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Vagas de estacionamento em shopping centers.

Onerosidade ou gratuidade

13/12/2009 às 00:00

Resumo:


  • O debate sobre a gratuidade ou cobrança de estacionamento em shopping centers é complexo e envolve múltiplos aspectos, como a natureza do shopping como ator no setor terciário da economia e a integração dos estacionamentos como parte da atividade do shopping.

  • Estacionamentos em shopping centers são considerados uma infraestrutura essencial e não uma atividade empresarial independente, sendo um fator de atração e comodidade para clientes, que diferem de estacionamentos pagos independentes.

  • Legislações municipais que regulamentam a cobrança de estacionamentos em shoppings agem no interesse do consumidor, exercendo poder de polícia e protegendo o interesse público, sem invadir competências legislativas da União ou ferir direitos de propriedade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Volto-me, hoje, sobre a questão da GRATUIDADE ou PAGAMENTO dos ESTACIONAMENTOS em SHOPPING CENTERS.

Antes de começar, apenas algumas perguntas: o SHOPPING CENTER é ou não um dos mais expressivos atores do setor terciário da economia brasileira? Podem ou não os estudiosos, ao se referirem aos "perfis" brasileiro e americano de SHOPPINGS CENTERS, falarem da existência de "indústrias de shoppings no Brasil, nos Estados Unidos e nos demais países"? Se podem, como o fazem os autores do artigo que adiante menciono, publicado pelo BNDES SETORIAL, é certo que não se pode falar de ESTACIONAMENTO em SHOPPING CENTER como uma atividade independente e lucrativa, no âmbito da atividade de um SHOPPING CENTER?

Detenham-se no fato de que não se confunde um Shopping Center com um Centro Comercial ou com uma Galeria Comercial! E nisso não há qualquer preconceito. É uma constatação técnica e conceitual!

Para essa abordagem dos ESTACIONAMENTOS, portanto, não posso deixar de me debruçar um pouco sobre o bordão da IGUALDADE, tal como Rui Barbosa o enunciou na sua "Oração aos Moços", de acordo com a versão publicada pela Elos Guanabara, 1961, 7ª Edição.

Talvez seja conveniente mencionar que Rui Barbosa, antes de pronunciar o período sobre a IGUALDADE, tantas vezes divulgado, afirmara-se em fase declinante. Efetivamente, disse ele: "Em verdade vos digo, jovens amigos meus, que o coincidir desta existência declinante com essas carreiras nascentes agora, o seu coincidir num ponto de interseção tão magnificamente celebrado, era mais do que eu mereceria;.. " .

Não os quero cansar, mas achei de bom tom referir-me a essas palavras, porque a "Oração aos Moços" foi dirigida a uma turma que se estava formando em São Paulo, "... templo do seu ensino..." (do Direito), e Rui não pudera comparecer, estando, no entanto, conforme suas próprias palavras, presente, por  "... me achar assistindo, assim, entre os de quem me vejo separado por distância tão vasta ...".

A referência emocional e geográfica, que faço, diz respeito, pois, à distância em que se encontram, venia concessa, as decisões judiciais que têm sido proferidas em favor dos Shopping Centers e os princípios existentes na nossa Constituição.

E, distantes, esqueceram-se, data venia, os DD. Ministros, de buscarem nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade a exata medida para legitimarem as NORMAS SUBSIDIÁRIAS sobre DIREITO do CONSUMIDOR, que têm os Municípios, sobre a questão dos ESTACIONAMENTOS em SHOPPING CENTERS, inspiradas no princípio da IGUALDADE, tal como pronunciado em linguagem tão bela e objetiva por Rui Barbosa.

Vamos, pois, a ele:

".... A parte da natureza varia ao infinito. Não há, no universo, duas coisas iguais. Muitas se parecem umas às outras. Mas todas entre si diversificam. Os ramos de uma só árvore, as folhas da mesma planta, os traços da polpa de um dedo humano, as gotas do mesmo fluido, os argueiros do mesmo pó, as raias do espectro de um só raio solar ou estelar. Tudo assim, desde os astros, no céu, até os micróbios no sangue, desde as nebulosas no espaço, até aos aljôfares do rocio na relva dos prados."

E, modestamente, acrescentaria eu, que também são diferentes:

1) os estacionamentos pagos, instalados numa área adredemente preparada para abrigar os veículos que lá são deixados, enquanto seus proprietários ou condutores "vão à vida";

2) os estacionamentos por vezes pagos, outras gratuitos, existentes na vizinhança de uma churrascaria, para servir exclusivamente aos Clientes, ou

3) os estacionamentos próximos de um cinema, normalmente pagos, porque independentes e explorados em áreas de terceiros, por uma empresa especializada, MAS NÃO exclusivos dos freqüentadores do cinema;

4) os estacionamentos gratuitos, no interior do prédio de um supermercado, destinados aos Clientes que lá comparecem para as compras do dia, da semana, e fechados, quando o próprio supermercado fecha;

5) os estacionamentos concebidos para ATRAIR os Clientes, e que se constituem em EQUIPAMENTO INSTITUCIONAL indispensável à própria conceituação do EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO em que foi instalado, como ocorre com os SHOPPING CENTERS.

É que tais ESTACIONAMENTOS estão fechados, quando fecha o SHOPPING CENTER, e são abertos, quando ABRE o SHOPPING CENTER. E tal EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO, no caso que analisamos, se denomina SHOPPING CENTER, exatamente porque respondeu às prescrições básicas e essenciais que o fazem um SHOPPING CENTER! E só existe como um TEMPLO de CONSUMO, como um ABRIGO, no mundo moderno, para proteger o Freqüentador, o Cliente, da ação dos "descuidistas", dos "oportunistas" e de tantos mais que, pelas ruas da Cidade, agrediriam o Cidadão, após ou antes de uma compra, após ou antes do acesso a uma instituição financeira, a um cinema. Desenvolveram-se seja pela localização que têm, pela insegurança dos meios sociais, pela climatização adequada que possuem, pela concentração de negócios possíveis, que possui, pelas "vantagens ou comodidades funcionais", que oferecem aos Clientes!

E Rui Barbosa sobre essas diferenças assim se pronunciou:

"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem."

E os "apetites humanos", nesse caso, se traduzem pela perspectiva de obtenção de uma receita extra, por parte dos Empreendedores de Shopping Center, sempre como se tal receita já não estivesse compreendida no próprio conceito de custo do empreendimento, cujo estacionamento se constitui em parte integrante, inseparável e conceitualmente denominada infra-estrutura de um Shopping Center.

E tal concepção e tal enunciado se vestem maravilhosamente para a questão dos ESTACIONAMENTOS em SHOPPING CENTERS, que na semana que ora finda voltou a merecer manchetes dos jornais, especialmente em São Paulo.

Tanto quanto Rui, o Homem, que afirmava estar em fase declinante, o que espero é que a abordagem da questão dos ESTACIONAMENTOS em SHOPPING CENTERS ganhe força suficiente para abortar a análise do tema, tal como vem sendo conduzida pelos Tribunais do País, isto é, como se as normas municipais estivessem alterando ou ferindo o direito de propriedade.

Porque a "propriedade", no caso, já está definida e limitada, sendo ela um complexo imobiliário, dotado de utilidades e equipamentos, todos destinados a um só objetivo, que é abrigarem o conjunto de salões ou áreas de uso comercial ou de serviços, que será concebida e designada como SHOPPING CENTER, em caráter universal, já que o conceito não é exclusividade de brasileiro, mas é de natureza universal!

E nos cabe, como Advogados, atentos às nuanças dos institutos jurídicos com que convivemos, e que se constituem, finalmente, no chamado "fato sócio-econômico", fazer declinar a abordagem atual e destorcida da prestação jurisdicional.

Porque, efetivamente, não cabe ao Magistrado descobrir os fatos, mas cabem aos operadores do Direito, investidos nas nuanças e na descoberta das "das intenções consubstanciadas na vontade", conforme Artigo 112, do Código Civil, apontar aos prestadores da função jurisdicional os traços marcantes que fazem de um instituto da comunidade econômica um elemento único e que se distinguirá dos outros existentes.

Daí, essa abordagem será iniciada, em primeiro lugar, perante o Município. Porque nenhum Município, no exercício do seu PODER de POLÍCIA, abrigaria como SHOPPING CENTER, a um empreendimento imobiliário que não atendesse ao conceito prevalecente. Daria ALVARÁ para um SHOPPING CENTER, se ele não estivesse satisfazendo a um dos principais requisitos de sua concepção, o ESTACIONAMENTO amplo?

Analisemos as nuanças da questão dos ESTACIONAMENTOS em SHOPPING CENTERS.

Para não me perder em muitas citações, vou me limitar a um estudo que foi publicado pela revista BNDES SETORIAL, nº 20, de setembro de 2004. 

A fls. 281, um belo estudo sobre a CARACTERIZAÇÃO da INDÚSTRIA de SHOPPING CENTERS no BRASIL, de autoria de Henrique Ferreira Gomes, Lecínio da Silva Portugal e Julio M. A. Monteiro de Barros, os dois primeiros do Programa de Engenharia de Transporte da Coppe/UFRJ e o último do BNDES. E o CNPQ forneceu, felizmente, duas bolsas de Iniciação Científica e de Produtividade, para os autores a tanto habilitados.

Nesse estudo, afirmaram os Autores no "resumo":

"Os shopping centers têm, por um lado, papel de destaque no setor terciário e na economia urbana de forma geral, mas tendem, por outro lado, a gerar possíveis impactos nos sistemas viários e de transportes, com conseqüências na qualidade ambiental. Essa dualidade exige que a implantação desses estabelecimentos contemple apropriados estudos por parte não só dos empreendedores, mas também da administração pública."

Se tomarmos, pois, esses pressupostos, temos que concordar que é o Município a entidade política mais adequada à avaliação de todos os vetores a que se referem os Autores.

É o Município que apreciará a pretensão do LOCAL de instalação do Shopping; é o Município que apreciará as questões pertinentes aos aspectos ambientais; é o Município que analisará, para autorizar, as questões pertinentes à obra, às alterações de tráfego e as demais relativas às conseqüências de seu ato administrativo.

Nos anos próximos ao do artigo a que me refiro, isto é, 2003/2004 (que possui dados estatísticos fornecidos pela ABRASCE, para 2002), a "política de proximidade" estava e está na ordem do dia nos países da Europa. Em jornadas realizadas por duas entidades francesas, a CERAPS e a CRAPE, coordenadas por Christian Le Bart e Remi Lefebv, em publicação de Marin Dacos de 18 de agosto de 2003, sob o título "La "proximité" dans le champ politique" (A "proximidade" no campo político), foi dito que

«...C''est par la proximité érigée en impératif catégorique que les liens sociaux et politiques sont appelés à être refondés, que la démocratie représentative est invitée à se ressourcer. C''est aussi par elle que l''action publique doit renouveler sa raison d''être et que les processus de décision et de traitement des problèmes doivent être modifiés en profondeur.»

(É pela proximidade, erigida como imperativo categórico, que os laços sociais e políticos são chamados a se reconstruir, que a democracia representativa é convidada a se revigorar. É também por ela que a ação pública deve renovar sua razão de ser e que os processos de decisão e de tratamento dos problemas devem ser modificados em profundidade.).

Estou trazendo a questão da política de proximidade para o tema ora abordado, porque a entidade política mais adequada para instrumentalizar esse vetor da administração pública sócio-econômica é o Município, no Brasil.

É o Município, mais que o Estado e a União, que sente os reflexos das "manifestações populares", dos desejos e das contrariedades dos Cidadãos. Pode-se mesmo dizer que o Município seria o termômetro da Felicidade de um Cidadão, já que é nele que se exprimirá, primeiramente, o Cidadão Feliz ou o Cidadão Infeliz.

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Não discuto que os políticos municipais não estejam sintonizados com as "razões" da expressão volitiva que os faz aprovar um texto legal relacionado aos Estacionamentos em Shopping Centers, mas o fato é que a tendência que os faz votar, isto é, aquele impulso que os faz pressionar o tecla "sim, aprovo" ou expressar oralmente o "sim, aprovo" traduz a captação de um sentimento coletivo de que há uma INJUSTIÇA na cobrança do tempo de estacionamento, nos ESTACIONAMENTOS de SHOPPING CENTERS.

Ora, por que uma INJUSTIÇA?

INJUSTIÇA, porque muito poucos se dirigem a um SHOPPING CENTER para simplesmente estacionar. O estacionamento numa área de ESTACIONAMENTO de um SHOPPING CENTER, na maioria das vezes, tem por objetivo "encostar um veículo", enquanto o condutor realiza uma compra, vai a um cinema, toma sua refeição, vai ao médico ou ao dentista, freqüenta a academia de ginástica ou um curso de línguas, tudo isso no interior de um SHOPPING CENTER!

Porque um SHOPPING CENTER moderno evoluiu ainda mais, na satisfação dos Clientes. De um conjunto destinado aos negócios comerciais, passou para os serviços e, logo, os abrigou em amplitude. Dos centros de alimentação nem falo, porque eles são necessários para renutrirem os Clientes, caminhantes ao longo das horas. Mas eles têm cinemas, divertimentos, jogos, cursos de línguas, clínicas ou consultórios e até academia de ginástica, porque um dos pólos de atração dos SHOPPING CENTERS é a existência de concentrações populacionais em áreas situadas fora do perímetro das grandes cidades.

E, ao aprovar o ALVARÁ do SHOPPING CENTER, sabia bem a Prefeitura do Município que ao concedê - lo estava dando uma AUTORIZAÇÃO a um EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO sui generis em que uma ÁREA SATISFATÓRIA de PARQUEAMENTO de VEÍCULOS tinha sido prevista! __ E tudo isso para a satisfação e no interesse dos Cidadãos que se estavam instalando naquela área, contribuindo, em conseguência, para desafogar o tráfego das grandes Cidades, congestionadas.

Portanto, sabia bem o Município que NÃO ESTAVA dispondo sobre USO da PROPRIEDADE ou sobre LIMITAÇÃO de USO de PROPRIEDADE ou, ainda, sobre ATIVIDADE EMPRESARIAL de ESTACIONAMENTOS, porque, como já informamos e demonstraremos adiante, NÃO TERIA o MUNICÍPIO autorizado um SHOPPING CENTER que NÃO TIVESSE um ESTACIONAMENTO compatível com a influência de público que para ele era esperada.

Nos termos do estudo a que nos referimos, publicado na revista do BNDES SETORIAL, foi explicado, o seguinte, numa síntese que me poupará outras transcrições conceituais:

"Segundo o International Council of Shopping Centers (ICSC) (apud Portugal e Godner <2003>), shopping Center é definido como um grupo de estabelecimentos comerciais unificados arquitetonicamente e construídos em terreno previamente planejado e desenvolvido. Deverá ser administrado como uma unidade operacional, sendo o tamanho e o tipo de lojas existentes relacionados diretamente com a área de influência comercial a que essa unidade serve. Deverá também oferecer estacionamento compatível com todas as lojas existentes no projeto." (grifo final nosso)

E, adiante:

"Essa tendência ocorre não só nos Estados Unidos, mas também em outros países, devido à combinação de alguns fatores, como: a) crescimento urbano; b)  desenvolvimentos dos transportes, facilitando e agilizando o fluxo de mercadorias e serviços; c) entrada da mulher no mercado de trabalho; e d) necessidade de segurança e de maior conforto."

Ora, assim sendo, creio que é fácil entender que os empreendimentos imobiliários que se tipificam como SHOPPING CENTER carecem de responder às NECESSIDADES que o CLIENTE, que o CONSUMIDOR passa a ter, em virtude da dinâmica dos desenvolvimentos.

Tendo visitado, há uns cinco anos, um dos maiores Shopping Centers da Inglaterra, explicaram-me seus Administradores que a ocorrência de agressões às mulheres, naquele País, fizera com que se tornasse necessário disponibilizar, para a mulher-cliente e para o/a idoso/a-cliente transporte confiável e adequado às condições climáticas, de tal forma que bastava ao Cliente telefonar e marcar dia e hora que um motorista, num transporte próprio, sem qualquer custo para a/o Cliente nessas circunstâncias, fosse buscá-lo/la e esse mesmo transporte o levaria de volta à sua residência, ajudando, inclusive, no desembarque das compras.

Tanto quanto um supermercado, que SE DOTA de ESTACIONAMENTO para ATRAIR seu CLIENTE – e nada cobra por isso -, o SHOPPING CENTER NÃO SERÁ ASSIM DESIGNADO se não dispuser de ESTACIONAMENTO que RESPONDA a uma RELAÇÃO MATEMÁTICA de FLUXO ESPERADO de PÚBLICO e de NEGÓCIOS.

A verdade é que, para um SHOPPING CENTER, as VAGAS de ESTACIONAMENTO se constituem em conceito de INFRA-ESTRUTURA.

E nesse aspecto, até para confirmá-lo, a Tabela 3 e a Tabela 4 do estudo a que nos referimos, é muito significativa, pois ambas apresentam, destinando-se a uma "comparação regional da oferta "per capita..." " e a uma "comparação regional de oferta por superfície (km2)...", uma coluna especialmente dedicada ao NÚMERO de VAGAS de ESTACIONAMENTO nos SHOPPING CENTERS das, respectivamente, regiões Sudeste, Centro-Oeste, Sul, Nordeste e Norte.

Ora, por bem conhecermos a excelente competência de alguns Empreendedores de SHOPPING CENTERS, não temos dúvida em afirmar que nenhum deles deixaria de considerar nos custos de seus respectivos empreendimentos imobiliários não só o retorno dos custos de construção da área de estacionamento, como dos custos da instalação de controles de entrada e saída de veículos, bem como a necessária despesa mensal de vigilância permanente,

Na técnica dos empreendimentos, assim, tais encargos estariam sendo remunerados pelo valor dos alugueres que estarão sendo recebidos, sendo certo que no valor do aluguel mínimo mensal, sem dúvida alguma um dos elementos de seu cálculo seria o retorno dos investimentos em áreas de estacionamento e as despesas de sua manutenção, além das demais que adiante mencionamos.

Espantou-me ouvir, há poucos dias, numa entrevista, o presidente da ABRASCE acenar com a dificuldade de absorção desses custos pelos Comerciantes ou Prestadores de Serviços instalados em SHOPPING CENTERS.

Espantou-me, porque não é deles a viabilização dos estacionamentos. Ao alugarem salões ou áreas comerciais ou de serviços em SHOPPING CENTERS, tais Empreendedores contavam com a existência de toda essa infra-estrutura de que vínhamos falando. E isso foi provido e viabilizado pelo Empreendedor do próprio SHOPPING CENTER. Portanto, ao contratar a locação e fixar o aluguel, sabia o Locatário que, no PREÇO, estava incluída expressão monetária equivalente ao retorno do investimento na infra-estrutura indispensável.

É que tais despesas já se encontram "integradas" no "custo" de um SHOPPING CENTER, razão pela qual os Comerciantes e Prestadores de Serviços neles instalados NÃO PRECISARIAM arcar com tais custos. Eles se encontram "embutidos" no CUSTO OPERACIONAL INSTITUCIONAL do SHOPPING CENTER. Certamente, Sua Senhoria bem o sabe, na qualidade de presidente da ABRASCE, que qualquer SHOPPING CENTER qualificado como tal pela ABRASCE, que segue o modelo da ICSC, não seria um SHOPPING CENTER, mas um simples Centro Comercial ou uma Galeria Comercial, se não tivesse as VAGAS de ESTACIONAMENTO nos padrões instituídos por ela, após sérios estudos e ao longo de sua experiência na gestão de qualificação dos SHOPPING CENTERS.

E Centros Comerciais e Galerias Comerciais, e nós os conhecemos às centenas, não carecem de tais infra-estruturas. Algumas, aliás, nem a refrigeração possuem. E estacionamentos apenas por exceção se encontrará algum.

E tanto isso é um fato, que a fls. 24, do estudo a que abaixo me refiro, de 1986, dizia a ABRASCE, sobre o "USO e TIPO de EDIFICAÇÃO":

"Em Shoppings existe uma variedade muito grande de horários de funcionamento. Tal fato reflete diretamente no custo da operação. ... Estacionamentos internos ou externos, maior/menor número de pavimentos, etc. também têm peso significativo no custo." – Grifos nossos.

Numa coletânea de artigos de 1986, publicada pela ABRASCE com o título de BIBLIOTECA TÉCNICA, coordenada pelo Eng. João Carlos Moreira Pena, pode-se ler, especialmente dentre muitos outros conceitos relevantes para um SHOPPING CENTER, o seguinte:

"Selo Abrasce. Sendo a atividade de "shopping center" bem recente no Brasil, a ABRASCE sentiu a necessidade de estabelecer algumas características básicas e essenciais que distingam o "shopping Center" aprovado pela ABRASCE de outro tipo de atividade comercial ou imobiliária. ... Para atingir esse objetivo foi criado o SELO ABRASCE que é conferido pela Associação aos "shopping centers" que preencham os quesitos abaixo mencionados: 1. Localização...., 2. Presença de "lojas – âncora...; 3. Planejamento técnico da variedade...; 4. Sistema básico de locação das lojas....; 5. Estacionamento compatível com a "área bruta locável (ABL), que garanta a afluência e o escoamento tranqüilo do fluxo de automóveis que virão diariamente ao "shopping Center"; 6. Idoneidade e capacidade empresarial do grupo empreendedor, devido ao vultoso investimento necessário à sua implantação.

Por óbvio, "...automóveis..." não vão a Shopping Centers, para as compras. Às compras vão os Clientes, nos seus veículos. E são eles, nos termos do disposto no Artigo 112, do Código Civil, a que acima nos referimos, que se tem que buscar, para se encontrar a a intenção consubstanciada na declaração de vontade registrada!

E, ainda adiante, a fls. 2 do referido estudo:

"A ABRASCE define em seus Estatutos "o shopping Center" como um centro comercial planejado, sob administração única e centralizada, e que: i. .....; II. ........; III. ......; IV. OFEREÇA A SEUS USUÁRIOS ESTACIONAMENTO PERMANENTE E TECNICAMENTE BASTANTE." – Todos os grifos são nossos.

Portanto, quando um Município estabelece normas de DISCIPLINAMENTO da COBRANÇA de VAGAS em ESTACIONAMENTO de SHOPPING CENTERS, como demonstramos, NÃO ESTÁ INVADINDO área legislativa de exclusividade da UNIÃO, sobre Direito Comercial, Direito Civil, propriedade, ou qualquer outra área de competência privativa,

Aliás, o MUNICÍPIO não está legislando sobre qualquer das competências reservadas à UNIÃO, nos termos e para os efeitos do Artigo 22, inciso I, da Constituição, já que, regulamentando as condições de gozo dos equipamentos técnicos que se constituem em características básicas de um SHOPPING CENTER, dir-se-ia que o Município está exercendo seja o seu PODER de POLÍCIA, seja a DEFESA do INTERESSE PÚBLICO, no caso do CONSUMIDOR, impedindo que os mesmos elementos volitivos que se constituem em VETOR de ATRATIVIDADE do CONSUMIDOR, possam servir para lhe IMPOR um ENCARGO, que será adicional àqueles pelos quais estará pagando, quando efetivar uma compra em um SHOPPING CENTER.

No mesmo estudo, a fls. 13, também se pode ler:

"Com ampla área construída, grandes estacionamentos, subestações de alta tensão, instalações centrais de ar condicionado, fluxo contínuo de público, enfim um complexo equivalente a uma cidade, o Shopping Center necessita de uma estrutura de operação/manutenção em níveis técnicos. Tal estrutura, além de preservar o investimento envolvido, é responsável pelo já famoso "serviço invisível", ou seja, aquele que só é notado quando não funciona a contento.". E, adiante, a fls. 14: "Em Shopping Centers "vende-se" conforto e segurança e isto implica em custos. Tudo aquilo que não se transforma em receita, e nisto se encontra a operação/manutenção, provoca uma reação negativa. O desconhecimento técnico do que é uma centrífuga, fator de potência, demanda máxima...... causa uma certa desconfiança e mesmo uma certa oposição, na área comercial. Daí, questionarmos: o que um Shopping Center deve oferecer aos seus clientes? Conforto, segurança, estacionamentos, etc...? O objetivo e o grau de importância da área operacional, dentro da estrutura administrativa, passaram de um plano nitidamente secundário para, mesmo com as "oposições", à posição que lhes é devida."

Ora, com tais depoimentos, feitos dentro e nos limites do disposto no Artigo 422, do Código Civil brasileiro, pode-se, em algum momento, bradar contra os Empreendedores de Shopping Center, que fizeram o crescimento e a beleza desse tipo de indústria no Brasil? __ Certamente que a resposta é NÃO.

Agiram eles, como Contratantes, nos limites do referido artigo, in verbis:

"Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e da boa-fé".

Portanto, Colegas, não nos parece que, ao regulamentar a questão do USO dos ESTACIONAMENTOS, fixando um critério pelo qual o CLIENTE do SHOPPING CENTER, se CONSUMIR ou USAR as ATRAÇÕES do SHOPPING CENTER, não pague o ESTACIONAMENTO, nada mais está a fazer que dispor sobre o exercício do PODER de POLÍCIA do MUNICÍPIO, no que concerne à aplicação das políticas protetivas do DIREITO do CONSUMIDOR,

E devemos nos lembrar de que, conforme § 1º, do Artigo 24, da Constituição,

"No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais."

Além do mais, NÃO SENDO o SHOPPING CENTER uma empresa que explore a atividade de "estacionamento", é JUSTO que pague pelo ESTACIONAMENTO aquele que transformar uma VAGA, enquanto não-Cliente do Shopping Center, mas utilize o Estacionamento como um local de guarda do seu veículo, quando NÃO FOR ao SHOPPING CENTER.

Sem querer ser exaustivo, portanto, o fato que nos parece relevante reter, quanto ao ESTACIONAMENTO em SHOPPING CENTER, é que tal disponibilidade de vagas SÓ EXISTE se e enquanto o SHOPPING CENTER estiver em funcionamento. Note-se que, mesmo dispondo de quantidade relevante de VAGAS, tais VAGAS só são disponibilizadas se o SHOPPING estiver FUNCIONANDO, porque um Empreendedor de SHOPPING CENTER não exerce a função de LOCADOR de VAGAS de ESTACIONAMENTO, até mesmo porque, como vimos, as VAGAS estão disponibilizadas na área do SHOPPING CENTER como sua infra-estrutura, tal como o é o equipamento de refrigeração, tal como são os banheiros que são disponibilizados para o público, Cliente do Shopping.

Dispondo sobre o uso e os limites de uso de vagas de ESTACIONAMENTO em SHOPPING CENTERS, o Município ou o Estado estarão dispondo de forma SUBSIDIÁRIA sobre DIREITO do CONSUMIDOR. A disposição constante do inciso XXXII, do Artigo 5º, da Constituição, ao se referir ao Estado, o faz dispondo sobre o exercício dessa proteção em qualquer de seus níveis. Portanto, dir-se-ia que a disposição é não só concorrente como, se ocorrer a partir de normas gerais da União, subsidiária.

Celso Ribeiro Bastos, in Comentários à Constituição do Brasil, Ed. Saraiva, 1989, 2º Volume, a fls. 157, leciona:

"A civilização industrial trouxe consigo um problema grave que foi o de proteger o consumidor. ...... O consumidor individual que discutia com o artífice as características de um produto personalizado, é substituído por um comprador de bens, os quais não lhe cabe conferir. A sua postura passiva é ainda reforçada por uma propaganda intensa que gera novos hábitos de consumo, no mais das vezes criados artificialmente."

A questão dos hábitos artificiais é que é grave.

Não se discute, efetivamente, que a segurança é um dos maiores problemas para o Cidadão. Andar nas ruas, hoje, é um vetor de risco, já que, a qualquer instante, uma agressão pode alcançá-lo, muitas vezes ainda que tenha sido dirigida a um terceiro. Portanto, ao surgir identificando que vantagens poderiam atrair um CIDADÃO, o SHOPPING CENTER lhe ofereceu segurança. Foi como se tivesse dito: "Venha para cá que eu lhe ofereço estacionamento, ar refrigerado, água fresca e banheiros sempre limpinhos, para seu uso. Mas, atenção, não se esqueça de que eu estou lhe vendendo um produto, que é a minha estrutura imobiliária, porque eu sou um SHOPPING CENTER! Vamos, pois, às compras, às minhas atrações, sempre que você me visitar!"

Talvez alguém objete sobre o conceito de CONSUMIDOR, no texto constitucional. Não vamos nos reportar à Lei, porque nos parece fácil a resposta. Preferimos, então, nos apoiar em Celso Ribeiro Bastos que, lastreando-se em Fábio Konder Comparato, afirma:

"... Consumidores são os que não dispõem de controle sobre os bens de produção e, por conseguinte, devem-se submeter ao poder dos seus titulares."

E o "... poder dos seus titulares .." está na capacidade de atrair!

Lembram-se daquele SHOPPING CENTER de que lhes relatei, na Inglaterra?

Ele é o BLUEWATER SHOPPING CENTER.

E no seu painel de apresentação, ao qual se pode chegar pela Internet, está escrito, em destaque:

"Car Parking"

"There is free parking for 13,000 cars with a sophisticated traffic management system in place to ensure that parking is as hassle-free and easy as possible.

"Car parking spaces are never more than a five-minute walk away from entrances, and there are separate pedestrian pathways so children are not crossing busy roadways."

(Estacionamento – Há um estacionamento gratuito para 13.000 veículos, com um sofisticado serviço de gerenciamento para assegurar-lhe estacionar com facilidade e poupá-lo de qualquer inconveniente. As vagas de estacionamento estão nunca mais que cinco minutos a pé das entradas do shopping Center, e ha caminhos separados para os pedestres, de tal forma que as crianças não atravessem as vias de circulação dos veículos.)

Colegas, o que se espera é que possamos, em matéria de conceitos e geração de normas legais, começar, com muita urgência e freqüência, a praticar o que está disposto no Artigo 112, do Código Civil, e que não é uma novidade, porque já existia no Artigo 85, do Código Civil de 1916, in verbis: "Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem."

Se assim for, apenas duas perguntas, para terminar:

1ª)

 os SHOPPING CENTERS disponibilizam vagas de estacionamento para atrair Clientes, como se demonstra que fazem os outros SHOPPINGS do MUNDO, ou pretende com a renda das vagas elevar sua receita?

2ª) as VAGAS de ESTACIONAMENTO não se CONSTITUEM em INFRA-ESTRUTURA de um SHOPPING CENTER?

Será que se precisa dizer que as vagas de ESTACIONAMENTO em SHOPPING CENTER são sempre vetor de ATRATIVIDADE?

Será que se precisa dizer que as vagas de ESTACIONAMENTO em SHOPPING CENTER se constituem em um dos elementos de sua INFRA-ESTRUTURA?

Portanto, data venia, ao legislar sobre os benefícios abusivos da cobrança de encargos sobre o uso das vagas, está o MUNICÍPIO laborando no interesse do CONSUMIDOR, no exercício de uma de suas finalidades, que é a proteção do interesse público.

Não está legislando o MUNICÍPIO sobre direito de propriedade ou sobre direito comercial. Não está ferindo a CONSTITUIÇÃO, ao contrário. Está atuando SUBSIDIARIAMENTE, no interesse da efetivação da PROTEÇÃO ao CONSUMIDOR, no caso o Cliente do SHOPPING CENTER. Quando não for Cliente, a proteção não cabe, porque o CONSUMIDOR está usando indevidamente como ESTACIONAMENTO PÚBLICO ou PRIVADO ONEROSO, aí sim, um ESTACIONAMENTO GRATUITO.

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Sobre o autor
Pedro José F. Alves

Advogado, Consultor Jurídico de Empresas Formado pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, em 1965, com quarenta e oito anos de atividade jurídica como estagiário e como advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES, Pedro José F.. Vagas de estacionamento em shopping centers.: Onerosidade ou gratuidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2356, 13 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14013. Acesso em: 22 dez. 2024.

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