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A irretroatividade da Lei nº 11.464/2007

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A Lei n. 11.464/2007 surgiu como um meio indireto de declaração de ineficácia do art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072, de 25.7.1990 (a lei hedionda), o que foi imperioso, porque o STF, no julgamento do HC n. 82.959-SP (Min. Marco Aurélio, julgamento em 23.2.2006), declarou o referido dispositivo inconstitucional por violar o princípio da individualização da pena.

A declaração de inconstitucionalidade foi incidenter tantum (controle difuso de constitucionalidade), mas – antes da edição da Lei n. 11.464/2007 – a declaração da repercussão geral, sem permitir que novos casos fossem conhecidos pelo STF, só autorizava entender que o desaparecimento do preceito do nosso ordenamento jurídico já havia se operado. Lei superveniente só poderia ser aplicada se fosse mais benéfica que existente no momento da sua edição.

A Lei n. 7.210, de 11.7.1984, se autodenominou Lei de Execução Penal (LEP), constituindo o nosso Código de Execução Criminal (CEC). Seu art. 112, desde a redação originária, fixa o requisito temporal de cumprimento de 1/6 da pena no regime anterior para a obtenção de progressão de regime.

A lei hedionda previu no seu art. 2º, § 1º, o cumprimento da pena integralmente no regime fechado, em flagrante inconstitucionalidade que só reconhecida pelo STF mais de 15 anos depois do seu início de vigência. Ao lado de inúmeros autores, deixei evidente que o princípio da individualização da pena foi violado em seu terceiro momento, o da execução.

Pretendeu-se dizer que o controle difuso de constitucionalidade não faz a norma desaparecer do ordenamento jurídico. Com isso, a Lei n. 11.464/2007 seria mais benéfica que a anterior (a redação originária da lei hedionda), razão de ser admissível a sua aplicação aos fatos pretéritos.

No dia 16.12.2009, o STF editou a Súmula Vinculante n. 30, com o seguinte verbete:

Para efeito de progressão de regime de cumprimento de pena, por crime hediondo ou equiparado, praticado antes de 29.3.2007, o juiz da execução, ante a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990, aplicará o art. 112 da Lei de Execuções Penais, na redação original, sem prejuizo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

A súmula confirma aquilo que eu vinha afirmando anteriormente, ou seja, a Lei n. 11.464, de 28.3.2007, constitui lex gravior ou novatio legis in peius, portanto, irretroativa. A lei hedionda continha preceito que foi declarado inconstitucional e, embora o controle tenha sido incidenter tantum, mister é reconhecer o seu desaparecimento da ordem jurídica, o que impede que os requisitos de 2/5 e 3/5 de cumprimento da pena sejam exigidos para quem praticou crime antes do advento da nova lei.

Diz o ditado popular que "antes tarde do que nunca". Por isso, fico feliz com a mudança de postura no STF, o que provoca a modificação da sua jurisprudência.

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Sobre o autor
Sidio Rosa de Mesquita Júnior

Procurador Federal e Professor Universitário. Graduado em Segurança Pública (1989) e em Direito (1994). Especialista Direito Penal e Criminologia (1996) e Metodologia do Ensino Superior (1999). Mestre em Direito (2002). Doutorando em Direito. Autor dos livros "Prescrição Penal"; "Execução Criminal: Teoria e Prática"; e "Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006" (todos da Editora Atlas).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa. A irretroatividade da Lei nº 11.464/2007. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2382, 8 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14147. Acesso em: 6 mai. 2024.

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