Artigo Destaque dos editores

Possibilidade de cessão a terceiro e de compensação de crédito-prêmio IPI

Exibindo página 3 de 3
18/01/2010 às 00:00
Leia nesta página:

IV – DA COMPENSAÇÃO DO CRÉDITO-PRÊMIO IPI COM DÉBITOS INTEGRANTES DO REFIS I - PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL REGULAMENTADO PELA LEI 9.964/200

Ainda que seja vedada a possibilidade das empresas pagarem suas dívidas com o Fisco utilizando créditos tributários de terceiros, cumpre dispor que a Secretaria da Receita Federal, mediante a IN nº. 41, de 07 de abril de 2000, permitiu a utilização de créditos tributários de terceiros no pagamento de débitos das empresas inscritas no Programa de Recuperação Fiscal (REFIS I), senão vejamos:

"Art. 1º. É vedada a compensação de débitos do sujeito passivo, relativos a impostos ou contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, com créditos de terceiros.

Parágrafo único. A vedação referida neste artigo não se aplica aos débitos consolidados no âmbito do Programa de Recuperação Fiscal REFIS e do parcelamento alternativo instituídos pela Medida Provisória no 2.004-5, de 11 de fevereiro de 2000, bem assim em relação aos pedidos de compensação formalizados perante a Secretaria da Receita Federal até o dia imediatamente anterior ao da entrada em vigor desta Instrução Normativa.

Art. 2º. Fica revogado o art. 15, caput e parágrafos, da Instrução Normativa SRF no 021, de 10 de março de 1997." (grifos nossos) [09]

Porém, o parágrafo único do art. 1º da IN SRF n. 41 de 2000 foi revogado pela IN SRF n. 210 de 30 de setembro de 2002, e tal assertiva foi ratificada na IN SRF n. 460 de 18 de outubro de 2004, e, posteriormente, na IN SRF nº. 600, de 28 de dezembro de 2005, que vige atualmente, in verbis:

IN SRF nº. 600/2005

Art. 26.

O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive o reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrados pela SRF, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados pela SRF.

§ 3º Não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º:

V – o débito do sujeito passivo para com a Fazenda Nacional com crédito de terceiro;

Com base na legislação supracitada, a Receita Federal vem se manifestando que, atualmente, não é permitida a compensação de crédito de terceiro nem mesmo com os débitos consolidados no REFIS I.

Todavia, a Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal é um ato normativo o qual não pode violar direito garantido em Lei Ordinária, em respeito ao primado da legalidade (art. 5º, II, da Constituição Federal de 1988).

Neste passo, a Lei nº. 9.964 de 10 de abril de 2000 que regulamenta o REFIS I garante o direito do sujeito passivo compensar crédito de terceiro com os débitos referentes a multa e juros abrangidos e consolidados no programa de recuperação fiscal, in verbis:

"Art. 2º O ingresso no Refis dar-se-á por opção da pessoa jurídica, que fará jus a regime especial de consolidação e parcelamento dos débitos fiscais a que se refere o art. 1º. (Vide Lei nº 10.002, de 14.9.2000)

§ 7º Os valores correspondentes a multa, de mora ou de ofício, e a juros moratórios, inclusive as relativas a débitos inscritos em dívida ativa, poderão ser liquidados, observadas as normas constitucionais referentes à vinculação e à partilha de receitas, mediante:

I – compensação de créditos, próprios ou de terceiros, relativos a tributo ou contribuição incluído no âmbito do Refis;" (grifos nossos)

Apesar da IN SRF nº. 600/2005 impedir a compensação de créditos tributários de terceiro com débitos tributários da Fazenda Pública Federal, a Lei Ordinária nº. 9.964/2000 deve prevalecer, em atenção ao primado constitucional da legalidade, por conseqüência, é possível a compensação de créditos tributários de terceiros com os débitos relativos a juros, multa e outras despesas abrangidas pelo REFIS I.

Ressalta-se que não existe jurisprudência dominante sobre o tema. No entanto, foram prolatadas algumas decisões judiciais, seguindo o entendimento exposto em caso semelhante:

EMENTA: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. REFIS. LEI Nº. 9.964/2000. DECRETO Nº. 3.431/2000. PREJUÍZOS FISCAIS E BASES DE CÁLCULO NEGATIVAS. CESSÃO. PREVISÃO LEGAL. QUITAÇÃO DE JUROS E MULTA. RESOLUÇÃO Nº. 19/2001. LIMITAÇÃO INDEVIDA.

1. Recurso especial contra acórdão que entendeu ser possível a compensação de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL, próprios ou de terceiros, com o valor relativo a juros e multa do REFIS, na forma prevista na Lei nº 9.964/2000.

2. A Lei nº 9.964/2000, instituidora do REFIS, objetivando regularizar os créditos da União, dispôs, em seu art. 2º, § 7º, I e II, que "O ingresso no Refis dar-se-á por opção da pessoa jurídica, que fará jus a regime especial de consolidação e parcelamento dos débitos fiscais a que se refere o art. 1º. Os valores correspondentes a multa, de mora ou de ofício, e a juros moratórios, inclusive as relativas a débitos inscritos em dívida ativa, poderão ser liquidados, observadas as normas constitucionais referentes à vinculação e à partilha de receitas, mediante: I - compensação de créditos, próprios ou de terceiros, relativos a tributo ou contribuição incluído no âmbito do Refis; II - a utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da contribuição social sobre o lucro líquido, próprios ou de terceiros, estes declarados à Secretaria da Receita Federal até 31 de outubro de 1999".''

3. A Resolução CG/REFIS nº 19/2001, que limitou o direito do contribuinte estatuído pela legislação vigente à época do pedido, não pode ser motivação para sua denegação, em face da ofensa ao princípio da hierarquia das leis.

4. A restrição determinada pela referida Resolução ("art. 3º - O valor relativo a prejuízo fiscal ou a base de cálculo negativa da CSLL cedido por pessoa jurídica optante pelo REFIS será utilizado para liquidação de multas e de juros de mora de terceiros apenas quando exceder do seu próprio débito correspondente a multas e a juros de mora") não pode ter incidência a pedido requerido pelo contribuinte antes da sua edição, ainda mais quando tal ato ultrapassa sua função regulamentadora, fixando requisitos não estabelecidos na lei.

5. Tanto a Lei nº 9.964/2000 como o Decreto regulador nº 3.431/2000 nada dispuseram sobre a impossibilidade de uma pessoa jurídica optante ceder seus prejuízos fiscais e bases de cálculo negativas da CSLL a terceiros optantes. O Decreto regulamentou a lei instituidora do benefício fiscal, sem aumentá-lo ou restringi-lo, e este por si só, trouxe apenas algumas condicionantes, e em nenhuma delas vedou a empresa optante ceder seus prejuízos fiscais e bases de cálculo negativas da CSLL antes da quitação da multa e juros próprios.

6. Recurso não-provido.(STJ, RESP Nº. 748524, processo nº. 200500749425, Primeira Turma, Relator José Delgado, data da decisão: 02.05.2006, DJ data: 29.05.2006, p. 186, STJ000690527)

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Ademais, fazendo cotejo da Lei nº. 9.964/2000, que disciplina o REFIS I, e a Lei nº. 9.430/1996, que regulamenta a compensação em matéria tributária, conclui-se que a Lei do REFIS I deve prevalecer sobre a Lei 9.430/96, pois consiste em lei especial, a qual permanece sobre a lei geral de compensação tributária, conforme art. 2º, §2º, da Lei de Introdução ao Código Civil.

Portanto, é perfeitamente possível a compensação de crédito tributário de terceiro com débito do REFIS I concernente a multa e juros consolidados neste, com arrimo no art. 2º, §7º, inciso II, da Lei nº. 9.964/2000. Todavia, chama-se atenção que será necessário ter resguardado o direito prescrito no art. 2º, §7º, inciso II, da Lei nº. 9.964/2000, mediante decisão judicial, visto que a Secretaria da Receita Federal não vem admitindo a compensação de crédito tributário de terceiro com débito do REFIS I.


V – DAS CONCLUSÕES

Pelas razões acima expendidas, seguem as seguintes conclusões:

a) O crédito tributário referido pode ser cedido a terceiro, segundo a legislação pátria?

Sim. Pode ser objeto de cessão, segundo o art. 286 do Código Civil, visto que não existe impedimento em lei civil ou tributária, nem convenção entre as partes, bem como não há restrição pela natureza do crédito tributário, referente ao crédito-prêmio IPI, reconhecido em decisão transitada em julgado em ação ordinária. Entretanto, por uma questão de segurança e garantia do crédito objeto do contrato cessão, recomenda-se que este acordo de vontades seja reconhecido nos autos processuais. Ressalta-se que a cessionária poderá ter dificuldade em participar do processo que garante o crédito cedido, pois há divergência na jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais quanto à legitimidade ativa da cessionária, no entanto, é certo que terá êxito na instância do Superior Tribunal de Justiça. De qualquer forma, ainda que não consiga integrar a lide, é plenamente possível o pedido de "reserva" do valor no processo executivo, como forma de garantir o valor cedido a terceiro.

b) Caso seja realizado o contrato de cessão, pode a empresa cessionária compensar o crédito tributário cedido por terceiro com os débitos próprios relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal?

Não, segundo a legislação vigente que regula a compensação tributária (art. 74, §12, inciso II, alíneas a e b, da Lei nº. 9.430/96), não pode ser compensado crédito tributário proveniente de terceiro com débitos próprios relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal; nem mesmo pode ser compensado crédito oriundo do incentivo fiscal crédito-prêmio IPI. Logo, caso a empresa consulente se torne cessionária de parte do crédito tributário da empresa cedente, não conseguirá compensá-lo com os débitos tributários próprios perante a Secretaria da Receita Federal. Não obstante o exposto, há a possibilidade de postular em juízo a compensação de crédito tributário de terceiro traduzido em precatório com os débitos tributários da Secretaria da Receita Federal, em atenção ao art. 78 do ADCT da Constituição. Ressalta-se que não há entendimento jurisprudencial sedimentado sobre o tema, conforme demonstrado acima, contudo, o STF em recente manifestação sobre o tema decidiu de forma favorável à compensação de crédito tributário formalizado em precatório em atenção ao art. 78 do ADCT da Carta Política.

c) O crédito tributário referido pode ser compensado com o débito tributário consolidado pelo Programa de Recuperação Fiscal (REFIS I) disciplinado pela Lei nº. 9.964, de 10.04.2000?

Conforme a IN SRF nº. 600/2005, a qual, atualmente, regulamenta a compensação tributária, não pode ser compensado crédito tributário de terceiro com os débitos relativos a juros e multa consolidados no REFIS I. Contudo, sustenta-se a possibilidade de compensação do crédito tributário de terceiro com o débito relativo a juros e multa consolidados no REFIS I, com fundamento no art. 2º, §7º, inciso II, da Lei nº. 9.964/2000, em observância ao primado constitucional da legalidade. Ocorre que dificilmente essa compensação seria admitida no âmbito administrativo, sendo necessário pleitear judicialmente, estando certo de que não há ainda um posicionamento jurisprudencial sobre o específico assunto.


Notas

  1. Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação.
  2. PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Vol. 2, 4 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 309-310). No mesmo sentido, dispõem Orlando Gomes (Obrigações. 11 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 203-213); Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado. Direito das Obrigações. Vol. 23, Rio de Janeiro: Borsoi, 1958, p. 290-334); e Silvio Rodrigues (Direito Civil. Vol. 2, 2 ed., São Paulo: Max Limonad, 1965, p. 345-358).
  3. Segundo Pontes de Miranda (Comentários ao Código de processo Civil, tomo IX, RJ, Forense, p. 378), a certeza do crédito "é a ausência de dúvida quanto à sua existência, tal como está no título executivo judicial".
  4. Recomenda-se que a consulente tome diversos cuidados no caso de realização de cessão de crédito com a empresa cedente, um deles seria ter o reconhecimento da cessão nos autos do processo, no sentido de obter maior garantia do crédito objeto de cessão.
  5. Procurador-Geral da Fazenda Nacional. Revista Dialética de Direito Tributário. Compensação: Requisitos, Créditos de Terceiros, Decisão Judicial não transitada em julgado, prescrição etc. São Paulo: Dialética, n. 126, p. 102-125.
  6. A título exemplificativo, veja-se: GALBINSKI, Diego. Desmistificando a Compensação de Tributos com Precatórios. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 130, p. 15-20.
  7. Tratando do mesmo assunto há, ainda, a ADI nº. 2.927/SP, a qual está pendente de julgamento no STF.
  8. BATISTA, Clayton Rafael. Revista Dialética de Direito Tributário. Utilização de precatórios para quitação de débitos tributários. São Paulo: Dialética, junho-2006, n. 129, p. 18-20.
  9. O entendimento sustentado pela SRF na IN n. 41/2000 foi ratificado na IN SRF n. 044 de 25 de abril de 2000.
Assuntos relacionados
Sobre a autora
Karla Marques Pamplona

Assessora da Casa Civil da governadoria do Estado do Pará. mestra em direitos fundamentais e relações sociais e doutoranda no programa de desenvolvimento do trópico úmido do núcleo de altos estudos da Amazônia da Universidade Federal do Pará

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAMPLONA, Karla Marques. Possibilidade de cessão a terceiro e de compensação de crédito-prêmio IPI. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2392, 18 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14195. Acesso em: 19 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos