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Fundo partidário: a constitucionalidade da divisão proporcional e limitada de recursos públicos

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18/11/2009 às 00:00
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Resumo: O critério para divisão do fundo partidário é assunto debatido em diversos países. No Brasil, o Congresso Nacional definiu, finalmente, um critério. A lei 9.096/95, regulamentando o artigo 17, §3º da Constituição Federal, estabeleceu a cláusula de barreira para a divisão da maioria dos recursos públicos partidários. O elemento diferenciador adotado foi o percentual mínimo de cinco por cento dos votos válidos na Câmara dos Deputados (Casa do Povo). Como reação, os partidos menores propuseram as ações de declaração de inconstitucionalidade nº 1351-3 e 1354-8. O fundamento dessas demandas, em síntese, era a violação ao pluralismo partidário. As eleições de 2006 demonstraram que 06 partidos ultrapassaram a cláusula de barreira. A despeito disso, em dezembro de 2006, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a cláusula de barreira, juntamente com o critério de divisão dos recursos do fundo partidário. Isso gerou uma lacuna no ordenamento. A solução encontrada pelo Pretório Excelso foi notificar o Tribunal Superior Eleitoral, a fim de que este ente regulamentasse a matéria. Dessa maneira foi feito. Diante desse quadro, pretende esse estudo discutir a impropriedade da decisão do Supremo Tribunal Federal, já que a atuação do controle de constitucionalidade deve ser excepcional. O critério definido era legítimo, já que foi determinado pelos representantes do povo, eleitos pelo voto, obedecendo à igualdade. Não bastasse isso, face à omissão legislativa, a solução possível seria modular os efeitos da declaração de constitucionalidade. Para comprovar a constitucionalidade da delimitação utilizam-se os critérios definidos por J. J. Gomes Canotilho. Em razão desses argumentos, pretende esse estudo reavaliar os parâmetros da decisão do Supremo Tribunal Federal, tentando-se, assim, asseverar a constitucionalidade da proporcionalidade limitada como critério para o recebimento das verbas do fundo partidário e salvaguarda do sistema democrático brasileiro.

Abstract: The basis in which the parties’ fund is shared became a polemic subject in many countries. In Brazil, the National Congress finally defined the division’s standard. The Federal Law n. 9.096/95, which regulates the article 17, §3º, of the Federal Constitution, established the barrier clause for the majority of parties’ fund resources allocation. The key element introduced was the minimum quorum of five percent of the valid votes in the Chamber of Deputies (House of the People). As reaction, the small parties had instituted the Actions of Declaration of Unconstitutionality nº 1351-3 and 1354-8. The bedding of these lawsuits, in synthesis, was the parties’ pluralism violation. The elections of 2006 revealed that 06 parties had exceeded the barrier clause. In December of 2006, the Supreme Federal Court declared the unconstitutionality of the barrier clause, as of the basis of the parties’ fund public resources division. This decision has caused a gap into the law system. The solution created by the Supreme Court was to notify the Electoral Superior Court so that this tribunal could regulate the subject. And so it was done. In this context, this study proposes to discuss the impropriety of the Supreme Federal Court’s decision, since the constitutionality control must be exceptionally performed. The elected standard was legitimate, since it was determined by the representatives of the people, elected by vote, obeying the equality. Nevertheless, face to the legislative omission, the possible solution would be to modulate the effect of the declaration of constitutionality. To prove the constitutionality of the proposed delimitation standards defined by J. J. Gomes Canotilho are used. For this reasoning, the present study intends to reevaluate the parameters of the Supreme Federal Court’s decision, attempting to affirm the constitutionality of the limited proportionality as the basis for the incoming resources from the parties’ fund and for the safeguards of the Brazilian democratic system.

Palavras-chave: Constitucionalidade. Financiamento Público. Partidos Políticos. Proporcionalidade limitada. Poder de legislar.

Keywords: Constitutionality. Public funding. Political parties. Limited proportionality. Ability to legislate.

Sumário: 1 Introdução - 2 O Fundo Partidário e a Cláusula de Barreira – 3 As Ações Declaratórias de Inconstitucionalidade 1351-3 e 1354-8 – 4 A Presunção de Constitucionalidade da limitação do art. 13, § 3 da Constituição Federal – 5 A Invasão da Discricionariedade do Poder Legislativo – 6 A Igualdade de chances conferida aos partidos políticos 7- O Problema da Omissão legislativa deixada pelo julgamento das ADINs 1351-3 e 1354-8 – 8 Avaliação dos Requisitos de Constitucionalidade através do Método de J. J. Canotilho 8.1 Restrição a norma de direito, liberdade ou garantia 8.2 Autorização Constitucional – 8.3 Salvaguarda de outros direitos e interessas constitucionais 8.4 Observância de requisitos constitucionais 8.4.1 Princípio da Proporcionalidade (necessidade, proporcionalidade e adequação) – 8.4.2 Generalidade e Abstração – 8.4.3 Não-retroatividade e garantia de núcleo essencial – 9 Considerações Finais – 10 Referências


1 Introdução

O Brasil, inegavelmente, é um país que viveu os mais diversos formatos políticos. Do Império à República; da ditadura à democracia. Então, após essas etapas, estabeleceu-se na Constituição Federal que o governo brasileiro seria fundado na representação popular. Para garantir a permanência do poder nas mãos do povo, reconheceu-se a necessidade de manter a diversidade política, o que foi possível através dos partidos políticos.

Para evitar a ingerência do poder econômico nas decisões partidárias, a Constituição Federal de 1988 garantiu a sua mantença através de recursos públicos. Nasceu o Fundo Partidário Nacional. Para aqueles que entendem os recursos desse fundo como irrelevantes vale a pena esclarecer que, apenas em 2006, a sua arrecadação foi de 117,8 milhões de reais (1). Esse montante deveria ser dividido entre as agremiações políticas registradas no TSE. Faltava, entretanto, estabelecer de que maneira seria feita essa divisão. Então, em 1995, a lei 9.069 (2) fixou o critério proporcional, ao mesmo tempo em que exigiu a ultrapassagem da cláusula de barreira para o recebimento de maior parte das verbas.

Desde então, a questão enveredou por discussões políticas e judiciais. O tema ganhou maior relevo quando chegou ao Supremo Tribunal Federal. Era o embate: pluralismo partidário versus poder de legislar. Por fim, o Pretório Excelso decidiu que a disciplina dada à matéria, pela lei 9.069/95, era inconstitucional. Dessa decisão, surgiram os problemas a serem tratados nesse trabalho.

Pretende-se discutir aqui como se pode resolver a lacuna deixada por essa declaração de inconstitucionalidade; avaliar a medida tomada na prática; averiguar se o critério fixado pelo Congresso Nacional viola o Princípio da Igualdade; além disso, debater até que ponto o Poder Judiciário pode adentrar na regulamentação conferida pelo Poder Legislativo aos partidos políticos, visto que os critérios eram quantitativos. A metodologia empregada para obter as conclusões desse estudo foram os critérios definidos por J. J. Canotilho (3), em sua Teoria da Constituição, a análise de instrumentos legais para modular a declaração de inconstitucionalidade, bem como a avaliação de princípios constitucionais, juntamente com a posição de doutrinadores da área.


2 O Fundo Partidário e a Cláusula de Barreira

A Constituição Federal de 1988 (4) reservou o capítulo IV para abordar o tema partidos políticos. Nesse espaço fixou os princípios, consagrou a liberdade de criação e de organização. Quando tratou do financiamento das agremiações políticas, determinou no artigo 17, §3: "Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei."

Em outras palavras, o constituinte assegurou aos partidos políticos o recebimento dos recursos do fundo partidário (dinheiro público). Mas, os critérios para o seu recebimento e qual seria o percentual devido a cada entidade deveriam ser determinados pela lei. A norma constitucional necessitava de regulamentação infraconstitucional para ter eficácia (5).

Por essa razão, em 1995, o Congresso Nacional finalmente regulamentou o dispositivo constitucional, através da lei 9.096 (6). No que concerne ao financiamento partidário atrelou o recebimento de recursos aos critérios estabelecidos na chamada cláusula de barreira. Isso significou a fixação de uma série de requisitos a que os partidos políticos ficaram condicionados para merecerem algumas benesses políticas. Os partidos que não conseguissem alcançar o percentual de votos definido pela lei teriam reduzidos vários direitos, como o tempo de horário gratuito na televisão (artigo 49), recursos financeiros (artigo 41), entre outros. Os critérios fixados pela cláusula de barreira foram os seguintes:

Art. 13. Tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenha elegido representante, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mínimo, cinco por cento dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um terço dos Estados, com um mínimo de dois por cento do total de cada um deles.

Através da cláusula de barreira (porcentagem mínima de votos a ser obtida na votação da Câmara dos Deputados) restou estabelecido no artigo 41 da lei 9.096/95 como seria feita a distribuição dos recursos partidários. Um por cento de forma uniforme e noventa e nove por cento conforme a representatividade obtida por quem ultrapassa a cláusula de barreira. Conclui-se que os valores a serem recebidos teriam proporção direta com o número de votos apurados na eleição da Câmara dos Deputados, mas, limitadamente.

Como se poderia esperar, a reação dos partidos pequenos foi imediata. Entenderam-se desfavorecidos pelos novos parâmetros de divisão do fundo partidário. Mais ainda com a redução de direitos proveniente da cláusula de barreira. A atitude seguinte foi a propositura de duas ações diretas de inconstitucionalidade:

- ADIN 1351 – 3 (Proposta pelo PC do B e outros)

Distribuição em 28.09.1995 (7);

- ADIN 1354 – 8 (Proposta pelo PSC – Partido Socialista Cristão)

Distribuição por prevenção em 06.10.1995 (8).

Contudo, não foi imediata a análise do mérito de tais demandas. Ao contrário, houve tempo para testar a aplicação dos artigos da lei 9.096/95, ao menos em tese, já que a divisão do dinheiro do fundo partidário, conforme artigo 57 da lei 9.096/95, só seria efetuada a partir de 2007 (próxima legislatura). O quadro nacional, nas eleições de 2006, terminou da seguinte maneira:

a) no TSE constavam registrados 29 partidos políticos; (9)

b) dos 29 partidos, 16 tinham representação no Congresso Nacional (10);

c) após as eleições, 6 partidos ultrapassaram a cláusula de barreiras. (11).

Passaram a representar o pluralismo partidário os seguintes partidos: 1. Partido Progressista (PP); 2. Partido dos Trabalhadores (PT); 3. Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB); 4. Partido da Frente Liberal (PFL); 5. Partido Socialista Brasileiro (PSB); 6. Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

A despeito da propositura de duas ADINs, terminadas as eleições, a controvérsia sobre a cláusula de barreira e o financiamento partidário parecia estar resolvida. Mas, como se observará na análise a seguir, a celeuma estava só começando.


3 As Ações Declaratórias de Inconstitucionalidade nºs 1351-3 e 1354-8

Como anteriormente demonstrado, logo após a publicação da lei 9.096, certos partidos menores, em 19.09.1995, argüiram a inconstitucionalidade de alguns de seus dispositivos perante o Supremo Tribunal Federal. A ADIN 1351-3, distribuída em 28.09.1995, foi proposta pelo PC do B, PDT, PT, PSB, PV, PL, PSD, PPS, questionando os seguintes dispositivos: artigo 13; expressão contida no art. 41, inciso II; artigo 48; expressão contida no caput do art. 49 e artigos 56 e 57.

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Destacando o fato do tema desse trabalho ser o financiamento partidário, interessa essencialmente a observação do seguinte artigo impugnado:

Art. 41. O Tribunal Superior Eleitoral, dentro de cinco dias, a contar da data do depósito a que se refere o § 1º do artigo anterior, fará a respectiva distribuição aos órgãos nacionais dos partidos, obedecendo aos seguintes critérios:

I - um por cento do total do Fundo Partidário será destacado para entrega, em partes iguais, a todos os partidos que tenham seus estatutos registrados no Tribunal Superior Eleitoral; 

II - noventa e nove por cento do total do Fundo Partidário serão distribuídos aos partidos que tenham preenchido as condições do art. 13, na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados.(12)

Pela redação do artigo 41, ficou claro que o Poder Legislativo, ao fixar um parâmetro para dividir a verba do fundo partidário, utilizou o critério proporcional limitado. Tentou-se, assim, reduzir o notório problema do crescimento do número de partidos políticos, sem, contudo, perder a característica de sistema plural.

Na petição inicial (13) da ADIN 1351-3, de 22 páginas, os fundamentos para o controle de constitucionalidade foram, em síntese, os seguintes:

- Ofensa ao princípio do pluralismo político, fundamento da República (artigo 1º, V, da CF);

- Violação ao exercício do poder do povo, através de seus representantes eleitos (artigo 1º, § único da CF);

- Ofensa à intervenção estatal nas associações e desrespeito ao Direito Fundamental da continuidade de seu funcionamento (artigo 5º, XVII, XVIII e XIX da CF);

- Desrespeito à liberdade dos partidos políticos e sua autonomia organizacional (artigo 17 da CF);

- Infração ao direito dos partidos políticos de ter acesso aos recursos do fundo partidário (artigo 17§ 2º da CF);

A argumentação ventilada na peça vestibular foi a de que haveria ofensa aos dispositivos constitucionais enumerados acima. Não bastasse isso, em sucessivo, os partidos realizaram um paralelo entre os dispositivos da lei 9.096 e a famosa emenda constitucional nº 1/69 (da época da ditadura), para apresentar as duas medidas como antidemocráticas. Ressaltaram, também, que a Constituição Federal de 1988 evoluiu, abolindo tais óbices, fazendo apenas exigências mínimas para a criação e o funcionamento partidário. Por isso, não caberia o retrocesso.

Outro fundamento aduzido foi o de que apenas o "caráter nacional" precisava de objetiva delimitação. Todos os outros princípios enumerados pela Constituição Federal, referentes aos partidos políticos, já seriam auto-suficientes. Prescindiriam de regulamentação infraconstitucional. Como precedentes, apontaram as ADINs 958-3/ RJ e 966-4/DF, julgadas pelo STF, que declararam inconstitucional dispositivos da lei 8.713/93 (chamada de cláusula de barreira ou exclusão naquela época).

O Partido Social Cristão (PSC) propôs uma nova ADIN (1354-8) (14), distribuída em 06.10.1995, argüindo as mesmas inconstitucionalidades apontadas pela ADIN 1351-3. Em suma, o diferencial do novo pleito era o seu pedido liminar.

Em 18.05.2004 foram concedidas vistas aos autos para que o Procurador Geral da República se manifestasse sobre a pretensão das ADINs (15). Em 01.06.2004 foi colacionado parecer pela improcedência do pedido, constitucionalidade dos artigos da lei 9.096 (16). No dia 07.12.2006 foi decidido o mérito, julgando procedente o pedido das ADINs, nos seguintes termos:

O Tribunal, à unanimidade, julgou procedente a ação direta para declarar a inconstitucionalidade dos seguintes dispositivos da Lei nº 9096, de 19 de setembro de 1995: artigo 013; a expressão "obedecendo aos seguintes critérios", contida no caput do artigo 041; incisos 00I e 0II do mesmo artigo 041; artigo 048; a expressão "que atenda ao disposto no art. 013", contida no caput do artigo 49, com redução de texto; caput dos artigos 056 e 057, com interpretação que elimina de tais dispositivos as limitações temporais neles constantes, até que sobrevenha disposição legislativa a respeito; e a expressão "no art. 013", constante no inciso 0II do artigo 057. Também por unanimidade, julgou improcedente a ação no que se refere ao inciso 0II do artigo 056. Votou a Presidente, Ministra Ellen Gracie. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pelos requerentes, Partido Comunista do Brasil - PC do B e outros, o Dr. Paulo Machado Guimarães e, pelo Partido Socialista Brasileiro - PSB, o Dr. José Antônio Figueiredo de Almeida. - Plenário, 07.12.2006. - Acórdão, DJ 30.03.2007(17).

Interessante ressaltar que, mesmo antes do julgamento pelo pleno, em 16.11.2006, foi exarado o seguinte despacho, antevendo a lacuna a ser deixada por uma possível declaração de inconstitucionalidade:

À Presidente - Ministra Ellen Gracie para o exame de empréstimo de preferência ao pregão, ante a necessidade de o Tribunal Superior Eleitoral baixar ato fixando os parâmetros para a distribuição do fundo partidário, tudo a partir dos preceitos da lei 9096/95 questionados. imprimam urgência, remetendo cópia a s. exa.. (grifo nosso) (18)

Então, como previsto, após a declaração de inconstitucionalidade do artigo 13 da lei 9.096/95 (cláusula de barreira) e, consequentemente, da divisão de recursos do fundo partidário (artigo 41 da lei 9.096/95), ficou carecendo de regulamentação a divisão do fundo partidário. Mas, diante do pedido do Supremo Tribunal Federal, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu a questão da seguinte maneira:

Agora, o fundo será assim distribuído entre as legendas: uma quota de 29% do fundo irá para os partidos na proporção da representação parlamentar filiada no início da Legislatura em curso, segundo o artigo 56, item VI, da Lei 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos); outra quota de 29% irá para os partidos que tenham concorrido ou venham a concorrer às eleições gerais para a Câmara dos Deputados, elegendo representantes em duas eleições consecutivas em, no mínimo, cinco estados, obtendo, ainda, 1% dos votos apurados no país, não computados os brancos e os nulos e distribuídos na proporção dos votos obtidos na última eleição geral para a Câmara dos deputados, segundo o artigo 57, item II, da Lei 9.096/95; a quota de 42% restante será distribuída igualitariamente entre todos os partidos políticos que estejam com os estatutos registrados no TSE. (19)

A discussão parecia encerrada. Mais um engano. Em verdade, tornou-se cada vez mais complicada. Frente à regulamentação do TSE, prontamente, um novo projeto de lei saiu do Congresso Nacional, aprovado em 27.02.2007 e sancionado pelo presidente Lula, disciplinando a divisão dos recursos do fundo partidário.

O texto da lei 11.459/07 (20) prevê o repasse igualitário de 5% do total de recursos do fundo para todos os partidos. Os restantes 95% serão repassados às legendas de acordo com o tamanho das bancadas eleitas para a Câmara. Em outras palavras, o Legislativo se curvou ao entendimento do Judiciário. Não existe mais a limitação para o recebimento das verbas públicas. Criar um partido político, mesmo que sem ideologia alguma, volta a ser um ótimo negócio.

Mesmo assim, tampouco a proporcionalidade da lei nova foi aceita pelos partidos menores. O PRTB propôs reclamação (nº 4979) (21) perante o Supremo Tribunal Federal para rechaçar o novo critério de divisão do fundo partidário (na época da propositura, era ainda um projeto de lei). Pretendia garantir os índices maiores conferidos pelo TSE. Em 18.04.2007, a reclamação foi arquivada (22) pelo Ministro Gilmar Mendes, com fucro no entendimento de que o Poder Legislativo não está vinculado à última palavra do Poder Judiciário. Contudo, a nova lei de divisão dos recursos não transparece essa posição. Acaba com qualquer limite. Transparece a timidez do Poder Legislativo face às decisões do Poder Judiciário.

Diante desse deslinde jurídico, presta-se esse estudo a defender a posição de que a divisão dos recursos do fundo partidário de maneira proporcional, com certos limites, é constitucional e o julgamento das ADINs pelo Supremo Tribunal Federal padeceu de vícios na verificação de seus requisitos.

Registre-se que, apesar do trânsito em julgado nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade em enfoque neste estudo, o tema ainda se revela muito importante, e carente de discussão, pois, a melhor aplicação dos recursos públicos corresponde a um anseio social pungente. Não bastasse isso, o mote da cláusula de barreira faz-se palco de um importante debate: a limitação do Judiciário para a não-usurpação da competência do Poder Legislativo. Os motivos para essas disposições serão explorados a seguir.

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Sobre a autora
Mariana Barbosa Cirne

Mestre em Direito, Estado e Constituição (UnB). Especialista em Direito Público (UnP) e em Processo Civil (IDP). Bacharela em Direito (UFPE). Procuradora Federal (AGU). Coordenadora do Centro de Estudos Jurídicos da Presidência da República (PR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CIRNE, Mariana Barbosa. Fundo partidário: a constitucionalidade da divisão proporcional e limitada de recursos públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2331, 18 nov. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13872. Acesso em: 17 nov. 2024.

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