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Considerações acerca da súmula impeditiva de apelação (art. 518, § 1º, CPC)

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24/01/2010 às 00:00
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4 SÚMULA IMPEDITIVA DE APELAÇÃO (ART. 518, § 1.º, DO CPC)

O Código de Processo Civil sofreu, desde sua promulgação até os dias atuais, três grandes reformas. A primeira delas, na década de 90, trouxe a adoção da antecipação da tutela; a segunda, ocorrida em 2002, introduziu modificações quanto ao cabimento e gestão dos recursos; e a terceira, nos anos de 2005 e 2006, que trouxe medidas com a finalidade de empreender maior celeridade ao Poder Judiciário, dentre elas, a alteração do processo de execução, do recurso de agravo e a criação da súmula impeditiva de recursos, objeto do presente estudo.

A súmula impeditiva de recursos, que seria tecnicamente melhor denominada de súmula impeditiva de apelação, uma vez que só faz menção expressa a tal recurso, consiste na inadmissão do recurso de apelação que ataque decisão baseada em súmulas editadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de mais um dispositivo decorrente da vinculação dos precedentes dos tribunais superiores.

Assim está disposto o art. 518, caput e § 1.º, do CPC:

Art. 518: Interposta a apelação, o juiz, declarando os efeitos em que a recebe, mandará dar vista ao apelado para responder:

§ 1º O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.

Originada do Projeto de Lei do Senado (PLS 140/2004), após deflagração da "Campanha pela Efetividade da Justiça", promovida pela Associação dos Magistrados Brasileiros, a súmula impeditiva de recurso surgiu com a finalidade de aprimorar e agilizar a prestação jurisdicional, impedindo recursos meramente procrastinatórios, sendo cabível a interposição de agravo de instrumento contra a decisão que inadmitir o recurso de apelação. Não se trata de novidade na nossa legislação, visto que tal prerrogativa de denegar o prosseguimento de recurso destoante de matéria pacífica ou sumulada pelos tribunais superiores já era possível ao relator, nos termos do art. 557 do CPC. No mesmo sentido, o § 3.º do art. 475 do CPC também prevê a possibilidade do relator dispensar o reexame necessário quando a sentença estiver fundada em súmula do tribunal superior.

De acordo com a súmula impeditiva de apelação, como convencionaremos chamar neste estudo, é necessário que exista súmula a respeito da questão, não bastando o entendimento majoritário. Apresenta similitude com a súmula vinculante, sendo que o julgador não está obrigado a decidir de acordo com o entendimento sumulado, mas se o fizer, poderá recusar a apelação interposta. Sob esse aspecto, há uma maior liberdade do julgador, que poderá discordar ou concordar com as orientações sumuladas. Concordando, "impedirá" a interposição da apelação; caso contrário, poderá defender sua tese, contribuindo para a evolução jurisprudencial. Somente as súmulas vinculantes têm o condão de submeter, obrigatoriamente, o juízo singular ao entendimento dos Tribunais Superiores.

O texto original do projeto [18] previa que o recurso de apelação seria obstado caso a decisão atacada estivesse em consonância com súmula do tribunal respectivo ou dos tribunais superiores, o que foi reformulado com a seguinte justificativa:

Entendo, entretanto, que um reparo deve ser feito no proposto § 1º do art. 518, no que se refere à possibilidade de não recebimento de recurso de apelação quando em confronto com súmula do respectivo tribunal, pois, tal medida regionalizaria a jurisprudência, incrementando o trabalho do Superior Tribunal de Justiça na tentativa uniformização dos entendimentos jurisprudenciais. Ressalte-se que, nesse caso, é preferível que a "súmula impeditiva de recursos" refira-se apenas às súmulas editadas pelos Tribunais Superiores. (BRASIL, 2004).

Apesar de a medida conceder uma certa valorização do juiz de primeiro grau no tocante à uniformização da jurisprudência, seu juízo de admissibilidade é apenas provisório e passível de reforma através de agravo de instrumento. Não obstante a intenção de trazer uma maior celeridade processual, a súmula impeditiva de recurso poderá acarretar um emperramento ainda maior da máquina judiciária.

Segundo Marina Freitas do Nascimento [19], a medida é totalmente ineficiente para conter manobras protelatórias. Corroborando seu entendimento, cita Wambier, Wambier e Medina:

Para percorrer o caminho até o pronunciamento do órgão colegiado do tribunal, deverá a parte apelar contra a sentença, agravar contra a decisão proferida pelo juiz com base no Art. 518, §1º, e interpor agravo interno contra a decisão monocrática proferida pelo relator do recurso. Substitui-se, assim, um recurso (a apelação) por três (a apelação e dois agravos), para se chegar a um mesmo destino, o que onera a parte com mais custas processuais, o que contraria o princípio econômico, formulado por Mancini ainda no século XIX, segundo o qual a lide não deve ser alvo de custas ou impostos pesados, cuja, despesa torne a justiça acessível somente a alguns cidadãos privilegiados pela riqueza. (WAMBIER, WAMBIER e MEDINA apud NASCIMENTO, 2009).

Vislumbra-se que a demanda recursal não será reduzida com a súmula impeditiva de apelação. Ainda que o magistrado esteja em consonância com o entendimento dos tribunais superiores, sua decisão impeditiva da apelação não impedirá que a questão chegue ao tribunal.

Mas não é apenas sob o efeito prático que a súmula impeditiva de apelação vem causando amplos debates. Sua (i)legalidade também é discutida, mormente no que se refere à observância de garantias constitucionais.

Com o advento da súmula impeditiva de apelação, o juiz de primeiro grau teve o seu trabalho de análise de admissibilidade recursal aumentado, visto que, ao verificar se a decisão está ou não em consonância com súmula dos tribunais superiores, exerce o juízo de mérito. Em outras palavras, o próprio prolator da decisão é quem examina o mérito do recurso, o que, para alguns, configura violação ao princípio do duplo grau de jurisdição.

A Ministra Fátima Nancy Andrighi, em palestra proferida no Seminário "As Novas Reformas do Processo Civil" [20], defende que o dispositivo não afronta o duplo grau de jurisdição, visto que a parte inconformada com a decisão de inadmissibilidade da apelação poderá interpor agravo de instrumento e submeter, por via indireta, a questão controversa à análise do Tribunal. Argumenta, ainda, que a eventual afronta ao referido princípio não seria capaz de tornar inconstitucional a norma, retomando-se aqui a celeuma já apontada neste trabalho, no que diz respeito ser o duplo grau de jurisdição uma garantia ou um princípio constitucional. Para a jurista, trata-se de princípio e, portanto, passível de mitigação:

Não se discute que o princípio do duplo grau de jurisdição está previsto, ainda que implicitamente, na Constituição Federal, pois, de fato, há dispositivos constitucionais estabelecendo que os Tribunais terão competência para julgar causas originariamente e em grau de recurso. No entanto, a existência de previsão constitucional, por si, não impede a mitigação do princípio do duplo grau de jurisdição. O Supremo Tribunal Federal, órgão competente para definir a interpretação adequada dos dispositivos constitucionais, no julgamento do RHC 79785, da relatoria do Min. Sepúlveda Pertence, com acórdão publicado no DJ de 22.11.2002, definiu que o duplo grau de jurisdição não representa uma garantia constitucional, sendo perfeitamente viável, portanto, que a legislação infraconstitucional crie obstáculos ao cabimento da apelação, sem que isso importe em inconstitucionalidade da norma. Com estas considerações, sob qualquer prisma que se analise o novo art. 518 do CPC, conclui-se que o dispositivo legal não afronta à Constituição Federal, não obstante imponha obstáculos que dificultam, significativamente, o reexame da lide por outro órgão. (ANDRIGHI, 2006)

Por outro lado, Vanessa Flávia de Deus Queiroz, em seu trabalho intitulado como "As Consequências Constitucionais da Súmula Impeditiva de Recursos" [21], concebe o duplo grau de jurisdição como garantia fundamental contra o arbítrio do julgador, mas que sua ausência expressa no texto constitucional vem dando margem à sua mitigação, como ocorre no Código de Processo Civil com o advento da súmula impeditiva de apelação. Argumenta, ainda, que por infringir garantia, seja constitucional ou processual, a medida dá ensejo a recurso diverso e, portanto, não reduzirá a morosidade processual.

Ainda sob o ângulo do duplo grau de jurisdição, vislumbra-se uma desconfiança "propositada" do julgado de primeiro grau, com fins de protelar cada vez mais o efetivo cumprimento da decisão. É como se o juiz de primeiro grau fosse incapaz de julgar sozinho, fazendo-se sempre necessária a ratificação através do duplo grau de jurisdição.

Invoca-se também a inconstitucionalidade da norma em estudo em face da possibilidade de violar o princípio do contraditório. Para que isso não ocorra, é importante que as súmulas tenham sido editadas após prévio e exaustivo contraditório. Argumenta-se, ainda, que a aplicação do art. 518, § 1.º, do CPC, nega, de ofício, prosseguimento à apelação, sem a devida formação do contraditório, desprezando a possibilidade de reconhecimento do direito do autor pelo réu ou até mesmo a formalização de um acordo entre os litigantes.

Para Júlio Siqueira [22], há também violação ao princípio do Estado Democrático de Direito, inicialmente imperceptível. Considera a súmula impeditiva do recebimento de recurso de apelação uma ruptura constitucional e que sua aplicação deve ter caráter excepcional. Para o jurista, o caput do art. 518 garante o contraditório e a ampla defesa, determinando que seja o apelado intimado a responder. No entanto, o § 1.º do mesmo dispositivo autoriza o julgador a rejeitar de pronto o pedido do recorrente, examinando o próprio mérito recursal. Defende o autor que mesmo estando a decisão recorrida fundamentada em súmula do STF ou do STJ, mas trazendo o recorrente nova razão ou questão que renove a discussão, deve ser recebida a apelação. E aqui cabe lembrar que a regra no direito brasileiro é a proibição de inovar em grau de recurso. Todavia, o art. 517 do CPC permite que sejam suscitadas questões de fato novas, desde que a parte prove que deixou de fazê-lo por motivo de força maior.

Há também uma preocupação no sentido de que a súmula impeditiva de apelação ofenda o direito de ação. Para este, não há limitação quanto às demandas que podem ser levadas ao Poder Judiciário, bastando apenas a presença dos pressupostos processuais previstos no art. 267, IV, do CPC, dentre eles, o interesse de agir. Consiste o acesso à jurisdição na possibilidade da parte prejudicada levar sua insatisfação ao Poder Judiciário, para solução do conflito. No caso da súmula impeditiva de apelação, vislumbra-se que houve somente uma prorrogação da competência antes delegada apenas ao relator do recurso, o que não configura cerceamento ao direito de ação. Por outro lado, vê-se que o interesse recursal diante de questão com entendimento pacificado pelos tribunais superiores fica prejudicado. Neste caso, a súmula impeditiva de recurso poderia ser justificada pela falta de utilidade do recurso, uma vez que não havendo novas razões, o resultado recursal seria o mesmo proferido pelo juízo de primeiro grau.

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Outro ponto que merece destaque é a atualização das súmulas dos tribunais. A Lei n.º 11.276/06 foi silente no tocante à aplicação ou não das súmulas prolatadas anteriormente à sua entrada em vigor. Como se sabe, as súmulas não são constantemente revisadas e muitas vezes acabam por ditar entendimento diverso do atualmente dominante. E o pior, o reexame da súmula não pode ser proposto pelo jurisdicionado, que, se quiser atacá-la, deverá fazê-lo através de recurso. Com a nova redação do art. 518 do CPC, esta possibilidade ficou ainda mais restrita, restando apenas o agravo de instrumento, que, por sua vez, não devolve ao tribunal toda a matéria fática controvertida.

A extensão do julgamento do agravo interposto contra decisão que inadmitiu a apelação com fundamento no § 1.º do art. 518 do CPC também merece esclarecimento. Antes da introdução da súmula impeditiva de apelação em nosso ordenamento, o julgamento do agravo contra decisão que não recebia recurso de apelação cingia-se à análise dos pressupostos recursais e, caso estes fossem considerados presentes, era determinada a subida dos autos principais para análise da apelação.

Com a nova redação do art. 518 do CPC, poderão ocorrer duas alegações: inaplicabilidade da súmula ao caso concreto ou sentença com entendimento contrário ao sumulado pelo STJ ou STF.

Na primeira hipótese, acaso provido o agravo, o Tribunal mandará subir os autos principais para apreciação da apelação. Seria mais coerente com os princípios da celeridade e da economia processual a mudança de tal procedimento, permitindo que não fosse esperado o eventual provimento do agravo para preparação da apelação. Ou seja, a parte recorrida deveria ser intimada para apresentar resposta a ambos os recursos, que já poderiam ser apreciados, se fosse o caso, numa mesma sessão de julgamento.

Já no segundo caso, a questão controvertida do agravo é o próprio mérito da apelação, qual seja, inobservância de súmula dos tribunais superiores. O problema é que inexiste regra expressa permitindo a apreciação da apelação no julgamento do agravo de instrumento (seria uma espécie de conversão do agravo em apelação). O Código de Processo Civil já contempla tal possibilidade para os recursos especial e extraordinário (art. 544, §§ 3.º e 4.º), sendo razoável sua aplicação analógica ao caso da apelação. Pensar o contrário, ou seja, vislumbrando a necessidade de subida dos autos principais, é ir de encontro à celeridade almejada pela nova figura processual.

Sobre o assunto, a Ministra Fátima Nancy Andrighi, na mesma palestra antes referida, sugere a criação de uma terceira modalidade de agravo, qual seja, o agravo "encartado":

Ainda, considerando a possibilidade de extensão do julgamento do agravo de instrumento, quando aplicada a nova regra do art. 518 do CPC, é possível apontar para eventual proposta de modificação normativa que estabeleça uma terceira modalidade de agravo: o agravo "encartado". Teríamos, então, o agravo de instrumento, dirigido diretamente ao Tribunal competente; o agravo retido nos autos, interposto no juízo a quo, que, nos termos do art. 523 do CPC, alterado pela recente Lei 11.187/2005, poderá ser apreciado pelo Tribunal na hipótese de o agravante requerer, preliminarmente, nas razões de apelação; e o inusitado agravo encartado, interposto contra decisão que aplicar, especificamente, o novo parágrafo primeiro do art. 518 do CPC. Assim, quando o juiz deixasse de admitir a apelação por entender que a sentença está em conformidade com súmula do STJ ou STF, a parte inconformada poderia interpor o denominado "agravo encartado", perante o juízo a quo, que deveria, automaticamente, após a concessão de prazo para apresentação de contra minuta pelo agravado, remeter os autos ao Tribunal. (ANDRIGHI, 2006).

Discute-se também se a aplicação do art. 518, § 1.º, do CPC, integra o juízo de mérito ou de admissibilidade recursal. Afirma-se que a medida trouxe mais um pressuposto de admissibilidade recursal. No entanto, há os que entendem que ao analisar se a decisão em ataque foi prolatada ou não de acordo com enunciados dos tribunais superiores, o julgador está realizando verdadeira análise do mérito recursal.

Pela análise literal do texto da norma em questão, verifica-se que o legislador referiu-se ao juízo de admissibilidade, afirmando que o juiz "não receberá o recurso", deixando transparecer que a ele não caberá qualquer apreciação do mérito.

Em sentido contrário, Wambier, Wambier e Medina apud Nascimento (2009) lecionam que saber se uma sentença está ou não em consonância com súmula editada pelo STF ou pelo STJ é questão atinente ao juízo de mérito do recurso.

Na mesma esteira de pensamento, Didier Jr. e Cunha (2009, p. 132):

Na verdade, quando o juiz aplica o § 1º do art. 518 do CPC, ele está a negar seguimento à apelação por razões de mérito; pode-se dizer que se conferiu ao juiz, nesse caso, competência para julgar o mérito da apelação. O juiz, em outras palavras, estará negando provimento à apelação.

Liu Carvalho Bittencourt [23], em "O artigo 518, § 1.º do Código de Processo Civil – juízo indireto de mérito recursal no manejo das ‘súmulas impeditivas de apelação’", sugere a criação de uma nova figura processual – juízo indireto de mérito recursal - para explicar com melhor técnica a questão. Segundo o autor, o juiz apenas analisa a sentença proferida, no intuito de verificar sua consonância com os entendimentos sumulados pelos tribunais superiores, adentrando no mérito recursal apenas de forma indireta.

Assim sendo, conclui-se que o Juiz a quo não tocará o mérito das razões recursais pela própria ocasião do processamento da apelação, mas sim, pela realização da atividade de subsunção – que foi discricionária - realizada até o enquadramento da demanda à súmula do STJ ou STF, pois a matéria alegada nas razões de apelação (quando possível a aplicação do art. 518, § 1º) será necessariamente deduzida a partir da mesma argumentação que ensejou a aplicação pelo Juiz da súmula impeditiva de apelação naquele caso. (BITTENCOURT, 2007).

Independentemente de se tratar de pressuposto de admissibilidade ou não, o certo é que se a decisão recorrida estiver fundamentada em súmula do STF ou do STJ, o recurso de apelação não será recebido.

No entanto, a súmula impeditiva de apelação deixará de ser aplicada em algumas situações, tais como:

a) quando o apelante pretende invalidar a decisão por vício formal. Neste caso, o objeto recursal não estará levando em consideração se a decisão contraria ou não súmula dos tribunais superiores, mas sim, que houve um erro no procedimento do feito, que, por conseqüência, invalida a sentença;

b) a impossibilidade de incidência da súmula no caso concreto. Aqui talvez seja o ponto mais importante e que exige a máxima cautela do julgador. Ao proferir qualquer decisão baseada em súmula ou entendimento jurisprudencial, seja de tribunais superiores ou não, o julgador deve ter a cautela de examinar os precedentes, o contexto e as circunstâncias que ensejaram aquele entendimento, sob pena de fazer julgamento equivocado. Se o apelante entende que a súmula não se aplica ao caso concreto, o mérito recursal não será o conteúdo sumulado e, por conseguinte, inadmissível a aplicação do art. 518, § 1.º, do CPC;

c) a invocação de fundamento novo, não examinado pelos precedentes que ensejaram a edição da súmula. Consequência da falta de regular atualização, as súmulas podem enunciar entendimento ultrapassado e, neste caso, também não há possibilidade de aplicação da súmula impeditiva de apelação.

Segundo Didier Jr. e Cunha (2009, p. 130):

Chama-se na doutrina do common law, overruling a superação de um precedente, por se o entender equivocado ou ultrapassado (...) implica uma revogação expressa do precedente, podendo haver, também, a revogação implícita, quando simplesmente se decide contrariamente ao precedente anterior ou quando se argumentar que a decisão não se sustenta diante de uma decisão posterior de uma corte superior.

d) quando houver divergência de entendimento entre o STF e o STJ sobre o mesmo tema, tal como ocorre acerca da alegação de posse advinda de promessa de compra e venda, não inscrita no cartório de imóveis, ensejar embargos de terceiro, onde o STF entende que não cabem tais embargos, enquanto o STJ afirma sua possibilidade, ambos os entendimentos sumulados – 621 e 84, respectivamente. No mesmo sentido, se há um entendimento sumulado por uma Corte Superior e a outra possui jurisprudência dominante no sentido contrário, ainda que não sumulada, também não vai ser possível a aplicação do novo dispositivo legal. Como é evidente, se os tribunais superiores não chegaram a um consenso, não há como o juiz de primeiro grau impedir a apelação.

A súmula impeditiva de apelação surge como um paliativo para tentar diminuir a demanda recursal. Para alguns, a medida é mais eficiente do que a súmula vinculante, sob o argumento de que não oferece qualquer dano à independência e à criatividade jurisprudenciais. Por outro lado, uma análise superficial do dispositivo pode levar à conclusão equivocada de que, mesmo no sentido inverso, todas as súmulas do STJ e do STF passaram a ter efeito vinculante. No entanto, a diferença reside substancialmente na obrigatoriedade de sua utilização. Enquanto a invocação das súmulas persuasivas é faculdade para o julgador, as súmulas vinculantes são obrigatórias.

Por se tratar de uma reforma pontual do sistema recursal, é possível que a súmula impeditiva de apelação não gere os efeitos almejados. A possibilidade de recurso contra a decisão que não recebe a apelação é um dos pontos que revela um pouco da ineficácia da medida para reduzir o número de recursos nos tribunais superiores.

Há tempos existe uma enorme preocupação com a uniformização jurisprudencial, com o fundamento de que é através dela que se alcança a segurança jurídica tão almejada. Realmente, não há dúvidas de que o direito uniformizado, onde todos terão a mesma resposta para os mesmos conflitos, faz parte inclusive do ideal de justiça. O que não pode ocorrer é uma uniformização cega, sem análise das circunstâncias fáticas de cada caso concreto.

O mundo globalizado exige respostas rápidas e até mesmo imediatas, o que atinge também o meio jurídico. A uniformização de entendimentos jurisprudenciais parece atender a este reclamo. No entanto, o perigo reside no caso do mau julgador, que através de uma simples leitura da súmula ou da ementa do acórdão, já acha a resposta ideal para o seu caso concreto e, não raras vezes, resolve o processo e perpetua o conflito. "A preocupação maior é com a resolução da grande quantidade dos processos (não necessariamente dos litígios) e, em razão disto, o fundo hermenêutico fica prejudicado." (ALENCAR, 2009, p. 100).

A súmula impeditiva de apelação é uma das várias tentativas do legislador em unificar a jurisprudência para diminuir a demanda recursal e aumentar a celeridade processual. Como já dito acima, talvez não produza os efeitos desejados, mas possui aspectos positivos e, diante dos problemas da nossa realidade, onde a morosidade e os recursos procrastinatórios são uma constante, resta-nos empreender esforços para sua melhor aplicação.

O momento é de pragmatismo. A Lei entrará em vigor inexoravelmente e temos que aplicá-la. A mínima inteligência manda que usemos todos os esforços para a sua melhor aplicação. Uma atitude eu tenho certeza que a sociedade brasileira espera de nós, lidadores do Direito: parar de reclamar que não temos Lei, especialmente quando a temos, e, então, entendemos que ela tem muitos defeitos e se torna difícil sua aplicação. Misoneísmo e idealismo são excludentes, portanto mãos à obra, porque só a boa vontade de fazer o melhor é capaz de produzir verdadeiros milagres e, a humanização da Justiça passa inexoravelmente pelo uso da nossa melhor parte – a inteligência de cada um. (ANDRIGHI, 2006).

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Sobre a autora
Adriana Farias Mesquita

Analista Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, lotada no Fórum da Comarca de Santa Quitéria-CE; graduada em Direito e especialista em Direito Processual Civil, pela Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MESQUITA, Adriana Farias. Considerações acerca da súmula impeditiva de apelação (art. 518, § 1º, CPC). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2398, 24 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14244. Acesso em: 18 nov. 2024.

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Monografia elaborada sob orientação do Prof. Esp. Flávio Maria Leite Pinheiro.

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