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O mito da proibição de provas ilícitas "pro societate" no processo penal

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13/02/2010 às 00:00
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5. CONCLUSÃO

A admissibilidade das provas ilícitas em favor da acusação, ao contrário do que pensam alguns insígnes juristas, não revela uma visão privatística dos direitos e das provas. Se, por um lado, é inquestionável que nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de Direito; no devido processo penal, a busca da verdade se transmuda num valor mais precioso do que a própria proteção da liberdade individual do acusado.

De fato, são diversas as vozes em doutrina (nacional e internacional) que criticam tal posicionamento, mas o que deve ser dito e repetido, em alto e bom som, e este sim se refere ao punctum saliens da aludida controvérsia, é que no julgamento do RE nº 251.445/GO - há quase uma década - a violação covarde dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes não mereceu, por parte do STF, a aplicação do princípio da proporcionalidade sob a perspectiva da vedação da proteção deficiente.

Ora, conquanto o Direito não deva ser realizado a qualquer preço, a prova, se imprescindível, deve ser aceita e admitida (sempre em situações de estrita necessidade), a despeito de ilícita, desde que seja produzida pelo particular (e não pelo Estado).

Dessa forma, é possível prestigiar aquele direito fundamental que, em determinado caso concreto merece maior respaldo em virtude da busca da verdade real, sob a justificativa do estado de necessidade ou em face da aplicação do princípio da proporcionalidade, apto a autorizar o sopesamento e consequente flexibilização de alguns direitos fundamentais como, inclusive, já procedeu a Suprema Corte outrora.


6. BIBLIOGRAFIA

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VASCONCELLOS, Roberto Prado de. Provas Ilícitas (Enfoque Constitucional) In: Revista dos Tribunais, nº 791, setembro de 2001.


Notas

  1. Importa saber para aplicação dessa teoria, contudo, quando determinada prova pode ser considerada derivada de outra e quando essa pode ser considerada independente. Assim, se a prova derivada poderia ter sido produzida independentemente da obtenção da prova ilícita, não há razão para negar eficácia àquela. Podendo ser oriunda de uma "fonte autônoma de prova" (independent source rule), pode a prova ser utilizada no processo, ainda que concretamente derivada de prova ilícita (STF, 2ª Turma, RHC 90.376/RJ, rel. Min. CELSO DE MELLO, j. em 03.04.2007, DJ 18.05.2007, p.113). Do mesmo modo, se o descobrimento da prova derivada era inevitável (inevitable discovery) não há razão para negar-se eficácia à prova derivada, que aí se desvincula da prova ilícita.
  2. GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal. 11 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.116.
  3. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.27
  4. GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Direito à Prova no Processo Penal. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p.47.
  5. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.330.
  6. ROXIN, Claus. Derecho Procesal Penal. Buenos Aires: Editores del Puerto; 2000, p. 258.
  7. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Altas, 2002, p.169.
  8. Cf. 6ª T., RHC nº 2.777-0/RJ, Rel. Min. PEDRO ACIOLI, Ementário STJ, nº 8/721.
  9. "(...) os direitos do homem, segundo a moderna doutrina constitucional, não podem ser entendidos em sentido absoluto, em face da natural restrição resultante do princípio da convivência das liberdades, pelo que não se permite que qualquer delas seja exercida de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias. As grandes linhas evolutivas dos direitos fundamentais, após o liberalismo, acentuaram a transformação dos direitos individuais em direitos do homem inserido na sociedade. De tal modo que não é mais exclusivamente com relação ao indivíduo, mas no enfoque de sua inserção na sociedade, que se justificam, no Estado social de direito, tanto os direitos como as suas limitações" in GRINOVER, Ada Pellegrini. Op. Cit., p.140.
  10. HÄBERLE, Peter. Verfassung als Öffentlicher Prozess, 1978, p.123.
  11. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21. ed. atual, 2007, p.515.
  12. Sobre a aludida controvérsia assim já se pronunciou o Min. SEPÚLVEDA PERTENCE: "Não contesto a relatividade dos direitos e garantias individuais, sujeitos a restrições na estrita medida da necessidade, em caso de conflito com outros interesses fundamentais igualmente tutelados pela Constituição. Por isso, igualmente não nego, em linha de princípio, a legitimidade do apelo ao critério da proporcionalidade para solver a colisão entre valores constitucionais. Posto não ignore a autoridade do entendimento contrário, resisto, no entanto, a admitir que à garantia constitucional da inadmissibilidade da prova ilícita se possa opor, com o fim de dar lhe prevalência em nome do princípio da proporcionalidade, o interesse público na eficácia da repressão penal em geral ou, em particular, na de determinados crimes. É que, aí, foi a Constituição mesma que ponderou os valores contrapostos e optou – em prejuízo, se necessário, da eficácia da persecução criminal – pelos valores fundamentais, da dignidade humana, aos quais serve de salvaguarda a proscrição da prova ilícita". (STF, HC 79.512, Rel.: Min. Sepúlveda Pertence, j. 16/12/1999)
  13. A nossa Constituição (art. 5º, inc. LVI) adotou o sistema da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos; isso significa que a prova ilícita sequer pode ingressar nos autos. E, se ingressar deve ser excluída (exclusionary rules). Contudo, deve o dispositivo ser interpretado cum grano salis, até porque, como já se deixou vincado, é plenamente justificável a utilização de provas ilícitas pro reo. Resta saber, agora, se é razoável a admissibilidade de provas ilícitas pro societate no processo penal, em determinados casos concretos.
  14. AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas ilicitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandetinas. 3. ed. ver., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.77.
  15. GRINOVER, Ada Pellegrini. Liberdades públicas e processo penal – As interceptações telefônicas. São Paulo: Saraiva, 1976, p.199.
  16. TÁVORA, Nestor e ANTONNI, Rosmar. Curso de direito processual penal, 2.ed. Salvador: Ed. JusPODIVM, 2009, p.312.
  17. LOPES JR., Aury. Direito Processual e sua Conformidade Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.565.
  18. AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Op. Cit., p.147.
  19. CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 16. ed. Sâo Paulo: Saraiva, 2009, p.307.
  20. OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Op. Cit., p.331.
  21. Idem, p.333.
  22. GONZALEZ-CUELLAR SERRANO, José Francisco. Proporcionalidad y derechos fundamentales en el proceso penal. Madrid: Colex, 1990, p.331.
  23. Idem, p.334.
  24. Rcl nº 2.040/DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, em 21.2.2002 – Informativo STF nº 257, 18 a 22 de fevereiro de 2002.
  25. Ibidem
  26. STF, 1ª T. HC 70.814/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – DJ 24/6/1994.
  27. JHERING, Rudolf Von. A luta pelo Direito. Trad. Richard Paul Neto, Rio de Janeiro, 1978, p.348.
  28. VASCONCELLOS, Roberto Prado de. Provas Ilícitas (Enfoque Constitucional) In: Revista dos Tribunais, nº 791, setembro de 2001, p. 465.
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Sobre o autor
Júlio Medeiros

Advogado criminalista. Professor de Direito Penal da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEDEIROS, Júlio. O mito da proibição de provas ilícitas "pro societate" no processo penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2418, 13 fev. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14356. Acesso em: 7 nov. 2024.

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