Consoante posicionamento hodierno do Superior Tribunal de Justiça, o cúmplice do adultério, cometido durante a constância matrimonial, não deve indenizar o cônjuge traído por dano moral.
Na hipótese aventada, não há que se falar em responsabilidade civil de terceiro, de acordo decisão dos ministros da Quarta Turma da Colenda Corte Superior.
O entendimento encontra respaldo em notável doutrina e jurisprudência, não sendo crível que o Poder Judiciário imponha uma obrigação de "não fazer" ao amante partícipe. Disso decorre a inviabilidade do pleito indenizatório por lacuna legal.
Em verdade, conquanto haja patente violação de uma norma moral, "é certo que não se obriga a amar por via legislativa ou judicial e não se paga o desamor com indenizações", como propugna o ministro Luís Felipe Salomão.
A ilação é indubitável: é reprovável a conduta do cúmplice em contribuir com a realização do adultério, no entanto, seu comportamento amoral não enseja responsabilidade na acepção jurídica de modo a justificar uma reparação ao cônjuge lesado a título de danos morais.
De tal forma, é inquestionável o fato de que o somente cônjuge "culpado" descumpre os deveres impostos pelo casamento, independente de que seja imprescindível a participação de uma outra pessoa para consecução do ato ilícito, qual seja, o adultério.
Invocar responsabilidade solidária do amante imputaria culpa a um terceiro alheio à relação jurídica havida entre o casal, elo do qual se origina o dever de fidelidade válido entre eles, como disciplina o artigo 1566, I, do Diploma Civil: "O casamento, se examinado tanto como uma instituição, quanto contrato sui generis, somente produz efeitos em relação aos celebrantes e seus familiares; não beneficiando nem prejudicando terceiros".
Insta esclarecer o que é considerado inobservância do dever conjugal de fidelidade. Este consiste na lealdade existente entre os parceiros, particularmente quando o principal propósito é o prazer físico e a satisfação sexual. Caracteriza-se pela prática de relação sexual com pessoa estranha ao casamento ou à união estável ou mesmo demais atos ofensivos que não culminem na conjunção carnal propriamente dita, mas que evidenciam o desiderato de saciar o instinto sexual fora da sociedade conjugal.
Cabe mencionar ainda o artigo 5° da Lei n° 6.515, Lei do Divórcio, o qual assevera que a separação judicial pode ser pedida por um só dos cônjuges quando imputar ao outro conduta desonrosa ou qualquer ato que comporte em grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum.
A fidelidade recíproca, bem como o respeito e a consideração mútuos são corolários da família monogâmica admitida por algumas culturas, como ocorre em nossa pátria. A norma tem cunho social, estrutural, moral e normativo. Todavia, embora tenha reflexos em todas essas esferas, é sobretudo norma jurídica de caráter cogente, vez que seu desrespeito possibilita punição.
No mesmo sentido, as sábias palavras de Maria Helena Diniz, "o dever moral e jurídico de fidelidade mútua decorre do caráter monogâmico do casamento e dos interesses superiores da sociedade, pois constitui um dos alicerces da vida conjugal e da família matrimonial [01]."
Com a supressão do adultério como fato típico na esfera penal, o campo civil ganhou relevância e aumentou a propositura de ações indenizatórias por dano moral. Para coibir lides temerárias e eventual enriquecimento sem causa, sua aplicação deve ser balizada com ponderação e prudência, considerando as peculiaridades de cada caso concreto.
É mister do Julgador analisará as conseqüências que o fato aportou à vítima, bem como a intensidade do constrangimento e do sofrimento provocados pela ofensa. Ademais, verificará as condições econômicas de ambos os cônjuges.
Em síntese, o adúltero que manifesta e concretiza a satisfação de desejos sexuais com outros parceiros, incide em violação de um dever matrimonial e sua postura merece reprimenda, configurando responsabilidade pessoal e exclusiva.
A transgressão do dever supra citado pode gerar danos indenizáveis ao cônjuge inocente. A falta de respeito e de consideração por parte de um dos consortes também pode gerar situações de transtorno ou constrangimento que desembocam nos danos morais aludidos [02].
Ex positis, é certo que a decisão de trair é de livre arbítrio de cada cônjuge, que consciente da ilicitude, tem que suportar as conseqüências jurídicas de sua infidelidade. O "preço" a ser pago pelo rompimento de uma obrigação conjugal deve recair unicamente sobre àquele que por direito anuiu às condições impostas pela instituição matrimonial. Valer-se da via judicial para pretensões que fogem da previsão normativa é prática a ser repelida pelos operadores de direito e deve servir de paradigmática para a repreensão de quaisquer práticas que exorbitam os preceitos vigentes no ordenamento jurídico.
Notas
- DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 123.
- VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 153.