4 ANÁLISE SOB O ASPECTO CONSTITUCIONAL
A expedição da Resolução n.º 22.610/2007 pelo Tribunal Superior Eleitoral, que dispõe sobre o processo de perda de cargo eletivo por infidelidade e de justificação da desfiliação partidária, colocou em pauta, novamente, uma discussão não tão recente acerca dos limites da competência regulamentar desse Tribunal, culminando na apreciação pelo Supremo Tribunal Federal da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.999, conforme será visto adiante.
É importante, no entanto, antes de se discutir a ADIn acima destacada, fazer-se uma análise dessa função regulamentadora da Justiça Eleitoral, a fim de verificar seus fundamentos e sua legitimidade.
4.1 Poder Regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 84, inciso IV, restringiu ao Presidente da República o poder de expedir normas regulamentadoras, que têm por objetivo facilitar a execução das leis, em regra genéricas, cabendo-lhes a atribuição de descer aos detalhes necessários para o fiel cumprimento destas, explicitando-as ou complementando-as, observando os limites legais e constitucionais.
Alexandre de Moraes, ao falar sobre o poder regulamentar do Chefe do Poder Executivo, ensina que:
o exercício desse poder regulamentar se situa dentro da principiologia constitucional da separação dos poderes, pois, salvo em situações de relevância e urgência, o presidente da República não pode estabelecer normas gerais criadoras de direitos ou obrigações, função do Poder Legislativo, e que este poder regulamentar apenas será exercido quando alguns aspectos da aplicabilidade da lei são conferidos ao Poder Executivo, que deverá evidenciar e explicitar todas as previsões legais, decidindo a melhor forma de executá-la e, eventualmente, inclusive, suprindo suas lacunas de ordem prática ou técnica.
Ao Poder Legislativo, restou limitada a atuação normativa quanto à elaboração de seu regimento interno, à competência dos respectivos órgãos jurisdicionais, à organização de suas secretarias e serviços auxiliares, entre outros.
Entretanto, o parágrafo único do art. 1.º e o inciso IX do art. 23 do Código Eleitoral prevêem o poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral, uma das peculiaridades da Justiça Eleitoral, a saber:
Art. 1.º Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado.
Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá instruções para sua fiel execução.
Art. 23. Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior:
[...]
IX – expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código;
A origem do poder normativo da Justiça Eleitoral confunde-se com sua própria existência, pois o primeiro Código Eleitoral (Decreto n.º 21.076, de 14.2.1932), em seu art. 5º, instituiu a Justiça Eleitoral com atribuições contenciosas e administrativas, entre as quais "fixar normas uniformes para a aplicação das leis e regulamentos eleitorais, expedindo instruções que entenda necessárias". Isto é, a Justiça Eleitoral passou a ter a competência para regulamentar as eleições.
Sobre o poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral, observa Marcos Ramayana:
Diversas competências estão afetas à Justiça Eleitoral: questões de natureza administrativa, v.g., organização administrativa das zonas eleitorais, tais como locais destinados à votação, apuração, funcionários e o próprio alistamento eleitoral de natureza declaratória administrativa; questões atinentes ao poder regulamentar, pois o Poder Legislativo, ao editar as leis em matéria eleitoral, deixa sempre uma substanciosa margem de complementariedade afeta ao poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral
Logo, embora haja a predominância da sua função jurisdicional, como todo órgão do Poder Judiciário, a Justiça Eleitoral exerce fortemente as funções normativa e administrativa das eleições, com o fim de garantir a lisura do processo eleitoral.
Ocorre que, como visto acima, a Constituição Federal atribuiu somente ao Poder Executivo a competência de editar normas regulamentadoras de leis genéricas, sendo omissa quanto à função regulamentadora da Justiça Eleitoral prevista no Código Eleitoral.
A Constituição Federal dispôs, ainda, em seu art. 121, que a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais deveriam ser disciplinadas por lei complementar, gerando uma incompatibilidade com o Código Eleitoral vigente.
Porém, embora não haja fundamento constitucional explícito acerca do poder regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral, não há também na Constituição Federal nenhuma regra que proíba ou se contraponha a essa função, continuando a Justiça Eleitoral no exercício de tal atribuição.
Ademais, o próprio Tribunal Superior Eleitoral (Acórdão n.º 12.641) já se manifestou no sentido de que o Código Eleitoral, pelo fenômeno da recepção, é, atualmente, lei complementar, não obstante em sua origem ser lei ordinária, pelo menos até que seja editada a lei complementar de que faz referência no art. 121 da Constituição Federal.
A função regulamentadora da Justiça Eleitoral, portanto, é aceita e respeitada, sendo, inclusive, uma das atribuições principais realizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Esse poder regulamentar processa-se, formalmente, por meio de resoluções, entendendo-se como tais as decisões, administrativas ou judiciais, que visam dar eficácia legal e social às normas eleitorais, sejam constitucionais, sejam legais, bem como por instruções normativas, que
constituem atos normativos secundários, editados pela instância máxima da Justiça Eleitoral. Na classificação dos regulamentos, podem ser consideradas como regulamentos de execução, atos administrativos normativos, que contêm normas gerais, visando à correta aplicação da lei, cuja função, segundo Clève (2000, p. 297), "é explicitar a norma legal e os aparelhamentos dos meios concretos para a sua execução"
As resoluções podem ter caráter temporário ou permanente, devendo limitar-se a preencher e interpretar as normas eleitorais, por serem atos normativos secundários.
Ressalte-se, ainda, que as resoluções são atos normativos de observação imperativa pela Justiça Eleitoral, conforme preceito expresso no art. 21 do Código Eleitoral, a saber: "Os Tribunais e juízes inferiores devem dar imediato cumprimento às decisões, mandados, instruções e outros atos emanados do Tribunal Superior Eleitoral".
É visível, portanto, a atuação peculiar da Justiça Eleitoral no cenário jurídico e político brasileiro atual, em decorrência dessa ativa ação administrativa, com destaque para a regulamentação do processo eleitoral, por meio da edição de resoluções e instruções com força de lei geral, afastando, assim, a possibilidade de lacuna ou antinomia normativa,
bem como a ocorrência de fato ou circunstância, política ou administrativa, que não possa, de pronto, ser submetida à normatividade eleitoral.
O historiador do processo eleitoral brasileiro Vamireh Chacon (apud LACERDA et alii, 2004, p. 45), adverte que, se nós retirássemos essa competência normativa da Justiça Eleitoral, "poderíamos prejudicar o processo eleitoral, deixando-o entregue à lerdeza, mais que lentidão, do Legislativo. Ela perderia a agilidade"
Logo, pode-se dizer que uma das peculiaridades da Justiça Eleitoral é o seu poder regulamentar, que atribui ao Tribunal Superior Eleitoral a competência para expedir resoluções e instruções normativas, a fim de executar fielmente as leis eleitorais, não apenas para regulamentá-las, mas também para compatibilizá-las com o sistema no qual se inserem.
No entanto, a Resolução n.º 22.610/2007, que regulamentou o processo de perda de mandato eletivo por desfiliação partidária, provocou uma discussão acerca dos limites da função regulamentadora do Tribunal Superior Eleitoral, restando ao Supremo Tribunal Federal a decisão acerca de sua constitucionalidade, pelas questões abordadas a seguir.
4.2 A Constitucionalidade da Resolução n.º 22.610/2007
O Partido Social Cristão – PSC ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade, protocolada sob o n.º 3.999-7/Distrito Federal, argüindo a inconstitucionalidade da Resolução n.º 22.610/2007 do Tribunal Superior Eleitoral, que disciplina o procedimento de justificação da desfiliação partidária e a perda do mandato eletivo, com os seguintes argumentos:
a) o art. 2º da Resolução, que determina a competência da Justiça Eleitoral para julgar pedido de perda de mandato eletivo por ato de infidelidade partidária, teria contrariado a reserva de lei complementar para definição das competências de Tribunais, Juízes e Juntas Eleitorais, conforme previsão expressa no art. 121 da Constituição Federal;
b) teria ocorrido usurpação da competência do Legislativo e do Executivo para dispor de matéria eleitoral, uma vez que a Constituição Federal confere à União a competência privativa para legislar sobre direito eleitoral e, por meio de Resolução, em contrariedade à Constituição, o Tribunal Superior Eleitoral criou nova hipótese de perda de cargo eletivo;
c) a Resolução também teria violado a reserva de lei complementar ao estabelecer normas de caráter processual, como a forma da petição inicial e das provas (art. 3º), o prazo para a resposta e as conseqüências da revelia (art. 3º, caput e parágrafo único), os requisitos e direitos da defesa (art. 5º), o julgamento antecipado da lide (art. 6º), a disciplina e o ônus da prova (art. 7º, caput e parágrafo único, art. 8º);
d) o texto da Resolução estaria em desacordo com a orientação do Supremo Tribunal Federal nos precedentes que a inspiraram quanto à atribuição do Ministério Público Eleitoral e do terceiro interessado para postular a perda do cargo eletivo, ante a omissão do Partido Político, pois nova atribuição ao Ministério Público deveria ser apresentada por lei em sentido estrito (arts. 128, §5º e 129, inciso IX, da CF) e, por outro lado, o suplente não estaria autorizado a postular, em nome próprio, a aplicação da sanção que assegura a fidelidade partidária, uma vez que o mandato pertenceria ao Partido Político;
e) por fim, o ato impugnado teria invadido a competência legislativa, violando o princípio da separação dos poderes.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, manifestou-se, em sua maioria, pela constitucionalidade da Resolução n.º 22.610/2007, tendo por base os fundamentos antes expostos nas decisões dos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604, já analisados anteriormente, que garantiram o direito constitucional de perda de mandato eletivo por ato de infidelidade partidária, destacando, inclusive, de forma expressa, a competência do Tribunal Superior Eleitoral para editar resoluções a fim de conceder eficácia a sua decisão, conforme disposto abaixo:
E M E N T A: [...] COMPETÊNCIA NORMATIVA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL [...] ADMISSIBILIDADE DE EDIÇÃO, PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, DE RESOLUÇÃO QUE REGULAMENTE O PROCEDIMENTO DE JUSTIFICAÇÃO [...] HIPÓTESES EM QUE SE LEGITIMA, EXCEPCIONALMENTE, O VOLUNTÁRIO DESLIGAMENTO PARTIDÁRIO. [...] A INSTAURAÇÃO, PERANTE A JUSTIÇA ELEITORAL, DE PROCEDIMENTO DE JUSTIFICAÇÃO. - O Tribunal Superior Eleitoral, no exercício da competência normativa que lhe é atribuída pelo ordenamento positivo, pode, validamente, editar resolução destinada a disciplinar o procedimento de justificação, instaurável perante órgão competente da Justiça Eleitoral, em ordem a estruturar, de modo formal, as fases rituais desse mesmo procedimento, valendo-se, para tanto, se assim o entender pertinente, e para colmatar a lacuna normativa existente, da "analogia legis", mediante aplicação, no que couber, das normas inscritas nos arts. 3º a 7º da Lei Complementar nº 64/90. - Com esse procedimento de justificação, assegura-se, ao partido político e ao parlamentar que dele se desliga voluntariamente, a possibilidade de demonstrar, com ampla dilação probatória, perante a própria Justiça Eleitoral - e com pleno respeito ao direito de defesa (CF, art. 5º, inciso LV) -, a ocorrência, ou não, de situações excepcionais legitimadoras do desligamento partidário do parlamentar eleito (Consulta TSE nº 1.398/DF), para que se possa, se e quando for o caso, submeter, ao Presidente da Casa legislativa, o requerimento de preservação da vaga obtida nas eleições proporcionais [...]
Assim, o próprio Supremo, ante a omissão legal acerca de tal procedimento, previu como instrumento para viabilizar a garantia ora reconhecida a resolução, a ser expedida pelo órgão competente da Justiça Eleitoral, sob pena de não ver efetivada sua decisão. Não faria sentido a Suprema Corte reconhecer um direito constitucional sem prever um mecanismo para assegurá-lo.
Nesse sentido, destaca o ministro Joaquim Barbosa, Relator da ADIn n.º 3.999:
Pois bem, ao reconhecer aos partidos políticos o direito de postular o respeito ao princípio da fidelidade partidária perante o Judiciário, decisão na qual, é importante relembrar, eu fiquei vencido, esta Corte, interpretando a Constituição, não lhes negou um meio processual para assegurar concretamente as conseqüências advindas de eventual desrespeito ao princípio então reconhecido. É nesse sentido que leio as palavras lançadas pelo Ministro Celso de Mello, de que compete ao TSE dispor sobre a matéria durante o silêncio – eloqüente, talvez – do Legislativo.
Vale dizer, de pouco adiantaria a Corte reconhecer um dever – fidelidade partidária – e não reconhecer a existência do mecanismo leva a quadro de exceção, que se crê ser temporário. É nesse quadro excepcional, de carência de meio para garantia de um direito constitucional, marcado pela transitoriedade, que interpreto a adequação da resolução impugnada ao art. 21, IX do Código Eleitoral, este interpretado conforme a Constituição. O poder normativo do Tribunal Superior Eleitoral se submete, por óbvio, à Constituição. Por seu turno, o texto constitucional comete ao Legislativo o poder-dever de exercer a representação política que lhe foi outorgada e dispor sobre matéria eleitoral, nela consideradas o alcance e o processo que leva à caracterização da infidelidade partidária. E, neste ponto, ressalvadas as salvaguardas constitucionais, o Legislativo é soberano. A demarcação do âmbito de atividade do Legislativo, contudo, deve ser sensível às situações extraordinárias, marcadas pela necessidade de proteção de um direito que emana da própria Constituição. A atividade normativa do TSE recebe seu amparo da extraordinária circunstância de o Supremo Tribunal Federal ter reconhecido a fidelidade partidária como requisito de permanência em cargo eletivo e a ausência expressa de mecanismo destinado a assegurá-lo
Em seu voto, o ministro Joaquim Barbosa advertiu, ainda, o caráter excepcional e transitório da situação ora imposta, reconhecendo a soberania do Poder Legislativo, embora advertindo a necessidade de proteção de direito constitucional reconhecido pela própria Corte.
Ademais, há entendimento no Supremo Tribunal Federal, na voz do ministro Cezar Peluso, de que o princípio do devido processo legal não decorre tão somente de uma lei, mas de qualquer outra fonte constitucional, a exemplo da coisa julgada material de uma decisão da Suprema Corte, que, no caso ora analisado, foi fonte constitucional para disciplinar o procedimento quanto à perda de mandato eletivo por ato de infidelidade partidária, a saber:
Hoje, sabe-se que, quando o tal princípio constitucional se refere ao devido processo legal - e no artigo 111 da Constituição italiana consta agora a expressão "il glusto processo regolato dalla legge"-, não significa apenas que tal processo, a disciplina ou o perfil de tal processo deva decorrer de uma lei. É que o princípio agasalha, também, a hipótese de que o processo possa decorrer de qualquer outra fonte normativo-constitucional.
É o que parece, com o devido respeito, que se passou, no caso. Por quê? Porque a necessidade da disciplina do procedimento, que foi a razão da edição da resolução ou das resoluções ora impugnadas, advém de outra fonte constitucional, qual seja, a eficácia de coisa julgada material de um acórdão do Supremo Tribunal Federal. Noutras palavras, se esta Corte, em decisão recoberta pela autoridade de coisa julgada material, determina ao Tribunal Superior Eleitoral que, para dar eficácia prática ao objeto da sua decisão, deva disciplinar o modo de concretização do seu comando, a atuação do Tribunal Superior Eleitoral não pode deixar de ser considerada como expressão de um devido processo legal, de fonte constitucional, porque nasce exatamente da eficácia de coisa julgada material que a Constituição lhe garante
Vale destacar, por fim, alguns aspectos do voto do ministro Carlos Britto, que enfatizou a importância de se ver concretizado e garantido o direito constitucional reconhecido pela jurisprudência brasileira de perda do mandato eletivo por ato de infidelidade partidária, fazendo menção às palavras de Celso de Mello em julgados anteriores:
Pois bem, a expedição de ambas as resoluções se fez para cumprir determinação do Supremo Tribunal Federal, em fina sintonia com decisões do Supremo Tribunal Federal em dois mandados de segurança e, no particular, ambas as resoluções louvaram-se em passagens do voto proferido por esse luminar do Direito que é o Ministro Celso de Mello; esse erudito componente da Suprema Corte brasileira que, sem dúvida, se inscreve na lista, no rol, dos melhores, dos maiores Ministros que passaram por esta Casa em todos os tempos.
Disse o Ministro Celso de Mello, lapidarmente:
"O direito vindicado pelos partidos políticos afetados por atos de infidelidade partidária não nasce nem surge da resposta que o TSE deu à Consulta que lhe foi submetida, mas representa emanação direta do próprio texto da Constituição, que a esse mesmo direito confere realidade e dá suporte legitimador, especialmente em face dos fundamentos e dos princípios estruturantes em que se apóia o Estado Democrático de Direito, como a soberania popular, a cidadania e o pluralismo político".
[...] O fato é que o partido, ponte necessária entre o eleito e o candidato, é quem filia o candidato como condição de elegibilidade; aprova o nome do candidato em convenção – até então é um pré-candidato -; inscreve o candidato; registra-o na Justiça Eleitoral (ou o partido ou a coligação); cede ao candidato o seu espaço gratuito de rádio e televisão; financia a campanha do candidato com recursos do fundo partidário e outros recursos; empresta ao candidato o seu aval ideológico, o seu aval ético durante a campanha, porque a ideologia do candidato se conhece pela ideologia do partido. E, depois, o candidato põe o diploma debaixo do braço e arbitrariamente dá as costas ao partido sob cuka bandeira, sob cuja legenda se elegeu?
Aí disse o Ministro Celso de Mello:
"O ato de infidelidade, seja o Partido Político, seja, com maior razão, ao próprio cidadão-eleitor, mais do que um desvio ético-político, representa um inadmissível ultraje ao princípio democrático e ao exercício legítimo do poder, na medida em que migrações inesperadas, nem mesmo motivadas por razões justas, não só surpreendem o próprio corpo eleitoral e as agremiações partidárias de origem – desfalcando-as da representatividade por elas conquistadas nas urnas -, mas culminaram por gerar um arbitrário desequilíbrio de forças do Parlamento, vindo, até, em clara fraude à vontade popular, e em frontal transgressão ao sistema eleitoral proporcional, a asfixiar, em face de súbita redução numérica, o exercício pleno da oposição política".
[...]
Mas, no que nos interessa mais de perto, disse o Ministro:
"Nada impedirá que E. Tribunal Superior Eleitoral, à semelhança do que se registrou em precedente firmado no caso Mira Estrela/SP (RE 197.917-SP) formule e edite resolução destinada a regulamentar o procedimento (materialmente) administrativo de justificação em referência, instaurável perante órgão competente da própria Justiça Eleitoral, em ordem a estruturar, de modo formal, as fases rituais desse mesmo procedimento (...)"
Dessa forma, o Tribunal Superior Eleitoral teve confirmado no Supremo Tribunal Federal seu poder regulamentar e a constitucionalidade da Resolução n.º 22.610/2007, em todos os seus termos, figurando, inclusive, como instrumento hábil e necessário para assegurar o direito constitucional à perda do mandato eletivo em caso de infidelidade partidária.