Considerações Finais:
O risco da nanotecnologia se potencializa na medida em que avançam suas aplicações, sem ocorrer o mesmo com as pesquisas voltadas para análise de suas conseqüências sociais, econômicas e ambientais. A falta de informação acerca dos efeitos nocivos das inovações tecnológicas no meio ambiente e na saúde humana serve de argumento para medidas de prudência (precaução).
Dito de outra forma, a incerteza científica, quanto aos danos potenciais das diversas aplicações da nanotecnologia, não é justificativa para a inação. A omissão de hoje pode gerar danos sérios e irreversíveis no futuro. Não se deve negligenciar o princípio da precaução como importante fundamento na discussão de políticas de gestão de risco e regulamentação da nanotecnologia.
É de suma importância o debate sobre a necessidade de regulamentação estatal e as possibilidades de auto-regulação dos usos da nanotecnologia. Nesse sentido, a criação de normas jurídicas é fundamental e a auto-regulação deve ser vista como complementar.
A legislação existente é insuficiente e não se adapta as peculiaridades da nanotecnologia. Assim no contexto atual, Não existem avaliações "obrigatórias", exames específicos para definir os riscos da nanotecnologia
Todavia, diversas questões ficam em aberto: deve-se criar um novo marco regulatório que abarque genericamente a nanotecnologia? Ou deve-se inserir na legislação existente um tratamento diferenciado para a nanotecnologia? É importante o debate sobre "o que é conveniente regulamentar?", "por que regulamentar?", "como regulamentar?" e "para quem regulamentar?".
Percebe-se a dificuldade de se regulamentar algo desconhecido pela sociedade e pelos juristas. Pouca discussão traz um risco maior à decisão de criar normas possivelmente sem efetividade, ou que imponham restrições excessivamente burocráticas ao desenvolvimento da nanotecnologia, ou que sirvam apenas como norma de efeito simbólico, para encobrir e legitimar o uso irresponsável da nanotecnologia.
Entretanto, a regulamentação não deve ficar a cargo apenas de especialistas e cientistas. É importante assegurar o acesso à informação, a transparência e a Participação Pública na tomada de decisões.
Qualquer que seja a resposta da sociedade para a criação de um sistema normativo para a nanociência e a nanotecnologia, é importante que este se assente sobre alguns valores fundamentais: o respeito aos direitos fundamentais, a proteção da dignidade da pessoa humana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o princípio democrático.
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Notas
- ECCHCP/ European Commission Community Health and Consumer Protection. Nanaotechnologies: a preliminary Risk Analisis. Workshop Organizado em Bruxelas 1-2 de março de 2004 por Health and Consumer Protection Directorate Genereal of the European Commission.
- O debate sobre os desafios decorrentes da inserção social da nanotecnologia e da nanociência permanece restrito a um número reduzido de pessoas e instituições. Entretanto, a Convergência Tecnológica que envolve a nanotecnologia "impõe dilemas éticos importantes demais para que seu monopólio pertença a quem quer que seja, inclusive a cientistas." (Cavalheiro, 2007, p 23)
- Nos Estados Unidos os estatutos gerais de saúde e ambientais que podem aplicar-se a na notechnologia incluem o "Federal Food, Drug and Cosmetic Act ("FDCA") "Clean Air Act" ("CAA"), o "Clean Water Act" ( "CWA"), o "Occupational Safety and Health Act" ("OSHA") e o "Toxic Substances Control Act" ("TSCA"). Na União Européia as principais normas que podem ter implicações indiretas na regulação da nanotecnologia são: o Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH), que cria a Agência Europeia das Substâncias Químicas; e a Diretiva 2001/18/CE disciplina a libertação no ambiente de organismos geneticamente modificados e a autorização de OGM para comercialização em toda a UE, incluindo o cultivo comercial.
- No Direito Internacional podem ser citados a Convenção sobre Diversidade Biológica (1992) e o seu Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (2000), a Convenção da Basiléia sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e seu Depósito (1989) e a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes (2001). No Brasil a Constituição Federal de 1988 reconhece no artigo 225 o direito fundamental ao meio ambiente: "Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."
- Seja ela uma comissão técnica a exemplo da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança instituída no Brasil, ou uma Agencia Reguladora específica, uma espécie de Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNano).
- A criação de um marco geral sobre "nanossegurança" já foi objeto proposição normativa no congresso brasileiro (Projeto de Lei nº 5.076, de 2005), apresentado pelo deputado Edson Duarte rejeitado pelas Comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática e pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.
- Tal instituição teria entre suas competências a possibilidade de regulamentação da matéria via resoluções, a criação de um "Certificado de Qualidade em Nanossegurança" e análise dos casos concretos de liberação de pesquisa e a comercialização de produtos.
- A doutrina divide as fontes legais no Direito Internacional moderno em duas categorias: Hard Law e Soft Law. O primeiro é representado pelo consentimento dos estados, de tal forma que são considerados mais persuasivos, enquanto que o segundo é visto como dependente da noção de justiça extraconsensual, fazendo-lhe menos persuasivos. Os instrumentos de Soft Law, como resoluções, declarações, princípios e outros instrumentos regionais e internacionais são considerados pelos doutrinadores tradicionais como menos persuasivos porque não são vinculantes juridicamente nem jurisprudencialmente. [...]Os princípios do Soft Law não estabelecem direitos nem obrigações, mas criam grande expectativa na opinião pública e acabam por exercer influência na conduta dos estados. Seria ingênuo pensar que os estados não percebem, claramente, a diferença entre os dois tipos de normas. Quando eles subscrevem os documentos de Soft Law ou a eles não fazem oposição, isso não significa que os governantes se comprometam ou tenham a intenção de se comprometer com eles. Todavia, o acúmulo e a força da repetição dos instrumentos não-normativos acabam, com o passar do tempo, a influenciar sua positivação como se fosse um estágio de maturação prévio à conversão em leis. Quanto às Declarações internacionais, embora não estejam ainda incluídas entre as fontes tradicionais do Direito Internacional e não tenham imperatividade jurídica própria dos tratados e convenções internacionais, ainda assim devem ser reconhecidas como instrumentos dotados de relevância jurídica. [...] A atração dos instrumentos de Soft Law reside na sua flexibilidade, não sendo sua forma o elemento mais relevante, mas sim a maneira em que as obrigações são expressas. Os instrumentos de Soft Law são geralmente produzidos em longas e, freqüentemente, controvertidas negociações. O fato dos estados serem cuidadosos na redação dos documentos de Soft Law evidencia que têm conseqüências políticas sérias. Os estados podem continuar a defender suas ações sob a doutrina da soberania, mas está claro, pela proliferação dos documentos de Soft Law, que entendem que a mútua interdependência na ordem mundial necessita de cooperação global e esta, por seu turno, requer o estreitamento da doutrina da soberania. (CARVALHO, 2005)
- Norma Técnica: Documento aprovado por uma instituição reconhecida, que prevê, para um uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para os produtos ou processos e métodos de produção conexos, e cuja observância não é obrigatória. Também pode incluir prescrições em matéria de terminologia, símbolos, embalagem, marcação ou etiquetagem aplicáveis a um produto, processo ou método de produção, ou tratar exclusivamente delas. (http://www.inmetro.gov.br/barreirastecnicas/definicoes.asp).
- Em 2008 foi publicada pela International Standization Organization a ISO / TR 12885:2008 descreve práticas em saúde e segurança ocupacional definições relevantes para as nanotecnologias. A ISO / TR 12885:2008 concentra-se na fabricação e utilização de nanomateriais. O documento não aborda questões de segurança e saúde ou práticas associadas com nanomateriais geradas por processos naturais, processos e quente outra norma operações que possam involuntariamente gerar nanomateriais, ou consumidores potenciais riscos ou utiliza, embora algumas das informações na norma ISO / TR 12885:2008 pode ser relevantes para essas áreas. Uso da informação na norma ISO / TR 12885:2008 poderia ajudar as empresas, pesquisadores, trabalhadores e outras pessoas para evitar consequências adversas de segurança e saúde durante a produção, manipulação, utilização e eliminação dos nanomateriais fabricados. Esta norma técnica é amplamente aplicável ao leque de nanomateriais. (http://www.iso.org/iso/catalogue_detail?csnumber=52093). As normas da ISO
- A incerteza científica resulta normalmente de cinco características do método científico: a variável escolhida, as medições efetuadas, as amostras recolhidas, os modelos usados e o nexo de causalidade utilizado. A incerteza científica pode também derivar de uma controvérsia em relação aos dados existentes ou à inexistência de dados relevantes. A incerteza pode dizer respeito a elementos qualitativos ou quantitativos da análise.
- Uma nova declaração ministerial foi adotada na terceira Conferência Internacional para a proteção do mar do Norte (1990). Clarifica a declaração anterior, indicando que os governos signatários devem aplicar o princípio da precaução, ou seja tomar medidas para evitar os impactos potencialmente prejudiciais das substâncias persistentes, tóxicas e passíveis de bioacumulação, mesmo quando não exista uma prova científica do nexo de causalidade entre as emissões e os efeitos.
- Art. 225. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
Disponível em: http://europa.eu.int/comm/health/ph_risk/events_risk_en.htm>. Acesso em 24 de abril de 2007.
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Disponível em <http://www.nanoforum.org/nf06~modul~showmore~folder~99999~scid~341~.html?a ction=longview_publication&> Acesso em : 12 de setembro de 2007
A Carta Magna institui no parágrafo primeiro do mesmo artigo como obrigações do poder público, na esfera preventiva: a) a fiscalização das entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético, atualmente regulamentado pela Lei de Biossegurança - Lei nº 11.105 de 24 de março de 2005); b) a exigência do Estudo prévio de impacto ambiental, regulamentado no plano federal pela Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6..938 de 31 de agosto de 1981 e pela Resolução do Conselho nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº 01 de 1981; c) o controle da produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente estabelecido por diversas normas federais e estaduais, com destaque para a Lei dos Agrotóxicos (Lei n.º 7.802 de 11 de julho de 1989). Também merece destaque a possibilidade de responsabilização Civil, Circinal e Administrativa por danos ambientais, conforme disposto no artigo 225, §3º da Constituição Federal de 1988.
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; [...] IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; [...] V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;