em sentido amplo; (b) inafastabilidade do controle jurisdicional; (c) dever jurídico do administrador público de adotar a solução ideal ou de excelência; e (d) redução da discricionariedade a zero.
As três primeiras são os principais argumentos a justificar a controlabilidade dos atos administrativos discricionários pelo Poder Judiciário. Primeiramente, identificada a ampliação do conceito vetusto de legalidade diante da nova ordem constitucional, entendida modernamente como juridicidade, em que os princípios ganham força por serem o alicerce de todo o ordenamento jurídico. Assim, o ato somente se mostra legal quando em consonância com a legislação e com os princípios, gerais ou específicos do direito administrativo.
Por sua vez, a inafastabilidade do controle jurisdicional, constante no art. 5º, XXXV, da CF, mostra-se como o fundamento jurídico e lógico para a possibilidade de anulação de um ato administrativo, seja ele discricionário ou não, até mesmo justificando a determinação do cumprimento de obrigação de fazer para a Administração quando exigir o caso concreto, sempre em vista do interesse público.
Já o dever jurídico atribuído ao administrador público de adotar a solução de excelência ganha força tendo em vista a supremacia do interesse público. Ou seja, se a Administração tem por dever buscar sempre o interesse público, que não se contenta com uma solução mediana, mas tão-somente com aquela que se mostre ideal, não há que se admitir uma liberdade sem que posteriormente o Judiciário possa atestar o cumprimento ou não deste. E é nesse ponto que surge a redução da discricionariedade a zero, isso porque caso exista apenas uma única alternativa para atender o interesse público, impõe-se sua adoção.
Nessa linha, liga-se intrinsecamente ao princípio da juridicidade, porque serão os princípios que viabilizarão a análise que permitirá concluir se no caso concreto foi alcançada a solução ótima. Em decorrência, ganha força o princípio da razoabilidade, pelo qual se verifica a adequabilidade, necessidade e proporcionalidade da opção do administrador público. Sem dúvida um juízo subjetivo, no entanto, necessário em face da exacerbada liberalidade escondida sob o manto da discricionariedade.
De modo evidente, aumenta-se consideravelmente a margem de controle pelo Judiciário. Com efeito, a Constituição Federal assegurou a esse órgão a independência e a competência para exercer o controle jurisdicional pela via difusa e concentrada, a fim de que não predominassem as lesões e ameaças a direitos. Não se pode olvidar que o órgão judicante é o legitimado constitucional para a defesa e guarda da constituição, incumbindo-lhe a verificação da compatibilidade dos atos, de natureza pública ou privada, sempre que deles decorra arbitrariedade, injustiça ou ilegalidade.
Nesse sentido, detectou-se inclusive ser possível o controle do mérito administrativo, zona de liberdade da Administração Pública, consubstanciado na conveniência e oportunidade, uma vez que não há mérito fora da juridicidade, ou seja, não consentâneo com os princípios e as regras. Além disso, permanece a idéia de que o controle dos atributos motivo e objeto, faixa discricionária do ato, é cabível apenas quando houver vício de legalidade, haja vista a ampliação deste conceito.
Por fim, não se deve olvidar que a jurisprudência hodierna ainda oscila entre admitir o controle judicial da discricionariedade e entendê-lo como espaço de livre atuação do administrador público. Em outras palavras, continua muito forte a idéia de que o controle é alternativa última, quando é de conhecimento amplo que à Administração não é dado fazer coisa alguma sem que haja fiel cumprimento do princípio da legalidade.
Sendo assim, é imperiosa a evolução desse entendimento entre o Poder Judiciário, de forma a assimilar a constitucionalidade do controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários (que se mostra plausível, dentre outras maneiras, pelo princípio da razoabilidade), independentemente de a análise recair sobre o mérito ou não, a fim de viabilizar a efetiva sobreposição da Constituição ante o Direito Administrativo.
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Notas
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